The Project Gutenberg eBook of Tres capitaes This ebook is for the use of anyone anywhere in the United States and most other parts of the world at no cost and with almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included with this ebook or online at www.gutenberg.org. If you are not located in the United States, you will have to check the laws of the country where you are located before using this eBook. Title: Tres capitaes Author: José Augusto Corrêa Release date: March 3, 2020 [eBook #61554] Language: Portuguese Credits: Produced by Adrian Mastronardi and the Online Distributed Proofreading Team at http://www.pgdp.net (This file was produced from images generously made available by The Internet Archive/American Libraries.) *** START OF THE PROJECT GUTENBERG EBOOK TRES CAPITAES *** Produced by Adrian Mastronardi and the Online Distributed Proofreading Team at http://www.pgdp.net (This file was produced from images generously made available by The Internet Archive/American Libraries.) TRES CAPITAES Impresso em machina _Marinoni_, na =Typ. Minerva= de Gaspar Pinto de Sousa & Irmão V.ª N.ª de Famalicão José Augusto Corrêa TRES CAPITAES [Illustration] FAMALICÃO TYP. MINERVA DE GASPAR PINTO DE SOUSA & IRMÃO 20—Rua de Santo Antonio—24 1909 _RAZÃO DE SER_ _É opportunissimo o momento de estudar e de tentar descrever as duas grandes capitaes da America do Sul, rivaes pela opulencia, vizinhança, estimulo e por consubstanciarem e traduzirem a riqueza, o porvir, a grandeza e a gloria de duas pujantissimas nacionalidades, destinadas aos mais brilhantes destinos._ _Montevideu, capital de um pequeno Estado, comparado com o Brasil e a Republica Argentina, entre os quaes agita-se, febrilmente, servindo-lhes de constante pomo de discordia, não obstante ser uma cidade importante e interessantissima, póde considerar-se um compasso de espera no parallelo entre o Rio de Janeiro e Buenos-Aires._ _Das três capitaes trata este livro; porém o seu interesse maximo concentra-se na apreciação d’estas duas famigeradas metropoles que, encarniçadamente, disputam-se a primazia sul-americana._ _O auctor percorreu-as pessoal e minuciosamente, detendo-se, com especialidade e interesse, nos pontos em que o seu orgulho e patriotismo de cidadão brasileiro, teve de ceder o logar á admiração pelos progressos affirmados, ha muitos annos, em varios aspectos da grandiosa capital argentina._ _Do terreno sacrosanto e utilissimo da actividade e competencia nas diversas manifestações da civilização e do progresso dos povos e das nacionalidades, não deve admittir-se, hoje em dia, que ultrapasse a rivalidade entre os membros da grande familia humana, collectiva e individualmente considerados._ _Toda a America é um grandioso laboratorio, onde o trabalho e o capital dão-se as mãos no desenvolvimento dos tres grandes factores da prosperidade das nações—a agricultura, o commercio e a industria._ _Os Estados Unidos da America do Norte, porém, attingem, actualmente, o vertice da escala progressiva, tendo dado, ao mundo, o assombroso exemplo de quanto póde a energia de uma raça preponderante, auxiliada pela collaboração de todos os povos da Terra._ _A America Central está dividida em pequenas Republicas que, a cada passo, guerreiam-se e esphacelam-se em mesquinhas lutas de interesses._ _É na parte meridional d’aquelle immenso e uberrimo continente que, n’este instante da vida universal, produz-se, principalmente, a vitalidade da raça latina, quasi expurgada dos vicios hereditarios das suas antigas metropoles, pelos beneficios da immigração e pelas excellencias das instituições democraticas, fundidas no preciocissimo cadinho de uma natureza bella e fecunda._ _Na America do Sul, todavia, nem todas as nações progridem á altura das suas instituições politicas e do sólo ubérrimo que as alimenta._ _No Mar das Antilhas, a Venezuela, dá-nos o degradante espectaculo de uma democracia subjugada por um tyranno demente e senil._[1] _A Colombia, cujo territorio é banhado pelos dois maiores oceanos do nosso planeta, vegeta em condemnavel apathia._ _Encravada entre ella e o Perú, a Republica do Equador mantem-se, equilibrada, no concerto sul-americano._ _Das tres nacionalidades que degladiaram-se, ha annos, por questões de territorio, apenas o Chile conserva relativa importancia, devido á sua invejavel e especialissima situação geographica e topographica._ _Quanto á Bolivia e ao Perú, tardiamente recuperarão as energias perdidas._ _O Paraguay e a Republica Oriental do Uruguay, abafadas pela approximação de dois colossos, debatem-se entre as ambições e os interesses de ambos, influenciadas ora por uma ora por outra das parcialidades rivaes._ _Só o Brasil e a Republica Argentina estão em plena e progressiva prosperidade, pleiteando-se, honrada e gloriosamente, no campo da actividade humana. Por vezes, essa effervescencia ameaça degenerar em conflicto armado, por causa de ambições desmedidas e, especialmente, de vinganças e de represalias entre personalidades rivaes e preponderantes em um e outro paiz._ _Estanislau Zeballos, por exemplo, estadista e escriptor de merecimento, alto commissario e arbitro argentino no pleito das Missões, nunca poude perdoar ao Brasil, em geral, e particularmente ao Barão do Rio Branco, representante brasileiro n’esse litigio, a victoria d’este ultimo._ _Esses dois eminentes cidadãos encontraram-se, ao mesmo tempo, á frente do ministerio das relações exteriores dos seus respectivos paizes. D’ahi más vontades, animosidades, ameaças de rompimento, mal estar geral, atmosphera pesada e quente._ _O Barão do Rio Branco, á força de prudencia e de diplomacia, conseguiu conjurar a tormenta, vencendo, mais uma vez, o seu terrivel adversario._ _Este não desanimou, porém, e saíndo do ministerio, foi para as columnas de «La Prensa», o mais importante jornal argentino, mover tremenda campanha contra o Brasil e o seu rival._ _Crêmos, todavia, que como aquellas, falharão todas as tentativas que, n’uma e n’outra nacionalidade, sejam feitas para alterar a paz entre os dois povos. Estes são bem os successores e os continuadores de hespanhoes e portuguezes, para os quaes o pontifice Alexandre VI dividiu o mundo, em duas partes iguaes, e que gravaram, nas paginas da Historia, feitos de tanta e tão imperecivel gloria, que desafiam a acção deleteria do tempo, e fulgirão, deslumbrantemente, pelos seculos além, até ao ultimo alento vital da humanidade._ _Brasileiros e argentinos continuarão, pacifica e activamente, a desenvolver as suas aptidões e os seus recursos naturaes, de cuja actual importancia póde avaliar-se pela descripção das suas soberbas capitaes._ _O conhecimento e a comparação dos elementos progressivos de ambas, assim como as suas preciosidades e defeitos, poderão servir de orientação e de estimulo no aproveitamento de uns e na eliminação e substituição de outros._ _Eis a razão de ser d’este livro, escripto com toda a imparcialidade e inspirado no interesse e no amôr a que tem direito a grande familia humana, e não sómente o povo entre o qual nascemos e as encostas e os valles que repercutiram os nossos primeiros vagidos e beberam as nossas e as lagrimas das nossas mães._ [1] No momento d’este livro entrar no prélo parece finda a dictadura do general Castro. RIO DE JANEIRO Domingo de Ramos Ás 5 horas da manhã de 12 de Abril de 1908, o velho e rapido transatlantico _Magellan_, da Messageries Maritimes, passou por entre as fortalezas da Lage e de Santa Cruz, e deixando atrás de si a de Villegaignon, fundeou defronte das ilhas Fiscal e das Cobras, N’este momento já o astro-rei emergia do Oriente, a realçar e aureolar a maravilhosa e incomparavel belleza natural da bahia de Guanabara, e do immenso e formosissimo scenario que a abraça em deslumbramentos de apotheose. A amplidão da bahia, semeada de muitas e grandes ilhas, circumdada de duas cidades e de ridentes povoações, a alvejarem por entre verdejantes e floridos maciços; as serras e montanhas, opulentamente vestidas, até aos vértices, e que encantadoramente fecham a orla do horizonte; todo esse empolgante conjuncto, que constitue o mais bello e arrebatador panorama do nosso globo, patenteava-se alli, á nossa vista deslumbrada. Ao mesmo tempo, o nosso pensamento, enlevado nas sublimidades do supremo encanto e da belleza maxima, divinizava-se aos esplendores eternos. Approximavam-se as visitas officiaes e, após ellas, immensos botes e pequenos vapores conduzindo parentes e pessôas amigas dos passageiros. Em um d’elles lobrigamos gente querida, havia muito tempo ausente, e com ella desembarcamos, radiantes de contentamento e anciosos de revêr e percorrer de novo a terra idolatrada, hoje transformada e onde se passaram os melhores annos da nossa mocidade. Era ainda cêdo para almoço. Que fazer? —Dar um passeio, de bonde, até á Gavea, alvitrou alguem. Unanimamente approvada a ideia e ... a caminho. Estavamos em Botafogo, o bairro da aristocracia, do luxo, da elegancia, da formosura e do supremo gosto. O bonde electrico começou a deslisar e os nossos olhos não sabiam o que mais admirar, se os primôres irradiantes da paisagem, se as curiosidades que nos cercavam, quasi originaes para nós, empolgantes e interessantissimas. O vehiculo parou defronte da matriz de S. João Baptista, e foi invadido por numeroso grupo de crianças e senhoras, que empunhavam floridos ramalhetes, de varios tamanhos, vélas de cêra enfeitadas a papeis de côres e cannas servindo de hastes a ramos de flôres. —O que é isto? inquirimos. —Domingo de Ramos, foi a resposta. Continuamos a observar as devotas. Nada póde haver de mais bizarro e extravagante. A variedade de colorido cançaria a paciencia ao mais habil classificador de nuances. Desde o negro retinto e do preto suavisado pelo cruzamento do sangue, até ao vermelho aloirado das filhas de Albion e da Germania, tudo alli se via em mistura de encantos, a contrastar cora as côres berrantes dos vestuarios e com os deslumbramentos da paisagem, ridente de primôres e abrasada de sol. A manhã brilhava na suavidade e frescura do arvoredo, no dorso azulado das montanhas, ao longe acariciadas e envoltas por nuvens que hauriam-lhes as humidas e fecundantes exuberancias. E o electrico continuava sempre a correr entre a apotheose da natureza e os vividos quadros realçados pelas cariocas que empunhavam os ramos commemorativos da entrada triumphal de Christo na cidade deicida. O bonde parára á porta de outra egreja. Era a matriz da Gavea. Grande e garrula renovação, de passageiras. Como as primeiras, as nossas novas companheiras de passeio eram igual e altamente interessantes nas côres do rosto, do vestuario, dos floridos tropheus e, principalmente, n’essa linguagem cantante e dulcissima, que é um encanto para quem vae acostumado ao forte e classico portuguez de Portugal. O tempo aquecêra, porém. A atmosphera tornára-se pesada e humida. As devotas, acclimadas, dessoravam a essencia das suas côres naturaes, emquanto que o nosso possante e adiposo tecido desfazia-se em liquidas camarinhas e ardentes exhalações. Attingiramos o ponto extremo da linha dos electricos da _Botanical Garden_, depois de, por largo espaço, havermos seguido parallelamente a essa maravilha das curiosidades fluminenses que se chama Jardim Botanico. Restava-nos retroceder. As nossas garridas companheiras tinham ficado pelo caminho e desapparecido por entre frondosos e bellos jardins, que abraçavam lindissimas chacaras. Outras passageiras as substituiram; porém o interesse de observal-as tinha, pouco a pouco, cedido o logar a um appetite devorador e á morbida prostração causada pelo vazio do estomago e pela ardencia rigorosa e dissolvente da canicula. Em todo o caso, a primeira impressão fôra de ineffavel agrado e de saudosissimas recordações. Elle ahi estava, bem patente ao nosso olhar investigador, esse Rio de Janeiro exuberante de seducções e de primôres, em profundo renovamento esthetico, mas sempre soberbo e magnificente nos inesgotaveis thesouros da sua pujantissima natureza, que eternamente o sublimarão á hierarchia da mais bella cidade da Terra. E como dirigissemos um ultimo olhar de despedida e de admiração á paisagem circundante, vimos o dorso imponente e alteroso do Corcovado, ligeiramente occulto pelas proprias emanações, liquidificadas em diaphana e alvissima nuvem. O Chapéu de Sol, a refulgente auréola do seu vértice, velado pelas opulencias do ether, trocava segredos com os mysterios do infinito, talvez haurindo dos arcânos da immensidade nova e deslumbrante apotheose, com que divinizar o já inextinguivel diadema de soes, que realça os naturaes esplendores da capital brasileira aos deslumbramentos divinos. Situação e Aspecto Geral Entre 22°43´ e 23°6´ de latitude Sul, 4° de longitude Este, e 35° long. Oeste, abre-se a entrada da bahia e do porto do Rio de Janeiro, apenas com 1:500 metros de largura, mas que, no interior, attinge a amplidão de 28 kilometros por 30 kilometros de comprimento. Os transatlanticos passam por entre as fortalezas da Lage e de Santa Cruz, deixando, á esquerda, a gigantesca mole do Pão de Assucar e a fortaleza de S. João. N’esse momento enfrentam a fortaleza de Villegaignon, já em plena bahia, deixam-n’a á rectaguarda e vão fundear no quadro dos navios mercantes, além das ilhas Fiscal e das Cobras. D’ahi, do centro do mais vasto e bello porto de mar do mundo, a vista abrange um dos mais empolgantes e arrebatadores panoramas do nosso planeta. A magestosa bahia, semeada de oitenta ilhas e ilhotas, é ladeada pelas cidades de Nictheroy, capital do Estado do Rio de Janeiro, na margem oriental, e do Rio de Janeiro, capital da Republica dos Estados Unidos do Brasil, do lado occidental. O horizonte do observador é limitado por serras e cordilheiras, das quaes a mais importante é a dos Orgãos, ao Norte. Ao contemplal-a, da entrada do porto, nota-se a figura de um gigante, deitada sobre o dorso. A immensa bahia de Guanabara, capaz de abrigar todas as esquadras bellicas e mercantes do nosso globo, forma ainda duas enseadas, a de Botafogo e a de Jurujuba. O aspecto geral da capital da Republica, visto do porto é, ao mesmo tempo, formoso e imponente, se bem que, em grande parte, prejudicado pela sua configuração topographica e, especialmente, pelos morros que pejam e encobrem a cidade, ao centro, nas extremidades e em toda a sua circumferencia. Os primeiros são os do Castello, de Santo Antonio, de Santa Thereza, da Gloria e de S. Bento e os outros os da Conceição, Saude, Livramento, Providencia, Mundo Novo, Santos Rodrigues, Urca, Babylonia, Pinto, Paula Mattos, Pasmado, Viuva, Corcovado e Pão de Assucar. A cidade occupa uma superficie de cêrca de dois mil kilometros quadrados, tendo 14 kilometros de extensão, de Norte a Sul, e 16 ditos, de Leste a Oeste. É limitada ao Norte e a Oeste pelos riachos Guandú, Merity e Guandú-Mirim, e ao Sul e Leste pelo Oceano Atlantico. As condições climatericas da capital do Brasil estão hoje muito melhoradas com as importantissimas e grandiosas obras de saneamento e aformoseamento, effectuadas nos ultimos annos, e ainda por outras em execução. Emquanto, porém, o governo e a municipalidade não se resolverem a arrasar, entre outros, os morros do Castello e de Santo Antonio, dando mais ar, mais luz e mais ampla vista á cidade, as manifestações endemicas não deixarão de produzir-se, periodicamente, e com maior ou menor intensidade. A temperatura média é de 24.°, subindo além de 30.° nos mezes de Dezembro a Abril, e descendo a 20.°, de Junho a Setembro. A atmosphera é, quasi sempre, humida, o que explica-se pela abundancia de vegetação, que envolve o Rio de Janeiro em um perenne amplexo de frescura e de belleza. A brisa terrestre, de manhã e á noite, e a que sopra do mar, desde as 11 horas da manhã ao crepusculo, são o providencial lenitivo dos fluminenses, na maior parte do anno. Para abranger-se e gosar-se a mais ampla e a melhor vista geral do Rio de Janeiro, é preciso ascender ao Chapéu de Sol, vértice do morro do Corcovado. Para vistas parciaes, ou geraes, menos extensas do que aquella, prestam-se, entre outros pontos, o Observatorio Astronomico, no morro do Castello, a ponta do Curvello, em Santa Thereza, o Somaré, n’esta montanha, e o zimborio da Candelaria. O aspecto geral da povoação é interessante e variadissimo. O desembarque, no caes Pharoux, praça Quinze de Novembro, proporciona a vista dos dois passeios ajardinados, que formam esta praça, do palacio do Ministerio da Agricultura, do ex-palacio imperial, hoje repartição central dos Correios e Telegraphos, da estatua do general Osorio, ao centro; do Chafariz Colonial, da Cathedral e do templo do Carmo. Seguindo-se a rua Primeiro de Março, ou _boulevard_ Carceler, ampla e bella arteria que se prolonga ao morro de S. Bento, entra-se em plena cidade commercial. Ahi ostentam-se os grandiosos edificios da Bolsa, da egreja da Cruz dos Militares, do Correio Geral, do Supremo Tribunal Federal e do Arsenal de Marinha. D’ella partem e ahi bifurcam-se as estreitas e animadas ruas do Ouvidor, que terá menção especial, do Rosario, Hospicio, Alfandega, S. Pedro, General Camara, Theophilo Ottoni e Visconde de Inhaúma. Tomando-se pela primeira das ruas citadas, e depois de deixar-se, de um e outro lado, as ruas Julio Cesar, Quitanda e travessa do Ouvidor, entra-se na magestosa Avenida Central, que será descripta em capitulo separado. Atravessando-a, continuaremos, ainda pela rua do Ouvidor, que é cortada n’esse trajecto pelas ruas Gonçalves Dias e Uruguayana, até ao Largo de S. Francisco de Paula, centro civico de grande movimento, ponto central dos bondes das Companhias de S. Christovão e Carris Urbanos, as unicas empresas de viação carioca, ou fluminense, que ainda adoptam a tracção animal. N’este largo admira-se a elegante frontaria do templo de S. Francisco de Paula, a estatua de José Bonifacio e o edificio da Escola Polytechnica. A antiga rua do Theatro, communica a praça anterior com a da Constituição, em cujo centro eleva-se a estatua equestre, em bronze, de D. Pedro I, do Brasil. O theatro de S. Pedro de Alcantara, ostenta ahi a sua pesada architectura. Pela ampla rua da Constituição attinge-se a praça da Republica, uma das mais vastas do mundo, com um magnifico parque, circumdado, entre outros, pelos edificios da Municipalidade, Escola Normal, Quartel General do Exercito, Estação Central da E. F. D. Pedro II, Casa da Moeda, Senado e Archivo Nacional. As ruas do Senador Eusebio e do Visconde de Inhaúma, principalmente, communicam a praça da Republica com a praça Onze de Junho e a Avenida do Canal do Mangue, que termina na avenida marginal do novo porto, actualmente em construcção. N’este longo trajecto percorrido pelos bairros mais centraes e interessantes do Rio de Janeiro, a parte mais animada é a comprehendida entre as praças Quinze de Novembro e da Republica. É n’esse espaço, com as suas proximas dependencias, que concentra-se e desenvolve-se a vida commercial e civica da colossal metropole brasileira. Outra corrida de orientação, para o observador intelligente, é a que partindo do ponto central dos bondes electricos da _Botanical Garden_, na Avenida Central, dirige-se ao extremo norte da grandiosa arteria e deixando, á esquerda, o elegante pavilhão de Monroe e o bellissimo Passeio Publico, junto a este entra na grandiosa e bella Avenida á Beira-Mar. Seguindo-a, o passeiante gosa dois panoramas rivaes em interesse e formosura, o da terra e o da bahia. O primeiro proporciona-lhe os encantos irradiantes dos artisticos monumentos do Centenario, da fonte Ramos Pinto, da estatua do Visconde do Rio Branco; o pittoresco dos morros cobertos de casaria, que fecham o horizonte; em frente o legendario outeiro da Gloria, encimado pelo seu celebérrimo santuario e, ao fundo, o famigerado Pão de Assucar, em cuja cúspide será um dia erecta a gigantesca e symbolica estatua da Patria Brasileira que, empunhando o facho deslumbrante da Liberdade e da Gloria, illuminará a immensidade oceanica, a superficie terraquea e os mundos do firmamento com os esplendôres da pujante nacionalidade sul-americana. Deixando, sempre á direita, o Palacio da Presidencia da Republica, a praça do Duque de Caxias, com o bello monumento d’este general, a estatua de José de Alencar e outros monumentos e numerosos bairros, arruados e edificios artisticos e interessantissimos, o forasteiro dará entrada no amplissimo e magestoso Botafogo, precioso escrinio da elegancia, da belleza e do luxo da capital fluminense. Ahi a perspectiva é differente da anterior, mas igualmente empolgante e fascinadora. Do lado esquerdo está a pequena e lindissima enseada de Botafogo que, nascendo da pujante Guanabara, por entre os morros da Viuva e da Urca, vem espraiar-se junto ao paredão da Avenida á Beira-Mar, que continuaremos a percorrer, deslumbrados pelo panorama geral, até que ella termine nos contrafortes da montanha Babylonia, magnifico scenario do ultimo certamen nacional. Dos jardins e avenidas que decoram a esplanada da enseada de Botafogo, partem muitas e formosas ruas, algumas extraordinariamente extensas, como a dos Voluntarios da Patria, e todas ladeadas de lindas chacaras, no meio de floridos jardins e de bosquetes encantadores. É aos portões d’esses minusculos paraisos que, passada a hora da ardencia solar, grupos de formosas e gentis senhoras concorrem a realçar a imponencia arrebatadora do quadro, aureoladas pelos deslumbramentos do crepusculo. O aspecto geral do Rio de Janeiro de hoje, é o de uma grande cidade em completa e radical transformação para melhor. Já muito pouco resta da velha metropole colonial, irregularmente edificada, ao acaso e ao capricho dos influentes locaes. A independencia nacional e, nos ultimos vinte annos, a mudança de regimen politico, deram causa ao despertar de energias civicas que, em breve prazo, farão do Rio de Janeiro, não só a primeira cidade da America do Sul, mas tambem a rival gloriosa das mais celebres capitaes do nosso orbe. Se, interiormente, a metropole fluminense é o que, rapidamente, vimos apreciando e vamos conhecer em detalhe, os seus arrabaldes e suburbios encerram e irradiam tanta pujança, belleza e encantos taes e tão maravilhosos, que a penna, por impotente, não póde traduzir nem pallidamente descrever. Sob este ponto de vista, a capital do Brasil não conhece nem admitte rivaes. O ineffavel amplexo da natureza que, perennemente, a envolve em deslumbramentos de apotheose, attestará ás gerações vindouras que é aqui o paraiso terreal e a metropole universal, por excellencia, onde, em porvir pouco distante, os povos da Terra celebrarão, com a gloria da nacionalidade brasileira, a civilização, o progresso e a grandeza da humanidade. Historia Os historiadores não são concordes sobre a data precisa em que a bahia do Rio de Janeiro foi entrada pelo primeiro europeu. Emquanto uns fixam o anno de 1501 como o da descoberta da magnifica perola fluminense, outros affirmam que só no anno seguinte as aguas da poetica Guanabara foram sulcadas por embarcações portuguezas. Parece mais acceitavel a versão de que o dia 1 de Janeiro de 1502 auxiliou o almirante lusitano Gonçalo Coelho a lançar as ancoras dos seus tres navios nas profundidades guanabarinas. O navegador dirigia-se da Bahia de Todos os Santos a explorar a costa meridional da Terra de Santa Cruz. O facto do almirante não dar o nome de um santo ou santa á nova descoberta, como fizera a outros pontos da costa, anteriormente visitados, explica-se, talvez, pela supposição de que a bahia, que occupava, fôsse a foz de um rio, devido á sua configuração e amplitude. D’ahi o nome de Rio de Janeiro, com que Gonçalo Coelho a baptisou e que ninguem, depois d’elle, se atreveu a mudar. Tanto no littoral como nas principaes ilhas que enfeitam a bahia, o almirante portuguez encontrou estabelecidos os tamoyos, indios da raça tupy, cujas tabas, ou aldeias, estendiam-se em maior e mais densa quantidade, de Uruçumirim, hoje praia do Flamengo, até Paranapuan, ou seja a actual ilha do Governador. Gonçalo Coelho continuou a navegar no rumo do Sul, e só 17 annos depois da sua descoberta, a bahia de Guanabara foi entrada por outra expedição europeia, commandada ainda por um portuguez, Fernão de Magalhães, mas ao serviço da Hespanha. D. Manoel, que ao tempo reinava em Portugal, tinha muito que fazer na Europa e para os lados do Oriente, não lhe sobrando o tempo para occupar-se de novas e longinquas descobertas. Só no reinado de D. João III, seu filho e successor, entrou no Rio de Janeiro a primeira expedição militar portugueza, porque ao rei constára que, desde 1528, os francezes occupavam a bahia e as margens circumvisinhas. Christovão Jaques commandava a esquadrilha lusitana, de reconhecimento, a que seguiu-se o grosso da expedição, sob as ordens de Martim Affonso de Souza, em 1531. Este desembarcou na pequena praia, fóra da barra, que se estende do morro da Babylonia ao da Urca, e que ainda hoje é conhecida pelo nome de porto de Martim Affonso. Expulsos os intrusos, o commissario de D. João III, voltou, com as suas caravellas, para a Bahia de Todos os Santos, ficando novamente Rio de Janeiro desguarnecido. Foi preciso que, vinte e quatro annos depois, em 1555, os francezes voltassem á carga, sob o commando do almirante Nicolas Durand de Villegaignon, para que o rei de Portugal, passados cinco annos, ordenasse a Mem de Sá, terceiro governador geral do Brasil, que expellisse os invasores. Villegaignon, que sonhára fundar a França Antartica em terras de Santa Cruz, desembarcou á entrada da barra, na ilha da Lage, hoje fortificada, passando a occupar e a guarnecer a ilha de Serygipe, que, desde então, é conhecida pelo nome do almirante bretão, não obstante elle havêl-a baptisado _Fort Coligny_. Quando, em 1560, Mem de Sá entrou, com onze navios, o porto do Rio de Janeiro, encontrou os francezes na melhor harmonia com os tamoyos, e reforçados por uma esquadrilha, ao mando de Bois Le Comte. Batidos, os invasores fugiram nos destroços dos seus navios, porém voltaram quatro annos, mais tarde, e estabeleceram-se na actual ilha do Governador, então Moracaia, ou Paranapuan. D’esta vez foi um sobrinho de Mem de Sá, Estacio de Sá, que partiu directamente de Portugal ao Rio de Janeiro, a fazer frente aos obstinados usurpadores. Foi em Abril de 1565 que a nova expedição deu entrada na bahia de Guanabara, e depois de reconhecer as fortes posições dos francezes, desembarcou no porto de Martim Affonso. Ahi, entre os morros da Urca e de Babylonia, o oceano Atlantico e a enseada de Botafogo, fundou Estacio de Sá uma povoação, Villa de S. Sebastião, Durante dois annos conservou-se o commandante portuguez n’esta posição, em continuas escaramuças com os francezes e os tamoyos, seus alliados, até que em 18 de Janeiro de 1567, appareceu Mem de Sá com cinco galeões e seis caravellas, bem guarnecidas, em auxilio do sobrinho. Logo tres dias depois, em 20 de Janeiro, os indios e os francezes fôram atacados e destroçados por mar e por terra. Em pleno combate, Estacio de Sá, teve o rosto varado por uma flexa, morrendo trinta dias depois e sendo sepultado na ermida de S. Sebastião. Para celebrar a victoria, Mem de Sá, elevou a nascente povoação á cathegoria de cidade de S. Sebastião do Rio de Janeiro, resolvendo transferil-a para o actual morro do Castello, sitio mais central e menos accessivel aos ataques dos inimigos. Realisado este intento, e depois de cercar a nova cidade de muralhas e de fazer erigir no cume da montanha uma capella sob a invocação do orago da localidade, o governador geral regressou á Bahia, entregando o governo do Rio de Janeiro, a outro sobrinho seu, Salvador Corrêa de Sá. Este, alguns annos depois, fez trasladar a ossada do primo, da velha ermida, junto do Pão de Assucar, para a capella-mór do novo santuario. Cobre o tumulo uma lapide, com os seguintes dizeres: «Aqui jaz Estacio de Sá Capitão e conquistador d’esta terra e Cidade. E a campa mandou fazer Salvador Corrêa de Sá, seu primo, segundo capitão e Governador, com suas armas. E esta capella acabou no anno de 1583». A inscripção esquece-se de mencionar o principal titulo e a gloria immortal da pessôa a quem se refere—a de fundador do Rio de Janeiro. Da sua leitura conclúe-se que Estacio de Sá conquistou a cidade, o que não é verdade. Salvador Corrêa de Sá, que governou durante trinta annos e morreu na idade de 113 annos, teve a habilidade de transformar os tamoyos em amigos dos portuguezes, e a tal ponto que o chefe indigena Ararygboia, foi o seu principal auxiliar nas luctas que teve de sustentar com os francezes, que não podiam conformar-se com a ideia de dar de mão á sua sonhada colonia Anctartica. Taes foram os progressos da nova cidade, e tambem das suas immediações que, em 1608, o governo de Lisbôa elevou-a á cathegoria de governo geral, comprehendendo as capitanias de S. Paulo, do Espirito Santo e do Rio de Janeiro. Depois da audaciosa tentativa de Villegaignon, o mais sério ataque dos francezes contra a preciosa perola de Portugal, realisou-se em 1710, sob o commando de Duclerc. Tendo desembarcado, em 11 de Setembro d’esse anno, na praia de Guaratiba, o inimigo conseguiu penetrar até ao centro da cidade, onde foi batido pela pequena guarnição militar, poderosamente auxiliada pelo povo e, especialmente, pelos estudantes. Dos 1:100 invasores, 400 pagaram, com a vida, as velleidades de conquista, entregando-se os restantes á benevolencia dos vencedores. Quanto a Duclerc, foi assassinado por um desconhecido, seis mezes após estes acontecimentos. O celebre Duguay-Trouin foi encarregado de vingar a derrota do collega, o que conseguiu, ganhando um combate naval, nas aguas guanabarinas, contra a armada lusitana e obrigando os habitantes da cidade a pagar-lhe um tributo de 610:000 cruzados, cem caixas de assucar e 200 bois. Quando, em 1733, o conde de Bobadella, general Gomes Freire de Andrade, foi nomeado governador do Rio de Janeiro, esta cidade entrou em activa phase de prosperidades, sendo, em 1762, elevada a capital do Brasil, e recebendo o conde de Bobadella o titulo de vice-rei. No seu governo foi importada, de Cayenna, a planta do café e construido, entre outros melhoramentos, o famoso aqueducto da Carioca. Desde 1763, anno em que falleceu Gomes Freire de Andrade, até 1808, data da chegada de D. João VI ao Rio de Janeiro, governaram o Brasil, o conde da Cunha, o conde de Azambuja e o marquez de Lavradio. Com a presença e demora da côrte portugueza, pelo espaço de treze annos, desenvolveu-se extraordinariamente a capital brasileira. O fugitivo monarcha começou por franquear os portos do Brasil ao commercio de todo o mundo, em 1 de Junho de 1808, memoravel data, cujo centenario foi, no anno passado, celebrado pela Exposição Nacional. D. João VI fundou, no Rio de Janeiro, a Côrte de Justiça, a Academia de Marinha, o Supremo Conselho Militar, a Fabrica de Polvora, o Banco do Brasil, a Escola de Medicina, o Tribunal do Commercio, os Archivos Militares, a Imprensa Real, o Jardim Botanico, a Bibliotheca Nacional, etc. Em 10 de Setembro de 1808, publicava-se a «Gazeta do Rio de Janeiro», primeiro jornal fluminense, impresso em uma typographia da rua dos Barbonos. Foi de 1:200 contos de réis o primeiro capital do Banco do Brasil, inaugurado em 12 de Outubro de 1808, data inolvidavel na prosperidade e grandeza da nação brasileira. O _rei tabaqueiro_, na phrase dos seus detractores, que na metropole fizéra má politica e pessima administração, acabando por abandonar a patria ao jugo dos invasores, com a mudança de hemispherio, mudou de temperamento e quiçá de ideias politicas e administrativas, a tal ponto, que a sua viagem forçada á grande colonia sul-americana, assignalou um periodo de assombroso desenvolvimento para o Brasil. O rei cercou-se de gente de grande valor e de prestigio, tal como Lebreton, membro do Instituto de França, os irmãos Taunay, João Baptista Delbret, Zeferino Ferrez, sabios e artistas do pincel e do escopro e, acima de todos, Grandjean de Montigny, que nos legou a admiravel concepção architectonica da Academia das Bellas Artes, álem de outros trabalhos de que teremos conhecimento. Em 26 de Abril de 1821, D. João VI regressou a Lisbôa, deixando na regencia do Brasil, o principe D. Pedro, seu filho. Logo no anno seguinte, em 7 de Setembro, andando o regente a viajar por S. Paulo, taes noticias recebeu da côrte de Portugal, inadmissiveis pelas suas exigencias, que alli mesmo, nas margens do Ipyranga, proclamou a independencia do Brasil. A 30 d’esse mez, apresentou-se o principe no Rio de Janeiro, em um camarote do theatro S. Pedro d’Alcantara, ostentando a legenda—Independencia ou Morte. Este acto é especialmente notavel por antecipar acontecimentos que forçosamente teriam de realisar-se em breve futuro, devido ao gráu de prosperidade da mais preciosa joia de Portugal e ás absurdas medidas adoptadas pelas côrtes portuguezas, no intuito de contrariar os desejos de independencia, que já começavam a manifestar-se no Brasil. Foi a antiga colonia transformada em imperio e o seu regente em imperador. Este facto teve logar no Rio de Janeiro, em 12 de Outubro de 1822. Em 7 de Abril de 1831, D. Pedro I foi obrigado a abdicar a corôa em seu filho D. Pedro d’Alcantara, criança de 5 annos, e a retirar-se para a Europa. As principaes causas d’esta resolução foram os actos absolutistas do novo imperador, entre os quaes avultaram a dissolução da Assembleia Constituinte e um vergonhoso tratado celebrado com Portugal. Á abdicação precederam as noites das _garrafadas_, ou de motins populares, sangrentos para a população do Rio de Janeiro. Durante o reinado de D. Pedro II, e álem do facto capital da guerra do Paraguay, muitos acontecimentos politicos se deram na capital do imperio, que seria longo e fastidioso enumerar, e augmentariam demasiadamente este capitulo. Não podemos, todavia, deixar de mencionar o 13 de Maio de 1888 e o 15 de Novembro de 1889, datas, respectivamente, da abolição da escravidão em todo o territorio nacional e da proclamação da Republica dos Estados Unidos do Brasil. O aureo e glorioso decreto de 13 de Maio, foi assignado por D. Izabel, regente do imperio, ex-princeza imperial e ainda hoje condessa d’Eu, na ausencia de seu pae, o imperador D. Pedro II, que viajava pela Europa. Não obstante os protestos dos conservadores, interessados e tradicionalistas, tal acontecimento foi motivo de grande regosijo para a população fluminense, e teve por immediata consequencia a mudança de instituições politicas, em 15 de novembro do anno seguinte, pelo exercito e pela armada, com o tacito consentimento do povo brasileiro, em geral, e muito especialmente dos habitantes do Rio de Janeiro. Na presidencia do marechal Floriano José Vieira Peixoto, 2.º presidente da Republica e successor do marechal Manoel Deodoro da Fonseca, teve logar, na bahia de Guanabara, de 1892 a 1894, a revolta da armada, sob o commando do contra-almirante Custodio José de Mello. No espaço de muitos mezes, a cidade do Rio de Janeiro foi bombardeada e muito damnificada, se bem que com a hostilidade da esquadra mais soffresse a sua visinha fronteira, a cidade de Nictheroy, capital do Estado do Rio de Janeiro. No Arsenal de Marinha, um soldado de infantaria tentou assassinar o dr. Prudente José de Moraes Barros, presidente da Republica, de 1894 a 1898, conseguindo trespassar, com a bayoneta, o marechal Machado Bettencourt, ministro da guerra, que se interpuzéra. Desde então, a paz não tem sido perturbada, na capital da Republica, que Municipio Neutro, por decreto de 1884, e Districto Federal, pela Constituição de 24 de Fevereiro de 1891, conta hoje uma população superior a 900 mil habitantes e, concluidos os melhoramentos que a transformam, por completo, será, indiscutivelmente, a primeira cidade da America do Sul e uma das mais bellas e importantes metropoles do mundo. Phases Fluminenses Nos dois primeiros seculos de existencia civica, Rio de Janeiro progrediu morosamente, por duas causas principaes—o abandono da metropole e as constantes hostilidades dos francezes e dos indios. Em 1618, isto é, 43 annos depois da sua fundação, a cidade apenas contava uns 3:500 habitantes, incluindo a guarnição militar. Dois seculos mais tarde, quando D. João VI desembarcou na capital do Brasil, apenas havia, mal edificadas, 46 ruas, 19 praças, campos e largos e 4 travessas. Foi n’essa epocha que teve inicio o grande desenvolvimento da cidade. Em cincoenta annos de progresso, o seu activo era de 284 ruas, 47 praças, 42 travessas, 27 morros e 30 praias habitadas, nas proximidades. A povoação, já immensa, galgava e contornava as collinas que a pejam e circumdam, estendendo-se pelo Engenho de Dentro, Laranjeiras, Andarahy Grande, Gavea, Tijuca, Villa Izabel e outros pontos. A segunda fortaleza construida para defeza da cidade occupava o logar da actual egreja da Cruz dos Militares, que era então beira-mar. As egrejas de S. Domingos e da Lampadosa foram construidas, no seculo XVIII, fóra da cidade que, em 1700, apenas attingia o ponto por onde hoje passa a rua de Uruguayana. Em 1572 foi uma temeridade edificar-se, _no sertão_, o templo de S. Francisco Xavier. O primitivo santuario da Candelaria, foi construido em 1604, e as egrejas de Santa Luzia e de N. S. da Conceição, em 1592 e 1600, respectivamente. A actual egreja de S. Sebastião do Castello é a terceira erguida no mesmo local, desde a trasladação da cidade, não obstante a data que encima o portico ser a da fundação do primeiro santuario, inscripção conservada no mesmo logar, assim como, na capella-mór, tem sido respeitado o tumulo de Estacio de Sá, o primeiro dos fluminenses. O primeiro corpo administrativo e municipal que teve o Rio de Janeiro, com o nome de Senado da Camara, era constituido por tres vereadores, um procurador, um escrivão, dois almotacés e o Juiz de Fóra, que presidia. No anno da chegada de D. João VI ao Rio de Janeiro, este senado estabeleceu, por meio de marcos de pedra, os limites da cidade junto aos rios das Laranjeiras e Comprido, por um lado, e por outro junto ao mar, em toda a circumferencia. Foi tal o desenvolvimento commercial e civico da capital, no primeiro quartel do seculo XIX, e eram tão estreitas, tortuosas e deficientes as arterias publicas existentes n’essa epocha que, em 1838, a Camara publicou uma postura ordenando que todas as vias publicas da cidade, e seu termo, tivessem, pelo menos, sessenta palmos de largura. Em 1893, a Prefeitura decretou que essa amplitude fôsse, no minimo, de 17 metros. O primeiro nivelamento das ruas, calçamento e illuminação, foi começado em 1854, e dois annos depois a municipalidade prohibiu as aguas furtadas e mandou que todos os projectos de construcção fôssem submettidos ao seu exame e approvação. Deve-se, porém, á Republica, em geral e, especialmente, a tres eminentes patriotas—o dr. Rodrigues Alves, presidente da Republica; dr. Lauro Müller, ministro da Viação e Obras Publicas e dr. Francisco Pereira Passos, Prefeito Municipal, a transformação do Rio de Janeiro colonial, com todos os defeitos das povoações da metropole, aggravados pelos caprichos dos mandões locaes, em uma grande cidade, moderna, rival das mais bellas capitaes do nosso planeta. Pertence á iniciativa e execução do Governo, principalmente, a construcção do porto, com cáes acostaveis, na extensão de 3:500 metros; a magestosa e formosissima Avenida Central, de mar a mar, rasgando 16 das velhas e movimentadas ruas da cidade, e as obras especiaes de saneamento da capital, que déram em resultado a extincção da febre amarella e de outras molestias endemicas e epidemicas, de ha muito acclimadas no sólo fluminense. A Prefeitura, ou Municipalidade, no espaço de 4 annos, de 1903 a 1906, executou e iniciou os seguintes melhoramentos: —Avenida á Beira-Mar, do Passeio Publico á Praia Vermelha, no comprimento de 5:200 metros e com a largura de 33 metros. —Avenida Mem de Sá, na extensão de 1:540 metros, desde o largo da Lapa até á rua Frei Caneca, atravessando as ruas dos Arcos, Lavradio, Riachuelo, Rezende e Invalidos. —Avenida Salvador de Sá, ligando a rua Estacio de Sá, com a rua Frei Caneca. —Alargamento, para 17 metros, d’esta rua e das do Visconde do Rio Branco, Carioca e Assembléa. —Prolongamento e alargamento da antiga rua de S. Joaquim, hoje Marechal Floriano, até ao largo de Santa Rita. —Prolongamento da rua Visconde de Inhaúma até ao mar, na extensão total de 1:500 metros e largura de 23. —Prolongamento da rua do Sacramento até á rua do Marechal Floriano, com a largura de 15,ᵐ60. —Alargamento da rua Camerino. —Prolongamento e alargamento da rua da Prainha, hoje do Acre, até ás ruas Marechal Floriano e Uruguayana. —Transformação d’esta rua, com a largura de 17 metros, arborisação e edificação de grandiosos predios. —Alargamento e transformação da rua Treze de Maio. —Ajardinamento do largo da Gloria, da esplanada de Botafogo, do Alto da Boa Vista, na Tijuca, e da praça Quinze de Novembro. —Ampliação e embellezamento do Cáes Pharoux. —Prolongamento da travessa de S. Francisco ao largo da Carioca. —Transformação da praça Marechal Deodoro. —Ampliação do palacio da Prefeitura. —Construcção da estrada das Furnas, na Tijuca. —Canalização do Rio Carioca. —Construcção do Theatro Municipal. —Construcção do Mercado Central e de mais tres mercados regionaes. —Decretação do alargamento e recúo de oitenta ruas. —Aperfeiçoamento do calçamento de numerosas ruas e augmento da sua illuminação. —Transformação do quadrilatero da praça da Republica, defronte do Quartel General do Exercito. Para tão pequeno espaço de tempo é assombroso o trabalho realisado pela municipalidade do Rio de Janeiro. O governo geral está procedendo á construcção de uma gigantesca avenida, que começando junto da Avenida Central, passe defronte do novo porto e vá terminar na praia de S. Christovão, communicando assim esta com a bellissima praia de Botafogo, na extensão de 10:500 metros. Será, incontestavelmente, a primeira arteria do mundo, em dimensões, porque em belleza, supplantal-a-ha a Avenida Oceanica que, partindo da Avenida Beira-Mar, na Praia Vermelha, contornará, exteriormente, o Pão de Assucar e, pelas praias da Copacabana, do Leme e de Ipanema irá terminar no extremo-sul da praia da Gavea. E de tudo isso que ahi fica exposto, o que ainda não está prompto ou iniciado, será concluido no espaço de poucos annos, porque o Brasil, em geral, e muito especialmente a sua esplendorosa capital, entraram, decididamente, pela descentralisação administrativa e sob a egide de instituições democraticas, na rapida e brilhantissima senda dos seus gloriosos destinos. Monumentos Candelaria Ha duas versões sobre a fundação d’este santuario. Segundo a maioria dos auctores, Antonio Martins da Palma, hespanhol, da ilha de Palma, e com mandante de um navio de trafego, vendo-se naufragado, prometteu á Virgem da Candelaria, muito venerada na sua ilha, erigir-lhe uma capella no primeiro terreno que pisásse, vindo aportar ao Rio de Janeiro e desembarcando no local do actual templo, acompanhado de sua mulher, Leonor Gonçalves. Outros escriptores affirmam que á primitiva ermida foi dado o nome de uma velha náu, chamada N. S. da Candelaria, encalhada n’aquelle local, e que foi com o madeiramento d’essa embarcação que se edificou o primeiro santuario, em 1604. As obras do actual monumento foram começadas em 1776, e cento e vinte e dois annos se passaram antes da sua conclusão. Francisco João Roscio, engenheiro e sargento-mór de Portugal, fez o desenho do exterior do templo, em estylo barroco. Concluiu a obra, em 1898, o engenheiro civil dr. Antonio de Paula Freitas, que a dirigiu durante vinte annos, succedendo aos architectos Job Justino de Alcantara, Gustavo Waehnldt, Bettencourt da Silva, Ferro Cardoso e Evaristo Xavier da Veiga. A frontaria, toda de granito e ladeada por dois soberbos campanarios, é de magestoso aspecto, e melhor sobresairia se mais vasto fôsse o espaço em que se eleva. Quatro portas de bronze dão entrada ao imponente e artistico santuario, ellas mesmas primôres de arte e devidas á genial concepção do esculptor portuguez Teixeira Lopes. A decoração interior é em estylo corinthio e constitue o principal valor e attractivo do monumento. É marmoreo todo o revestimento mural, niveo, de Carrara, nas pilastras, cornijas e entablamento, preto nos pedestaes e vermelho nos paineis. Álem d’estas tres côres e qualidades, o altar-mór ostenta o lapis-lazuli, o brocatello, o verde antigo, o malachito e o amarello de Verona. Os nove altares lateraes são de marmore branco, de Carrara. Nas abobadas, revestidas de alvenaria de tijolo, ha pinturas historicas de Zeferino da Costa. Numerosos quadros, bellas esculpturas e preciosos dourados completam a decoração interior da Candelaria, santuario da religião e da arte. O templo é aberto em tres naves, a do centro formosa e vastissima; as lateraes apenas a communicar os altares. Todo o monumento occupa a area de 3:520 metros. As suas dimensões, quanto á planta geral do edificio, são de 80 metros de comprimento por 44 de largura. O corpo de entrada, ou principal, tem 43,ᵐ40 de comprimento, por 12 de largo, excluindo as naves lateraes. A altura total do edificio, sobre o nivel do mar, é de 76 metros. As torres teem 57 metros de altura. Este precioso monumento é coroado por um zimborio de cantaria, tijolo e marmore de Lisbôa, formado por 1:422 blócos de pedra, com o pêso de 630 toneladas, e alto de 64 metros. Do seu vértice descortina-se amplo e bello panorama geral da cidade, bahia, arrabaldes e suburbios. O zimborio foi construido, successivamente, pelos engenheiros-architectos Bettencourt da Silva, Ferro Cardoso e Evaristo Xavier da Veiga. Álem das pinturas decorativas das abobadas e muralhas, executadas, principalmente, pelos artistas Costa e Tunes, e cujos assumptos prendem-se á lenda dos fundadores do santuario e ás phases da sua construcção, ha a admirar, entre outras artisticas curiosidades, o Baptisterio, á esquerda da entrada principal. A pia é de roseo marmore da Arrabida, e a tampa é de bronze cinzelado, trabalho de Manoel Ferreira Tunes. É dourada a fogo e produz maravilhoso effeito. Do lado posterior do baptisterio vê-se um precioso tabernaculo, sobre uma banqueta. Na parede do fundo avulta um baixo-relevo, em cedro, representando o baptismo de Christo, trabalho do mesmo artista. Theatro Municipal Dez annos antes da inauguração das obras, que teve logar em 20 de Novembro de 1904, já a municipalidade tributava as companhias theatraes, as emprezas de diversões publicas e até os vendedores de bilhetes para espectaculos, com destino á edificação do Theatro Municipal. No momento da publicação d’este livro estará elle concluido e, talvez, inaugurado. É um grandioso e bello monumento, que occupa a area de 4:127 metros quadrados, entre a Avenida Central, o becco Manoel de Carvalho, a rua Treze de Maio e a praça Ferreira Vianna. Está edificado sobre cêrca de 1:700 estacas de massaranduba, sapucaia, oleo vermelho, graúna e angelim pedra, batidas em terreno barrento e arenoso. Trabalharam regular e diariamente 500 operarios, durante os cinco annos da sua construcção e decoração, que consumiram quantia superior a 12:000 contos de réis. O auctor do projecto e engenheiro-chefe da sua execução, foi o dr. Francisco de Oliveira Passos. Eis algumas notas escriptas durante uma visita a este monumento, em Maio de 1908: No rez-do-chão, deposito d’agua com a capacidade de 200:000 litros. Motor da força de 115 cavallos, para ventilação. Entradas especiaes, para o Presidente da Republica, do lado da Avenida Central e para o Prefeito Municipal, pela rua Treze de Maio. Paredes decoradas a mosaico francez, representando scenas das principaes peças do theatro universal. Escadarias de marmore branco, decoradas a bronze dourado. Sala de espectaculo. Uma ordem de frisas, duas de camarotes e uma de amplas galerias. Pintura em branco e profusa illuminação. Camarotes especiaes, á direita, para o Chefe do Estado, á esquerda para o Prefeito Municipal. Tecto pintado sobre téla, por Visconti. Lotação total, para 1:700 pessôas. Cinco entradas para a plateia. Todo o pavimento dos corredores dos camarotes é a mosaico, bem como o das frisas e galerias. O vestibulo é em marmore de côres, avultando o verde e o côr de rosa. Elegantes columnas de roseo marmore circumdam os pavimentos superiores, ornamentando a escadaria. Os capiteis das columnas são a bronze dourado. Todo o marmore empregado no edificio foi importado de Portugal, da França e da Italia. Ha dois terraços—varandas, lateraes e exteriores, a seis columnas de marmore mesclado e pavimento a mosaico. As bancadas geraes da ultima ordem são de peroba e comportam mais de 800 pessôas. Na caixa do theatro, todos os pannos são movidos a electricidade. Os camarins, em tres pavimentos, com installação hydrotherapica no 1.º, são vastos, arejados e profusamente illuminados. Em um prédio contiguo estão os motores electricos para a illuminação geral do edificio. O porão do theatro, está seis metros abaixo do nivel do sólo. Em caso de incendio, a scena será immediatamente inundada por machinismo especial. Todos os relogios da casa funccionam electricamente, pela energia que lhes é transmittida por um relogio central. A illuminação da sala é feita por um systema original, que consiste em lampadas disfarçadas no oval dos balaustres. A mobilia da plateia e dos camarotes é de mogno vermelho, com incrustações de páu-marfim. O fundo dos camarotes e galerias é de pellica côr de rosa, bem como as guarnições das balaustradas. Ha um ascensor para a communicação geral da caixa do theatro e um salão para bibliotheca da especialidade. As portas e janellas do _foyer_ são de carvalho e crystal. O aspecto geral, como os detalhes, até aos mais minuciosos, obedecem ás mais modernas condições, de hygiene, aceio e luxo. Gabinete Portuguez de Leitura A associação fundadora d’este monumento, data de 10 de Setembro de 1847, e a inauguração do edificio teve logar cincoenta annos depois. Eleva-se na rua Luiz de Camões, defronte da travessa da Academia, a pouca distancia do largo de S. Francisco de Paula. O Gabinete é uma joia artistica, interior e exteriormente, e o mais bello padrão de gloria da colonia portugueza no Rio de Janeiro. A frontaria, elegantissima, é de pedra lioz, em estylo manuelino. Decoram-n’a as estatuas de Camões, Vasco da Gama, Pedro Alvares Cabral e do Infante D. Henrique. No interior, além da secretaria e de varias peças interessantes, ha dois salões notabilissimos pelas dimensões e pela belleza architectonica e decorativa. O salão da Bibliotheca, occupa toda a altura do edificio, na dimensão de 23 metros. É ladrilhado a mosaico e illuminado por bellissima claraboia de vitraes coloridos. Está dividido em tres pavimentos, por galerias circulares, guarnecidas a columnas de ferro dourado. O golpe de vista é empolgante e maravilhoso. As artisticas estantes que forram este salão, comportam 85:000 volumes, entre elles a mais celebre camoneana do mundo. O salão nobre, ou de Honra, é decorado com os escudos de todas as cidades de Portugal. Ha mais a admirar, o album commemorativo de Eduardo de Lemos, o fundador do Gabinete; os bustos do mesmo, de Joaquim da Costa Ramalho Ortigão, de Eça de Queiroz e de D. Carlos I; a miniatura da canhoneira _Patria_, vitrinas com preciosidades bibliographicas, a mesa da Directoria, etc. O monumento importou em 592 contos de réis, mas quasi outro tanto se tem gasto em melhoramentos e reparações. O Gabinete conta um fundo social de 800 contos e 114 socios benemeritos, 39 honorarios, 26 correspondentes, 1:327 remidos e 357 contribuintes. Foi architecto do edificio o portuguez Frederico José Branco. Academia das Bellas Artes Foi fundada em 1816, pelo vice-rei Conde da Barca, que contratou 11 professores francezes, para as cadeiras de desenho, pintura, esculptura, architectura e mechanica. Chamou-lhe o fundador, Real Academia de Desenho, Pintura, Esculptura e Architectura Civil. A frontaria é obra de Grandjean de Montigny. Nota-se um artistico portão de ferro, do mesmo artista; baixos relevos, de Zeferino Ferrez; uma sacada com balaustres de bronze, e seis columnas jonicas; as estatuas de Minerva e de Appolo e, a rematar, o frontão decorado pela classica quadriga, execução de Ferrez, como o restante é de Montigny. Em 1855, este edificio foi augmentado pelo architecto Job Justino de Alcantara. A Academia foi inaugurada em 5 de Novembro de 1826, por D. Pedro I, e por iniciativa do ministro Visconde de S. Leopoldo. A primeira exposição publica de trabalhos artisticos, teve ahi logar em 1829, expondo, entre outros, os artistas Debret, Grandjean e Marcos Ferrez. A sala de leitura é decorada a pinturas de Montigny e de Ferreira, seu sobrinho. Ha ahi muitos retratos de pintores celebres. Bibliotheca da especialidade. Ao subir a dupla escadaria, veem-se quadros de Pedro Americo, Grandjean e Ferreira. A notar, _Santa Thereza de Jesus_, pelo primeiro. Salão da Escola Nacional. Ao centro, _Batalha de Avahy_, por Pedro Americo. O proprio pintor está retratado á frente do regimento n.º 33. Em frente, _Batalha de Guararapes_, por Victor Meirelles. O _Ultimo Tamoyo_, esplendido trabalho de Rodolpho Amoedo. Do mesmo auctor:—_Partida de Jacob_. De Henrique Bernardelli:—_Os Bandeirantes_. Segue-se uma galeria de escólas estrangeiras, de pintura, onde está principalmente representada a escóla italiana. Ha preciosidades artisticas de Raphael, Rubens, Ticiano, Ribera, Velasquez, e de outros pintores immortaes, que o visitante não póde apreciar, devido á péssima exposição dos quadros. A notar, ainda, _A Noite_, de Pedro Americo. A collecção artistica d’esta Academia, é avaliada em 4:000 contos. O magnifico palacio das Bellas Artes, em construcção na Avenida Central abrigará, brevemente, estas e outras preciosidades esparsas por diversos edificios da capital da Republica. Grupos e Estatuas _Monumento do Centenario_—Na praça da Gloria, que mede 20:000 metros quadrados, e sobre um pedestal de granito, da altura de 4 metros, eleva-se o grupo, em bronze, commemorativo do 4.º centenario da descoberta do Brasil. É alto de 10 metros e consta das figuras bem lançadas de Pedro Alvares Cabral, Pero Vaz de Caminha e Fr. Henrique de Coimbra, respectivamente commandante, escrivão e capellão da frota descobridora. O monumento é de Rodolpho Bernardelli, e foi encommendado pela Associação do Quarto Centenario do Descobrimento do Brasil. A arte casa-se aqui com a imponencia e a formosura do aspecto geral. * * * * * _Fonte Ramos Pinto_—Este gracioso e artistico monumento está collocado ao centro do jardim que aformoseia a Praça da Gloria. Foi offerecido á cidade do Rio de Janeiro, pelos viticultores portuenses Adriano Ramos Pinto & Irmão, e é um gigantesco blóco de marmore branco, decorado por quadros estatuas. A execução, do esculptor Thevenet, é primorosamente artistica, especialmente a da figura feminina que, tendo um joelho poisado sobre uma anfractuosidade da rocha, mostra a parte posterior ao publico. É tão perfeito este trabalho, que provocou a regeição do prefeito Francisco Pereira Passos, com o pretexto de que excitaria os instintos libidinosos das baixas camadas populares. Com grande reluctancia, Thevenet praticou o enorme delicto artistico de cobrir a estatua com uma ligeira camisa, que não deixa de accusar-lhe o primôr das fórmas. * * * * * _Estatua Equestre de D. Pedro I_—A erecção d’este monumento foi approvada em sessão do Senado da Camara Municipal do Rio de Janeiro, a 11 de Maio de 1825. Esta resolução não teve seguimento, bem como outras posteriores tentativas, até que em 7 de Setembro de 1854, a Camara Municipal approvou nova proposta do seu presidente, dr. Roberto Jorge Haaddock Lobo. Para o custeio foi aberta uma subscripção publica, por intermedio das camaras municipaes de todo o paiz. Tambem foi aberto concurso entre artistas nacionaes e estrangeiros, cabendo o 1.º premio ao brasileiro João Maximiano Mafra, quanto ao projecto e desenho, sendo a execução confiada ao esculptor francez Luiz Rochet, o 3.º concorrente premiado. A pedra fundamental do monumento foi collocada em 1 de Janeiro de 1862, realisando-se a inauguração em 30 de Março do mesmo anno. A estatua, que custou 334:710$375 réis, occupa o centro da praça da Constituição. A base é de granito, seguindo-se-lhe o pedestal, em bronze, ornamentado a grupos que representam os grandes rios do Brazil—Amasonas, Paraná, Madeira e S. Francisco, symbolisados por indigenas, cuja expressão é eminentemente artistica. O friso do pedestal é guarnecido por escudos, que representam as vinte provincias brasileiras. D. Pedro I está a cavallo e em grande uniforme de general. Na mão direita, o imperador empunha a Carta Constitucional do Brasil. O peso total do monumento é de 55:000 kilos. A sua altura é de 3,ᵐ30 na base, 6,ᵐ40 no pedestal e 6 metros da estatua equestre. * * * * * _Estatua do Visconde do Rio Branco_—Eleva-se ao sul da Praça da Gloria, e a pouca distancia da Fonte Ramos Pinto. É de bronze e foi modelada e fundida pelo esculptor francez Charpentier. A figura está sentada e veste o uniforme de senador do imperio. A mão direita descansa sobre dois livros do Visconde—_A Convenção de 20 de Fevereiro e Collecção de Leis do Brasil_. A base, de gneiss do Brasil, sustenta o pedestal, de pedra do Jura, e a estatua da Historia, em bronze, que lê, em uma tábua, a seguinte phrase de Tacito—_Autoritate Constantia fama inquantam proeumbante imperatoris fastigio datus clarus_. Este monumento foi inaugurado em 13 de Maio de 1902, anniversario da promulgação da lei que extinguiu a escravidão no Brasil, e em homenagem ao estadista que fez votar a lei do ventre livre. * * * * * _Estatua do Duque de Caxias_—Este primôr de esculptura, talvez o melhor trabalho de Rodolpho Bernadelli, ergue-se, desde 15 de Agosto de 1899, ao centro do Jardim e da Praça do Duque de Caxias. O monumento é equestre, em bronze, e assenta sobre um pedestal de marmore de Carandahy. São notaveis, como obra de arte, os baixo-relevos que ornam o pedestal. O marechal, que monta um cavallo de raça, sustenta, na mão direita, um oculo de alcance. * * * * * _Estatua de José de Alencar_—Foi inaugurada em 1897, e ergue-se na pequena praça que enfrenta o Hotel dos Estrangeiros, entre o Cattete e Botafogo. É de bronze e de Rodolpho Bernardelli. Alencar está sentado em uma poltrona que tem, por base, um blóco de marmore cinzento. Nas quatro faces do pedestal ha baixo-relevos representando scenas de _Iracema_, do _Guarany_, do _Sertanejo_ e do _Gaúcho_, obras primas do eminente cearense, que brilhou no romance, no drama, na poesia e no jornalismo. * * * * * _Estatua de João Caetano dos Santos_—Eleva-se defronte da fachada principal da Academia das Bellas Artes, em um hemicyclo traçado por Grandjean de Montigny, para dar espaço, ar e luz á primorosa frontaria do palacio. É obra do esculptor fluminense Chaves Pinheiro, modelada em 1859, no Rio de Janeiro, e fundida em Roma, em 1890. É de bronze, tendo estado, o modelo, exposto na exposição de Philadelphia, em 1876. * * * * * _Estatua do General Osorio_—Foi inaugurada em 12 de Novembro de 1894, e fundida com o bronze de canhões, tomados aos inimigos da patria. O monumento é equestre, eleva-se ao centro da praça Quinze de Novembro e foi modelada por Bernardelli. Pésa 5:700 kilos. O pedestal é de granito dos Alpes. Em dois baixo-relevos ha scenas de batalhas ganhas pelo grande cabo de guerra. Desde 21 de Julho de 1892, que o seu corpo repoisa na crypta do monumento, tendo sido trasladado do Asylo dos Invalidos da Patria. * * * * * _Estatua de José Bonifacio_—Foi esculpturada pelo artista francez Luiz Rochet, e inaugurada em 7 de Setembro de 1872, 50.º anniversario da independencia do Brasil. Deve-se este monumento a uma subscripção popular, iniciada pelo Instituto Historico, que rendeu 60:000:000 réis. Pesa 18:000 kilos, é de bronze e tem a altura de 2ᵐ,40. O heroe da independencia é representado de pé, empunhando uma penna com que escreve o _Manifesto ás Nações_. A estatua eleva-se defronte da rua do Ouvidor, ao centro do largo de S. Francisco de Paula. Egrejas _Cathedral_—O bispado do Rio de Janeiro foi creado em 1676, tomando o 1.º bispo conta do seu cargo seis annos depois. A primitiva cathedral foi a egreja de S. Sebastião, erecta no morro do Castello, berço da cidade. Em 1703 foi a Sé transferida para o templo da Cruz dos Militares, e em 1720, por algum tempo para a basilica da Candelaria, voltando para a Cruz dos Militares, em 1773. Devido, porém, ao estado de ruina d’esta egreja, no mesmo anno, em 1 de Agosto, o cabido sahiu em procissão e dirigiu-se para a egreja do Rosario, elevando-a a cathedral, contra a vontade dos pretos, seus proprietarios. Ainda assim conservou-se ahi a Sé por mais de setenta annos. Em 1808, o cabido, em virtude de alvará regio, passou para o santuario mandado construir pelos frades carmelitas, em 1761, ao lado do templo do Carmo, onde actualmente se conserva. A ermida, precursora d’esta egreja, foi edificada á beira-mar, e desabou em dia de festividade, matando muitos fieis. O interior do templo é ornamentado a trabalho de talha e a estuque dourado, em estylo barroco, por mestre Ignacio, que iniciou os trabalhos em 1785. Ha sete altares e duas capellas fundas; uns e outras separados por balaustres dourados. No corpo da egreja ha tres tribunas de cada lado, divididas por pilares. É bella a perspectiva interior pela feliz combinação dos dourados com a guarnição branca, em estuque, e com o primoroso trabalho de talha. A fachada não pertence a ordem alguma architectonica. O grande painel da capella-mór foi pintado por José Leandro de Carvalho. * * * * * _Carmo_—Bella e imponente frontaria de granito, em estylo barroco, com um lindissimo portico lavrado em marmore da Arrabida. A confraria dos irmãos terceiros do Carmo, do Rio de Janeiro, foi fundada em 19 de Julho de 1648. A primeira pedra do templo foi lançada em 16 de Julho de 1755, sendo inaugurado em 11 de Julho de 1770. Custou 91:088$995 réis. As duas formosas torres lateraes á frontaria, só ficaram concluidas em 1850 e custaram 111:000$000 réis. Um espaço fechado por dois portões separa esta egreja da Cathedral, ex-capella imperial. O gradil de ferro que cercava o adro e que custára, em Londres, 1:764$100 réis, foi mandado retirar, ultimamente, pelo prefeito Pereira Passos, bem como o do santuario contiguo. Foi no Carmo que se celebrou, em 1792, o Te-Deum em acção de graças pelo enforcamento de Tiradentes. O templo foi novamente dourado em 1854. Até 1812 esteve installado o hospital da Ordem, em edificio annexo, sendo removido para a rua de Riachuelo, em 1870. O interior da egreja é ornamentado a branco, com toques dourados. Ha seis altares lateraes e a capella-mór. No corpo principal estão seis tribunas e dois pulpitos. A luz é filtrada, além do zimborio da capella-mór, por seis janellas sobrepostas ás tribunas e por tres do côro, com vitraes coloridos. * * * * * _Cruz dos Militares_—Occupava, outr’ora, a beira-mar. Está situada na rua Primeiro de Março, esquina da do Ouvidor, e a pequena distancia dos santuarios anteriormente descriptos. É obra dos ultimos annos do seculo XVIII, sendo seu constructor o brigadeiro José Custodio de Sá e Faria. Se bem que de elegante aspecto exterior, nada contém esta egreja de especialmente notavel. * * * * * _S. Bento_—Templo e mosteiro situados no vértice da collina de egual nome, no extremo da rua Primeiro de Março. É simples e sem arte o aspecto exterior da egreja e dos edificios annexos; ao transpôr, todavia, o peristylo, o visitante fica deslumbrado com a perspectiva e os detalhes da magestosa fabrica. Desde o sopé ás abobadas, o santuario resplandece o velho ouro que os seculos ainda não conseguiram desvanecer. Em talha dourada, é a d’esta egreja a maior, a mais antiga e a mais preciosa decoração que existe na capital do Brasil. É d’uma só nave, ladeada por dez altares, oito dos quaes communicam-se, interiormente, por duas especies de naves. Os dois pulpitos são tambem preciosos. Sobre os arcos que dão ingresso aos altares, ha outras tantas tribunas douradas, com balaustradas. O tecto é em quadriculos de madeira colorida. No pavimento do corpo principal estão as sepulturas dos doadores, D. Diogo de Brito de Lacerda, e D. Victoria de Sá, com brazões heraldicos. São riquissimas as capellas do Santissimo Sacramento e da Immaculada Conceição. A primeira tem quatro tribunas e um magnifico altar, com esplendoroso sacrario e quatro columnas salomonicas, tudo dourado. Todos os altares do monumento são guarnecidos a columnas do mesmo estylo e profusamente douradas. Na capella-mór ha bancadas de nogueira para a assistencia capitular. Á esquerda está o solio, com o docel, para o abbade-bispo de S. Bento. Os beneditinos estabeleceram-se no Rio de Janeiro, em 1589, e occuparam, primitivamente, a ermida de N. S. do Ó, na praia da cidade, doada pelo governador Corrêa de Sá. O tecto da capella-mór é decorado a frescos, representando scenas da vida de S. Bento. É grande, valiosa e artistica a collecção de objectos de prata, que adorna o templo, avultando a imagem de N.ª S.ª do Monserrat, que occupa a cúspide do altar-mór; o crucifixo d’este altar, o tocheiro da capella-mór e as lampadas das capellas lateraes. O corpo da egreja é illuminado por seis artisticos lampeões de ferro, a tres luzes. Da esplanada, bem como de varios pontos da vasta cêrca do convento, a vista é extensa e bella para diversos pontos da cidade e da bahia. O Gymnasio de S. Bento e a escóla de preparatorios, contiguos ao templo, teem frequencia superior a 300 alumnos. Ha ainda a escóla preliminar de S. José e uma escóla nocturna, tudo para o sexo masculino. Todos os frades d’este convento são allemães. Na cêrca está uma caixa de agua, do rio do Ouro, que communica com o deposito geral do Pedregulho. * * * * * _S. Francisco da Penitencia_—Minusculo e magnifico santuario, pertencente á Ordem Terceira de S. Francisco da Penitencia, situado no alto da collina de Santo Antonio, e junto á egreja d’esta invocação. Depois do de S. Bento, é este o interior sagrado mais artistico e bello do Rio de Janeiro. Os 6 altares lateraes, os 2 pulpitos, as 6 varandas, o magestoso árco-cruzeiro, a capella mór e o côro constituem um grandioso poema em talha dourada, onde a arte da execução rivalisa com os primôres das concepções decorativas e da materia prima empregada, ha seculos, no realce artistico. O tecto é em madeira pintada e nos intervallos das tribunas ha quadros emmoldurados em talha dourada e pintados por José de Oliveira. A primitiva egreja da Ordem Terceira da Penitencia, no Rio de Janeiro, foi a capella da Conceição, erecta na visinha egreja de Santo Antonio, por Luiz de Figueiredo e sua mulher, Antonia Carneiro. O actual edificio foi concluido em 1772, depois de muitas contendas com os visinhos frades franciscanos do convento de Santo Antonio, tendo começado as obras em 1653. Tanto o interior como o exterior do santuario são em estylo barroco. * * * * * _Santo Antonio_—Communica com o edificio anteriormente descripto. Esta egreja é modestissima, destacando-se apenas a capella do Noviciado, com o tumulo, em marmore, do principe D. Pedro Carlos, filho de D. João VI. Contiguos a estas egrejas estão os dois conventos das mesmas invocações, ambos habitados por frades franciscanos. Do adro d’estes santuarios, gosa-se o panorama parcial da cidade, da bahia e dos suburbios. * * * * * _S. Francisco de Paula_—No lado Sul da praça de egual nome, ergue-se imponentemente a elegantissima frontaria d’este templo, pertencente á Veneravel Ordem Terceira dos Minimos de S. Francisco de Paula. É construcção architectonica da ordem composita e ostenta um bellissimo portico de marmore da Arrabida. Foi inaugurado em 1801. Os artistas brasileiros Valentim da Fonseca e Silva e Antonio de Padua e Castro, decoraram interior e sumptuosamente esta egreja, a mais central da cidade. Ladeiam a fachada duas torres, que realçam a belleza do conjuncto. Tambem aqui, e em nome da esthetica civica, o prefeito Passos destruiu o gradeado que protegia o adro. * * * * * _Matriz da Gloria_—Esta vastissima egreja eleva-se na face occidental da praça do Duque de Caxias. A frontaria é aformoseada por oito columnas jonicas, de granito, com dez metros de altura, que assentam em treze degraus de cantaria e sustentam um frontão da mesma pedra, com um painel decorativo, e as estatuas de S. Pedro e S. Paulo, nas extremidades lateraes. Do lado posterior do frontão eleva-se um campanario da altura de quarenta e dois metros, até um terraço guarnecido a balaustrada e a estatuas de granito. Sobre esta esplanada levanta-se outro corpo de torre, rematado por uma pyramide quadrangular, que sustenta uma cruz á altura total de sessenta metros. Interiormente, o templo é decorado em estylo barroco, notando-se a preciosa obra de talha do altar-mór. * * * * * Outras muitas egrejas, menos notaveis, accentúam o aspecto monumental do Rio de Janeiro, taes como S. José, Lapa, S. Christovão, Rosario, Sacramento, S. João Baptista, Gavea, e a historica e popular ermida octogona que corôa o vértice da pittoresca altura da Gloria. Museus _Museu Nacional_—Foi fundado em 1710, pelo vice-rei Luiz de Vasconcellos, em um predio da rua do Sacramento, mais tarde ampliado para Thesouro Federal. Tendo caído em abandono, D. João VI reergueu-o, em 1818, a pedido do seu ministro Thomaz Antonio de Villa Nova Portugal, sendo installado em um palacete do campo de Sant’Anna, depois praça da Acclamação. Em 11 de Julho de 1864, foi inaugurada a bibliotheca d’este Museu, com 3:000 volumes, contando hoje mais de dez mil. Um italiano, em 25 de Junho de 1865, tendo-se escondido no interior do edificio, no momento de serem fechadas as portas, durante a noite roubou 49 diamantes, 153 moedas antigas e 70 medalhas diversas. O Museu foi mudado, em 1892, para o ex-palacio imperial de S. Christovão, que servira, em 1890 e 1891, de Palacio do Congresso Constituinte da Republica. É um amplo e vistoso edificio situado em terreno elevado, ao centro de terras incultas e enfrentado por um magnifico parque, cuidadosamente ajardinado. As principaes collecções são a mineralogica e a antropologica, seguindo-se-lhes, em importancia, a numismatica, a ethnographica e a de antiguidades egypcias e pompeanas. Começando pelo 3.º pavimento, visita-se a _Sala Rodrigues Ferreira_, com curiosos exemplares de simios, phocas e outros animaes. _Sala Correia de Lacerda._ Carnivoros roedores. Bellissimo exemplar leonino. Insectivoros. _Sala Spix._ Mammiferos. Antiodactylos ruminantes. Magnificos exemplares de elephantes e de veados. _Sala Blainville._ Esqueletos de passaros. Gabinetes, a seguir, com variadissima e abundante collecção de insectos do paiz. Interessantes habitações de maribondos. _Galeria Buffon._ Esqueletos de quadrupedes. Segundo pavimento. _Sala Burmeister._ Curiosissima collecção de ninhos de aves. _Sala Natterer._ Passaros. _Sala Wied._ Aves de rapina. Esplendido exemplar de condor dos Andes. _Sala Schreiner._ Numerosa e escolhida collecção avicola-brasileira. _Sala Wallace._ Passaros corredores, entre elles dois magnificos exemplares de avestruz. _Galeria Baptista Caetano._ Ethnographia. Vestuarios e armas de varias tribus de indios da bacia do Amazonas. _Sala Simão de Vasconcellos._ Armas, utensilios e ornatos de indios mundurucús, araras, uaupés e da Guyana Brasileira. _Sala Castelnau._ Retratos e estatuas de indigenas do Brasil. Grupo, em bronze, offerecido pelo marechal Deodoro. _Sala Varnhagen._ Numerosa e curiosissima collecção de armas, vestuarios, utensilios e ornatos dos indios carajás, appiaças, bororós, mahués e guajarás. _Sala Ferreira Penna._ Ceramica greco-romana. Ceramica brasileira, peruana e mexicana. Alguns dos objectos expostos são pre-historicos. _Galeria Fernão Cardim._ Ethnographia das ilhas Aleutas, Sandwich, Nova Guiné, Rainha Carlota, Madagascar e Nova Zelandia. _Sala Champollion._ Sarcophagos e mumias. Antiguidades mexicanas, africanas e europeias. Ethnographia africana e asiatica. Antiguidades egypcias. _Sala Broca._ Mumias pequenas. Esqueletos indianos. 300 caveiras de indios diversos. _Sala Freire Allemão._ Fibras textis. Cipós e madeiras do Brasil. Amostras de oleos e de sementes nacionaes. _Galeria Conceição Velloso._ Troncos gigantescos de vegetaes do Brasil. _Sala Humboldt._ Ethnographia sul-americana. _Galerias Gabriel Soares_, _Eschwege_ e _Couto de Magalhães_. Pirogas, remos e rêdes indianas. Pedras e placas com inscripções e brazões. _Sala Haeckel._ Echinoides. Ovos e embryões. _Sala Lamarch._ Molluscos. Collecção numerosissima e interessante. _Sala Lacaze-Duthiers._ Madreporarios. Hydroides. Espongiarios. Alcyonarios. _Sala Dumeril._ Serpentes, lagartos, jabutis, tartarugas, kagados, etc. _Sala Agassiz._ Bello exemplar de Cephaloptera Vampyrus Gunth Jamantra, apanhado na praia da Copacabana. Mostruario de peixes em alcool. _Sala Andrada._ Riquissima collecção mineralogica. Rez-do-chão: Secções de paleontologia brasileira e estrangeira. Ossuario de baleia com 16 metros de comprimento. Meteorito de Bendegó. É o maior e mais pesado que se conhece. Foi encontrado em 1784, por Joaquim da Motta Botelho, nas proximidades do riacho Bendegó. Chegou ao Rio de Janeiro em 1 de Junho de 1888. Pésa 5,360 kilos. Composição: Ferro 95,1 Nickel 3,9 Outros elementos 1, _Museu Naval_—Encontra-se, este museu, no rez-do-chão da repartição do Almirantado, na rua de D. Manuel. Foi creado por decreto de 14 de Março de 1868 e inaugurado em 25 de Março de 1884, nos salões do Arsenal de Marinha, devido á intervenção do vice-almirante Arthur de Jaceguay. Por decreto de 26 de Abril de 1890, o almirante Wandenkolck, ministro da marinha, reuniu no mesmo estabelecimento, á rua do Conselheiro Saraiva, n.º 12, o Museu e a Bibliotheca. No dia 11 de Junho de 1898, sendo ministro da marinha o contra-almirante Manoel José Alves Barbosa, foi solemnemente inaugurado o museu, no edificio actual, e franqueado ao publico. O principal valor artistico d’este museu, consiste nos seguintes quadros do pintor De Martino: —Aprisionamento da corveta argentina _General Dorrego_, pela corveta brasileira _Bertioga_. —Passagem do Tonelero, em 1851. —Combate naval do Riachuelo. —Abordagem do _Barroso_ e do _Rio Grande_. —Bombardeamento do forte de Curuzú. —Abordagem da fragata brasileira _Imperatriz_, pela esquadra argentina. —Couraçado _Independencia_. —_Passagem do Humaytá_. —Noite de luar, no porto de Montevideu. —Encontro do _Almirante Barroso_ com o _Riachuelo_, no alto mar. —Couraçado _Independencia_, fundeado no Tamisa. —Abordagem da corveta _Maceió_, por canhoneiras argentinas. —Abordagem dos paraguayos á esquadra brasileira, em 2 de Março de 1868. —Acampamento do Chaco, em frente a Humaytá. Quadros de Victor Meirelles: —Passagem do _Humaytá_, em 19 de Fevereiro de 1868. —Combate Naval do _Riachuelo_. Ha ainda muitos outros quadros a oleo, photographias e retratos de almirantes e de ministros da marinha. Este museu é dividido em oito secções, constando a 1.ª de quadros a oleo; a 2.ª de retratos e photographias; a 3.ª de modelos de navios; a 4.ª de bandeiras e estandartes; a 5.ª de artilharia, couraças, torpedos e variado armamento fixo; a 6.ª de armamento portatil; a 7.ª de reliquias de navios historicos e de ethnographia nacional; e a 8.ª secção consta de medalhas. _Pedagogium, ou Museu Escolar._ Funccionam n’este edificio, defronte do Passeio Publico, os cursos fixos e normaes de sciencias physicas e naturaes e os cursos temporarios[2]. Tambem ahi realisam-se conferencias e exposições pedagogicas. Encerra uma officina de trabalhos manuaes; uma sala-modelo da classe primaria, contendo o material escolar; um gabinete de geographia; um gabinete-museu de historia natural; um gabinete de physica e laboratorios de psychologia experimental, de chimica e de physiologia do systema nervoso. Contem uma bibliotheca que, com o museu e os laboratorios, está patente das 10 horas da manhã ás 3 da tarde, excepto ás segundas-feiras. As classes são nocturnas. De maneira que o Pedagogium, que funcciona em edificio proprio e municipal é, ao mesmo tempo, um instituto para habilitação de professores primarios e um museu pedagogico. O laboratorio de psychologia experimental é o unico, no seu genero, no territorio da Republica. Em 1902 trabalharam 7 cursos, com a frequencia de 153 alumnos; em 1903, 10 cursos com 143 alumnos, e em 1904, 17 cursos com 194 alumnos. [2] Ao entrar este livro no prélo deixaram de funccionar as aulas do Pedagogium. Bibliothecas _Bibliotheca Nacional_—Foi fundada por D. João VI, em 1810, com os livros que levou da bibliotheca do palacio real de Lisboa. Primitivamente funccionou nos altos do hospital do Carmo, junto do palacio imperial. Até 1822, esta instituição não foi publica. Em 4 de Agosto de 1858, foi reaberta ao publico no edificio especial que o governo comprára, no Largo da Lapa, por 124 Apolices de um conto de réis. No momento da publicação d’este livro está a construir-se, na Avenida Central, um magestoso palacio destinado á definitiva installação da Bibliotheca Nacional. Contem cêrca de 240:000 volumes, 25:150 exemplares de moedas e medalhas e 100:000 estampas e gravuras. Possue muitos exemplares rasos, impressos e manuscriptos, e numerosos retratos de artistas celebres, taes como Alberto Durer, Van-Dyck, Lucas de Hollanda, Raimondi, Andréa Mantegna, e outros. A biblia latina de Fust Schoeffer, de Moguncia, impressa em pergaminho e em 1462, é uma das preciosidades d’esta bibliotheca. Possue officina typographica e de encadernação. Está patente ao publico, ininterruptamente, das dez da manhã ás nove horas da noite. A frequencia média, mensal, é de 3:500 leitores. * * * * * _Bibliotheca Municipal_—Contem, actualmente, cêrca de 22:000 volumes litterarios e scientificos. Foi creada em 15 de Março de 1893, em sessão da Camara Municipal, por proposta do vereador-presidente, tenente-coronel Antonio Barroso Pereira. A frequencia média, mensal, é de 1:200 leitores. É publica nos dias uteis, das 10 horas da manhã ás 3 da tarde, e das 5 da tarde ás 8 horas da noite. Está installada no edificio da Prefeitura, na Praça da Republica. * * * * * _Bibliotheca Fluminense_—É esta a principal das bibliothecas particulares do Rio de Janeiro. Foi fundada em 1847, por Bernardo Joaquim de Oliveira, e está installada no predio n.º 92, da rua do Ouvidor. Encerra 90:000 volumes de artes, litteratura e sciencias, álem de numerosos e preciosos manuscriptos. * * * * * Alem d’estas ha as bibliothecas especiaes do Exercito e da Marinha, nos respectivos arsenaes; a Bibliotheca Germania, na Praia do Flamengo n.º 60; a Bibliotheca do Commercio, no edificio da Associação Commercial, e outras de menos importancia e particulares. Jardins e parques _Parque da Republica_—Occupa o centro da maior praça do mundo, com a superficie de 198:000 metros. O Campo de Marte, em Paris, tem 112:000 metros; a Praça Real, de Berlim, 100:000 metros; a Praça do Hotel de Ville, em Vienna d’Austria, 90:000 metros, e a Praça da Concordia, em Paris, 89:000 metros. E isto para citar só as principaes. O Parque foi inaugurado em 7 de Setembro de 1880, e é circumdado por um gradil de ferro, da altura de 2,ᵐ30. Esta obra foi custeada pela Camara Municipal e executada sob a direcção do dr. Glaziou, eminente botanico, architecto e paysagista. As obras começaram sete annos antes da inauguração. Nas quatro faces do gradeamento, que é fundido em sopé de cantaria, abrem outros tantos portões monumentaes, com motivos decorativos. A superficie plantada é de 86:000 metros; os lagos e os rios occupam 18:000 metros e os arruados 43:522 metros. Estes são amplos e calcetados a macadám, O Parque está situado no centro da cidade do Rio de Janeiro, e divide os velhos bairros, hoje transformados, da nova metropole, começada a edificar no seculo XVIII. Das decorações d’este bellissimo e magestoso logradouro publico avulta a cascata, em fórma de gruta, com galerias transitaveis, de cujos tectos pendem gottejantes estalactites. Ha dois pavilhões de ferro para concertos, e na vastissima praça central tem-se construido, por vezes, numerosas barracas para kermesses, e realisado esplendidas batalhas de flôres, com o concurso das alamedas que a ella convergem. Numerosas estatuas, grupos artisticos e pontes rusticas decoram este magnifico Parque. * * * * * _Passeio Publico_—O mais antigo e um dos mais bellos logradouros publicos da formosissima capital do Brasil, foi mandado delinear e executar pelo vice-rei Luiz de Vasconcellos e Sousa, sobre a lagôa pantanosa e aterrada do Boqueirão da Ajuda. Foi auctor do trabalho o mestre Valentim da Fonseca e Silva, que da tarefa se desempenhou com aprimorado gosto artistico. A inauguração realisou-se em 1783, mas tendo sido a conservação do Passeio descurada pelos successores d’aquelle vice-rei, houve necessidade de reformal-o, o que se fez, pela ultima vez, em 1861, sob a direcção do dr. Glaziou. Foi reaberto o Passeio, ao publico, no dia 7 de Setembro do anno seguinte. A area total do terreno é de 28:196 metros, e a superficie plantada, de 17:637. O arvoredo, mais que secular, é denso, frondoso e bello, constituindo uma preciosidade pela raridade e excellencia dos exemplares que o formam e o melhor local de sombra que existe no centro da cidade. Nota-se um Aquario, inaugurado em 1904 e o primeiro construido na America do Sul, com 20 tanques, ou piscinas e cêrca de 40 variedades de peixes raros, zoophytos, echinodermes, molluscos e crustaceos. Sob uma formosa e soberba _Latania_ vê-se o busto de Gonçalves Dias, inaugurado em 1901. É de bronze, sobre pedestal de granito, e execução de Rodolpho Bernardelli. Ha ainda a notar duas columnas de pedra, cobertas de hera, obra do mestre Valentim, e dois tanques com jacarés de bronze, de cujas fauces precipita-se, ha 122 annos, o precioso liquido que dessedenta parte da população fluminense. O mais precioso local d’este pittoresco e bello Passeio Publico, é o amplo terraço, que domina a Avenida Beira-Mar e a magestosa bahia de Guanabara. D’ahi aprecia-se todo o movimento do porto e um dos mais empolgantes panoramas do nosso planeta. * * * * * _Jardim Botanico_—Entre a lagôa Rodrigo de Freitas e o ponto terminal da linha de tramways electricos da _Botanical Garden_, está situado o mais bello dos jardins botanicos do mundo. A sua area é de 544:611 metros, e encerra mais de 60:000 exemplares de plantas, muitissimas raras, algumas originaes e unicas, e todas extraordinariamente desenvolvidas. Foi fundado por D. João VI, em 1808, com o nome de Real Horto de D. João VI, mudado por decreto de 11 de Maio de 1809, para Real Jardim Botanico. Logo á entrada a nossa retina é maravilhada pela Alameda das Palmeiras, com 134 exemplares magnificos, que occupam a extensão de 740 metros, em linha recta. As palmeiras teem 25 metros de altura e cerca de 1,ᵐ30 de circumferencia na base. Esta alameda é universalmente afamada e a primeira no seu genero. Outras alamedas, menos extensas, e tambem bordadas a palmeiras, correm parallelas a esta e dão um aspecto monumental, bello e imponente ao Jardim Botanico do Rio de Janeiro. Á esquerda da entrada admira-se uma _Guarea trichilioides_, o mais velho dos vegetaes indigenas d’este estabelecimento. Do lado opposto ostenta-se um soberbo exemplar de _Nephelium Li-tchi_, importado de Cayenna, em 1809. A _Palma Mater_, que produziu as sementes de todas as grandes palmeiras da mesma especie que enfeitam o Jardim Botanico, a capital e todo o Brasil, eleva-se ao lado da Cascatinha, e tem a altura de 36 metros. É oriunda da Ilha de França, e foi plantada por D. João VI, em 1809. O director Serpa Brandão, cujo nome foi dado á Alameda Central, mandava queimar as sementes da _Palma Mater_, para que não se reproduzissem fóra do Jardim; porém os escravos subiam, de noite, ao vértice da planta, e roubavam as sementes, que vendiam a 100 réis cada uma. Ultimamente, apparecendo lagartas verdes a devorar a base das folhas d’esta preciosa e secular palmeira, o director Barbosa Rodrigues, mandou propositadamente construir um andaime para extinguir os damninhos reptis. Ao fundo da Alameda Serpa Brandão, vê-se um artistico fontanario de bronze que outr’ora esteve em uma praça da cidade. Proximo d’um magestoso bambual formando curvas em gothico, ergue-se o monumento a Frei Leandro do Sacramento, o primeiro director d’este Jardim. É um busto de bronze com pedestal de marmore e dedicatoria em lettras douradas. Está abrigado por uma construcção octogona com tecto de vidro. Enfrenta-o um lago coberto pela _Victoria Regia_, representada por esplendidos exemplares. Este Jardim é cortado por lindissimas avenidas de samambaias, mangueiras, bambús e palmeiras, notando-se todos os exemplares das plantas com as suas designações scientificas, e o maximo aceio e cuidado na conservação do preciosissimo horto, uma das principaes curiosidades da capital do Brasil. Junto da _Palma Mater_, inicia-se a construcção do monumento ao fundador do Jardim. Será inaugurado por occasião da celebração do centenario da fundação d’este maravilhoso escrinio scientifico, natural e artistico. * * * * * _Floresta da Tijuca_—Não obstante estar já situada em um dos mais apraziveis arrabaldes do Rio de Janeiro, nem por isso a floresta da Tijuca deixa de ser um dos logradouros publicos mais procurados e admirados pela população fluminense e, especialmente, pelos forasteiros, que ahi se deliciam em plena apotheose da excelsa natureza. Na Tijuca, como no Jardim Botanico, na Gavea, no Corcovado e no Pão de Assucar, o visitante é empolgado por esse abraço natural que, pela sua extensão, variedade, abundancia e incomparavel formosura, sublima Rio de Janeiro á culminancia da mais bella e pittoresca metropole do nosso planeta. O electrico da _Light_, parte da praça da Constituição e, ao saír da rua do Conde de Bomfim, atravessa terrenos incultos e abundantemente vegetativos, precursores das exuberancias florestaes. Ao passo que, atravessada a estrada velha, pronuncia-se o movimento ascendente pela encosta, o vehiculo transforma-se em barco, a navegar através de encapellado oceano, pondo em grave risco o equilibrio e as costellas dos passageiros. A linha é pessimamente construida e as curvas são numerosas e rapidas. Porém o observador tem ampla e ineffavel compensação espiritual na formosura da paisagem e no deslumbramento do panorama que os seus olhos abrangem e contemplam. O electrico pára no alto da Boavista, a 13½ kilometros do largo de S. Francisco de Paula, em uma praça de 15:000 metros de superficie que, ha meia duzia de annos, apenas era um matagal. Hoje está transformada em formoso jardim, com um elegante pavilhão de ferro, ao centro. Estamos na entrada da serra e da floresta. Começou a aproveital-a e a aformoseal-a o Visconde do Bom Retiro, em 1857, quando ministro do Imperio. Deu-lhe grande desenvolvimento o major Gomes Archer, em 1874, construindo estradas, na extensão de 20 kilometros, regularisando os cursos de agua que atravessam a floresta e plantando arvoredo nas clareiras dispersas. Quem, da praça da Boavista, internar-se pela estrada principal, na espessura vegetativa, depara, a pouca distancia, com a Cascatinha, primeira quéda d’agua, para quem caminha na direcção norte e que precipita-se da altura de 30 metros. Ao cabo de uns 3 kilometros attinge-se o _Excelsior_, ponto de vista maravilhoso, á altura de 693 metros. Tambem é notavel o planalto do Bom Retiro, que lhe fica proximo e cuja altura é de 659 metros. Continuando-se a percorrer a magestosa floresta, visita-se a _Gruta de Paulo e Virginia_, as _Furnas de Agassiz_, a _Cascata Grande_, a _Meza do Imperador_ e a _Vista Chineza_, com um chalet rustico, de onde se gosa feerica perspectiva. O ponto culminante, porém, da serra e da floresta, é o Pico da Tijuca, na altitude de 1:022 metros acima do nivel do mar. O panorama que d’ahi se descortina escapa á percepção humana, pela sua sublimidade, e não póde descrever-se em linguagem alguma, porque não é dado ao homem immiscuir-se nos esplendores divinos. * * * * * _Jardim Zoologico_—Este estabelecimento, outr’ora um dos mais bellos e interessantes logradouros publicos da capital carioca, no tempo do seu fundador, o barão de Drummond, é agora a desvergonha do Rio de Janeiro. Hoje é deposito da casa Herman Stoltz & C.ª representante do grande parque zoologico Stingler, de Hamburgo, o primeiro do mundo. Nem por isso a collecção é valiosa, antes péssima pela deficiencia de numero e qualidade de individuos expostos. O parque está quasi abandonado, quando deveria ser um dos melhores no seu genero, ainda que não expozésse senão exemplares nacionaes. Não obstante ser agora o Jardim Zoologico um deposito particular de animaes importados do estrangeiro, paga-se ainda mil réis de entrada por pessôa, como se verdadeiramente fôsse um parque para gôso da população. Está situado no arrabalde de Villa Izabel. Rio de janeiro encerra ainda outros parques e praças ajardinadas, taes como a praça Marechal Deodoro, em S. Christovão, com 180:000 metros de superficie; a praça da Gloria, onde se erguem os monumentos do Centenario, a estatua do Visconde do Rio Branco e a Fonte Ramos Pinto; a praça do Duque de Caxias; a da Constituição; a de Quinze de Novembro, e toda a magestosa e bella esplanada de Botafogo, que enfrenta a enseada do mesmo nome. Theatros _S. Pedro de Alcantara_—O principal theatro do Rio de janeiro, ainda por inaugurar, é o Municipal, já descripto no capitulo—Monumentos. Das antigas casas de espectaculos, o melhor edificio é o do Theatro S. Pedro de Alcantara, na antiga praça da Constituição, hoje Tiradentes. Segundo a giria popular fluminense, este theatro tem _caveira de burro_, porque tendo sido construido, primitivamente, em 1770, ardeu em 1824, em 1851 e em 1856. Exterior e interiormente, a sua architectura é vulgarissima. Tem 87 camarotes, 532 cadeiras, na plateia, 28 no balcão e 400 logares de galeria. É frequentado por companhias estrangeiras e nacionaes de opera, opereta e comedia. * * * * * _Theatro Lyrico_—Outr’ora Theatro D. Pedro II. É um casarão situado na rua Treze de Maio, esquina da rua Senador Dantas, e prestes a desapparecer, em nome da hygiene e da esthetica. Ahi exhibiram-se as maiores celebridades da scena lyrica universal. Póde conter duas mil pessôas. Tem 806 cadeiras de plateia, 220 de balcão, 84 camarotes e 500 logares de galeria. * * * * * _Theatro Apollo_—Está situado na rua do Lavradio e é precedido de um pequeno jardim. Procuram-n’o as companhias de operetas, revistas e magicas. A construcção é ligeira e sem importancia. * * * * * _Theatro Recreio Dramatico_—Ao fundo da rua Luiz Gama, antiga do Espirito Santo. É muito antigo e precede-o vasto jardim, principal attractivo do estabelecimento. É muito frequentado por companhias dramaticas e de operetas. Tem gloriosas tradições. Ahi representaram Antonio Pedro, João Caetano dos Santos e outras notabilidades nacionaes e estrangeiras. * * * * * _Theatro Sant’Anna_—Está, como o antecedente, situado na rua Luiz Gama e tem, como elle, gloriosas tradições artisticas. Á saída d’este theatro, foi D. Pedro II victima de uma tentativa de assassinato, em 1888. Encerra 22 camarotes, 81 cadeiras e 500 logares de galeria. Tem sido frequentado por companhias theatraes de todos os generos. * * * * * _Theatro Lucinda_—Ainda na mesma rua. Contem 306 cadeiras, 13 camarotes e 200 logares de galeria. É para comedias, operetas, dramas, revistas e magicas. Foi fundado pela grande actriz Lucinda Simões, que o illustrou durante muito tempo. Álem d’estes theatros, ha o de S. José, na praça Tiradentes, e grande numero de cinematographos, casinos, frontões e cafés cantantes. A vida de theatro é, porém, pouco intensa no Rio de Janeiro, terra de trabalho e de calor. As familias preferem gosar a escassa frescura da noite, aos portões das suas chacaras, a irem metter-se em exiguas salas, cuja atmosphera é insupportavel pelo calor emanante da illuminação, dos corpos e da falta de ventilação e de ventiladores. Cemiterios O maior cemiterio da capital do Brasil, é o de S. Francisco Xavier, entre a praia do Cajú, o Retiro Saudoso e a rua Bella de S. João. Foi inaugurado em 1840. Pertence á Irmandade da Misericordia, porém os enterramentos são publicos. D’entre os seus monumentos destacam-se: —Aos marinheiros italianos do couraçado _Lombardia_. —Capella da familia Jannuzzi. É circular, interessante e artistica. —Sepultura de Flavia Maciel. —Sepultura do Barão de Alagôas. —Campa em marmore preto e lettras de bronze, do marechal Manoel Deodoro da Fonseca e sua esposa. E poucos mais jazigos notaveis sob o ponto de vista artistico. Annexo a este, ha um cemiterio para acatholicos. * * * * * O cemiterio de S. Francisco da Penitencia está separado do anterior por uma collina. Aqui tambem não abundam as campas artisticas. Destaca-se uma grande capella de granito, com frontaria de marmore cinzento, guarnecida por duas columnas inteiras e duas meias columnas de marmore branco. Remata-a uma cupula de granito. Interiormente, as paredes são occupadas por 460 gavetas de marmore branco, numeradas, para ossuarios. Ha duas galerias circulares, de ferro, e uma crypta com numeroso ossuario, disposto em triplice muralha. Foi inaugurada em 21 de Abril de 1908, e pertence, como o cemiterio, á Veneravel Ordem Terceira de S. Francisco da Penitencia. Á entrada d’este campo santo, primorosamente ajardinado, estão gravados, em marmore, os seguintes dizeres, a lettras pretas: —Hoje sois o que nós fômos—. * * * * * O cemiterio do Carmo, de propriedade da Ordem de egual nome, está situado a seguir aos antecedentes, na direcção da cidade. É o mais pequeno dos tres. Ha a notar ahi:—Capella-Jazigo do commendador Manoel Mattos do Souto, em estylo manuelino. —Sepultura de João Gonçalves Barroso. É de marmore branco e decorada a estatuas. Ladeiam-n’a dois leões da mesma pedra. —Jazigo de granito, do conselheiro Manoel Pinto de Sousa Dantas, com o seu busto em bronze. É em estylo egypciaco e encerra crypta e urna de granito. Estes cemiterios estão admiravelmente situados, sob o ponto de vista topographico, á beira-mar e a grande distancia da cidade. * * * * * O cemiterio de S. João Baptista, está situado em Botafogo, junto das ruas de S. João Baptista e do General Polydoro. O terreno é ligeiramente accidentado, abrangendo-se, á entrada, a vista geral de todo o campo santo, com os jazigos em amphitheatro. Que esplendor de scenario, em tão limitado horizonte! A propria montanha, cuja encosta oriental o cemiterio occupa, e o Corcovado, que magestosamente domina e corôa o panorama, fecham os limites visuaes, com as elevações suas derivadas, patenteando ao observador a indescriptivel belleza natural dos seus contornos. Artisticamente ha a notar: —Jazigo de marmore e de granito côr de rosa, da familia Murinelli. —Capella monumental, que encerra o niveo sarcophago do marechal Floriano Peixoto. —Jazigos das familias Silva Macieira e Torres, com lindissima frontaria a columnas salomonicas. —Sepulturas das familias Carneiro da Cunha Esteves, Rodrigues Portella, Armand Darlot, Adolpho Hasselman, e uma ou outra estatua decorativa de sepulturas mais modestas. Um montão de soberbas corôas, sobre uma campa rasa, indicava que, na vespera da nossa visita, tinha alli sido collocado o feretro do almirante Saldanha da Gama. Notam-se os tumulos de outras notabilidades, como o Barão de Cotegipe e o Marechal Machado Bettencourt. No arrabalde de Catumby está o cemiterio da Ordem Terceira dos Minimos de S. Francisco de Paula. Álem d’estes, ha os cemiterios protestante e israelita. Curiosidades _=Avenida Central=_—Os trabalhos iniciaes da mais bella e monumental arteria publica do Rio de Janeiro, começaram em 8 de Março de 1904, e já em 7 de Setembro do mesmo anno, o Presidente da Republica, Dr. Francisco de Paula Rodrigues Alves, e o Ministro da Viação e Obras Publicas, Dr. Lauro Müller, inauguravam officialmente a Avenida Central, comprida de 1812 e larga de 33 metros. Prolonga-se de mar a mar, desde a Prainha ao Passeio Publico. Decoram-n’a sumptuosos edificios, alguns tambem notaveis pela arte architectonica e decorativa. Destacam-se os seguintes: —Pavilhão de Monröe. É elegantissimo, com estructura de ferro e serviu na Exposição de S. Luiz. Palacio da Justiça. Bibliotheca Nacional. Academia das Bellas Artes. Theatro Municipal. Companhia Jardim Botanico. Casa Guinle. Predio n.º 131, estylo Renascença. Associação dos Empregados do Commercio. Club de Engenharia. Jornal do Commercio. Predio em estylo mourisco e cupula dourada, construido pelo architecto Morales de los Rios. Predio de Theodoro Wille. Companhia Docas de Santos, com uma artistica e monumental porta esculpturada em talha. Palacio da Caixa de Conversão, exteriormente decorado a columnas caneladas, com capiteis dourados. O _hall_ é lindissimo, vistoso e artistico. Casa Roxo Rodrigues, em cantaria cinzenta e em fórma acastellada. Para terminar, citaremos o palacio dos Benedictinos e o edificio do grande jornal _O Paiz_. Jannuzzi e Heitor de Mello foram, álem do já citado, os principaes constructores dos bellissimos palacios e palacetes que sublimam a Avenida Central do Rio de Janeiro á culminancia de primeira arteria publica da America do Sul. No extremo da Prainha, ergue-se uma columna de granito, destinada a supportar a estatua do Visconde de Mauá. * * * * * _=Palacio da Presidencia da Republica=_—Foi edificado em 1862, pelo Barão de Nova Friburgo, e adquirido, pelo Governo Federal, em 1896, para residencia do chefe do Estado. Tem soffrido varias modificações, e o terreno da chácara foi augmentado até á Avenida Beira-Mar; porém, interiormente, á excepção dos sobrados e de alguns motivos decorativos, a fabrica é da primitiva. A fachada é em tres pavimentos, estando installadas no do rez-do-chão as repartições de serviço; no 1.º andar, ou 2.º pavimento, as salas e os salões de recepção, servindo o 3.º de residencia particular. Á entrada ha duas ordens de columnas caneladas que atravessam o perystillo, ornado a estatuas e grupos. A escadaria é magnifica, realçando-lhe a belleza as tribunas douradas que circulam o 3.º pavimento. No andar nobre ha, especialmente a notar, pela decoração a frescos, estuques e dourados, a sala Azul, para recepções de embaixadores; a sala Amarella, ou de Musica; a sala da Capella, que serve de recepção á esposa do Presidente da Republica; a sala Pompeiana, com finissimas decorações e a celebre Jarra Beethoven, obra prima de Raphael Bordallo Pinheiro; o salão dos Banquetes; a sala Mourisca, decorada a marmore preto, e o Salão Official das Recepções, esplendidamente decorado. Todas estas salas e salões ostentam soberbos lustres e precioso mobiliario. Na sala Silva Jardim, nota-se o quadro de Aurelio de Figueiredo—_Juramento de Deodoro_—com todos os principaes personagens do 15 de Novembro. Na secretaria vê-se _A Descoberta do Brasil_, outro quadro de Aurelio de Figueiredo, e _A Selva_, quadro de Antonio Parreiras. Um ascensor communica os pavimentos. O parque, esculpturalmente decorado, é atravessado por dupla fila de lindas e gigantescas palmeiras. * * * * * _=Aqueducto da Carioca=_—É a principal e monumental curiosidade que o Rio de Janeiro possúe dos tempos coloniaes. A sua extensão principal é de nove mil metros, desde a Mãe d’Agua, na serra de Santa Thereza, até ao largo da Carioca. A sua parte monumental, porém, é composta de 42 arcos de alvenaria, da altura de 17,ᵐ6, desde a caixa d’agua da Carioca, onde hoje está a estação da Companhia Ferro Carril Carioca, até ao morro de Santa Thereza. Este é o actual viaducto da linha, que se prolonga até ao Silvestre. Foi este aqueducto mandado construir pelo Conde de Bobadella, 59.º Governador do Rio de Janeiro, em 1744. Durante o trajecto através d’esta colossal arcaria, gosa-se admiraveis vistas parciaes da cidade, da bahia, e de alguns arrabaldes. * * * * * _=Palacio Itamaraty=_—Está situado na antiga rua Larga de S. Joaquim. Foi o primitivo palacio do Governo, em seguida á proclamação da Republica. Hoje é o Ministerio das Relações Exteriores e serve tambem de residencia ao respectivo ministro, o Barão do Rio Branco. No 1.º andar, ou nobre, nota-se a sala do Tribunal Arbitral, com mobilia dourada e estofos côr de rosa. Sala de recepção para o director geral do Ministerio, com os bustos, em bronze, do Visconde de Cabo Frio e de Quintino Bocayuva. Salão Amarello, para recepção de diplomatas. Admira-se aqui um quadro de Pedro Americo, intitulado—_Paz_—. Bustos, em bronze, de José Bonifacio, José Antonio Saraiva, Barão de Cotegipe, Marquez do Paraná, Visconde do Uruguay, Marquez d’Abrantes, Pimenta Bueno, Visconde do Rio Branco e Visconde de Cachoeira. Gabinete particular de recepção de diplomatas. Vê-se aqui o _Grito do Ipyranga_, por Pedro Americo, esboço do quadro que está em S. Paulo. Retrato de metal, em relêvo, do Barão do Rio Branco, offerecido pelo povo de S. Paulo. Outros objectos, em prata e prata dourada, entre elles um do _Jornal do Commercio_, offerecidos ao actual ministro das Relações Exteriores, por occasião da sentença do tribunal arbitral suisso, na questão das Missões. Sala Vermelha, decorada a quadros e a retratos. Um dos primeiros foi offerecido ao Barão do Rio Branco, pelo rei D. Carlos I, de Portugal. Salão de Baile e Banquetes, com um soberbo lustre de metal amarello e crystal de rocha. Contigua está a sala de Fumo, que tambem serviu de recepção particular aos ex-presidentes da Republica, Deodoro e Floriano. Bustos, em bronze, do padre Bartholomeu de Gusmão e do Barão do Rio Branco. Relogio historico de D. João VI. Sala dos Retratos, dos presidentes da Republica. Ha um edificio annexo, com a Secretaria e a Bibliotheca do Ministerio, que é importantissima. Em tres salões, dos quaes o maior tem 33 metros de comprimento e o mais pequeno 22, estão 42:000 volumes encadernados, e cêrca de 100:000 brochuras e 25:000 cartas geographicas. Tambem, n’este edificio, está o archivo secreto do Ministerio das Relações Exteriores. * * * * * _=Chafariz Colonial=_—Outra reliquia do Brasil colonial. Foi o governador Gomes Freire de Andrade, Conde de Bobadella, quem o mandou construir ao centro do largo do Paço. Alguns annos depois, o governador Luiz de Vasconcellos e Souza, mandou que o chafariz fôsse removido para a beira-mar, junto do caes, a fim de abastecer as embarcações, ao mesmo tempo que parte da população da cidade. É uma obra artistica, de granito lavrado, com escudo, almofadas e balaustrada de marmore branco. Occupa, hoje, o fundo do primeiro polygono ajardinado da praça Quinze de Novembro, a 85 metros da bahia. Remata-o a esphera armillar, de ferro. É obra do seculo XVIII. * * * * * _=Casa da Moeda=_—O primitivo estabelecimento d’este nome, transferido da Bahia em 17 de Março de 1699, funccionou no edificio da Junta do Commercio, apenas durante um anno, sendo transferido para Pernambuco. N’esse curto periodo foram cunhados 612:644$000 réis em ouro e 255:694$980 réis em prata. Em Janeiro de 1703 foi restabelecida a Casa da Moeda do Rio de Janeiro. Para installal-a foi construido um edificio entre as travessas das Bellas Artes e da Moeda, aonde tambem funccionavam o Real Erario e a Thesouraria Geral das Tropas. Essa casa ardeu em 1 de Outubro de 1836, sendo os valores e apparelhos recolhidos á egreja do Sacramento. O actual edificio foi construido de 1851 a 1853, na face occidental do então Campo da Acclamação, hoje Praça da Republica. Occupa uma area de 97:083 palmos quadrados. É precedido de um elegante gradil de ferro fundido em cantaria, com dois portões artisticamente ornamentados. A frontaria consta de um corpo central saliente e revestido de cantaria, de dois torreões com tres janellas, em cada pavimento, e de dois corpos intermediarios, com 4 janellas em cada andar. O 1.º pavimento é decorado com pilares e columnatas de ordem dorica-romana, e o 2.º com pilares e columnata de ordem jonica, tudo de granito. Interiormente, ha seis columnas graniticas, em cada pavimento, que sustentam entablamentos, cujos frisos são ornados a triglyphos e metopos. A decoração vestibular é no estylo dorico-romano. Na escadaria do perystillo estão dois leões de bronze. Custou este palacio cêrca de dois mil contos. Foi o Visconde de Itaborahy, ministro da fazenda, em 1853, o iniciador d’esta construcção, levada depois a effeito pelo seu successor Bernardo de Souza Franco. Foram emprezarios-constructores o dr. Theodoro Antonio de Oliveira e Antonio Francisco Guimarães Pinheiro. No vestibulo estão 4 peças com o laboratorio de analyses, o gabinete da Direcção e o gabinete de mineralogia. 1.º pavimento. Officina de gravura. Mostruario de medalhas cunhadas no estabelecimento. Officina de estamparia de sêllos e de estampilhas. Occupa 45 operarios. No rez-do-chão, visita-se os depositos de material, as officinas de fundição de metaes, a officina de laminação e cunhagem e a officina das machinas. Na officina de xenographia imprime-se notas de 5, 10, 20 e 50$000 réis. Impressão de apolices na secção lithographica. No Deposito Geral da Thesouraria, no 1.º pavimento, admira-se a magnifica installação, a primeira da America do Sul. Consta de duas secções independentes, uma para a moeda e a outra para o sêllo. As portas, de ferro, abrem por meio de relogios, aos quaes dá-se corda na vespera, não se podendo abrir nem com a propria chave, antes da hora marcada. Em Maio de 1908, continha 200 mil contos de réis, em metal e sêllos. * * * * * _=Rua do Ouvidor=_—Esta arteria publica, a mais movimentada e caracteristica do Rio de Janeiro, tem setecentos metros de extensão desde a rua do Mercado ao largo de S. Francisco de Paula. A designação porque continúa a ser popularmente conhecida, não obstante haveram-n’a chrismado em rua Moreira Cesar, data de 1780, e provem do facto de ahi ter morado o ouvidor (magistrado) da capital do Brasil colonial, Berquó da Silveira. Atravessa as ruas Primeiro de Março, da Quitanda, a Avenida Central, e as ruas Gonçalves Dias e Uruguayana. Apesar da grande concorrencia que principia a fazer-lhe a sua visinha, a magestosa Avenida, esta curiosissima arteria continua a ser o _club ao ar livre_, como lhe chamam, isto é, a reunião da sociedade elegante dos dois sexos, que encontra-se e troca impressões nos passeios, no meio da rua, que não é transitada por vehiculos, e ás portas dos estabelecimentos de luxo, especialmente das casas de modas, redacções de jornaes, tabacarias, cafés e confeitarias. Em nenhuma outra cidade do mundo ha assim uma rua com um feitio tão original, tão intima, interessante e encantadora. * * * * * _=Senado=_—Occupa, na face occidental da actual Praça da Republica, o edificio construido e offerecido, em 1810, por uma commissão de negociantes da Bahia, ao conde dos Arcos. A sua adaptação a Senado realisou-se em 1824, comprando-o o governo imperial ao procurador do conde, por 44:568$000 réis. A 1.ª sessão teve logar em 6 de Maio de 1826. Em 1831 foi a casa abandonada por ameaçar ruina, passando o Senado a funccionar no edificio da Relação, na rua do Lavradio. Reedificou-se o antigo palacete que foi reaberto em 1835. Damnificado, em breve, pelo cupim, passou de novo o Senado a occupar a casa da Relação, até que reedificou-se o edificio actual, sob a direcção do engenheiro Miguel de Frias e Vasconcellos. O interior é pobremente decorado. A sala das sessões é modestissima. Tem 68 cadeiras e algumas galerias e tribunas. É construcção interior e exteriormente indigna e impropria da séde da primeira assembleia legislativa do Brasil. Pelas salas ha algumas pinturas, bustos e retratos de personagens e de oradores celebres. * * * * * _=Bolsa=_—Este palacio occupa a area de dois mil metros quadrados, na rua Primeiro de Março, confinando com a rua General Camara, a rua do Visconde da Itaborahy e uma passagem que a separa do edificio do Correio Geral. Iniciou a sua construcção, em 1880, o architecto Francisco Joaquim Bettencourt da Silva, terminando-a, ultimamente, o engenheiro civil José Valentim Dunhan. Pertence á Associação Commercial do Rio de Janeiro. O chefe da Camara Syndical de correctores de fundos publicos, preside diariamente á venda de papeis de credito, que effectua-se em uma vasta rotunda, ao centro do magnifico _hall_. As dependencias do edificio são amplas e numerosas, destacando-se a bibliotheca, que é importante, o archivo, o salão de leitura e a sala das sessões. A Associação Commercial foi fundada em 9 de Setembro de 1834, com o titulo de Sociedade dos Assignantes da Praça do Commercio. * * * * * _=Camara dos Deputados=_—Ha cêrca de 80 annos que existe este casarão, tendo primitivamente servido de paço municipal e de cadeia. Esta era no pavimento terreo e n’ella esteve encarcerado Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, álem de outros prisioneiros notaveis. A camara dos deputados funcciona n’este edificio, desde 1823. Tem a construcção soffrido varios remendos, mas fica sempre com o mesmo aspecto lugubre e mesquinho, absolutamente impropria para o fim que serve. Admira como na actual quadra, de assombrosos melhoramentos fluminenses, ainda não se começásse a edificação de um palacio proprio á reunião dos representantes do povo brasileiro. O pavimento superior é occupado pela Camara, e no rez-do-chão estão a Caixa Economica e o Monte de Soccorro. A construcção não pertence a nenhum genero de architectura. O salão, pouco amplo e muito simples, é ladeado por galerias, para o publico, e por tribunas para senhoras e para o corpo diplomatico. * * * * * _=Alfandega=_—Grande edificio que occupa toda a rua do Visconde de Itaborahy, do lado do mar. Foi construido em 1817, pelo risco do architecto francez Grandjean de Montigny. Encerra 14 vastissimos armazens. O corpo principal foi, até 1821, séde da Praça do Commercio, ou Bolsa. A renda mensal e actual da alfandega do Rio de Janeiro é, na média, de sete mil contos. Regula por quatro milhões de volumes, o movimento annual dos armazens. * * * * * _=Canal do Mangue=_—É uma das curiosidades da capital brasileira. O seu nome vem da planta _Eugenia Nitida_, vulgo _mangue_, que cobria um enorme pantano onde a população do bairro despejava as immundicies das habitações. Foi começado em 1855 e terminado em 1860, sob a direcção do Barão de Mauá. Não tendo, porém, declive sufficiente para facil communicação com o mar, procede-se actualmente á sua completa transformação e aformoseamento. O canal tem a extensão de 2:600 metros, desde a praça Onze de Junho até ao mar. É em duas rectas, a 1.ª de 1:200 e a segunda de 1:400 metros. Quadrupla fila de elegantes e gigantescas palmeiras sombreia e embelleza a 1.ª recta, prolongando-se pela 2.ª secção em dupla fila. Tanto a transformação d’este canal, como a esplendida avenida que o margina, do lado direito, fazem parte das obras do porto do Rio de Janeiro. * * * * * _=Supremo Tribunal Federal=_—É esta uma das mais bellas, artisticas e monumentaes construcções do Rio actual. Ergue-se na rua Primeiro de Março e é um palacio de marmore e de granito, primitivamente destinado e edificado para séde do Banco do Brasil. Foi seu architecto Paulo Schroeder. * * * * * _=Repartição Geral dos Telegraphos=_—É o historico palacio construido, em 1743, por ordem do 59.º Governador do Rio de Janeiro, Gomes Freire de Andrade, depois Conde de Bobadella. Occupou-o elle proprio e, a seguir, installaram-se ahi mais sete governadores, já então vice-reis do Brasil. Em 1808 occupou-o D. João VI, quando fugido de Portugal, e desde 1822 a 1889, foi palacio imperial. D’ahi embarcou para o exilio, na madrugada de 16 de Novembro de 1889, o imperador D. Pedro II, acompanhado por sua familia. Sob o ponto de vista historico é este o mais notavel edificio da capital da Republica. Exterior, como interiormente, nada contem de apreciavel. * * * * * _=Prefeitura=_—Ha dois edificios, occupados pelas duas instituições que constituem a Prefeitura, a saber o Conselho Municipal e a Municipalidade. O primeiro está installado em um elegantissimo predio da rua Treze de Maio, outr’ora escóla publica. Foi restaurado em 1895. A Municipalidade, ou Prefeitura, funcciona em um vasto edificio da Praça da Republica, lado oriental. Álem de varias salas e salões, amplos e bem decorados e guarnecidos, a Prefeitura encerra uma importante bibliotheca. Em 1904, a receita municipal foi de réis 28:302:269$242, e a despeza de 28:217:890$888 réis. Em 1905, foi a receita de 23:834:861$000 réis, e a despeza de 23:807:521$463 réis. * * * * * _=Imprensa Nacional=_—Este amplo edificio, com 89 metros de frontaria, foi mandado construir, em 1877, pelo Visconde do Rio Branco, então ministro da fazenda, para installação da Typographia Nacional, com todos os seus serviços annexos e derivados. Occupa uma area de 8:148 metros, e prolonga-se desde a estação da Companhia Carril Carioca, até ao Theatro Lyrico. O dr. Antonio de Paula Freitas, engenheiro, dirigiu as obras. A architectura é em estylo gothico-inglez. * * * * * _=Correio Geral=_—Esboçou o plano d’este edificio, o constructor Pedro Bosisio, por conta do ministerio da Fazenda e de accôrdo com a Associação Commercial. Afinal esta collectividade, que tinha de occupar um dos pavimentos, edificou casa á parte. A obra do Governo tem 40 metros de frente por 39 de fundo, dirigindo os trabalhos o dr. Antonio de Paula Freitas. O estylo architectonico é o do Renascimento, vendo-se no pavimento do rez-do-chão os caracteristicos da ordem jonica, no andar nobre os da ordem corinthia e no 3.º pavimento os da ordem composita. Também ahi funcciona a Caixa de Amortisação. * * * * * _=Mercado Novo=_—Tambem chamado Central. É novissimo, pois foi inaugurado em 15 de Fevereiro de 1908. Foi construido para substituir o mercado Velho, situado na praia do Peixe. O novo occupa a praia de D. Manuel. É de ferro e vitraes, tendo 8 portões, 4 nos angulos e 4 lateraes. Ao centro, eleva-se um elegante pavilhão com torre e relogio. É muito arejado, asseiado e cortado de ruas calçadas a parallelipipedos. O centro é ajardinado. Destina-se esta construcção, a unica do Rio de Janeiro, no seu genero, á venda de peixe, carne e legumes. Em diversos bairros da cidade, ha mercados provisorios, em plena rua, até ás 9 horas da manhã. * * * * * _=Banco da Republica=_—Foi fundado em 12 de Outubro de 1808, com o titulo de Banco do Brasil, e com o capital de tres milhões de cruzados, em 1:200 acções de um conto de réis, cada uma. Começou a negociar em 1809, em uma casa da rua Direita, esquina da rua de S. Pedro. Por alvará de 20 de Outubro de 1812, o Governo constituiu-se accionista com cem contos annuaes, producto de novos impostos, no intuito de auxiliar o Banco. Em 1815 foi o estabelecimento mudado para outro predio, na mesma rua. A 16 de Fevereiro de 1816, foram mandadas estabelecer agencias, d’este Banco, na Bahia e, a seguir, em outras provincias. Esteve quasi fallido, em 1821, em consequencia de um activo de cinco mil contos contra um passivo de seis mil, sendo reorganisado pelo Governo, em 1823, que o auxiliou com mil e duzentos contos. Alem disso o Estado permittiu que o Banco emittisse bilhetes de 4, 6, 8 e 12$000 réis. Por causa dos supprimentos feitos pelo Banco ao Governo, durante as guerras do Sul, a assembleia geral dos accionistas recorreu ao Governo, que contractou com o Banco pagar-lhe a divida com nova emissão de notas, proporcional á mesma divida. Esta medida desacreditou o Banco. Por carta de lei de 23 de Setembro de 1829, foi mandado liquidar, e definitivamente dissolvido em 3 de julho de 1848. Por decreto de 2 de Julho de 1851, foi creado um novo Banco do Brasil, com o capital de dez mil contos, dividido em 20:000 acções de 500$000 réis cada uma, começando as operações a 21 de Agosto, na casa n.º 143 da rua da Quitanda. Em 12 de Julho de 1853, este Banco foi fundido com o Commercial, sob o titulo do Banco do Brasil. Foi installado no actual edificio, especialmente construido, situado na rua da Alfandega, esquina da rua da Candelaria, em 10 de Abril de 1854. O capital do 3.º Banco do Brasil, era de trinta mil contos, divididos em 150:000 acções. Esse capital foi depois elevado a 33:000 contos, divididos em 165:000 acções de 200$000 réis cada uma. O primeiro ministro da Fazenda, da Republica, o dr. Ruy Barbosa, reformou-o em 1890, sob a designação de Banco da Republica dos Estados Unidos do Brasil, concedendo-lhe a faculdade emissora, ao principio com caracter privativo, ampliando-a depois a outros estabelecimentos de credito. Foi o abuso d’esta faculdade que produziu o _ensilhamento_, causa do atrazo e do descredito das finanças brasileiras. * * * * * _=Casas de Correcção e de Detenção=_—A primeira funcciona em edificio proprio, construido de 1835 a 1840, na rua do Conde d’Eu. A segunda, proxima da antecedente, foi inaugurada em 20 de Abril de 1856. Este estabelecimento é, hygienicamente, superior á Casa de Correcção, porém ambos estão mal situados. A primeira d’estas casas é uma especie de penitenciaria para trabalhos forçados e galés perpetuas. A segunda é apenas o deposito de presos das esquadras de policia, até que são julgados. * * * * * _=Palacio Episcopal=_—Foi edificado de 1701 a 1715, pelo bispo D. Francisco de S. Jeronymo, no local da ermida da Conceição e de uma casa habitada por alguns religiosos francezes. Reformou-o o bispo D. José Joaquim Justiniano. É um casarão sem architectura alguma definida, mas que occupa uma bellissima posição topographica, no alto do morro da Conceição, de onde o golpe de vista é maravilhoso para a cidade, a bahia e os arrabaldes. A decoração interior é modesta, notando-se alguns retratos e bustos de prelados e monarchas. Estabelecimentos Scientificos _Observatorio_—Occupa o vértice do morro do Castello e foi fundado no reinado de D. Pedro I. Servem ás suas installações as dependencias de um antigo estabelecimento de jesuitas, que nunca foi concluido. Torre mobil de duplo tecto, com instrumentos thermometricos e barometricos. Installação especial com apparelhos de precisão de horas. Avulta um de Bamberg, Allemanha, que importou em 4:200$000 réis. Pavilhão com cupula mobil, de madeira e ferro, onde está installada a pequena equatorial, com 25 centimetros de objectiva. Ha outra, com 33 centimetros, que está desmontada. Pavilhão com a installação de meridianos modernos e aperfeiçoados, não obstante prestar ainda serviços um apparelho de 1849. Secção especial de preparo de chronometros de bordo. Torre de ferro com balão, que sóbe e dispara precisamente á 1 hora da tarde. Deposito de instrumentos varios. Salão com a bibliotheca especial do estabelecimento, em mais de 20:000 volumes. Sismographo, interessante apparelho que marca, com precisão, todos os phenomenos sismicos que se produzam em qualquer parte do mundo. Ha ainda outro instrumento d’este genero, com o peso de 500 kilos. Apparelho para registo de electricidade atmospherica. Amplo terraço, ladrilhado a tijolo, cota esplendorosa vista da bahia, da barra e da cidade. Nas paredes e torreões vê-se o signal das balas disparadas pelos navios da esquadra revoltada, do contra-almirante Custodio José de Mello. * * * * * _Faculdade de Medicina_—Este estabelecimento scientifico, que teve a sua origem no decreto de 5 de Novembro de 1808, mandando fundar, no Hospital Real Militar, uma escola anatomica, cirurgica e medica, está, ha quarenta annos, a funccionar em um velho pardieiro que tem entrada pelo largo da Misericordia. É faculdade desde 3 de outubro de 1832. Comprehende os cursos de medicina, obstetrica, pharmacia e odontologia. Tem bibliotheca da especialidade e laboratorio de chimica. * * * * * _Escóla Polytechnica_—Esta instituição teve a sua origem em 1699, quando o governo da metropole mandou estabelecer, no Rio de janeiro, uma aula de fortificação. Em 1810, estando D. João VI na capital do Brasil, tratou-se de installação condigna para este estabelecimento, já então reformado em Academia Real Militar, sendo aproveitados os alicerces e as paredes, até meia altura, da egreja cuja construccção estava, havia annos, interrompida e que era destinada a cathedral. Em 1812 foram inauguradas as aulas n’esse novo edificio, que é o actual, varias vezes modificado, no largo de S. Francisco de Paula, defronte da rua do Ouvidor. É de alvenaria sem estylo architectonico. Em 9 de Março de 1842, o ministro da guerra, José Clemente Pereira, transformou o estabelecimento em Escóla Militar. Dezeseis annos mais tarde, Jeronymo Francisco Coelho, tambem ministro da guerra, modificou-a para Escóla Central. Foi reorganisada sob a denominação de Escola Polytechnica, por decreto de 25 de Abril de 1874. Tem sido reformada, por varias vezes, tanto sob o ponto de vista technico, como em relação ao edificio. Ultimamente, puzeram-lhe ao centro da fachada 4 columnas de pedra granitica, que o povo chrismou de _nariz de cêra_. Foi n’esta escóla que se formaram, em engenharia, os velhos marechaes do exercito brasileiro. Comprehende os cursos de engenharia civil, estradas, minas, engenharia geographica e sciencias physico-mathematicas. * * * * * _Conservatorio de Musica_—Este conservatorio foi creado por decreto de 27 de Novembro de 1841 e provisoriamente foram installadas as aulas no edificio do Museu Nacional, em 10 de Agosto de 1848. Em 14 de Maio de 1855 foi o Instituto Nacional de Musica, sua designação official, incorporado á Academia das Bellas Artes, construindo-se junto a esta Academia, um edificio especial para o Conservatorio, que foi inaugurado em 9 de Janeiro de 1872. A edificação nada apresenta de notavel, funccionando a instituição para os dois sexos. Este estabelecimento foi originado na Sociedade Beneficente Musical, fundada por Francisco Manoel da Silva, em 1833. O Conservatorio occupa 19 professores, 4 adjunctos e 9 auxiliares de ensino. * * * * * _Academia Nacional de Bellas Artes. Pedagogium. Syllogêo Brasileiro_—Das duas primeiras instituições já foi dada noticia desenvolvida no capitulo Museus. O Syllogêo Brasileiro abriga a Academia Nacional de Medicina, o Instituto da Ordem dos Advogados e a Academia de Lettras. D’esta Academia partiu, ultimamente, a iniciativa da reforma da orthographia brasileira. O edificio especial onde funcciona o Syllogêo, foi mandado concluir recentemente pelo ministro Seabra, e está situado defronte do Passeio Publico. * * * * * _Escóla Normal_—Estabelecimento scientifico para habilitação de professoras. Foi creado por decreto de 30 de Novembro de 1876, em duas secções, uma para preparo de professoras e a outra de instrucção primaria. Para seu funccionamento, foi construido um edifício especial, na rua da Relação, esquina da rua dos Invalidos, cuja pedra fundamental foi collocada em 2 de Dezembro de 1876. Actualmente, esta Escóla funcciona em um palacete da praça da Republica, porém vae ser brevemente transferida para casa propria, na Avenida Central. O curso normal divide-se em 4 séries, comprehendendo a primeira—portuguez, francez, arithmetica, geographia, musica, trabalhos manuaes, trabalhos de agulha, calligraphia e gymnastica. A 2.ª série abrange as aulas de portuguez, francez, algebra, geometria, geographia, historia, desenho linear, musica e trabalhos de agulha. Na 3.ª série ha as seguintes disciplinas:—portuguez, francez, historia da America, historia natural, physica, pedagogia, trabalhos manuaes e desenho de ornato. Finalmente, a 4.ª série comprehende litteratura brasileira, chimica, historia do Brasil, instrucção civica, pedagogia e desenho de figura. A Escóla Normal encerra uma bibliotheca, uma officina de trabalhos de agulha, um gabinete de historia natural e um laboratorio de physica e chimica. De 1900 a 1904 foram diplomadas 320 professoras, que só conseguem obter nomeação official depois de servirem um anno de adjuntas a professores cathedraticos, e mediante concurso publico. O estabelecimento é superiormente dirigido pelo Director Geral de Instrucção Publica, auxiliado por um sub-director. A Escóla tem professores cathedraticos especiaes para cada disciplina, com uma professora-substituta, para cada cadeira, escolhida entre as diplomadas de mais brilhantes provas. * * * * * _Collegio Militar_—Foi fundado, em 1880, pelo Conselheiro Thomaz José Coelho de Almeida, no antigo palacete do Barão de Mesquita. Em 1891 foram inauguradas vastas dependencias juntas á primitiva installação. Abriga cêrca de 600 alumnos, filhos e primeiros netos de officiaes effectivos e reformados do Exercito e da Armada, filhos e primeiros netos de officiaes honorarios, por serviços de guerra; e filhos de praças de pret mortas em combate. Estes são os internados gratuitos; porém o estabelecimento tambem admitte alumnos contribuintes, de todas as classes sociaes. Os alumnos do Collegio Militar podem seguir a carreira que quizerem, valendo-lhes o curso d’esta instituição para as escólas militares de terra e mar. Os dois edificios elevam-se ao centro de vasto e arborisado terreno, com a entrada pela rua de S. Francisco Xavier. No antigo palacete do Barão de Mesquita, visita-se a secretaria, a sala de armas, a repartição do quartel-mestre, a repartição do material, a arrecadação, os gabinetes do commandante, secretario e sub-secretario, a bibliotheca, a sala da congregação e a sala de honra dos alumnos distinctos. No grande edificio annexo estão installados tres dormitorios a 130 camas, álem de outros mais pequenos e 23 salas para aulas. Independentemente d’estes edificios, ha vasta installação hydrotherapica, gymnastica, usina para a illuminação electrica, etc. * * * * * _Gymnasio Nacional_—Divide-se este estabelecimento de ensino em Internato e Externato. O primeiro occupa um vasto edificio na praça Marechal Deodoro. Até 1889, e á proclamação da Republica, teve esta instituição o titulo official de Collegio de D. Pedro II. É destinado a formar bachareis em lettras, e foi fundado em 1837. O internato tem accommodações para 150 alumnos e o externato para 290. Este está installado na rua Marechal Floriano. * * * * * _Lyceu de Artes e Officios_—Esta instituição, de ensino popular e gratuito, foi fundada e é mantida pela Sociedade Propagadora das Bellas Artes, em um velho, incompleto e improprio edificio da rua Treze de Maio, defronte do predio do Theatro Lyrico. O Governo auxilia o custeio d’este estabelecimento de ensino superior, que é regularmente frequentado. Da Carioca ao Somaré Partindo-se do antigo largo da Carioca, por sobre um viaducto, outr’ora aqueducto-conductor das aguas da serra do Andarahy, e das suas bifurcações, para a caixa d’agua da Carioca, em meia hora attinge-se o Somaré, que é um planalto situado álem do morro de Santa Thereza, e sobranceiro aos bairros de Catumby, Rio Comprido, Engenho Novo, Larangeiras, Fabrica das Chitas, Engenho Velho e Andarahy. Sahindo do viaducto, o _tramway_ embrenha-se em uma região encantadora pela opulencia e pelo pittoresco da vegetação, como devido ás elegantes construcções, aos jardins e ás chacaras, que salpicam a montanha, quebrando-lhe a monotonia vegetativa e realçando-lhe a belleza natural. Porém, o viajante não sabe que mais admirar, se a paisagem que o cerca, cuja formosura e perfume o deliciam, se o panorama que os, olhos abrangem, empolgante para a imaginação e sublimado para o espirito. As encostas e os valles circumvisinhos, semeados de casaria, que quasi desapparece sob a fronde do arvoredo; os vértices de serras perenne e opulentamente vestidas, cujos encantos as nuvens tentam encobrir ao observador maravilhado; e, emfim, a immensa bahia de Guanabara, semeada de ilhas e resplendente das caricias do sol, tudo perpassa em profusão e como em um kaleidoscopio pela nossa retina, patenteando-nos os ineffaveis primôres da assombrosa capital brasileira. A primeira estação é França e a segunda Lagoinha, onde a linha ferrea bifurca-se para o Silvestre e para o Somaré. Attingido este ponto, em via de preparação pelo desbravamento do terreno e aterro da esplanada, o viajante assiste á apotheose da natureza em um dos mais deslumbrantes scenarios do universo. Não se descreve o indescriptivel, mas vê-se e sente-se que nenhuma outra cidade do mundo possúe os encantos naturaes do Rio de Janeiro. A Companhia Ferro Carril da Carioca, presta relevante serviço publico, melhorando e explorando o Somaré, proximo futuro ponto de reunião dos fluminenses e de todos os admiradores do bello na sua mais suggestiva e arrebatadora manifestação. A excelsa natureza, sempre libérrima e previdente, compensa assim os habitantes da esplendorosa capital do Brasil, proporcionando-lhes este e outros locaes de frescura e de recreio, a pouca distancia do centro de uma grande cidade, cuja temperatura é geralmente cálida. Assistencia Publica Seria negar a verdade escrever que não ha deficiencias no serviço de assistencia publica, no Rio de Janeiro. Pelo conhecimento d’este e do capitulo seguinte, que trata da beneficencia particular, ver-se-ha o quanto é cultivado e desenvolvido, na capital brasileira, o nobilissimo sentimento da philantropia, e quaes os principaes altares onde é adorada a deusa Caridade, que é tambem a mais bella e a mais sublime virtude civica como a mais gloriosa conquista da civilisação universal. As lacunas desapparecerão, gradualmente, pelos esforços combinados dos elementos officiaes, das associações beneficentes e da iniciativa particular, sempre sollicita e generosa na lucta ingente e sacrosanta contra as miserias humanas e as iniquidades sociaes. * * * * * _Hospital Nacional de Alienados_—Foi fundado por decreto de 18 de Julho de 1841, para solemnisar a sagração e coroação de D. Pedro II, e por iniciativa do ministro do Imperio e provedor da Santa Casa de Misericordia, José Clemente Pereira. A 1.ª pedra do edificio, que é o actual, situado na Praia Vermelha e na antiga chacara do Vigario Geral, foi lançada em 3 de Setembro de 1842, e a inauguração realisou-se, solemnemente, em 5 de Dezembro de 1852, com o titulo official de Hospicio de D. Pedro II, que conservou até á proclamação da Republica. Tres dias depois começou a funccionar com 140 alienados, 67 da enfermaria provisoria da Praia Vermelha e 73 removidos do Hospital da Misericordia. O palacio occupa uma area de 1:562 braças quadradas. O portico, de cantaria, é accessivel por 10 degráus. 4 columnas de pedra, com capiteis doricos, sustentam uma balaustrada de marmore, com tres portas entre as columnas. Na frontaria do 2.º pavimento estão quatro columnas de ordem jonica, coroando o corpo central do edificio um frontão recto. Um attico ornado de estatuas e vasos de marmore, occulta o telhado. A architectura do 1.º pavimento é de ordem dorica, com vinte janellas de peitoril, nos corpos lateraes, e a do 2.º andar é de ordem jonica, tambem com 20 janellas. O desenho d’este monumento é dos architectos Domingos Monteiro, Guilhobel e José Maria Jacintho Rebello. No vestibulo estão as estatuas de Esquirol e de Pinnel, por Pettrich. O lado direito do edificio é occupado por homens e o esquerdo por mulheres. A primitiva construcção do Hospicio importou em 1:313:451$481 réis. 2.º pavimento: Bibliotheca da especialidade, a melhor da America do Sul. Grande mesa ao centro, com as revistas publicadas, em todo o mundo, sobre molestias nervosas. Gabinetes do Director e do Secretario. Secção Calmeil. 150 doentes. Gabinete do medico. Sala de bilhar, para os doentes. Salão de recreio. Gabinetes particulares, para doentes recolhidos á custa das familias. Terraço para recreio, com lavatorio e banheiras de aceio. Corredor com quartos particulares para doentes de 4.ª classe. Bibliotheca para enfermos. Sala para doentes agitados. Foram supprimidos os quartos fortes para encerramento de furiosos. Refeitorio d’esta secção. Salão de sessões e festas. Aqui admira-se as estatuas de D. Pedro II e de José Clemente Pereira, em marmore branco, pelo esculptor Pettrich; os retratos de Deodoro, Rodrigues Alves, Aristides Lobo, e os bustos, em marmore branco, dos bemfeitores Eduardo Pinto e José Ribeiro. Archivo da casa. Capella, com um só altar e n’este a imagem de S. Pedro de Alcantara, marmorea obra de arte. 1.º pavimento. Dispensa e cosinha. Salão de curativos e de operações, dotado dos melhores e mais modernos apparelhos da especialidade. Installação especial para exames internos por meio da electricidade. Gabinete anatomico e estufa. Laboratorio bacteriologico. Esplendido microscopio e magnifico apparelho especial para medidas cerebraes. Apparelho de microphotographia. Pharmacia do estabelecimento. Sala da energia electrica. Secção dos raios X. Banheira electrica. Apparelho para banhos de luz. Sala de ophtalmologia. Gabinete odonthologico. Museu da especialidade, com grande numero de craneos. Na cêrca do estabelecimento está um pavilhão isolado, com a cosinha geral do estabelecimento, movida a vapor, monumental e primorosamente aceiada. Dois pavilhões para doentes epilepticos. Pavilhão para admissão e observação de doentes, com gabinetes para os exames medicos. Aula de chimica psychiatrica da Faculdade de Medicina. Pavilhão com installação balnear para doentes em observação. Duches e gabinetes para applicações electricas. Gabinete de psychologia experimental. Pavilhão com officinas de typographia, encadernação, colchoaria, sapataria e outras. Na primeira imprime-se a revista _Archivos Brasileiros_. Dois pavilhões de isolamento, com galeria, para tuberculosos. Pavilhão-necroterio. _Atelier photographico._ Pavilhão isolado, com um leproso. Grande horta, tratada por doentes. Enfermaria, isolada, de doentes immundos. Annexa á secção de mulheres, está a Escóla Barineville, com a frequencia, em Maio de 1908, de 54 creanças dos dois sexos, que aprendem a escrever com lettras de metal. A média geral de recolhidos, dos dois sexos, é de 1:200, annualmente. A frontaria do edificio central tem 200 metros de comprimento e a area de todo o estabelecimento é de 140:000 metros. N’este manicomio funcciona uma Escóla de Enfermeiros, a unica do Brasil. Na ilha do Governador ha uma dependencia d’este Hospicio, com escóla agricola. * * * * * _Instituto Benjamin Constant_—Na praia da Saudade, e a pequena distancia do monumento anteriormente descripto, eleva-se o grandioso edificio, por concluir, onde funcciona este Instituto, creado em 1857, com o titulo de Imperial Instituto de Meninos Cegos. Occupa uma area de 9:516 metros quadrados. Os alumnos são divididos em gratuitos e contribuintes e teem aulas de instrucção primaria, secundaria e profissional. Encerra officinas de typographia, pelo systema de Braille; de encadernação; de empalhação de moveis; de afinação e concerto de pianos; de fabrico de objectos caseiros, como vassouras, espanadores, escovas; de artefactos de missanga e de lã, para bordar; e de fabricação de colchões. O Instituto admitte internados, cegos, de ambos os sexos e possúe banda de musica. * * * * * _Instituto dos Surdos Mudos_—Foi fundado em 1857 e reorganisado em 1873. É só para o sexo masculino, sendo admittidos e favorecidos, pelo Governo, de preferencia, os orfãos de pae e mãe; os orfãos de pae e os filhos de funccionarios federaes, civis e militares. O ensino, n’este estabelecimento, é litterario e profissional, comprehendendo este os officios de encadernador, dourador, sapateiro e exercicios gymnasticos, e aquelle linguagem escripta, articulada, leitura sobre os labios, mathematica, geographia, historia do Brasil, desenho e modelagem. Os alumnos pobres teem uma percentagem, geralmente de 30%, sobre os objectos por elles fabricados e sobre o preço do trabalho feito nas officinas, quando os objectos são para o Instituto. Todo o calçado consumido no estabelecimento é fabricado na respectiva officina, subindo a 600 o numero de volumes encadernados mensalmente. * * * * * _Escóla Correccional 15 de Novembro_—Esta instituição, fundada em 1890, está sob a dependencia e administração da Chefia de Policia, para a internação de menores vagabundos, orfãos ou abandonados pelos paes, sendo-lhes ministrada conveniente educação physica, moral e profissional. Os menores delinquentes e os precocemente viciados, são separados d’aquelles que apenas foram abandonados pela penuria dos paes. * * * * * _Assistencia Judiciaria_—A radical transformação de instituições politicas, no Brasil, iniciada em 15 de Novembro de 1889, entre outras e beneficas consequencias, trouxe a da fundação da Assistencia Judiciaria, instituição destinada a proporcionar defeza e amparo aos miseraveis attingidos pela garra adunca das leis repressivas. O Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros confeccionou o Regulamento da Assistencia, indicado pelo artigo n.º 176 do Decreto n.º 1:030, do Governo Provisorio, publicado em 14 de Novembro de 1890, e determinado pelo Decreto Federal, n.º 2:457, de 8 de Fevereiro de 1897. É esta uma das mais sympathicas instituições dos serviços de assistencia publica do Rio de Janeiro. * * * * * _Assistencia Policial_—É da immediata direcção do Chefe de Policia, que contracta com uma ou mais emprezas particulares o serviço da conducção de enfermos domiciliados ou caídos na via publica, ebrios, alienados, feridos e de cadaveres, nas zonas urbana e suburbana do Districto Federal. Ha cinco estações principaes, com o material sufficiente, álem de numerosos postos de soccorros. Em uns e outros, ha medicos permanentes, para os casos urgentes. Este serviço, porém, ainda ultimamente não estava devidamente aperfeiçoado, nem mesmo regularisado, devido a attrictos profissionaes e burocraticos entre os facultativos municipaes e os policiaes. O Soccorro Immediato ás Victimas de Accidentes no Mar e o Deposito de Menores, são duas novissimas creações da Chefatura de Policia do Districto Federal. O primeiro serviço consiste em uma lancha-enfermaria, a vapor, com pessoal competente e material apropriado. O Deposito de Menores, é subdividido para os dois sexos, e destina-se a asylar, provisoriamente, as creanças até á sua entrega ao Juiz dos Orfãos. Em 1907, a secção do sexo masculino recolheu 177 creanças, das quaes 117 foram desligadas em virtude de requisição judicial. A Chefia de Policia mantem estes serviços pela verba _Diligencias Policiaes_, por não haver ainda o Congresso Nacional votado os recursos indispensaveis ao seu funccionamento. * * * * * _Hospital de S. Sebastião_—Está situado na Ponta do Cajú, e consta de um edificio central e de varios pavilhões isolados, com installações especiaes e para isolamento de enfermos contagiosos. Foi inaugurado em 1889 e substitue os extinctos hospitaes da Jurujuba e de Santa Barbara, aquelle para doentes de febre amarella e este para variolosos. Encerra 300 leitos e está a cargo da directoria Geral de Saúde Publica. No edificio central estão installadas a Secretaria, a Bibliotheca, a sala do Director, a Rouparia, o Consultorio Medico, a Sala de Operações, admiravelmente provida, a Pharmacia, os laboratorios, os refeitorios e a cosinha. Nos pavilhões estão o almoxarifado, a lavanderia a vapor, as estufas de desinfecção, o deposito das roupas dos doentes, os aposentos dos internos e os quartos particulares para contribuintes. Ha pavilhões especiaes para as enfermarias geraes, a 60 leitos cada uma. O magnifico laboratorio bacteriologico d’este estabelecimento funcciona em edificio proprio, no parque. Ha tres medicos internos, cinco externos e grande numero de enfermeiros e serventes. Como vão rareando os doentes de febre amarella, em consequencia da transformação da cidade e das rigorosas medidas hygienicas adoptadas pela Directoria Geral de Saúde Publica, o maior numero de internados é, actualmente, de variolosos. É a melhor possivel a situação topographica d’este estabelecimento hospitalar, que recebe doentes por mar e por terra. * * * * * _Hospital Central do Exercito_—Este estabelecimento, que apenas começa a funccionar, depois de concluido será, no genero, um dos primeiros do mundo. Foi inaugurado em 20 de Junho de 1902, na rua Jockey Club, suburbio de S. Francisco Xavier, em um terreno que mede 280 metros de frente por 282 de fundo. Consta de um corpo central e de oito pavilhões, contendo 25 enfermarias. Occupa actualmente quatorze medicos, cujo Director tem a patente de tenente-coronel, cinco pharmaceuticos, um enfermeiro-mór, 14 irmãs de caridade, 20 ajudantes de enfermeiro e 60 serventes. É profusamente illuminado a luz electrica e abundantemente provido de agua. Pavilhão Central. Hydrotherapia electrica. Banho de luz intensiva. Apparelho especial para luz azul. Sala de radiographia, com os mais modernos apparelhos. Gabinete de massagem. Sala das machinas extacticas. Gabinete de bacteriologia. Sala geral de operações, com numeroso e aperfeiçoado instrumental. Pavilhão de Cirurgia. Sala de esterelisação. Sala de operações, com gabinetes annexos. Salas de curativos. Sala do arsenal cirurgico. O custo de cada um d’estes pavilhões é de 200 contos. Mais tarde serão ligados por galerias, entre si e ao corpo central. A distancia d’este Hospital á cidade é de 70 minutos de tramway electrico. * * * * * _Hospital da Ilha das Cobras_—É destinado a abrigar e curar os doentes da Armada Nacional. Foi inaugurado em 3 de Março de 1834. Tem uma succursal na praia da Copacabana, para tratamento de marinheiros atacados de beriberi. * * * * * _Asylo dos Invalidos da Patria_—Funcciona desde 29 de Julho de 1868, na Ilha do Bom Jesus. Em 31 de Dezembro de 1907, abrigava 144 invalidos, mas o numero de asylados é de 800, achando-se os 650 restantes licenciados no territorio nacional. Abriga ainda muitos heroes da guerra do Paraguay. * * * * * _Instituto Oswaldo Cruz_—Desde 19 de Março de 1908, é que tem esta designação official, em homenagem ao dr. Oswaldo Cruz, actual Director Geral da Saúde Publica, que tem prestado relevantissimos serviços á causa da salubridade da capital da Republica. Anteriormente chamava-se _Instituto de Manguinhos_. É uma escóla de medicina experimental, especialmente destinada a auxiliar os serviços de prophylaxia e de policia sanitaria da Repartição Geral de Saúde Publica. Possúe laboratorios onde são preparadas as vaccinas, os sôros e outros productos applicados no tratamento e na prevenção de molestias contagiosas. * * * * * _Directoria Geral de Hygiene e Assistencia Publica_—Terminada a rapida descripção das instituições e dos estabelecimentos de assistencia publica do Rio de Janeiro, a cargo do governo federal, ou da União, daremos, a seguir, conta das principaes casas de caridade sob a administração e custeio da municipalidade fluminense e subordinadas á Directoria Geral de Hygiene e Assistencia Publica. Esta repartição foi organisada em 1893, para tratar dos serviços de soccorros medicos e gratuitos á população carioca, nas ruas e nos domicilios, em virtude de molestias ou de accidentes. Antes d’aquella data a assistencia publica estava unicamente a cargo das auctoridades federaes. Infelizmente, ainda não estão bem discriminados os serviços que incumbem á Directoria Geral de Saúde Publica, federal, e á Directoria Geral de Hygiene e Assistencia Publica, municipal, e d’ahi frequentes conflictos entre os representantes officiaes das duas entidades sanitarias, com o que soffre consideravelmente o serviço geral de assistencia publica. * * * * * _Institutos Profissionaes_—São dois, um para cada sexo. Se bem que a cargo da Directoria Geral da Instrucção Publica, estas duas instituições são caracteristicamente da assistencia publica-municipal. O instituto masculino é organisado militarmente e possúe banda de musica. O ensino ministrado n’este estabelecimento comprehende o triplice curso de sciencias, artes e officios. Este ramo abrange a electricidade (ensino pratico), composição typographica, impressão e stereotypia, encadernação, carpintaria, marcenaria, torneiro, entalhador e ferreiro. O curso de sciencia consta de instrucção primaria, francez pratico, mathematica elementar, machinas, escripturação mercantil, electricidade e dactylographia. A secção artistica comprehende desenho geographico e elementar, de ornato e de machinas, esculptura, musica vocal e instrumental, gymnastica, agronomia e exercicios militares. Este instituto é o antigo Asylo dos Meninos Desvalidos, fundado em 1874. Tambem admitte semi-internos contribuintes, para o estudo de machinas e de electricidade. O Instituto Profissional Feminino foi fundado em 1898, e é destinado a fornecer, a meninas, educação physica, moral, intellectual e pratica, esta em todos os ramos domesticos. * * * * * _Asylo de S. Francisco de Assis_—Está situada esta instituição municipal, em edificio proprio, na rua do Visconde de Itaúna. Foi inaugurada em 10 de Julho de 1879, e recolhe os mendigos, dos dois sexos, encontrados na via publica, verificando-se que não podem prover á propria subsistencia. No fim de 1907 era de 228 o numero dos asylados. * * * * * _Casa de S. José_—Recebe menores do sexo masculino, de 6 a 12 annos, que por abandono ou absoluta indigencia, careçam da protecção official. Fundou-o o conselheiro Ferreira Vianna, quando ministro do Imperio, e por subscripção publica. Os asylados recebem ensino de artes e officios, instrucção primaria, vestuario, alimentação e são obrigados a exercicios gymnasticos e militares. Completos os 12 annos o asylado é restituido á sua familia, e se a não tem é internado no Instituto Profissional, ou entregue ao Pretor, para dar-lhe destino. * * * * * _Instituto Vaccinico-Municipal_—Foi creado por Decreto de 5 de Setembro de 1894, e cabe-lhe, por contracto, a cultura, o preparo e a inoculação da vaccina animal. Importa e vende, com auctorisação superior, o sôro anti-diphetherico de Roux. Vaccina gratuitamente, não só a população indigente da capital, como os alumnos das escólas federaes e municipaes, as praças do Exercito, da Armada, do Corpo de Bombeiros, os funccionarios federaes e municipaes, fornecendo o sôro a qualquer dos Estados que o sollicite. Em 1904 este Instituto utilisou-se de 420 vitellos, distribuiu, na capital, 184:474 tubos vaccinicos, remetteu 171:461 tubos para os Estados e vaccinou 21:174 individuos. Está situado na rua Silveira Martins. * * * * * _Corpo de Bombeiros_—Poderoso instrumento de assistencia publica, esta corporação tem prestado assignalados serviços á população fluminense. Existe desde 12 de Julho de 1856, tendo o primitivo titulo de Corpo Provisorio de Bombeiros da Côrte. A primeira bomba a vapor foi adquirida em 1865, e até 1870 todo o material era puxado á mão, passando a sêl-o a muares. Em 1881, foi creada uma caixa de beneficencia, e a cidade dividida em cinco districtos, para regularidade do serviço, e em cada um estabelecido um posto de soccorros. Actualmente, o Corpo de Bombeiros, tem 626 praças, divididas em 5 companhias, um estado maior e um estado menor de officiaes. O material consta de 20 bombas a vapor, 2 fluctuantes, 16 bombas de cisterna, 22 de mão, 2 bombas chimicas, 1 de pressão hydraulica, 1 com dynamo, 5 abafadeiras chimicas, 6 meias-cabeças, 29 carros de transporte de pessoal e utensilios, 3 carros com escadas, 10 caminhões, 11 carroças com pipas para agua, 1 ambulancia, 19 carrinhos para mangueiras, 1 lancha a vapor com bomba para incendio a bordo, 78 escadas de assalto, 16 ditas de 1 e 2 ganchos, 52 apparelhos de salvação e 2 para-quedas. É de 100 a média de sinistros annuaes. No magnifico quartel d’esta corporação, ha uma enfermaria para as praças. Na falda do morro de Santo Antonio, e a pouca distancia do respectivo quartel, está installado o hospital privativo da Força Policial. * * * * * _Hospital dos Lazaros_—Está situado no vértice de uma collina, em face da bahia e no extremo da praia do Cajú, que ahi tem o nome do hospital. O seu fundador foi o governador Conde de Bobadella, em umas pequenas casas que alugou em S. Christovão. O Conde da Cunha creou um lazareto nas proximidades d’aquellas propriedades, que funccionou até 1817, anno em que os leprosos foram removidos para a ilha das Enxadas, e em 1823 para a ilha do Bom Jesus. Restaurado o primitivo hospital, os doentes para elle voltaram em 18 de Fevereiro de 1833. É em dois pavimentos e tem 2 capellas e um campanario que se avista logo á entrada da barra. É estabelecimento modelar, no genero. Beneficencia Particular O logar de honra n’esta especie de revista á assistencia particular da metropole fluminense, pertence, de direito, á Irmandade da Misericordia, benemerita instituição que nasceu com a cidade de S. Sebastião do Rio de Janeiro, e cuja historia é um preciosissimo escrinio de immenso e immortal amôr pela grande familia humana, divinal sacrario da verdadeira religião, a unica agradavel a Deus e ás sublimidades da nossa alma. Eis o relatorio official do Provedor da Irmandade da Santa Casa da Misericordia do Rio de Janeiro, referente ao anno de 1907: _Secretaria_—Centro do movimento administrativo de Instituição, canal por onde passam para terem execução as ordens e deliberações da Mesa e do Provedor, é de maxima importancia a sua acção, felizmente confiada a funccionarios, cuja actividade, intelligencia, zelo e prudencia constituem-no primeiro auxiliar n’esta parte dos nossos multiplos serviços. Não foi possível reorganizal-a ainda este anno, não tanto porque disso resultasse consideravel encargo pecuniario, mas porque se torna preciso preparar um regulamento que attenda á conveniente distribuição de serviços novos, á melhoria dos já existentes, á adopção de processos rapidos sem prejuizo das garantias de fiscalisação; e para fazer reforma proveitosa não houve absolutamente tempo. Repartição particular, é o seu movimento surprehendente, superior ao de muitas repartições officiaes, e para que bem se julgue bastará assignalar que por ella processaram-se 575 documentos, transitaram, sendo estudadas e informadas, 3:676 petições, fez-se o registro de 15:339 obitos, foram dadas 5:575 quitações, recebidos 1:218 officios e expedidos 4:671, sendo em diversos estabelecimentos da Santa Casa 4:355, dos quaes aos cemiterios publicos 3:835, aos Poderes Publicos da Republica 164 e a diversos 142, tiveram processo e expedição 5:670 ordens de pagamento, expediram-se 6:210 guias para recebimento, sendo 2:768 para arrecadação da renda dos cemiterios, com registros correspondentes em numero de 1:889, extrahiram-se 2:892 recibos para pagamentos de esmolas e pensões, passaram-se 3:506 certidões de obitos, e não me referirei aos papeis que entram ou sahem ás dezenas e centenas, taes como os titulos de perpetuidade de carneiros o jazigos, ordens aos cemiterios, portarias dando instrucções, nomeações, avisos, apostillas, cartas, e quanto póde calcular quem conhece quaes são os serviços e relações ligados á Santa Casa. Accresce a escripturação dos livros de receita e despeza dos diversos estabelecimentos, o serviço do importante patrimonio predial, o da secção da Empreza Funeraria, que começa ás 8 horas da manhã e termina ás 6 horas da tarde, a organisação de quadros e mappas, a collaboração nos orçamentos, balanços e relatorios. E tudo isso tem sido feito com inteira regularidade e sem reclamações. De accôrdo com o que expuz á Mesa e Junta e com a sua auctorisação, mandei desde logo copiar as actas referentes ao seculo findo, achando-se promptas as dos annos compromissaes de 1800-1801 a 1809-1810 e de 1838-1839 a 1851-1852 (24), sem prejuizo do serviço ordinario e sem augmento de despeza. Para que se comece a impressão falta só authentical-as o presado Irmão Escrivão, cuja formalidade espero será brevemente preenchida. Ao Sr. Dr. Vieira Fazenda dei a incumbencia de organisar a relação de todos os Provedores até á Provedoria do Sr. Conselheiro Barros Barreto, com succinta noticia de seus serviços, de modo a que não sejam esquecidos uns e outros no correr dos tempos. * * * * * _Hospital Geral_—Esta secção tem de ser tratada sob os pontos de vista da distribuição de soccorros, dos melhoramentos no hospital, das condições dos haveres patrimoniaes, e da situação geral da Instituição. Tratar desenvolvidamente de qualquer d’elles corresponderia a horas de leitura, o que a Sessão de Posse não comporta, por maior que seja a longanimidade dos presentes, e apenas haverá um esboço onde se poderia fazer longa memoria. * * * * * O estudo comparativo dos soccorros prestados este anno com os do anterior mostra que as necessidades cresceram, o que importa na elevação dos encargos e no augmento do trabalho. Restrinjamo-nos ao que foi recentemente feito. Recolheram-se 12:171 enfermos, restabeleceram-se 8:605, succumbiram 2:436, dos quaes 303 nas primeiras 24 horas, 165 nas segundas 24 horas e 116 as terceiras 24 horas. A percentagem sobre a mortalidade geral foi de 2:002 e abatidos os fallecidos nas primeiras 24 horas temos 1:752. Passaram para o corrente anno 1:130. Entre os enfermos recolhidos figuram 672 menores de 1 a 17 annos, dos quaes 219 remettidos por auctoridades policiaes, 158 por delegados de hygiene, 9 pelos juizes de orfãos; sendo 613 nacionaes, 50 estrangeiros, do sexo masculino 437 e do feminino 235. As enfermarias são em numero de 28 e mais o Isolamento, das quaes nove estão a cargo dos professores da Faculdade de Medicina, e as restantes a outros tantos clinicos, todos de grande competencia profissional e maior dedicação pelos enfermos, auxiliados por distinctos adjuntos gratuitos e numeroso corpo de internos saídos dos estudantes de medicina. Ha tambem seis medicos internos, e tres adjuntos encarregados do serviço de admissão, revesando-se na portaria de modo que sem interrupção de um minuto, de dia e de noite, ha sempre de promptidão um clinico para attender ás necessidades do serviço hospitalar. Os consultorios, ou a _Sala do Banco_, como popularmente se diz, foram procurados por 134:597 consultantes ou mais 3:927 que o anno passado, para os quaes se aviaram 156:497 receitas, ou mais 8:958. São encarregados d’esse consideravel trabalho diario 10 medicos effectivos e 10 adjuntos, nas secções de allepathia, homœopathia, pequena cirurgia, hydrotherapia, electricidade e diversas especialidades. É este um bom serviço realmente proveitoso para os necessitados. O gabinete odontologico aos cuidados de um cirurgião dentista, de dois adjuntos e seis internos, effectuou 1:897 curativos e 8:993 extracções. A pharmacia, sob a responsabilidade do Director e de dous pharmaceuticos avia, álem das receitas para a Sala do Banco, as das enfermarias, em uma média diaria de 800 (representando assim um total de 444:497 no anno). Os medicamentos vêm da Europa por compra directamente feita aos mais afamados fabricantes, bem como os instrumentos cirurgicos e apparelhos. Com elles despendemos 67:205$810, inclusive despachos. As dietas são preparadas com generos de primeira qualidade, comprados por concorrencia publica realizada de quatro em quatro mezes, em sua maior parte, e na mesma conformidade se procede para os que são consumidos pelo pessoal valido. Tudo isso representa o abastecimento de uma pequena cidade, tendo sido a despeza de 332:245$400 réis no anno findo, sem computar a do ultimo mez (Junho), ainda não liquidada. Para que se avalie das quantidades consummidas apontarei algumas: 1.866:000 pães de 75 grammas cada um; 103:000 litros de leite; 170:000 kilos de carne verde; 5:000 de carneiro; 26:220 kilos de arroz; 15:600 de farinha; 30:000 gallinhas; 9:080 frangos; 111:600 ovos; 10:000 kilos de café; 53:300 ditos de assucar; 250 barris de vinho branco; 100 de tinto e 70 do Porto, devendo notar que d’estas quantidades de vinho sahe o que é preciso nos outros hospitaes e asylos, e é preparada com medicamentos para ser distribuido por todos os consultorios da Casa. Este colossal serviço é desempenhado de modo inexcedivel por 58 Irmãs de S. Vicente de Paulo, 8 das quaes se occupam exclusivamente do movimento da pharmacia. São auxiliadas por 30 enfermeiros e enfermeiras, e por 175 serventes, moços de cosinha, copa, porteiros, guardas, etc. Cabe aqui consignar que vão dando excellentes resultados as aulas praticas dos enfermeiros; seis obtiveram premios no fim do anno, com a distincção de lhes haverem sido entregues pelo Sr. Presidente da Republica, de quem ouviram palavras summamente agradaveis. A enorme responsabilidade pelo bom desempenho de tão variados e delicados serviços cabe inteira sobre o zeloso, activo e intelligente Dr. Director do Serviço Sanitario, e o devotamento, pratica e economia da respeitavel Irmã Superiora. Ao pessoal da administração tambem cabe quinhão consideravel no serviço da escripta de entrada e saída de enfermos e outros encargos de não pequena importancia. Na parte material o hospital nada ou pouco deixa a desejar, tão consideravel foi a reforma com que o beneficiou n’estes ultimos seis annos a inexcedivel dedicação e comprovada competencia do nosso presado Irmão Dr. José Carlos Rodrigues, seu ex-mordomo com tanto pesar de todos nós e particular saudade minha. Á sua iniciativa exclusiva cabem todos os melhoramentos realisados, que elevaram esta obra de caridade até o ponto de não receiar confronto com qualquer outra do mundo civilisado, transformando-a completamente com proveito para os enfermos, gloria para a Santa Casa e honra para a nossa nação. N’este anno foram installados o gabinete da analyses e pesquizas na enfermaria n.º 10, sob a direcção do Dr. Azevedo Sodré; o pavilhão para as prelecções de clinica-medica e a sala de autopsias. Nas enfermarias de mulheres tambem foram installados quatro banheiros de agua fria e quente, bem como privadas em compartimento adequado, e igualmente installadas outras nas enfermarias n.ᵒˢ 20, 21 e 24 da Maternidade da Faculdade, sendo aproveitado para o serviço de cópa o espaço que ficou. A passagem para o hospital velho e assim a do Necroterio, entre a 3.ª e 4.ª alas do hospital, foi toda cimentada, o que facilita o asseio e hygiene. * * * * * _Finanças_—Nossa situação financeira se não é tão farta para augmentar como desejamos os soccorros que actualmente distribuimos, é sufficiente para mantel-os como estão constituidos e permittir a creação de mais alguns, o que é motivo para darmos graças a Deus. Os haveres em titulos foram accrescidos de sete apolices da divida publica, valor de 1:000$ réis, e 10 de 100$ réis, juros de 4 por cento, do Estado do Rio de Janeiro, legadas por diversos, como consta da relação annexa, e estão representadas por 1:511 apolices, uniformisadas, algumas com determinada applicação da renda, de varios valores, sommando 1:506:000$ réis; possuimos mais as do emprestimo municipal, valor de 200$ réis, juros de 6 por cento, papel, 803; e de £20, ouro, juros de 5 por cento, 2:689, que, tomado para base o cambio de 15, figuram pelo valor de 1:023:080$ réis; e 42 apolices do Estado do Rio, no valor nominal de 17:000$000 réis. Tambem temos 1:870 acções da Companhia Luz Stearica no valor de 200$ réis, ou sejam 374:000$ réis, 18 de 100 dollars da The Light and Power, e 22 do Banco Rural e Hypothecario, e mais 22 com 10 por cento do capital realisado. É evidente que a renda d’esta parte patrimonial fracamente concorre para attender á despeza. A fonte principal dos nossos recursos vem da renda predial e d’ahi merecer todo o cuidado a gestão d’essa parte do patrimonio. Por motivo de força maior não puderam tomar conta dos quinhões, em que foram divididos os predios, segundo a disposição compromissal que se devia executar, dois dos mordomos eleitos, pelo que ficaram provisoriamente com o primeiro e terceiro aquellas secções, e ao seu zelo, digno de todo o louvor, se deve não ter tido consequencias desastrosas para a renda a crise que está atravessando, ha cêrca de quatro annos, o patrimonio predial, em sua maior parte velho, e sujeito, sem injustiça maior, a successivas condemnações e a diarias notificações para serem realisados reparos consideraveis. Pela divisão feita, com a collaboração competente do 1.º mordomo, couberam a este 99 predios; 57 ao 2.º; 50 ao 3.º; 39 ao 4.º; mais tarde accrescido com 12 do patrimonio Souza Souto, então por concluir, e 67 ao 5.º A cada um abri o credito de 5:000$ réis para attenderem desde logo aos pequenos concertos, como permitte o Compromisso. Estes concertos absorveram 54:016$220 réis da respectiva verba orçamentaria. A Mesa e Junta, previdente e acertadamente, deliberou que os saldos orçamentarios e o producto das vendas de predios fossem applicados a construcções e a reconstrucções dando auctorisação para levantar 160:000$ réis por emprestimo ao saldo existente no cofre dos dotes; e é com taes recursos que temos attendido á restauração do antigo patrimonio, correndo por conta separada a construcção dos predios do patrimonio Souza Souto. Para o anno findo veio o saldo de 693:539$210 réis, elevado de 60:000$ réis, por me ter utilizado da referida auctorisação na parte sobre que ainda podia sacar: de réis 54:000$ em virtude do credito especial que fui auctorisado a abrir para construcção dos predios na rua Maranguape e Avenida Mem de Sá, e de 120:000$ réis, producto da venda do predio n.º 24 da rua dos Arcos, o que tudo representa a respeitavel somma de 927:539$210 réis. D’ella despendemos 780:404$610, e com a sobra, réis 147:134$600, mais o saldo orçamentario que o balanço apurar, é que terei de liquidar os pagamentos oriundos dos contractos do anno que findou e importam em 152:172$ réis e de enfrentar novas reconstrucções, cabendo-me recorrer á Mesa e Junta conforme o apuro em que me veja. Desde já, porém, me ennuncio no sentido de que mesmo á custa de sacrificios devemos continuar a reconstruir, dando preferencia aos predios que se acham na zona commercial. Foram-nos entregues no correr do anno os 22 predios da rua do Tunnel Novo, construidos em terrenos do Asylo Santa Maria, para inicio do Patrimonio Souza Souto, achando-se alugados quasi todos, e os 32 reconstruidos na quadra legada pelo bemfeitor Capitão-Mór José da Motta Pereira, em maioria já alugados, tendo-se dado baixa na fiança de 50:000$ réis em apolices a favor dos constructores Lavagnino & Betim. Tambem recebemos 57 predios reconstruidos, conforme se vê do respectivo annexo, do qual constam as importancias gastas e a renda de cada um. Dos predios ainda em obras, devemos receber dentro de 15 dias os da rua Maranguape n.º 57, Avenida Mem de Sá n.º 26, rua Marechal Floriano n.º 124 e rua da Conceição n.º 91, outros devem entrar dentro de dous mezes, e no de quatro os que restarem. Foram addicionados ao patrimonio 18 predios legados pelo bemfeitor Antonio Augusto Teixeira, alguns dos quaes necessitam reparos; sua renda, porém, dá para attendel-os e para pagamento das pensões. A synthese da nossa situação predial é a seguinte: Possuimos 350 predios—2/3 3/4 _Não teem achado inquilinos._ 24 » Em obras ou condemnados. 32 » Os alugueis recebidos no ultimo mez importaram em 85:326$846 réis. Nos seis annos que acabam de correr quasi duplicámos o patrimonio, constituido em titulos: restaurámos e melhorámos consideravel parte do predial, elevando de modo apreciavel a sua renda: está intacta no Banco do Brasil a quantia de 350:000$ réis, recebida do Governo para auxiliar a construcção do Hospital de Tuberculosos; temos mais 147:000$ réis para fundo de reconstrucções, e presumo que o balanço nos demonstre saldo superior a réis 200:000$, que irá reforçal-o. Os orçamentos para o anno que se inicia apresentam uma previsão lisonjeira; pois, álem de pequeno saldo, consignam verbas consideraveis, que não são de natureza permanente, taes como a de 166:000$ réis para a liquidação da divida com a Casa dos Expostos e 120:000$ réis para o Hospital dos Tuberculosos. Merecem ser trazidos ao vosso conhecimento alguns factos que, comquanto de natureza differente dos que venho de tratar, não podem deixar de interessar, tão de perto se ligam á marcha da instituição. A creação de mais uma Mordomia na nossa administração assignalará nos fastos da Misericordia o anno findo como um dos mais fecundos, pois foi n’elle que se ultimou o Dispensario para as crianças, dependencia de seu futuro hospital, cargo para que foi proposto e acceite o presado Irmão Dr. José Carlos Rodrigues, doador do valioso edificio, de custo superior a 300:000$ réis e cuja inauguração apenas depende da installação dos apparelhos recemvindos da Europa. Mais uma vez exprimo o reconhecimento da Instituição, não só pelo generoso donativo, como pelo proveitoso encaminhamento que ahi vae ser dado, por sua forte acção e sua carinhosa predilecção pela infancia necessitada, a uma boa distribuição de soccorros. Rigorosa interpretação das leis fiscaes, tendo negado dispensa de impostos para o material importado da Europa com destino ao edificio dado por um particular em proveito das crianças pobres, nos levou a requerer ao Poder Legislativo a concessão do favor, que aliás sempre nos fôra concedido não só para o caso vertente, como para identicos, pois temos pendentes as construcções dos edificios para a Casa dos Expostos, Hospital dos Tuberculosos e outros. Tratando da concessão de favores, não posso esquecer que o Conselho Municipal, em dezembro do anno passado, resolveu dispensar-nos do pagamento do imposto predial pelos predios que tivessemos adquirido até o anno de 1905, com perda da subvenção correspondente. Sem invejar os que na mesma occasião foram favorecidos com mais largueza, pois lhe deram isenção, até a data da lei, não deixarei de lastimar que esta Instituição menos merecesse, quando, entretanto, nenhuma como ella soccorre, por multiplas fórmas, aos desfavorecidos de todas as classes, idades, estados, sexos, nacionalidades e religiões, ha mais de tres seculos. Outro favor de que já gosavamos, foi-nos retirado, depois novamente concedido, e por ultimo mais uma vez negado: é o da dispensa de emolumentos e mais despezas decorrentes das licenças para a construcção, concertos e reparações dos hospitaes e asylos. Na proxima sessão ordinaria do Conselho terei de promover a renovação do antigo favor. Nem outra attitude posso ter, desde que me cabe a inestimavel honra de representar aquelles que se interessam por tantos infelizes e desprotegidos. Aguardando final deliberação do Ex,ᵐᵒ Sr. General Prefeito está o plano de extincção da valla commum, medida que que ha muito constitue uma aspiração da Santa Casa e para cuja realisação deseja ella contribuir, mesmo com sacrificio. N’esses e em outros assumptos relativos a direitos do Hospital, de muita valia me teem sido os conselhos do nosso advogado. Os estabelecimentos enviaram seus relatorios, mappas e inventarios dos bens existentes em cada um d’elles. Adiantar-me mais n’este capitulo destinado ao Hospital, quando prometti concisão em começo, e não pouco resta a referir, seria desmerecer da confiança dos presados irmãos, abusando da sua paciencia; e isso me justifica de, sem estar esgotada a materia, passar a tratar de cada um dos outros estabelecimentos. * * * * * _Hospital de Nossa Senhora das Dôres_ (para tuberculosos)—Sito em Cascadura, foi o primeiro hospital destinado a tuberculosos n’esta cidade, e vae ser reconstruido para o mesmo fim, de accôrdo com as regras mais geralmente adoptadas em edificios congeneres: para o que ouvi o conselho do Dr. Oswaldo Cruz, benemerito Director da Saúde Publica, e conto com a efficaz cooperação do presado irmão Dr. Lauro Muller. Enquanto se apuram as condições que definitivamente devem ser adoptadas no corpo principal, o que espero vêr resolvido em curto prazo, e tendo-se de fazer a total demolição do velho edificio, julguei prudente não consentir em novas admissões e transferencias de enfermas, salvo casos muito especiaes, afim de diminuir os embaraços que terão de ser encontrados para collocar alhures as hospitalisadas quando começarem as obras. * * * * * _Hospital de Crianças_—Da benemerencia do presado irmão Dr. José Carlos Rodrigues houvemos o terreno ás ruas Miguel de Frias e S. Christovão, onde já está construida, a secção do Dispensario, importando a doação em mais de 300:000$000. Brevemente terá logar a inauguração d’esse serviço de grande valia para a infancia, do bairro de S. Christovão. O custeio do novo estabelecimento, na parte já levada a effeito, será por conta da verba orçamentaria que a Mesa e Junta votaram este anno e o auxilio da renda dos predios doados á Santa Casa pelo bemfeitor Alberto Barth, com destino a esse Instituto, na importancia annual de 9:600$000 réis. A despeza ordinaria só será realmente conhecida e classificada depois do irmão Mordomo, que é o proprio doador, apresentar-me o plano de organisação dos serviços, tabella dos vencimentos do pessoal, e o mais que fôr necessario. * * * * * _Hospicio de Nossa Senhora da Saúde_—Existente no bairro da Gambôa ha mais de 40 annos, são extraordinarios os serviços que desde então presta ás classes desfavorecidas d’essa circumscripção. Dispõe de 340 leitos, inclusivé 16 dos quartos particulares, aos quaes foram recolhidos no anno findo 3:157 doentes. Saíram restabelecidos 2:709 e falleceram 486, em cujo numero estão 231 victimas da tuberculose, sob variadas fórmas, tratadas em enfermarias separadas das demais. Em seu consultorio foram medicados 25:562 enfermos e preparadas 31:300 fórmulas. O fornecimento de generos importou em 69:792$760 réis, sendo o abastecimento feito nas mesmas condições do Hospital. Entre os enfermos tratados gratuitamente estão quatro meninos procedentes da Escola Correccional e 33 da Casa de S. José, aquella mantida pela Policia e esta pela Prefeitura Municipal; todos elles se restabeleceram. Foi fartamente abastecido de lençóes, roupas, utensilios, etc. A lavagem da roupa passou a ser feita por tres machinas com motor a gaz, abollindo-se o serviço manual até então executado pelas asyladas. Com este importante melhoramento, a construcção de um pequeno pavilhão para uso particular das irmãs, reparos no serviço de distribuição de agua e concertos nas dependencias se dispendeu 15:781$200 réis. Por deliberação da Mesa e Junta, de 18 de Junho findo, foi reformado o antigo regulamento e consideravelmente melhorado o serviço clinico pela elevação do numero de medicos que de 6 passou a 11, creação de um logar de cirurgião, permanencia de um medico durante toda a noite, instituição de aulas praticas para os enfermeiros, augmento d’estes e dos serventes. O serviço da noite será inaugurado logo que se conclúa a construcção do pequeno commodo destinado ao medico, o que terá logar em breve, attento o zelo com que d’isso está tratando o solicito irmão Mordomo. * * * * * Taes melhoramentos crearam um encargo ordinario annual de 17:210$, do maior proveito, porém, para os enfermos sempre merecedores de nossos desvelos. O serviço clinico é dirigido por profissional que ha mais de 43 annos trabalha n’esta Santa Casa, o que importa dizer que nada deixou a desejar, e na mesma fórma se executou o da pharmacia sob as vistas do pharmaceutico, auxiliado pela Superiora e por tres Irmãs. A parte economica e a do tratamento de enfermos, em seu maior numero portadores dos mais dolorosos e repugnantes males, está confiada a 16 filhas de S. Vicente, a cuja frente se acha uma das mais dedicadas Superioras. O edificio ainda carece de modificações, sobretudo na parte central, que devem ser realisadas logo que o permittam nossas circumstancias, e de uma sala de operações afim de que sob todos os pontos de vista tenhamos n’este o segundo hospital d’esta cidade. O Capellão, que tem residencia effectiva, o Administrador e seus dous auxiliares cumpriram seus deveres. * * * * * _Hospicio de Nossa Senhora do Soccorro_—Recentemente reconstruido apenas necessita o edificio de conservação, com o que no exercicio se despendeu 2:283$420 réis, e de melhor installação para a lavanderia, o que espero realisar este anno. Sua lotação é de 100 leitos, 20 dos quaes para mulheres. Os infelizes tuberculosos teem enfermarias proprias. A despeza com a manutenção em pouco excedeu a orçada, correndo o augmento por conta de ter havido maior frequencia de enfermos, e alguma elevação nos preços dos generos de consumo, affastado como se acha do centro commercial. A respeitavel Irmã Superiora pediu-me reforço de fazenda para lençóes, roupas para os enfermos, aventaes, fronhas, que deverá chegar no anno que começa e importa em cêrca de 6:000$ réis, como consta da respectiva verba no orçamento. As Irmãs de S. Vicente de Paulo, que teem a seu cargo o serviço hospitalar e o do preparo das fórmulas para os doentes internos e os do consultorio, são em numero de 7, bem pouco para o muito que ha a fazer. O serviço religioso tem um capellão domiciliado fóra do Hospicio. Só ha um funccionario administrativo—o Administrador—merecedor de apreço por seu constante zêlo. O Irmão Mordomo foi o reconstructor desvelado do pequeno hospital, dotando-o com condições especiaes de hygiene, recursos para pequena cirurgia e tratamento hydrotherapico: d’ahi a continuação do verdadeiro carinho com que o conserva. Não são insignificantes os soccorros prestados no anno findo. Foram tratados nas enfermarias 1:042 pobres, sendo 895 do sexo masculino e 147 do feminino. As altas foram 852, os obitos 106, dos quaes 51 por tuberculose, passando para o novo anno 84 enfermos. Entre os tratados gratuitamente estão tres enviados do Asylo de Menores Abandonados. O consultorio funccionou em 279 dias uteis: n’elle fôram feitas 27 dilatações de pequenos abcessos e attendidos 14:065 consultantes, sendo preparadas 21:597 receitas. Seu movimento foi superior ao do anno precedente, em 2:659 consultantes e 5:408 fórmulas executadas na pharmacia pelas boas Irmãs incumbidas d’essa ardua tarefa, e mais das receitas para os doentes internados. Tal foi o auxilio que no anno findo se prestou aos necessitados do Cajú e S. Christovão. * * * * * _Hospicio de S. João Baptista_—Collocado na freguezia da Lagôa, bairro do Botafogo, póde á primeira vista parecer que os serviços prestados por este Hospicio serão muito inferiores ao de Nossa Senhora do Soccorro, sito n’uma zona populosa e de modestos recursos como S. Christovão. Entretanto, assim não succede; equilibram-se. Os doentes recebidos chegaram a 989, todos do sexo masculino, sendo nacionaes 540 e estrangeiros 449, passando para este anno 802. As altas foram em numero de 774 e os obitos no de 133, comprehendidos 53 casos de tuberculose. Os que soffrem d’este terrivel mal têm enfermaria separada. O consultorio attendeu a 15:709 necessitados, aviando-se, sob as vistas do pharmaceutico formado e execução das irmãs, 18:216 receitas. Á dedicação de uma respeitavel Superiora e de mais seis irmãs de S. Vicente de Paulo está confiada a guarda e tratamento dos enfermos e a direcção de toda a economia interna. O edificio é de um só pavimento, assobradado, de apparencia modesta, na rua da Passagem, com lotação de cem leitos, e em muito razoavel estado de conservação. Ha quatro annos passou por importante reforma, na qual se despendeu perto de 30:000$ réis, melhorando-se-lhe sensivelmente as condições hygienicas. Uma conservação attenta será sufficiente para, durante bastantes annos, com reduzida despeza, manter-se a actual situação. O presado irmão mordomo, que acaba de ser escolhido para mais trabalhoso cargo, assim sempre o entendeu e bastante me auxiliou, mandando fazer convenientes reparos que apenas importaram em 1:149$390 réis, e determinando outros que terão de ser pagos este anno com pouco mais de 600$ réis. A necessidade de impermeabilizar o sólo de todo o porão, não podia ser addiada; promovi a execução d’este melhoramento, que importou em 7:714$560. A despeza ordinaria esteve dentro das verbas destinadas no orçamento para o seu serviço. A cargo d’este estabelecimento estão 431 abandonados, sendo 241 em criação interna e 190 na externa, entregues, a criadeiras em maioria residentes no municipio de Maricá, Estado do Rio de Janeiro, mediante a retribuição mensal de 20$ réis até 18 mezes e de 15$ réis d’essa idade até 7 annos, quanto aos meninos e até 8 annos quanto ás meninas. O movimento foi de 179 entradas na casa central, sendo 44 enviados pelo hospital, por não comportar o grave estado das mães a prestação de cuidados aos filhos e d’elles não haver quem se encarregue, succedendo que quando ellas fallecem ficam as crianças definitivamente na casa; 112 entrados pela roda e 17 enviados por auctoridades policiaes, sendo 5 do sexo masculino e 12 do sexo feminino. Foram desligados 59 por terem attingido a maioridade e collocados em casas de familia; 9 restituidos aos paes que os reclamaram; do Hospital Geral deram entrada para serem entregues ás mães restabelecidas, 44. Para o Collegio Salesiano foram remettidos 15 meninos de 10 a 13 annos, afim de fazerem sua educação profissional, conforme o contracto que temos com esse collegio: para a criação externa foram dados 74, sendo 44 meninos e 30 meninas. Falleceram em criação interna e externa, nos primeiros oito dias de entrada, 6, e em subsequentes, 15. Por trabalho estatistico recentemente elaborado se verificou que nos ultimos 20 annos entraram 2:750 expostos, dos quaes 258 succumbiram nos primeiros oito dias e 824 nos seguintes, ou 1:082, correspondente á percentagem de 40,49, extremamente agradavel comparada com a que se encontra em identicos estabelecimentos na Europa; e muito melhorada com a que se obteve este anno, que é de 15%. A criação e educação interna nada deixam a desejar e a externa é toleravel. Afim de reunir sob nossas vistas e zelosamente cuidar de todos esses desprotegidos é que foi suggerida, pela dedicada administração a cujo serviço se acha o inexcedivel zelo do presado irmão Escrivão dos Expostos, e acceita pela Mesa e Junta, a ideia de ser de vastas proporções o edificio onde se tem de ficar definitivamente, na rua Marquez de Abrantes; em consequencia da desapropriação dos predios de residencia dos expostos na rua Evaristo da Veiga, que nos obrigou a tomar de aluguel os da rua Senador Vergueiro e praia do Flamengo, onde mal se accomodam. Fastidioso seria relatar as occorrencias que só agora consentem se poder organisar as bases do contracto com o constructor Rebecchi, para a edificação do grandioso edificio, pelo preço de 410:000$, álem do material que a casa fornecerá e está orçado em 130:000$ réis, se se obtiver dispensa do pagamento de impostos sobre o que fôr importado do estrangeiro. A construcção ficará prompta em metade, permittindo desde logo a mudança de parte dos expostos, o que será um grande beneficio, ao cabo de seis mezes, contados da data da licença da Prefeitura, e de todo concluida ao fim de 10 mezes. Teremos, pois, nunca menos de 12 mezes para apurar os recursos com que devemos acudir a tão consideravel despeza. No cofre existiam, em 30 de Junho, 214:870$406, em conta a prazo e de movimento; a receber desde já do Hospital pelas quotas dos bemfeitores, 25:848$000: do mesmo, no correr do anno, por liquidação do seu debito, 166:600$000: saldo muito provavel entre a receita e a despeza, no fim do corrente anno, 40:000$000. Necessita preencher-se um claro de 100:000$000, e para isso poder-se-ha recorrer aos cofres dos outros estabelecimentos, por emprestimo, conforme os recursos de cada um permittir, e segundo a Mesa e Junta no momento julgar melhor. Deus nos ha de ajudar na realização de tão elevado commettimento em favor de seres que só têm a Misericordia para amparal-os. O patrimonio dos Expostos é dos que se acham em melhores condições. Tem 563 titulos da divida publica, no valor de réis 562:200$000: 29 apolices de 200$000 (papel) da divida municipal, ou 5:800$000; 1:322 de 20 libras, da mesma divida que, ao cambio de 15, representam 423:040$000 réis. Seus predios são em numero de 33, quasi todos em excellente estado; bem localizados e vantajosamente alugados. No anno findo ainda se gastou em concertos e reparos a quantia de 81:694$440, não incluida a despeza da construcção dos alicerces do edificio da rua Marquez de Abrantes, n.º 20 (paredões e córte do morro). N’aquelle numero não está comprehendido o da travessa do Ouvidor n.º 27, que, sujeito a obras consideraveis, a Mesa e Junta julgou preferivel ser vendido por 50:000$000, como tambem pensava a Administração dos Expostos. Se é motivo de grande satisfação verificarmos a existencia de tão solido e valioso patrimonio, muito maior contentamento nos vem de termos apurado que do anno compromissal de 1829-1830 ao de 1906-1907 se despendeu 10.391:000$000. É exactamente por assim satisfazermos os intuitos dos fundadores e bemfeitores da Casa, que Deus nos recompensa dando-nos a prosperidade. A despeza com cada um exposto interno fica em réis 400$000 por anno, a do externo até 18 mezes, por 240$000, e d’essa idade em diante por 180$000. Pagamos quatro dotes de 600$000 a expostas que se casaram, já desligadas pela maioridade, depois do inquerito que sempre se faz para conhecer as condições do pretendente e habilitar o Provedor a consentir no enlace, e a proposito devo dizer que alterei a pratica de dar menores em casamento aos que vinham pedil-as á Casa, sem de vista conhecel-as. Ninguem cria filhas para dal-as ao primeiro que as quer, e as expostas são nossas filhas. Demais, sempre considerei o matrimonio materia de tanta relevancia, deliberação tão cheia de responsabilidades, que não me julgo com forças para ser n’ellas solidario, intervindo como elemento preponderante, e muito menos decisivo, mesmo no proprio lar. Um clinico retribuido e um adjunto gratuito cuidam da saúde dos internos, e por occasião de se pagar ás criadeiras são apresentados os externos e recolhidos os encontrados em más condições. * * * * * _Recolhimento das Orfãs e das Desvalidas de Santa Thereza_—O numero de orfãs é de 170, saíram 9, falleceram 3 e entraram 10. As desvalidas são 20, existiam 10, saíram 2 e entraram 6. É superior a educação dada a essas meninas; nada fica devendo á dos mais reputados collegios da Capital. Entretanto é de 400$000 em média a despeza annual com cada uma das 190 educandas. O patrimonio das orfãs é constituido por 468 apolices da divida publica de diversos valores, representando réis 461:600$000 e de 322 municipaes de libras 20 que, ao cambio de 15, correspondem a 103:040$000: por 11 predios cuja renda está orçada em 61:200$000, alguns construidos de novo, outros reconstruidos, com cujo serviço se gastou 71:059$525 este anno, e apenas necessitando um, em Nictheroy, de reconstrucção inteira e outro n’esta Capital, de serios reparos. Tambem existe em cofre a quantia de 400:000$, que será applicada ás necessidades do patrimonio predial, conforme deliberação da Mesa e Junta, determinando que para tal fim fôssem vendidas 50 apolices de 1:000$000, ao portador, resultantes do preço dos predios da rua Visconde de Inhaúma, desapropriados para alargamento da via publica. * * * * * _Cofre dos dotes_—Seu patrimonio é de 671 apolices da divida publica no valor de 661:700$000; de 73 municipaes de libras 20, que ao cambio de 15 representam réis 23:360$000, e de um predio recentemente reconstruido, tendo-se pago ao empreiteiro este anno 7:600$000 pela ultima prestação, do preço de 34:593$440, sito á rua Marechal Floriano n.º 67, cuja renda annual é de 7:200$000. Ao encerrar-se o anno, o balanço d’este cofre apresenta no Banco Commercial, em conta corrente de movimento, o saldo de 17:770$344, e em caixa 4:715$485. * * * * * _Asylo da Misericordia_—Na ordem de importancia dos patrimonios e do numero de amparadas vem este asylo. Seu regulamento foi reformado na sessão de Mesa e Junta, de 18 de Junho proximo passado, dando mais amplitude ás condições da admissão, elevando desde já com tres logares o numero de 162, que era o maximo, e estabelecendo um nivel de ensino mais proveitoso. O movimento annual consistiu na transferencia de seis meninas para o Asylo de S. Cornelio, na retirada de 12 e no fallecimento de uma, tendo sido desde logo preenchidas todas as vagas, e ficando á espera de opportunidade mais de 50 pretendentes. As asyladas prestam ao Hospital Geral o importante adjutorio de cortar e costurar uma grande parte da roupa de uso dos enfermos, assim compensando a quota annual com que elle contribue para cobrir o _deficit_, pois a renda do patrimonio é insufficiente para attender á despeza. Este auxilio importou em 36:025$750, no anno concluido E não é possivel haver mais economia desde que a despeza de cada asylada importou, nos doze mezes, em 253$000 algarismo redondo, a mais reduzida dos nossos estabelecimentos, e certamente sem competencia nas de outras instituições, desde que sejam mantidos nas condições em que temos o nosso. Nada falta a uma boa alimentação, o vestuario é modesto, mas sufficiente, as condições de hygiene excellentes, a instrucção, que já era regular, vae ser mais completa, e os trabalhos de costura, bordados e de confecções de flôres artificiaes não ficam muito áquem dos outros estabelecimentos. O predio onde se acha installado, á rua de S. Clemente, acha-se em magnifica situação, perfeitamente conservado, e satisfazendo ás actuaes necessidades; apenas preciza que seja completado o lavatorio da secção das menores, o que se fará no anno corrente. Álem d’este possúe mais o Asylo o de n.º 168, na mesma rua, alugado por 220$, e 236 apolices da divida publica, de varios valores, no total de 232:300$000. Foi orçada a receita para este anno em 50:804$750, incluida a quota do Hospital, na importancia de 36:025$750 e a despeza em 50:804$750. Recebeu um donativo de 490$ applicado á compra de uma apolice federal de 500$, entrando o Hospital com o excedente; pelo cofre respectivo foi satisfeito o dote de 300$ a uma asylada, já maior, que contrahiu casamento, com licença. O mordomo, que de ha annos presta reaes serviços ao asylo, frequentando-o assiduamente e angariando donativos em dinheiro e objectos proveitosos, a activa superiora e suas oito companheiras, dignas filhas de S. Vicente de Paulo, merecem nosso reconhecimento. O capellão, o medico e a dentista cumpriram suas obrigações com interesse. * * * * * _Asylo de S. Cornelio_—O numero de suas asyladas é de 34 e ao findar o anno existiam 33. No periodo compromissal foi removida uma para o Asylo de Santa Maria e retiraram-se 7; estas vagas e as provindas do anno anterior foram preenchidas com 7 meninas transferidas do Asylo da Misericordia, 1 do Asylo Provisorio do Hospital Geral e 1 de procedencia externa. Não houve fallecimento. Casaram-se 3 ex-asyladas, devidamente licenciadas, recebendo cada uma o dote de 300$000. A administração interna está entregue a quatro irmãs de caridade de S. Vicente de Paulo, uma das quaes é a superiora, todas bem cuidando do desempenho de seu voluntario encargo. O prezado irmão mordomo, álem do zêlo que emprega no desempenho de suas funcções, ha annos presta com ininterrupta dedicação, e gratuitamente, os seus serviços de distincto clinico, o que basta dizer para que se possa avaliar da extensão da nossa divida. * * * * * _Asylo Provisorio do Hospital Geral_—Talvez pareça extranho que se mantenham asylos nos hospitaes, mas a lei da necessidade a isso nos obriga. O que se ha de fazer das crianças cujas mães succumbem nas enfermarias, não tendo ninguem que se encarregue dos infelizes orfãos, e das que são abandonadas propositalmente na Sala do Banco? Guardamol-as. Se são de tenra idade ficam na Casa dos Expostos; de 4 annos em diante permanecem no hospital em commodos especiaes, recebendo instrucção primaria, até attingirem idade que permitta ás meninas irem para algum dos asylos e aos meninos para o Collegio Salesiano, em Santa Rosa, mediante retribuição, afim de se prepararem em artes mechanicas. A manutenção, vestuario e quanto é preciso nos asylados correm por conta da despeza geral do hospital, inclusive os enxovaes dos que são entregues aos Salesianos. Existe matricula com todos os esclarecimentos que se póde obter, afim de em qualquer tempo ser reconhecida sua identidade. No anno findo existiam, em seu começo, 35 meninos, no seu decurso entraram 3 e foram enviados 5 para o Collegio Salesiano; não houve obito, restando-nos assim 33. Com relação ás meninas o movimento foi este no mesmo periodo: existiam 25, entraram 4, foi enviada uma para o Asylo de S. Cornelio, nem uma falleceu, e actualmente existem 28. Temos ao todo 61. Quando contrahem casamento, mesmo desligadas por terem feito 21 annos, recebem 300$ de dote, tanto mais que são ellas dos 8 aos 12 annos, as que fazem o serviço do sorteio dos numeros nas loterias, fonte do peculio d’onde sahem os dotes. Assignalarei a circumstancia de, apezar da tenra idade, das más condições em que se acham quando nos são legados, e de viverem n’um hospital, não haver fallecido nem um d’esses seres frageis, o que mostra o interesse e carinho que merecem das irmãs de caridade, a cujo cargo estão. * * * * * _Asylo Provisorio do Hospicio da Saúde_—No periodo compromissal de que estou dando contas começámos com 36 asyladas, entraram tres, falleceram duas, saíram cinco e restam-nos 32. * * * * * _Peculio das Asyladas_—Sob esta rubrica figurava no orçamento a importancia de 52:825$122, destinada ao pagamento de dotes de 300$, a todas as orfãs e asyladas dos estabelecimentos da Santa Casa, que não dispõem de cofre privativo, como o Recolhimento das Orfãs, ou de recursos proprios como a Casa dos Expostos. Para a sua constituição concorreram e ainda concorrem, álem de outros donativos que lhe foram applicados, os que recebem as asyladas do Hospital Geral pelo serviço que prestam, ha bastantes annos, em tirarem as espheras dos numeros e premios nos sorteios lotericos. Durante o anno compromissal, de que estou dando contas, foram pagos cinco dotes, sendo as contempladas uma ex-asylada do Asylo da Misericordia, tres ex-asyladas do Asylo de S. Cornelio e uma ex-asylada do Asylo Provisorio do Hospicio de Nossa Senhora da Saúde. O patrimonio, em 30 de Junho, feita a conta dos respectivos juros, é de 60:770$783. Por conta dos dotes—Prudente de Moraes—nem um se pagou, sendo o saldo, na mesma data, de 10:486$690, com os respectivos juros. Os dotes já distribuidos, por esta conta, são em numero de 18. * * * * * _Cemiterio de S. Francisco Xavier_—Essa vasta necropole, em cujo centro se acha o Campo Santo da nossa Irmandade, está sendo, e ainda por muitos annos será, em consequencia de suas vastas proporções, e dos colossaes melhoramentos que lhe são indispensaveis, o longo e largo canal por onde se escoará consideravel parte da renda da Empreza Funeraria. Basta assignalar que ha cêrca de seis annos, sem interrupção, se faz o aterro do mangue que ainda existe n’uma de suas faces, n’isto se despendendo até agora um pouco mais de 500:000$000. Mui poucas de suas longas e extensas ruas estão calçadas, e ha grande numero de quadros de carneiros que precisam de ter cimentados os corredores que lhes dão accesso. Sua arborização é deficiente, apezar de iniciada ha dous annos. Longo seria indicar quanto se deve fazer; limitar-me-hei a affirmar que, dentro dos recursos orçamentarios, se trabalha continuamente, attendendo ao que é inadiavel, e a informar o que se executou no anno passado. Serviço da maior importancia foi iniciado ha cêrca de tres mezes, espero vêl-o concluido dentro de dous ou tres annos; é a revisão da numeração das sepulturas rasas, em numero superior a 40:000, não incluidas as sepulturas communs. Esse trabalho está sendo feito com o maximo cuidado, examinados os assentamentos um a um, substituídas as condemnadas chapas de ferro por marcos de cimento, e depois de só assim preparado e rectificado o quadro, far-se-ha n’elle novo enterramento. Ao presado Irmão Mordomo cabe boa somma do que se tem levado a cabo, e do pessoal da administração apenas cinco empregados, em particular de seu chefe, que é um d’elles, me tem vindo valioso auxilio para a boa execução das reformas em andamento. Os enterramentos no anno de que trato, foram de 519 em carneiros, 7:282 em sepulturas rasas e 3:923 em sepulturas communs, ou um total de 11:726. _Cemiterio de S. João Baptista_—De menores proporções, sempre merecendo cuidados, é este cemiterio hoje um dos bons attestados do zêlo da Santa Casa e póde competir com os que em melhor conta sejam tidos. Muito pouco ha a fazer n’elle, álem da conservação do que se tem executado, e um ou outro melhoramento. Ainda este anno findo foi dotado de um forno para incineração de lixo, cuja construcção importou em 7:500$. macadamisaram-se e alcatroaram-se algumas das suas ruas; a substituição das chapas de ferro e a numeração das sepulturas rasas foi terminada; e apenas restam dous ou tres quadros de carneiros ou jazigos para terem as ruas internas cimentadas. A arborisação está terminada. Póde começar a descançar o presado Irmão Mordomo, que ha cerca de cinco annos se esforça para conseguir o bello resultado que todos applaudem. Tres são os empregados da administração, que bem cumprem seus deveres, salientando-se um a que faz justa referencia o zeloso Mordomo. Foram inhumados 3:299 cadaveres, dos quaes 492 em carneiros, 2:468 em sepulturas rasas de contribuição, e 339 em gratuitas, facultadas aos indigentes; pois n’esse cemiterio ha muito que foi exctincta a sepultura commum. Dos nichos perpetuos do collumbario, exclusivamente feitos para os que não têm recursos que permittam a acquisição de jazigos perpetuos, foram vendidos 64. Espero em breve vêr concluida a planta cadastral iniciada no anno findo. * * * * * _Recapitulação_—Não fôsse a conveniencia, direi melhor, a proveitosa obrigação de, em obediencia ao Compromisso, explanar o modo porque a administração da Santa Casa se houve durante um anno no desempenho de seus delicados deveres, afim de que a Mesa, todos os presados Irmãos, os Poderes Publicos, a população d’esta Capital, possam julgar de sua gestão e continuar a dar-lhe o amparo e confiança tão necessarios á acção que se vae desenvolver no anno corrente, e bastaria apresentar de um lado a commemoração dos serviços prestados pela Instituição no alludido periodo, de outro, os recursos disponiveis para acudir no novo anno ás grandes necessidades que como sempre se hão-de apresentar para serem remediadas. Em poucas linhas seria dito bastante para patentear a grandeza da obra da Misericordia. N’uma synthese rapida, mas eloquentemente expressiva, mostrar-se-hia, quanto aos soccorros, que em um anno foram recolhidos aos hospitaes 19:440 enfermos, attendidos nos consultorios 236:511, preparadas 258:686 fórmulas, dispensados nos gabinetes de especialidades 27:828 soccorros, agasalhadas nos diversos estabelecimentos cêrca de mil orfãs, expostos e asyladas, distribuidos a viuvas, 20:272$, e inhumados caridosamente 4:264 indigentes. Com relação aos recursos com que se vae encetar o anno, sujeitos ao balanço addicional e a destinos especiaes, encontramos no cofre do Hospital Geral, 701:293$600, no da Casa dos Expostos, 214:870$406, no do Recolhimento das Orfãs, 43:620$782, no das Desvalidas de Santa Thereza, 22:594$520, no dos Dotes, 23:070$520, no da Empreza Funeraria, 112:105$128. E o meu relatorio estaria feito. Apenas accrescentar-lhe-hia, com tristeza, que quanto temos para applicar em obras de misericordia não basta. No cumprimento de meu dever, como quem mais de perto lida com a pobreza da Capital, e em justificação da attitude apparentemente pouco caritativa que me vejo obrigado a manter, conhecedor da estreiteza relativa dos nossos recursos, confessaremos ao Poder Publico, ás almas piedosas que, não ás vezes, sim quotidianamente, recusamos enfermos por não haver mais logar no chão dos hospitaes onde estender um colchão, não acolhemos dezenas de orfãos solicitando admissão nos asylos por não haver collocação, deixamos sem esmolas a velhas viuvas por estarem esgotadas as verbas. Não será, pois, com o meu silencio que se desculpará a indifferença dos poderosos e, ainda menos, a deliberalidade dos opulentos. Quanto a nós, desempenhemo-nos dos nossos encargos com a inteireza e fidelidade que exige o serviço da Santa Casa, como determina o Compromisso, e teremos na tranquillidade de nossas consciencias elevada recompensa ao trabalho que nos rodear. E d’isso dando exemplo, em falta de mais valioso titulo, venho satisfazer um dever apresentando-vos meu relatorio. DR. MIGUEL JOAQUIM RIBEIRO DE CARVALHO. Este substancioso documento, melhor do que qualquer descripção especial, dá bem a ideia da beneficencia, ou assistencia particular no Rio de Janeiro, assumpto que continuaremos a tratar nos sub-capitulos que vão seguir-se. O relatorio acima transcripto não refere, porém, que a limpeza do Hospital Geral, deixa muito a desejar, sentindo-se em todas as suas dependencias o cheiro forte e caracteristico d’estas casas de caridade, quando a hygiene não é sufficientemente observada. Este immenso edificio, em 2 quadrilateros a 3 pavimentos e 4 torreões a 3 andares, faceia a praia de Santa Luzia e foi construido com o producto de loterias, tendo sido a primeira de 110 contos, concedida por D. João VI. Os pavimentos encerram 28 enfermarias geraes, com nomenclatura de santos. O Necroterio, adjunto ao Hospital, é indigno da instituição. A irmandade da Misericordia, do Rio de Janeiro, data de 1545, e o hospital foi fundado nos primeiros annos do seculo XVII, ignorando-se exactamente a data, occupando varios immoveis, antes da construcção do actual edificio. Como consta do Relatorio acima transcripto, a Santa Casa da Misericordia do Rio de Janeiro, tem as seguintes organisações subsidiarias, ou complementares: —_Asylo da Misericordia_, em S. Clemente, inaugurado em 27 de Julho de 1890, com 162 asylados, no fim de 1907; —_Asylo de Santa Maria_, funccionando desde 29 de Abril de 1877, e que encerra, actualmente, 52 orfãos; —_Asylo das Velhas_, inaugurado em 1 de Maio de 1884, com 43 invalidas; —_Casa dos Expostos_, ao principio, isto é, em 14 de Janeiro de 1738, data da sua fundação, intitulada Roda dos Expostos. Abriga 260 creanças dos dois sexos, além de cêrca de 200 dadas a criar fóra do estabelecimento. Até ao fim de 1900, tinha esta instituição recolhido 43:038 creanças. —_Recolhimento das Orfãs_, fundado em 15 de Outubro de 1739, em Botafogo. Em fins de 1907, tinha 170 internadas, ás quaes é ministrada educação elementar, além da alimentação, até á puberdade. —_Asylo de S. Cornelio_, no Cattete, inaugurado em 1 de Setembro de 1900. 34 asylados. —_Asylo de N. S. da Saúde_, annexo ao hospital da mesma denominação. Foi inaugurado em 1853 e abriga 340 orfãos. —_Asylo Provisorio do Hospital Geral_, especialmente destinado a recolher orfãos deixados sem abrigo por enfermos fallecidos nos hospitaes da Santa Casa. —_Asylo de N. S. das Dôres_, em Cascadura, para asyladas tuberculosas, ou extraordinariamente debeis, mandadas a melhores ares pelos varios estabelecimentos que a Santa Casa mantem na cidade. —_Hospital de S. João Baptista da Lagôa_, em Botafogo, com 100 leitos e 5 enfermarias, para homens. Consultorio externo e distribuição gratuita de remedios. —_Hospital de N. S. do Soccorro_, em S. Christovão, com 50 leitos. —_Hospital de N. S. da Saúde_, na Gambôa, com 300 leitos. Tambem abriga meninas desvalidas, não reclamadas pelos interessados. Consultorio gratuito para a indigencia. —_Instituto Pasteur._ Inaugurado em 1888. Assistencia preventiva de pessôas mordidas por animaes hydrophobos. Não obstante o numero e a variedade de estabelecimentos beneficentes, a Santa Casa resente-se, especialmente no grandioso Hospital Geral, da accumulação de enfermos invalidos, convalescentes e em tratamento de molestias incuraveis, sendo insufficientes as enfermarias existentes e de urgentissima necessidade a creação de novas instituições destinadas a recolher o excesso da população hospitalar. * * * * * _Asylo Gonçalves de Araujo_—Antonio Gonçalves de Araujo, negociante portuguez fallecido no Rio de Janeiro, em 21 de Setembro de 1889, legou mil e quinhentos contos de réis á Irmandade de N. S. da Candelaria, para a fundação e custeio de um asylo destinado a abrigar menores dos dois sexos. O edificio, com tres pavimentos, occupa na praça Marechal Deodoro, uma area de 12:000 metros. No 1.º pavimento estão as salas da Administração, o almoxarifado, a despensa, as officinas, o lavabo e as banheiras; no 2.º andar, a bibliotheca, a residencia do Director e das regentes, as aulas, os refeitorios e a cosinha; no terceiro pavimento, o salão de honra, os dormitorios, as enfermarias e a rouparia. Em fins de 1907 havia 92 asylados, sendo 67 do sexo feminino. A condição de admissão é a extrema pobreza, dos 7 aos 18 annos. Ensina-se costura, bordado, fabríco de flôres, lavagem, engommado, arte culinaria, além do curso primario, completo. * * * * * _Dispensario Azevedo Lima_—Esta altruistica instituição foi, em principio, denominada—_Dispensario da Liga Brasileira contra a Tuberculose_—por ser creado por esta collectividade, mas o Presidente da Republica, dr. Affonso Pena, ao inaugural-o, em 25 de Maio de 1907, escreveu no auto de inauguração—_Dispensario Azevedo Lima_—em homenagem ao seu fundador e Presidente da Liga, o eminente e benemerito facultativo, dr. José Jeronymo de Azevedo Lima. O governo cedeu o terreno, junto da Avenida Central, e a Liga levantou o predio, que custou 120 contos de réis. Fica isolado, por tres das suas faces, dos predios visinhos, e ergue-se entre jardins. O Estado subsidia o Dispensario com a annuidade de 24 contos. Os clinicos são beneficentes e effectivos. No vestibulo ha duas salas de espera; um gabinete de exame, com balança de pesagem e apparelhos para desinfecção; uma sala para exame especial de laringe, com o material competente; um laboratorio bacteriologico e uma dependencia com estufa para encineração de residuos. Primeiro pavimento. Gabinete da Directoria. Sala das sessões, com o busto da Caridade, em bronze, por Teixeira Lopes. Bibliotheca da especialidade. Esta secção continua no 2.º andar, onde tambem ha um terraço com a admiravel perspectiva da Avenida Central e de parte da cidade e da bahia. A Liga resolveu fundar novos sanatorios em varios bairros da capital e no interior do paiz, assim como um sanatorio para creanças tuberculosas, com o nome da rainha D. Amelia, de Portugal. A commissão da colonia portugueza que promovia grandiosos festejos para a recepção de D. Carlos I, resolveu entregar á Liga, para o fim acima exposto, as sommas arrecadadas. Para avaliar-se da necessidade d’esta philantropica instituição, bastará considerar-se que, em 1906, morreram, na cidade do Rio de Janeiro, 2:782 tuberculosos, em um total de 13:957 defuncções. Antes do actual a Liga já possuira um Dispensario na rua Gonçalves Dias, em 1902. Em 1906 a Liga deu 621 consultas, fez 77 visitas domiciliarias, aviou 883 receitas, fez 160 exames microscopicos e 87 laryngoscopicos. Além d’isso distribuiu 131 porções de oleo de figado de bacalhau, 2:150 de carne, 2:150 de leite e 353 escarradores. * * * * * _Hospital da Real Sociedade Portugueza de Beneficencia_—A ideia da fundação, no Rio de janeiro, de uma Sociedade Portugueza de Beneficencia, pertence ao então ministro de Portugal, no Brasil, Joaquim Cesar Figaniére Mourão, que, em 1839, a suggeriu ao consul, dr. José Marcellino da Rocha Cabral. Tomou a iniciativa da fundação a Directoria do Gabinete Portuguez de Leitura, que organisou os estatutos. Quanto ao hospital, foi seu iniciador o socio João Nunes de Andrade, que apresentou a proposta em sessão de 20 de Fevereiro de 1848. Começou-se pela fundação, em 1849, de uma enfermaria denominada de _S. Vicente de Paulo_, para os portuguezes atacados de febre amarella. A compra do terreno para edificação do actual hospital, fez-se em 1851 e importou em 9:280$000 réis, na rua de Santo Amaro e nas dimensões de 26 braças e 4 palmos. Muito concorreu para a fundação d’este estabelecimento, o presidente da Sociedade, Hermenegildo Antonio Pinto. Em 19 de Dezembro de 1853, foi lançada a 1.ª pedra do edificio, e a inauguração realisou-se em 16 de Setembro de 1858. Á entrada ha duplo lance de escadaria de granito, dividido por tres grupos estatuarios, representando a Caridade, depois de transposto o triplice portão de ferro, encimado pelas estatuas de D. Affonso Henriques e de Pedro Alvares Cabral. O vestibulo é decorado pelos bustos, em marmore, de D. Carlos I, e dos condes de Agrolongo, de Mattosinhos, de Avellar e de S. Mamede. Gabinete da administração, com os retratos de D. Pedro V, de D. Estephania e do conde de Santa Marinha. Seguem-se, no mesmo pavimento vestibular, a secretaria, a rouparia, o gabinete das consultas externas, 2 dos curativos e a sala de operações. Na ala fronteira, uma enfermaria cirurgica, 3 mistas de medicina e cirurgia, refeitorios, installação hydrotherapica e cosinha geral. A pharmacia e o laboratorio funccionam em pavilhão separado. Pavilhão de isolamento de molestias contagiosas. Enfermaria de tuberculosos. Necroterio, na cêrca, em pavilhão isolado. Novissimo pavilhão com 2 salas de operações. Quartos particulares para contribuintes. Vestibulo da 2.ª ala geral do edificio, decorado por um grupo, em marmore, representando a Caridade, e pelos bustos de D. Pedro V, do conde de S. Cosme do Valle, de Julio Alberto da Costa, por Teixeira Lopes, e de Alexandre Herculano, este em ferro prateado e aquelles de marmore branco. Sala da Bibliotheca, com 3:000 volumes. Primeiro pavimento. Sala das sessões, guarnecida a retratos de bemfeitores do hospital. Retratos a oleo de D. Pedro V, D. Luiz I e D. Maria Pia. Quartos particulares e de internos (doutorandos). Consultorio homópathico e pharmacia. Enfermaria S. José (homópatha) composta de quartos a 2 camas. Enfermaria de Santa Luzia, (ophtalmologica). Sala de operações, quartos e camara escura. Enfermaria de invalidos. Passagem sobre terraço e ao ar livre, para o 1.º pavimento da 1.ª ala. Enfermaria de S. Joaquim, para medicina, composta de quartos a 2 leitos; e de S. Jeronymo, para medicina. Mais quartos para contribuintes. Linda e vasta capella, decorada por Bernardelli. * * * * * _Hospital da Penitencia_—É o mais importante dos hospitaes particulares do Rio de Janeiro. Pertence á Veneravel Ordem Terceira da Penitencia, a mais rica da capital da Republica. Occupava, outr’ora, um vastissimo edificio do largo da Carioca, que foi demolido para embellezamento da cidade, e o hospital provisoriamente removido para dois grandes predios da rua do Conde de Baependy, até que fique concluido o grandioso edificio que, nas proximidades, está a construir a mencionada Ordem, a mais antiga do Rio de Janeiro. Sustenta uma escóla para menores, no bairro da Saúde, e soccorre os irmãos nos domicilios. * * * * * _Hospital do Carmo_—Pertence á Ordem de N. S. do Monte do Carmo, que tambem soccorre com dinheiro, pensões e visitas domiciliarias, os seus irmãos enfermos e invalidos. * * * * * _Hospital de S. Francisco de Paula_—É mantido pela Irmandade de S. Francisco de Paula, em vasto predio, na rua Duque de Saxe. Tem sala para consultas externas, cemiterio, em Catumby, e um asylo para meninas orfãs. * * * * * _Recolhimento de N. S. da Piedade_—Mantido pela Irmandade da Candelaria, e fundado em substituição do Recolhimento de Santa Ritta de Cassia, mandado fechar pela municipalidade, que o subvencionava, em consequencia de uma campanha sustentada n’_O Paiz_, por Francisco Ferreira da Rosa, um dos seus redactores, que descobrira, em minuciosa visita, ser este estabelecimento um antro de immoralidade. * * * * * _Asylos da Caridade, do Bom Pastor e de Santo Antonio_—Estes tres estabelecimentos philantropicos são mantidos pela Ordem da Immaculada Conceição. O 2.º é para regeneração de mulheres transviadas e o ultimo abriga umas 60 orfãs, e está situado no delicioso arrabalde do Rio Comprido. * * * * * _Policlinica Geral do Rio de Janeiro_—Funcciona officialmente, esta prestante collectividade, desde 17 de Junho de 1882. Foi fundada por medicos e empregou o seu patrimonio, de trezentos contos de réis, na construcção de um edificio para sua séde, na Avenida Central. É destinada a prestar soccorros medicos a enfermos pobres e possúe laboratorios para varias especialidades clinicas. * * * * * _Maternidade das Larangeiras_—Funcciona, desde 3 de Março de 1904, em um predio do bairro das Larangeiras, e em 31 de Dezembro de 1907, tinha em tratamento 19 parturientes. É subsidiada pelo governo. * * * * * _Stranger’s Hospital_—Está situado no bello e aristocratico bairro de Botafogo. Foi fundado em 21 de Janeiro de 1892, para realisar a assistencia hospitalar aos estrangeiros domiciliados no Rio de Janeiro. Dirige-o uma associação de beneficencia. * * * * * _Instituto de Protecção e Assistencia á Infancia_—Foi fundado em 24 de Março de 1889 e funcciona desde 14 de Julho de 1901. Sustenta um Dispensario, na rua do Visconde do Rio Branco, que soccorre, por todas as fórmas, as creanças indigentes. Além de medicos e medicamentos gratuitos, essa caridosa instituição fornece leite esterilisado, calçado e vestuario. Tambem examina amas mercenarias e soccorre as creanças victimas de accidentes na via publica. É subvencionado pela municipalidade e pelo governo federal. Este benemerito Instituto foi fundado pelo dr. Moncorvo Filho, e publica mensalmente os seus _Archivos_. * * * * * _Policlinica de Botafogo_—Em 10 de Junho de 1900, começou esta instituição a funccionar na rua Bambina, n.º 45, em Botafogo, na séde da Sociedade Propagadora da Instrucção ás Classes Operarias da Freguezia da Lagôa. São relevantissimos os serviços prestados por esta philantropica e benemerita collectividade á sociedade fluminense, em geral, e muito especialmente ao populoso bairro de Botafogo. Fundou-a um corpo clinico, a cuja frente está a figura sympathica e prestigiosa do dr. Luiz Barbosa, tão eminente facultativo como primoroso cavalheiro e diamantino caracter, que exerce a medicina como verdadeiro sacerdocio da religião da humanidade, e sublima o seu espirito ao exercicio da caridade, a mais divina de todas as virtudes e a unica a immaterialisar a nossa natureza e a irradiar a nossa alma aos esplendôres eternos. Até 31 de Dezembro de 1907, a Policlinica tinha dado 427:217 consultas, feito 30:716 applicações electricas e 9:049 operações diversas. Recentemente inaugurou esta altruistica instituição um pavilhão de cirurgia, que consta de sala de operações, sala de consultas e curativos cirurgicos e genecologicos, enfermaria, gabinete do interno, rouparia, quarto de banho, pequena sala de recepção dos medicos e gabinete para os serviços complementares de assistencia aos enfermos. No antigo edificio funccionam as secções de clinica medica, pediatria, dermatologia e syphilis, occulistica, de otologia e rhinologia, homópathia e odontologia, com material e mobiliario apropriados, notando-se em todas as installações o maximo cuidado e aceio. Trata-se da fundação de um Archivo Medico, especie de bibliotheca da especialidade. A Policlinica de Botafogo, além dos soccorros prestados na sua séde, faz numerosas visitas a domicilios e, com material rolante e dos mais aperfeiçoados, acóde aos accidentes da via publica, na area da sua benefica acção. * * * * * _Dispensario Central_—Funcciona na rua do Acre, n.º 17, e foi fundado pelo gremio protestante Missão Central. Presta, na séde ou nos domicilios, serviços medicos e de odontologia e fornece medicamentos aos seus assignantes, que são admittidos até á idade de 65 annos, pagando a mensalidade de 1$000 réis. * * * * * _Asylo da Velhice Desamparada_—Tambem conhecido pelo nome de Asylo de S. Luiz. Eleva-se em um comoro da rua Tavares Guerra, desde 1820, anno em que o fundou o Commendador, mais tarde Visconde de Ferreira de Almeida. É um grandioso edificio de tres pavimentos, no centro de jardins e bosques e com esplendoroso panorama geral. Abriga, alimenta, veste e fornece assistencia medica e hygienica a homens e mulheres idosas, invalidas e indigentes de qualquer nacionalidade. * * * * * _Outras Instituições_—Além das já mencionadas, outras e numerosas associações beneficentes elevam bem alto, ás sublimidades da civilisação universal, o espirito philantropico dos brasileiros da capital da Republica. Citaremos as seguintes, que avultam d’entre as 185 collectividades beneficentes que existem, actualmente, no Rio de Janeiro: * * * * * _Associação dos Empregados no Commercio do Rio de Janeiro_—Soccorre os seus associados com medico, medicamentos, dinheiro, e foi a primeira aggremiação que na Capital Federal estabeleceu o serviço de soccorros na via publica, para o que possúe material apropriado. Está installada em um esplendido palacio proprio, na Avenida Central, e organisa uma bibliotheca. Foi fundada em 1880 e possúe um patrimonio de réis 2:340:000$. * * * * * _Sociedade Amante da Instrucção_—É, ao mesmo tempo, uma associação propagadora do ensino e um centro de assistencia, com patrimonio, do qual mantem um asylo de orfãs, que são alimentadas, vestidas, e educadas até aos 19 annos. O património é de 576 contos e tem 4:400 socios remidos. * * * * * _Associação das Senhoras da Egreja Evangelica Brasileira_—Sustenta um posto medico destinado ás suas associadas. Funcciona no Campo de Marte, á rua de S. Leopoldo, n.º 185. * * * * * _Associação das Senhoras de Caridade de S. Vicente de Paulo_—Fornece roupa, medico, dieta e medicamento ás irmãs necessitadas. Tem onze annos de existencia e bifurca-se por varios bairros da cidade. * * * * * Convem citar ainda a Maçonaria Brasileira, a Federação Spirita, a Veneravel Ordem Terceira de N. S. da Conceição e Boa Morte, a Assistencia Pia dos Pobres de Santo Antonio, a Devoção da Piedade, as irmandades de S. Pedro, da Lapa dos Mercadores, da Lapa do Desterro, a Ordem do Bom Jesus do Calvario, o Dispensario de S. Vicente de Paulo, a Irmandade de Santa Cruz dos Militares, a _Société Philantropique Suisse_, entre as collectividades civis e religiosas que praticam a caridade, em maior ou menor escála, segundo as suas posses e a amplitude dos seus estatutos. Batalha de Confetti Ha dez annos passados, não se podia realisar, no Rio de Janeiro, batalhas de flôres, nem de confetti, nenhuma d’essas elegantes diversões que imprimem o tom e constituem a suprema elegancia das grandes capitaes civilisadas. Faltava local apropriado. Hoje, além do Parque da Republica, ha as magnificas avenidas que, pela beira-mar, prolongam-se ao extremo-sul da praia de Botafogo. Ellas constituem excellentes corsos, amplos, arborisados, limpos e floridos. Por uma bellissima e deliciosa tarde de Abril de 1908, centenares de vehiculos, alguns enfeitados com requintado gosto, deslisavam em quadrupla fila, pelas duas principaes alamedas que marginam a formosa enseada de Botafogo. Com flôres iam, muitos d’elles guarnecidos, mas apesar das bellas hortensias e das perfumadas rosas que os realçavam, o observador ficava indeciso no que mais admirar, se ellas ou as lindissimas senhoras, flôres tambem, que disputavam-lhes a primazia na propria belleza e no encanto e enlevo dos nossos olhos. Nos passeios lateraes o transito era difficil, quasi impossivel, pela quantidade das gentilissimas passeiantes, que os cavalheiros procuravam não magoar. A formosura dos rostos dizia bem com o primôr e a elegancia do vestuario das senhoras, como as garridas côres dos trajes realçavam a variedade dos typos, escuros e claros, das simples filhas do povo. Fraternisava-se, e se não com o enthusiasmo das festas carnavalescas, as mais populares da capital fluminense, ao menos em um ambiente mais calmo e perfumado, no apogeu de uma festa eminentemente civilisadora e digna dos centros mais luxuosos do globo. E que supremo gôso espiritual, o d’aquella extraordinaria animação humana, sob a celestial abobada, infinitamente azulada, e em pleno esplendôr d’essa uberrima e pujante natureza, que cingia aquelle grandioso campo de batalha de uma radiante aureola de belleza e de primôres! O mesmo sol, tão ardente, horas antes, affastava-se gentil e deslumbrantemente, illuminando, com suavidade e brilho, a arena e os batalhadores, a superficie das aguas, as encostas e os cimos das montanhas circumvizinhas, e incendiando de formosura e de desejos os olhares das moças cariocas, em um deslumbramento de apotheose. Mulheres bonitas e olhares de fogo podem vêr-se em todos os povos, porém a brasileira seduz pela dupla e ineffavel expressão de candura e de meiguice com que nos acaricia e anima, como se Deus e a natureza por ella irradiassem o gôso inconcebivel da suprema belleza e do infinito amôr. Instrucção Publica Ao municipio fluminense, como a todos os da União Brasileira, compete subvencionar e desenvolver a diffusão da instrucção, pelas classes populares. Na cidade do Rio de Janeiro, a instrucção primaria é dada em tres cathegorias de escólas officiaes do municipio—as primarias, as escólas modêlo e as escólas elementares. Pelos onze districtos escolares urbanos e pelos quatro suburbanos estão distribuidas 193 escólas primarias, regidas por professores cathedraticos, diplomados pela Escóla Normal do Districto Federal. N’essas escólas estavam, em 31 de Dezembro de 1907, matriculados 25:891 alumnos. Ellas são para os dois sexos, umas em separado e outras mistas. O programma d’essas escólas, dividido em curso elementar, médio e complementar, comprehende as seguintes materias:—Leitura, escripta e theoria da linguagem; arithmetica pratica até á regra de tres; elementos de geometria; systema metrico; elementos de geographia e historia, principalmente do Brasil; lição de coisas e noções concretas de sciencias physicas e de historia natural; instrucção moral e civica; desenho; gymnastica; trabalhos manuaes e trabalhos de agulha. A segunda cathegoria, as escólas modêlo, são apenas cinco, onde os candidatos ao professorado fazem a pratica escolar, sob a direcção dos cathedraticos. Quanto ás escólas elementares, são casas particulares de ensino da zona rural, ou suburbana, situadas a mais de um kilometro de distancia das escólas publicas-primarias, subvencionadas pela municipalidade, desde que admittam um numero estipulado de alumnos gratuitos e subordinem-se ao programma official de ensino. Existem cêrca de oitenta escólas particulares, com a matricula, approximada, de 5:500 alumnos dos dois sexos. Os professores d’estes estabelecimentos de ensino são diplomados, como os das escólas primarias. A instrucção profissional, além da Escóla Normal, é dada nos Institutos Profissionaes, um para cada sexo, dos quaes já tratamos no capitulo—_Estabelecimentos Scientificos_. Os Institutos Profissionaes, a Escóla Normal, o Pedagogium e as escólas-modêlo, funccionam em edificios proprios, municipaes. Tambem já alguns predios onde é ministrada a instrucção primaria-official, pertencem á municipalidade. Em 1907, o total de professores officiaes, isto é, diplomados pelo municipio, era de 952, para todas as escólas. Estas são divididas em 15 districtos escolares, comprehendendo todas as escólas primarias e elementares, sob a fiscalisação de outros tantos inspectores, subordinados á Directoria Geral de Instrucção Publica. As cinco escólas-modêlo e os estabelecimentos de instrucção normal e profissional, são directamente fiscalisados pelo Director Geral de Instrucção. Para a solução de assumptos difficeis, nas questões technicas e pedagogicas, reune-se o Conselho Superior de Instrucção Publica, composto de trinta membros, pertencentes ao corpo docente municipal e presididos pelo Director Geral. O Governo Federal sustenta, na capital da Republica, os seguintes estabelecimentos de instrucção secundaria, technica e superior: —_Escóla Nacional de Bellas Artes._ —_Faculdade de Medicina_, que habilita medicos, cirurgiões, pharmaceuticos, dentistas e parteiras. —_Escóla Polytechnica._ —_Gymnasio Nacional_ (internato e externato). —_Instituto Nacional de Musica._ —_Escóla Militar._ —_Escóla Naval._ —_Instituto Benjamim Constant_ (instrucção aos cegos). —_Instituto dos Surdos-Mudos._ —_Escóla Preparatoria e de Tactica._ Ha duas escólas de sciencias juridicas, que conferem o diploma de bacharel nas mesmas sciencias. Nos capitulos—_Estabelecimentos Scientificos_ e _Museus_, já descrevemos quasi todas as instituições de ensino acima citadas. Pelo recenseamento official, realisado em 20 de Setembro de 1906, dos 811:443 habitantes do Districto Federal, 361:501 eram analphabetos, dos quaes 185:873 homens e 175:628 mulheres. Os melhores edificios escolares que existem no Rio de Janeiro, foram construidos em 1904, a expensas da Prefeitura, e são a Escóla Tiradentes, na rua do Visconde do Rio Branco e no local onde foi suppliciado o proto-martyr da independencia do Brasil; a Escóla Prudente de Moraes, no delicioso arrabalde chamado Fabrica das Chitas; e a Escóla Rodrigues Alves, ao lado do palacio da Presidencia da Republica, na rua do Cattete. O orçamento geral dos serviços municipaes de instrucção publica, que em 1904 foi de réis 4:155:353$000, é, actualmente, superior a cinco mil contos de réis. Calculando-se que, ao Governo Federal, custe, pelo menos, somma egual a manutenção dos estabelecimentos de instrucção, já referidos, temos a quantia, approximada, de dez mil contos, despendida, annualmente, com a instrucção publica, no Rio de Janeiro. Cada professor das escólas-modêlo, vence réis 6:000$000, por anno; um professor cathedratico, 4:000$000; um adjunto effectivo, 3:000$000 réis; um dito estagiario, 1:000$000; cada professor elementar, 4:800$000 réis; um adjunto 2:400$000 réis. Dos 1.ᵒˢ ha 6, no quadro, dos 2.ᵒˢ 193, dos 3.ᵒˢ 300, dos 4.ᵒˢ, 200; 7 professores elementares e 72 substitutos. Ao todo 778 educadores de instrucção primaria, municipal. Ao quadro da instrucção normal-pedagogica, pertencem 25 professores de sciencias, com o vencimento annual de 5:400$000 réis; 12 professores de artes a 4:000$000 réis annuaes; 5 professores contractados, a 1:800$000 réis; e 2 preparadores e 1 conservador, a 3:600$000 réis. Á instrucção profissional pertencem 7 professores de sciencias, a 5:000$000 réis; 10 ditos de artes, a 4:000$000 réis; 11 adjuntos e auxiliares de ensino, a 3:000$000; 16 mestres de officinas, a 3:000$000, e 8 contra-mestres, a réis 1:200$000, annuaes. Os professores primarios que não habitam os predios das respectivas escólas, percebem uma gratificação supplementar de 1:800$000 réis, annualmente, a titulo de auxilio de aluguel de casa, e todos os educadores diplomados, de todas as cathegorias, teem direito á _gratificação addicional_, correspondente aos periodos de tempo de bons serviços. O seguinte quadro demonstra o numero de escólas municipaes do Districto Federal, das tres cathegorias, bem como as dos ensinos normal e profissional, dos dois sexos, assim como a respectiva frequencia de alumnos, segundo o ultimo recenseamento official: Escólas elementares 79 Numero de alumnos matriculados 5:136 Escólas primarias 193 Numero de alumnos matriculados 24:151 Escólas-modêlo 5 Numero de alumnos matriculados 2:299 _Escóla Normal._ Numero de alumnas matriculadas 431 » » exames effectuados 1:436 » » alumnas diplomadas 50 _Pedagogium._ Numero de alumnos matriculados 194 » » exames effectuados 171 _Instituto Profissional Masculino._ Numero de alumnos matriculados 300 » » officinas 9 _Instituto Profissional Feminino._ Numero de alumnas matriculadas 120 » » officinas 3 Total de individuos frequentando as escólas municipaes 32:631 * * * * * Abrangendo os tres gráus de instrucção primaria, secundaria e superior ha, no Districto Federal, constituido pela cidade do Rio de Janeiro, os arrabaldes e os suburbios, numerosos estabelecimentos particulares de ensino. Infelizmente, não existe estatistica official das escólas primarias, particulares, calculando-se a sua frequencia em 12:000 alumnos dos dois sexos. Computa-se em 6:000 o numero de alumnos que frequentam os numerosos collegios de instrucção secundaria, espalhados pela capital e seus contornos. Corcovado Ascende-se a esta grandiosa e bella montanha, distante dez kilometros do Caes Pharoux e alta de 711 metros, por uma estrada de ferro em cremalheira, inaugurada em 9 de Outubro de 1884, na extensão de 3:790 metros. Delineou-a, requereu a sua concessão e presidiu á construcção o dr. Francisco Pereira Passos, auxiliado pelo seu collega, o engenheiro João Francisco Soares. Foi um arrojo esta magnifica obra de engenharia, e o começo da celebridade do homem eminente que, mais tarde, deveria aureolar a sua gloriosa carreira publica com a brilhantissima administração de Prefeito do Districto Federal, e de iniciador e executor dos assombrosos melhoramentos que transformaram, por completo, a cidade do Rio de Janeiro. A estação inicial da Estrada de Ferro do Corcovado é nas Larangeiras, rua do Senador Octaviano, n.º 51. O carro, impellido por minuscula machina, dirige-se á estação das Paineiras, transpondo varios viaductos, o mais importante dos quaes é o do Silvestre. São tantos e tão maravilhosos os encantos visuaes e espirituaes, quantas as sinuosidades e curvas da linha, que nos patenteiam, infelizmente por curtissimo espaço de tempo, os primôres de um panorama que não tem rival em parte alguma do globo terraqueo. Todos os arrabaldes e suburbios do Rio de Janeiro são pujantissimos de vegetação e de belleza; porém a Tijuca e o Corcovado constituem os vértices, a magnificencia e o deslumbramento d’essa apotheose da natureza, que sublima a capital fluminense á cúspide maxima de primeira entre as metropoles do mundo. Visitar uma e outra, embrenhar-se nas suas florestas e concentrar o espirito nos seus primôres visuaes, é conversar com Deus, é enlevar-se a creatura humana a páramos celestes e, por instantes, despir-se do involucro material para immortalisar-se e ascender aos esplendores divinos e eternos. As Paineiras são o ponto das excursões pela floresta. D’ahi partem estradas e atalhos que ora seguem o velho e solido aqueducto da Carioca, ora embrenham-se na matta, subdividindo-se e ramificando-se em estreitissimos caminhos, apenas transitaveis por peões. Em tres horas de bom caminhar alcança-se a Tijuca, passando-se a Ponte do Inferno, suspensa sobre um abysmo, entre rochedos. As Paineiras estão a 465 metros acima do nivel do mar. O trajecto, que até ahi tinha sido feito em 28 minutos de comboio, prolonga-se por mais 12 minutos até ao alto do Corcovado, em um declive assustador, por sobre insondaveis e vestidos abysmos, e antevendo o passageiro, por duas vezes, trechos do mar, da cidade e de montanhas distantes. Do ponto final da linha ferrea ao Chapéu de Sol, pavilhão de ferro e vidro construido no cimo da montanha, gasta-se 5 minutos a subir por alva e novissima escadaria de granito. Uma vez attingido o cume, que além do pavilhão contem ainda duas varandas de pedra, é deixar que a alma extasie-se na sublimidade do Bello, e concentrar o pensamento nos mysterios da natureza e de Deus. A immensidade oceanica, que a perder de vista acaricia e suavisa a terra, beijando-a docemente; cadeias de montanhas e montes gigantescos que áquem, além e nos extremos do horisonte, agasalham as nuvens e roubam-nos pequenos trechos do panorama geral; a cidade, os seus extensissimos arrabaldes e suburbios a espreguiçarem-se por entre a opulencia vegetativa; as ilhas que enfeitam a immensa bahia e defendem a entrada do porto; a formosura incomparavel do céo, da terra e das aguas; esse conjuncto ineffavel, esplendoroso e magnifico, constitúe o mais bello e grandioso hymno da excelsa natureza ao seu Creador, a apotheose esthetica e deslumbrantissima do nosso planeta, e a essencia de tudo quanto o genio assombrosamente inconcebivel de Deus creou de sublime e primoroso em todas as maravilhas da amplidão etherea. Governo Municipal No periodo colonial, a cidade do Rio de Janeiro foi administrada pelo Senado da Camara, instituição importada da metropole e que findou em 1830, para dar logar á Camara Municipal. Em 7 de Dezembro de 1889, a Republica substituiu-a pelo Conselho da Intendencia Municipal, que por lei de 20 de Setembro de 1892, foi transformado em Conselho Deliberativo. Esta collectividade, que póde ser convocada, extraordinariamente, pela Prefeitura e pelo Governo, compõem-se de dez intendentes, dos quaes o Presidente é eleito pelos seus collegas. Reune-se, em sessões ordinarias, duas vezes por anno, de 2 de Abril a 31 de Maio e de 1 de Setembro a 31 de Outubro, em um edificio da praça Ferreira Vianna, de construcção municipal e que fôra destinado para escóla publica de instrucção primaria. Outr’ora funccionava o Conselho no edificio da Prefeitura, na praça da Acclamação, hoje da Republica, separando-se em 1896. O Districto Federal é directamente governado pelo Prefeito Municipal, que exerce o poder executivo, e é nomeado por decreto do Presidente da Republica. O Conselho Deliberativo vota as leis municipaes, o Prefeito sancciona-as e estão encarregados da sua execução vinte e cinco Districtos Munipaes, cada um composto de um agente, um escrivão e variavel numero de guardas. Os funccionarios municipaes, de todas as cathegorias, são cêrca de 3:200, que vencem, annualmente, quantia approximada a 10.500:000$000 réis. No seu governo e administração o Prefeito tem as seguintes repartições auxiliares: —_Directoria de Hygiene e Assistencia Publica._—Compete-lhe a organisação de serviços de assistencia medica; a fiscalisação do abastecimento de viveres; a superintendencia dos hospitaes municipaes; a regulamentação dos cemiterios; a fiscalisação dos serviços dos asylos municipaes; o saneamento geral da cidade; a adopção e execução das providencias de policia sanitaria e a creação de condições mesologicas favoraveis ao desenvolvimento normal da população. —_Directoria de Instrucção._—Tem a seu cargo o ensino publico municipal; a organisação e regulamentação dos estabelecimentos officiaes de ensino primario e profissional; o provimento de professores e de material para as escólas e o desenvolvimento dos meios de instrucção popular. —_Directoria de Obras e Viação._—Trata do embellezamento da cidade; da superintendencia em todas as obras municipaes; da construcção, reconstrucção, accrescimos e reparos de predios por sua conta e de particulares, em edificações de qualquer especie, provisorias e definitivas. Trata tambem da viação urbana, em geral, e da carta cadastral. —_Directoria do Patrimonio._—Compete-lhe o arrendamento, aluguel, fôro, compra e venda dos bens municipaes, moveis e immoveis; as doações, legados, heranças e fidei-commissos; o tombamento e cadastro do territorio e bens do Districto Federal; o processo de aforamento de terrenos devolutos; o de acquisição de terrenos baldios: o processo para desapropriação por utilidade municipal e a avaliação e medição de todos os bens municipaes. —_Directoria da Fazenda._—Tem a seu cargo a contabilidade geral da receita e despeza do Municipio; o pagamento das despezas legalmente auctorisadas pelo Prefeito; a direcção, fiscalisação e arrecadação dos impostos e rendas municipaes e, finalmente, os serviços da fazenda municipal, em todas as suas ramificações. —_Directoria de Policia Administrativa, Archivo e Estatistica._—Superintende o serviço de policia municipal administrativa, exercida pelos agentes da Prefeitura, pelos fiscaes de inflammaveis e pelos guardas municipaes; organisa a estatistica geral do Districto Federal, investigando todos os factos sociaes, politicos e administrativos de caracter local ou municipal; informa as questões relativas á legislação e policia, assim como as de natureza contencioso-administrativa; conserva, devidamente classificados, todos os documentos relativos á historia e á administração do Municipio e trata de todos os serviços da Prefeitura, que não estejam distribuidos ás outras repartições. —_Superintendencia da Limpeza Publica e Particular_—Compete-lhe, especialmente, o asseio das ruas e praças publicas, a limpeza e conservação das vallas e dos rios; a collecta e remoção do lixo das habitações particulares, dos quarteis e das repartições publicas. —_Inspectoria de Mattas, Jardins, Arborisação, Caça e Pesca_—Trata da superintendencia dos serviços que constam da sua nomenclatura. A receita geral da municipalidade fluminense foi, pelo Conselho Deliberativo, orçada em réis 26.427:215$000, para 1909, com uma despeza equivalente, tendo sido a receita, cinco annos antes, em 1904, de 22.252:645$735 réis, e a despeza de 22.852:874$313 réis. Copacabana, Leme e Ipanema Do centro da cidade e pela praia de Botafogo o tramway electrico entra na rua da Passagem, e por ella dirige-se ao tunnel do Leme, que fura um dos contrafortes da serra do Corcovado, ou da Tijuca. Transposta a galeria subterranea, encontra-se duas linhas; a da direita, que segue á praia de Ipanema, e a da frente, que termina na extremidade occidental da praia do Leme. Esta linha é a mais curta, e em poucos minutos attinge-se o obstaculo natural formado pela mesma serra que o tunnel vence e por um gigantesco blóco de pedra, o Pão de Assucar, a desafiar a furia das vagas que, impotentes, desfazem-se, espumantes, de encontro á sua formidavel estructura. Ahi, n’esse encantador final de praia, ha um botequim-restaurante, e organisam-se algumas diversões, no intuito de attraír a concorrencia dos cariocas a sitio tão pittoresco. Todo o conjuncto, que prolonga-se do extremo da praia do Leme, ao da de Ipanema, visinha da Gavea, tem a denominação generica de Copacabana, cujo ponto principal, além dos já citados, é a Egrejinha, logar elevado e reintrante que divide a praia do Leme da de Ipanema. Um santuario, branco e anti-artistico, occupa o vértice d’aquella elevação, proporcionadora de um dos mais deliciosos encantos que ao nosso espirito possamos offerecer na ephemera passagem pelos esplendores terrestres. O verde glauco das ondas, quebrando-se a nossos pés, em furia tremenda, e projectando-se, em nivea espuma, aos atomos ethereos; a enseada immensa da Copacabana, bordada de casaria, que emerge de tufos de verdura; a verdejante cadeia de montanhas que fecha o horizonte; á nossa direita, a immensidade oceanica, á esquerda as fortalezas que defendem a barra; em face o pharol da Ilha Rasa e os cumes de serras distantes, aureolados por um poente maravilhoso; eis o panorama que sublima a alma a regiões sonhadas pelo que existe, em nós, de immortal e de divino. O ministerio da guerra tomou conta da Egrejinha, que é tambem um excellente ponto estrategico, outr’ora aproveitado, e trata de fortifical-o. Ipanema é uma praia tão vasta e bella, dotada de taes condições topographicas e climatericas, que é um crime não preparal-a a ser frequentada e habitada pelos fluminenses, que costumam ir muito mais longe procurar o que possúem ao pé de casa, como nenhum outro povo do mundo. Aqui não é o oceano a debater-se contra formidaveis gigantes de pedra; as ondas espraiam-se suave e encantadoramente, estendendo niveos e formosos mantos, que as projecções solares bordam de myriades de scintillações deslumbradoras. Já existem muitas habitações em quasi toda a extensão da Copacabana, algumas elegantes; porém o sólo, extremamente arenoso, não está convenientemente preparado; não ha conforto nem distracções. Só a natureza, nos esplendôres do céo e da terra, gorgeia alli, perennemente, um hymno de triumpho, de belleza e de amôr ao Supremo Creador das celestes espheras. Salubridade A Bombaim sul-americana, como era classificada, na Europa, a cidade do Rio de Janeiro, desappareceu sob a alavanca demolidora do dr. Pereira Passos, ex-Prefeito Municipal, a competencia scientifica do dr. Oswaldo Cruz, Director Geral de Hygiene, e a collaboração de muitos elementos officiaes e particulares, que congregaram-se para dar batalha de exterminio á febre amarella e a outras molestias endemicas e epidemicas que afugentavam os immigrantes e os forasteiros, da perola das cidades mundiaes. Só a febre amarella dizimára, á sua conta, em 1896, 2:929 habitantes da Capital Federal; dez annos depois, em 1906, os seus estragos reduziram-se a 42 vidas! Hoje, póde affirmar-se que essa terrivel epidemia passou á historia sanitaria do Rio de Janeiro. A transformação da cidade pela abertura de grandes avenidas e pelo alargamento das velhas ruas coloniaes e, principalmente, as providencias energicas adoptadas pelo governo federal e pela municipalidade, isolando os enfermos, destruindo, pelo fogo, as habitações empestadas e dando caça implacavel ás larvas e aos mosquitos conductores e transmissores dos microbios febris, libertaram a formosa metropole brasileira da fama de necroterio universal e transformaram-na em uma das mais salubres capitaes do nosso globo. Já em 1906 era a seguinte a estatistica comparativa da mortalidade nas principaes capitaes da Europa, da Asia e da America: Athenas 30,9 S. Petersburgo 30,5 Madrid 28,0 Lisbôa 23,1 Roma 20,8 Rio de Janeiro 20,7 Vienna d’Austria 19,3 Tokio 18,9 New-Iork 18,3 Paris 17,6 Berlim 17,1 Londres 15,6 Actualmente, o Rio de Janeiro é, pelo menos, tão salubre como New-Iork e Paris. Este assombroso resultado é uma das glorias mais refulgentes e impereciveis da administração republicana do Brasil. A ultima estatistica official indica a mortalidade, no Districto Federal, de 16 por 1:000 habitantes, annualmente. Para manter esta proporção consoladôra e acima de toda a espectativa, muito contribúe o abastecimento de aguas á capital da Republica, hoje consideravelmente augmentado e aperfeiçoado. A distribuição do precioso liquido está a cargo da Inspectoria Geral de Obras Publicas, subordinada ao ministerio da Industria e Viação, e faz-se por 26 reservatorios, caixas, açudes e reprezas, que occupam situações elevadas dos seis districtos em que, para o effeito da distribuição, está dividido o Districto Federal. O primeiro reservatorio construido foi o do Pedregulho, em 1876, celebre pelas suas fendas, que custaram milhares de contos ao Thesouro. Só no anno de 1905 gastou o governo da União a somma de 20:000 contos para augmento do abastecimento de agua á cidade do Rio de Janeiro, arrabaldes e suburbios. Actualmente é o Districto Federal abastecido, diariamente, da seguinte fórma: —Rio Maracanã e affluentes 17 milhões de litros —Rio Macaco 6 » » » —Rio Cabeça 1,500 mil litros —Rios Carioca e Paineiras 3 milhões de litros —Aguas do Silvestre e morro do Inglez 300 mil litros —Rio Trapicheiro 2,500 mil litros —Rio Tres Rios 4 milhões de litros —Rios Mendanha, Piraquara e Covanca 3,700 mil litros —Serras Tinguá e Commercio 122 milhões de litros Augmento de 1905 50 milhões de litros ----------- 210:000:000 » » » Eis o quadro da mortalidade geral, no Rio de Janeiro, em 1906: Tuberculose pulmonar 2:647 Outras tuberculoses 135 Molestias do apparelho respiratorio 1:327 Molestias do apparelho digestivo 2:398 Molestias do apparelho circulatorio 2:242 Molestias do systema nervoso 1:331 Mortes violentas (excepto suicidios) 507 Molestias do apparelho urinario 473 Grippe 453 Molestias de primeira edade e vicios de conformação 437 Cancros e outros tumores malignos 291 Debilidade senil 219 Paludismo agudo 149 Outras molestias geraes 145 Injecção purulenta septicemia (excepto a puerperal) 140 Paludismo chronico 118 Peste 111 Molestias ignoradas ou mal definidas 98 Syphilis 71 Suicidios 71 Beriberi 69 Febre typhoide 65 Dysenteria 60 Molestias da pelle e do tecido cellular 56 Outros accidentes purperaes 55 Febre amarella 42 Septicemia puerperal 42 Diphteria e crup 41 Coqueluche 39 Erysipela 36 Lepra 22 Sarampo 18 Diversos tumores 14 Molestias dos orgãos genitaes 10 Molestias dos orgãos da locomoção 9 Variola 9 Hydrophobia 4 Outras molestias epidemicas 1 ------ Total 13:957 A mortalidade infantil é na proporção, média, de 150 por mil adultos. Viação Urbana A Estrada de Ferro Central do Brasil, a mais extensa e poderosa da União, ao partir da sua estação central, na praça da Republica, serve as zonas urbana e suburbana do Rio de Janeiro, pertencentes ao Districto Federal, até á estação de D. Clara. N’esse perimetro, foi o seguinte o movimento geral, no 1.º trimestre de 1908: 1.ª classe: 1:487:884 viajantes Réis 379:838:860 2.ª classe: 3:523:405 viajantes Réis 583:641:700 Total—5:011:359 viajantes, cujas ----------- passagens custaram 953:480:560 São 19 as estações d’esta Estrada, situadas no territorio do Districto Federal, 8 das quaes são tambem servidas por bondes, ou tramways electricos e a tracção animal. A Estrada de Ferro Central do Brasil, que já tem em trafego 1:360:000 kilometros, liga a capital da Republica aos Estados do Rio de Janeiro, S. Paulo e Minas Geraes, e será prolongada aos Estados de Goyaz e da Bahia, a este pelo fertilissimo valle do grande rio S. Francisco. Da estação de S. Francisco Xavier, suburbio fluminense, começa o trafego da _Leopoldina Railway Company_, que atravessa a zona federal de Irajá e dirige-se á cidade de Petropolis. Da Ponta do Cajú, arrabalde do Rio de Janeiro, parte o material da _Estrada de Ferro do Rio do Ouro_, especialmente construida para o serviço de abastecimento de agua á colossal metropole, mas tambem transporta passageiros e carga, no percurso total de 60 kilometros e 247 metros, com 24 estações, até ao Rio S. Pedro, na serra do Tinguá. * * * * * A outr’ora _Botanical Garden Rail Road Company_, e desde 1882, Companhia Ferro Carril do Jardim Botanico, é a mais poderosa empreza de viação urbana da capital brasileira. O seu serviço publico teve inicio em Outubro de 1868, cinco annos antes de ser inaugurada, em Paris, a primeira linha de identico systema de viação, da Praça da Concordia a Sévres. A tracção da _Jardim Botanico_, foi mudada de animal para electrica em 1891. A sua estação inicial é na Avenida Central, e a principal é no extremo do Cattete; praça Duque de Caxias. Aqui bifurca-se ás Larangeiras e por Botafogo até á Gávea, seu ponto terminal, a 11:880 metros da Avenida Central. A bitola d’esta linha é larga de 1,ᵐ44. A extensão total das linhas d’esta Companhia, é de 79:000 metros. A velocidade média é de 150 metros por minuto. É tambem esta empreza que serve os habitantes e visitantes das praias do Leme, Copacabana e Ipanema. * * * * * A _Companhia Ferro Carril da Villa Izabel_, serve os arrabaldes do Andarahy, Villa Izabel e Engenho Novo, communicando-os, por tracção electrica, com o centro commercial da cidade. A bitola é de 1,ᵐ44, partindo os seus carros da praça Tiradentes, para um percurso total de 49:000 metros. A mais extensa das suas linhas, a do Engenho Novo, attinge 11:650 metros de comprimento. Esta empreza tambem serve os povoados suburbanos de Jacaré, Bocca do Matto, e Cachamby, ligando-os com as estações de Engenho Novo, Meyer e Todos os Santos, da Estrada de Ferro Central, em um percurso total de 10:000 metros e com a bitola de 1 metro, a tracção animal. * * * * * A _Companhia Ferro Carril de S. Christovão_, outr’ora _Rail Street Company_, mantem ainda a tracção animal e é a que possúe maior numero de linhas, que são as seguintes: Do Largo de S. Francisco á Tijuca 10:630ᵐˢ. » » » » ao Jockey Club 10:134 » » » » á Ponta do Cajú 9:036 » » » » » Praça Marechal Deodoro 7:194 » Do Largo de ao Rio Comprido 5:845 » » » de a Itapagipe 5:469 » » » de » Itapirú 4:964 » » » de » Estacio de Sá 4:203 » » » de » Catumby 4:000 » --------- Total 61:435ᵐˢ. As linhas do Uruguay, S. Januario, Fabrica das Chitas, Santa Alexandrina, Bispo, S. Francisco Xavier e Alegria, são intermediarias das anteriores. A bitola é de 1,ᵐ35. A média do transporte annual é de 20:000:000 de passageiros, em 850:000 viagens. * * * * * A mais _carioca_, todavia, das emprezas de viação urbana do Rio de Janeiro, a que não transpõem os limites da cidade, é a Companhia Carris Urbanos, de tracção animal e bitola estreita, que deslisa o seu material por 15 linhas differentes. Quatro partem do _Boulevard_ Carceler, ou rua Primeiro de Março, em direcção ás praças da Carioca, Tiradentes e da Republica, terminando o seu trafego na praça Onze de Junho e nos extremos das ruas do Visconde de Sapucahy, Sant’Anna, Riachuelo e largo da Lapa. Seis linhas teem o seu inicio na Praça Quinze de Novembro, junto da estação das barcas de Nictheroy, e seguem até á Saúde, Gambôa, Estrada de Ferro e Canal do Mangue. Cinco linhas cruzam da Estrada de Ferro ao largo de S. Francisco de Paula, da Gambôa ao Arsenal de Marinha e do Largo da Lapa ao de S. Francisco. As linhas, estendidas, occupariam 70 kilometros, com a bitola de 0,ᵐ80. Regula transportar, annualmente, 34 milhões de passageiros. * * * * * A _Companhia Ferro Carril Carioca_, a tracção electrica, tem a sua estação central no largo da Carioca, que communica com o morro de Santa Thereza, Paula Mattos e Silvestre. É a mais pittoresca das linhas fluminenses, cuja belleza foi descripta no capitulo—_Da Carioca ao Somaré_. E mais surprehendente de formosura natural será ainda quando estivér concluido o prolongamento ao Alto da Bôa Vista, na Tijuca. O percurso actual é de cêrca de uma hora de viagem. Era 1904 os carros d’esta empreza transportaram 1:134:787 passageiros, em 76:860 viagens. Da Estrada de Ferro do Corcovado já nos occupamos no capitulo—_Corcovado_. * * * * * Além das já citadas, partem da Capital Federal as seguintes vias de communicação para o exterior: —Barcas da Prainha a Mauá, isto é, do Rio de Janeiro a Petropolis. —Barcas da Prainha a Sant’Anna de Maruhy, ou entre o Rio e Friburgo. —Barcas da Prainha á Piedade, ou Therezopolis. —Barcas da _Companhia Cantareira_ e _Viação Fluminense_, serviço permanente e rapido entre a capital e a cidade fronteira de Nictheroy. Ha uma dezena de companhias nacionaes e estrangeiras, de navegação, que communicam o Rio de Janeiro com os Estados maritimos da União e, directa e indirectamente, com todo o nosso planeta. Imprensa A primeira das potencias moraes que orientam as sociedades modernas, tem um dos seus principaes nucleos de expansão e influencia na grandiosa metropole brasileira. Se muitos e eminentissimos jornalistas que, no Rio de Janeiro, sublimaram a divina instituição da imprensa aos páramos da immortalidade, já desappareceram, materialmente, na frialdade dos sepulchros, a sua obra ficou e será uma das mais brilhantes fulgurações da gloria do Brasil. Outros gigantes da penna e do pensamento os substituiram, e os rutilantes nomes de Ferreira de Araujo, Joaquim Serra, Machado de Assis, Arthur de Azevedo, Saldanha Marinho, Evaristo da Veiga, Ferreira de Menezes, José do Patrocinio e os de tantos outros sacerdotes da imprensa, reflectem-se em Ruy Barbosa, Quintino Bocayuva, Coelho Netto, Olavo Bilac, Ubaldino do Amaral, Nuno de Andrade, Sylvio Romero, Ferreira da Rosa, Edmundo Bettencourt, Eduardo Salamonde, Alcindo Guanabara, José Verissimo, Virgilio Varzea, Paulo Barreto e em outros muitos, para que sejam mantidas as gloriosas tradições do jornalismo fluminense. O _Jornal do Commercio_, decano da imprensa fluminense; a _Gazeta de Noticias_; _O Paiz_; o _Jornal do Brasil_; a _Noticia_; _A Imprensa_; _A Tribuna_; o _Correio da Manhã_; o _Diario do Commercio_; _O Seculo_; _O Correio da Noite_ e numerosos outros orgãos diarios, matinaes e vespertinos, e periodicos da opinião carioca, abrilhantam a intensa vida social da maravilhosa capital do Brasil e collaboram efficaz e incessantemente no movimento ascencional da nacionalidade brasileira para a meta dos seus gloriosos destinos. O jornal é indispensavel ao fluminense, como parte integrante da sua propria natureza; elle o desdobra nas ruas, nos bondes, nos cafés, nas residencias e até durante as refeições; o que explica o extraordinario desenvolvimento de muitas emprezas jornalisticas do Rio de Janeiro que, além dos melhoramentos materiaes introduzidos nas suas officinas e patenteados nos seus periodicos, levantam soberbos palacios, para a propria séde, na Avenida Central e em outras das novas e grandiosas arterias da soberba metropole. D’entre elles destaca-se o do _Jornal do Commercio_, em via de conclusão, na Avenida Central, que brevemente substituirá o velho casarão onde, ha mais de meio seculo, está installado o primeiro jornal da America do Sul. Dos semanarios illustrados, destacam-se o _Fon-Fon_, _A Careta_, _A Semana Illustrada_, _O Degas_, _O Tico-Tico_, para creanças, e _O Malho_, que é o de maior circulação. _A Leitura para Todos_ é uma revista mensal, propriedade da empreza d’_A Tribuna_, assim como o semanario _Tico-Tico_. Dos orgãos vespertinos o mais lido é _A Noticia_, excellentemente redigido, como quasi todos os jornaes brasileiros. Os mais rendosos são o _Jornal do Commercio_, que tem feito fortunas, e o _Jornal do Brasil_. Quintino Bocayuva, o principe dos jornalistas brasileiros, e talvez sul-americanos, está, infelizmente, arredado das pugnas da imprensa; mas o seu nome fulgirá, ainda por muitissimo tempo, como estrella de primeira grandeza. Dos mortos, José do Patrocinio e Ferreira de Araujo eram organisações jornalisticas completas, e que fariam a gloria da imprensa dos mais adeantados paizes do globo. Ha a citar ainda, _O Diario Official_, _O Brasil Medico_, _Revista Medica_, _Revista de Engenharia_, _Kosmos_, _Os Annaes_, _A Rua do Ouvidor_ e _Rio Nú_. Diariamente apparecem e desapparecem publicações de varia indole. Commercio e Industria Ao findar o seculo XVIII, em 1799, a cidade de S. Sebastião do Rio de Janeiro, com 43:376 habitantes, possuia 97 estabelecimentos commerciaes, em todos os generos. Actualmente, com cêrca de 900:000 moradores, a capital do Brasil encerra um numero approximado de 22:000 casas de negocio, incluindo os arrabaldes e suburbios. Sóbe a 7:000 o numero de vendedores ambulantes de todas as especies de commercio. Os estabelecimentos commerciaes pagam, annualmente, á municipalidade, cêrca de 3:000 contos de alvará, ou licença, e os vendedores ambulantes, 500 contos. Quanto a fabricas, funccionam cêrca de 250, de todas as industrias, a maior parte na zona suburbana. As mais numerosas são as de calçado, aguas gazozas, flôres, doces, gravatas, chapeus e de colletes para senhora. Os estabelecimentos commerciaes mais numerosos, são os armazens de generos alimenticios, seguindo-se os açougues, as padarias, os hoteis e hospedarias, os botequins e bilhares, as casas de pasto, os barbeiros, as alfaiatarias, as pharmacias, os armarinhos, as lojas de calçado e as charutarias. Em menor proporção figuram os armazens de fazenda e artigos de moda, as chapelarias, as drogarias, as typographias, as livrarias, os estabelecimentos de pianos, as luvarias, os joalheiros, as lithographias, as photographias e as lojas de chapéus para senhora. O maior numero de officinas é de carpinteiro e marceneiro, vindo depois as colchoarias, serrarias, as officinas de encadernação, os marmoristas e os estaleiros, que eram 14 em 1906. _A Junta Commercial da Capital Federal_, regulamentada por decreto de 1890, composta de sete deputados, commerciantes, de um secretario e de tres supplentes, estes tambem membros do commercio, tem as seguintes attribuições:—Matricular os commerciantes e sociedades commerciaes; os trapicheiros e administradores de armazens de deposito, assim como todas as pessôas idoneas que pretenderem estabelecer emprezas commerciaes. —Nomear correctores de mercadorias e de navios; leiloeiros, interpretes e avaliadores commerciaes. —Rubricar os livros dos commerciantes e sociedades de commercio, das companhias ou sociedades anonymas e dos trapicheiros. —Admittir á assignatura do termo de fiel depositario o pretendente á concessão de entreposto particular. —Registar as nomeações de guarda-livros, caixeiros e outros quaesquer propostos de casas commerciaes; as marcas de fabrica e de commercio, nacionaes e estrangeiras; as firmas e razões commerciaes e quaesquer documentos que, por lei, teem de constar de registro publico do Commercio. —Archivar um exemplar dos contractos, suas prorogações, alterações e distractos de sociedades commerciaes; dos contractos ou estatutos das companhias ou sociedades anonymas, nacionaes e estrangeiras, e das sociedades em commandita por acções, com a lista nominativa dos subscriptores, e das marcas inscriptas no Registro Internacional. —Representar, informar e consultar o Governo da União, sobre a necessidade de interpretar, modificar ou revogar alguma lei, regulamento ou instrucção, e de reprimir abusos de funccionarios publicos, ou de commerciantes e agentes auxiliares do Commercio, sobre os interesses do Commercio e da Industria. —Processar administrativamente os funccionarios do Commercio que transgredirem as leis commerciaes, impondo-lhes a pena de multa, suspensão, destituição ou cassação de matricula. Das decisões d’esta Junta, ha recurso para o ministro da Justiça e Negocios do Interior. Os deputados e supplentes são eleitos pelo Collegio Commercial e pelo prazo de quatro annos. D’elles o ministro da Justiça escolhe o presidente e nomeia um secretario d’entre os cidadãos graduados em sciencias juridicas e sociaes. * * * * * Em 1906, o commercio exterior do Brasil ascendeu á cifra de um milhão e quatrocentos mil contos, tres quartas partes do qual pertence á actividade dos portos do Rio de Janeiro e de Santos. O movimento maritimo, annual, do porto da Capital Federal é, na média, comparando as estatisticas dos ultimos cincos annos, de 600 embarcações á véla e 2:400 a vapor, entradas e saídas, representando 3.000:000 de toneladas. Porto do Rio de Janeiro A incomparavel e formosissima bahia de Guanabara, ou do Rio de Janeiro, com 140 kilometros de circumferencia, 30 kilometros de comprimento e 28 de largura, era bem digna do auxilio dos seus possuidores na construcção de um porto commercial a aproveitar-lhe as riquezas naturaes e a facilitar o importantissimo commercio da capital da Republica. Esta obra colossal, iniciada em 20 de Março de 1904, deve ficar concluida em 1910, e é de todos os grandes melhoramentos da metropole fluminense, o mais gigantesco e util ao seu futuro. É devido á iniciativa do dr. Lauro Müller, quando ministro da Viação e Obras Publicas, na Presidencia do dr. Francisco de Paula Rodrigues Alves. Para a sua realisação, foi levantado um emprestimo de 8:500:000 libras, tres vezes coberto na praça de Londres. É constructora, por contracto, a firma J. C. Walcker & C.ª Se o novo porto, propriamente dito, começa na Ponta do Cajú e termina na Avenida Central, na extensão de 7:200 metros, póde dizer-se que as obras demandadas pelo seu trafego e pelo aformoseamento das suas dependencias, teem o seu inicio na praça Onze de Junho, com a dupla, magestosa e novissima Avenida do Mangue, empolgante de belleza. Ella substituiu uma série de pantanos immundos e prejudicialissimos á saúde publica e á segurança individual. Além da quadrupla fila de altas e elegantes palmeiras, que ladeiam o canal do Mangue, a Avenida, cujo centro é cortado por essa arteria liquida, ostenta, por sua vez, outras tantas fileiras do mesmo vegetal, que lhe seguem e aformoseiam a arrebatadora trajectoria. No ponto em que as aguas do canal entram na amplissima bahia, a Avenida contorna, dos dois lados, os caes acostaveis, seguindo-os ás suas extremidades. O paredão, para encosto e descarga das grandes embarcações, terá a extensão total de 3:750 metros, estando já promptos uns 2:000 metros. É de fortissimo granito, tem a altura de 25 metros e enfrenta uma faixa liquida e livre de 250 metros de largura, cujos trabalhos de drenagem, pela abundancia de lama e de varios dectrictos, constituem um esforço assombroso do trabalho humano. De 30 em 30 metros, grossos pégões de ferro, fundidos no granito, offerecem sólida amarração aos transatlanticos, e uma galeria subterranea acompanha toda a extensão das muralhas, para a conducção dos varios encanamentos exigidos pelo serviço publico. Vastissimos armazens erguem-se defronte dos caes acostaveis, e entre estes e aquelles passa um ramal da Estrada de Ferro Central do Brasil. A construcção d’este porto, trouxe tambem a vantagem da eliminação das velhas edificações, a desmoronarem-se e anti-hygienicas, dos bairros da Gambôa e da Saúde, lado do mar, e o desapparecimento dos ilheus Pombeba, Santa Barbara, Melões, Moças e Ferreiros que, pela proximidade da terra firme, serviam de depositos de immundicies e de refugios de malfeitores. De hoje em deante, a carga e descarga de mercadorias, que era feita das grandes embarcações para as fragatas e vice-versa, com atrazo de semanas e de mezes, terá rapido despacho, como o exigem a importancia e grandeza do porto do Rio de Janeiro e as necessidades do seu commercio de importação e exportação. Concluidas todas as obras e adoptadas as medidas de largo alcance administrativo e economico, tendentes ao desenvolvimento da riqueza nacional, este porto será não só o primeiro da America do Sul, mas tambem um dos mais importantes do mundo. A commissão de engenheiros, encarregada de estudar o projecto das obras do porto, orçamentou a sua construcção em 86:000 contos de réis, além das desapropriações já feitas no seu trajecto. Recenseamento O ultimo recenseamento official e o mais regular e completo que se tem feito no Rio de Janeiro, é datado de 20 de Setembro de 1906, e dá as cifras de 463:453 homens e 347:990 mulheres, sommando um total de 811:443 habitantes. Conhecida a reluctancia popular para o recenseamento, especialmente nas classes incultas, com receio do augmento de impostos e do serviço militar; attendendo á transformação, recentissima, da cidade e á era de paz, de trabalho e de desenvolvimento que o Brasil actualmente desfructa, não é exaggero calcular-se a população da sua capital em 900:000 habitantes, numero redondo, incluindo os arrabaldes e suburbios. O penultimo recenseamento data de 1890, accusando uma população fluminense de 522:651 individuos. Eis a divisão dos habitantes pelos 25 actuaes districtos municipaes do Districto Federal, ou seja da cidade do Rio de Janeiro, arrabaldes e suburbios: Candelaria 4:454 Santa Rita 45:929 Sacramento 24:612 S. José 42:980 Santo Antonio 38:996 Santa Thereza 7:971 Gloria 57:477 Lagôa 47:992 Gavea 12:570 Sant’Anna 37:266 Gambôa 42:049 Espirito Santo 57:682 S. Christovão 45:098 Engenho Velho 37:695 Andarahy 48:556 Tijuca 7:708 Engenho Novo 28:422 Meyer 34:476 Inhaúma 67:478 Irajá 27:406 Jacarépaguá 14:980 Campo Grande 31:248 Guaratiba 17:928 Santa Cruz 15:380 Ilhas 8:982 ------- População terrestre 805:335 » maritima 6:108 ------- 811:443 Quadro de instrucção da população do Rio de Janeiro: Edade Sabem lêr Não sabem lêr Total 6 a 15 annos 71:041 78:405 149:446 7 » » » 68:829 63:769 132:598 8 » » » 64:392 50:993 115:385 9 » » » 58:253 40:329 98:582 10 » » » 50:740 31:978 82:718 11 » » » 41:291 23:728 65:019 12 » » » 32:488 17:876 50:364 13 » » » 21:181 10:679 31:860 14 » » » 107:083 5:293 112:376 Menores de 6 annos havia, pelo ultimo recenseamento official, o de 20 de Setembro de 1906, 106:853 analphabetos, sendo 57:606 do sexo masculino e 49:247 do feminino, e 1035 que já sabiam lêr e escrever, 515 do sexo masculino e 520 do feminino. Maiores, de 15 annos, eram analphabetos 103:803 homens e 101:310 mulheres, sabendo lêr e escrever, 221:404 homens e 117:592 mulheres. A area total do Rio de Janeiro é de 1:116:593:000 metros quadrados, da qual a setima parte, ou sejam 158:316:000 metros, constitue a zona urbana, com a densidade de 3:928 habitantes por kilometro quadrado. Na zona suburbana, a densidade é de 191. O numero de predios, no Districto Federal era, em 1906, de 84:375, e o de domicilios, de 83:686. Sexualmente considerada, a população fluminense, em cada milhar de creaturas, dá 571 homens e 429 mulheres. Quadro da população, por edades e sexos: Edade Homens Mulheres Total 1 anno 9:653 8:487 18:140 2 annos 8:890 7:560 16:450 3 » 10:740 9:145 19:885 4 » 10:081 8:471 18:552 5 » 9:485 8:219 17:704 6 » 9:272 7:885 17:157 7 » 9:060 7:788 16:848 8 » 9:175 8:038 17:213 9 » 9:178 7:625 16:803 10 » 8:558 7:306 15:864 11 » 9:618 8:081 17:699 12 » 7:731 6:924 14:655 13 » 10:039 8:465 18:504 14 » 8:203 7:581 15:784 15 » 8:563 7:513 16:076 20 » 42:794 37:299 80:093 25 » 55:439 35:898 91:337 30 » 51:270 31:962 83:232 35 » 40:576 25:502 66:078 40 » 35:165 23:360 58:525 45 » 29:650 19:150 48:904 50 » 20:965 14:303 35:268 55 » 15:883 15:338 31:221 60 » 9:221 7:121 16:342 65 » 6:888 6:737 13:625 70 » 3:463 3:407 6:870 75 » 2:082 2:538 4:620 80 » 1:019 1:279 2:298 85 » 598 941 1:539 90 » 164 292 456 95 » 74 244 318 100 » 46 88 134 Maiores de 100 50 128 178 ------- ------- ------- 463:453 347:990 811:443 Eram solteiros 270:444, sendo 176:146 homens e 94:298 mulheres; casados 214:730; d’estes 124:904 homens e 89:826 mulheres; viuvos 52:704, 14:227 do sexo masculino e 38:477 do sexo feminino. Ignorava-se o estado civil de 9:860 homens e 6:311 mulheres. Dos casados 61 eram menores de 15 annos, dos quaes 56 mulheres e 5 homens. Quadro da população fluminense, por profissões e sexos: Profissão Homens Mulheres Total Agricultura horticultura e floricultura 18:605 2:806 21:411 Creação 846 11 857 Caça e pesca 2:410 4 2:414 Pedreiras 890 1 891 Salinas — — Outras 2 2 Textis 1:924 1:010 2:934 Couros 59 4 63 Madeiras 1:240 1 1:241 Metalurgia 7:140 4 7:144 Ceramica 666 666 Productos chimicos 172 172 Alimentação 3:297 288 3:585 Vestuario 13:523 18:187 31:710 Mobiliario 755 1 756 Edificação 31:785 15 31:800 Construcção de apparelhos de transporte 669 669 Producção de forças physicas 5:301 5:301 Industrias de luxo 3:680 39 3:719 » não classificadas 23:292 2:727 26:019 Transporte maritimo 6:639 9 6:648 Transporte terrestre 14:276 11 14:287 Correios, telegraphos e telephones 1:787 85 1:872 Bancos 76 76 Casas de commissões 634 3 637 Commercio 61:022 1:040 62:062 Exercito 7:133 7:133 Armada 4:639 4:639 Policia 4:059 4:059 Bombeiros 653 653 Municipio 1:232 57 1:289 União 10:965 28 10:993 Estudos (serviços) 63 2 65 Administrações annexas 90 90 Profissões religiosas 346 280 626 » judiciarias 1:804 6 1:810 » sanitarias 3:476 308 3:784 Magisterio 883 1:959 2:842 Sciencias, lettras e artes 2:846 146 2:988 Pessôas que vivem dos seus rendimentos 2:183 1:339 3:522 Serviço domestico 23:174 94:730 117:904 Trabalhadores braçaes 29:514 419 29:933 Profissões mal classificadas 6:289 306 6:595 Classes improductivas 20:549 7:339 27:888 Profissões desconhecidas 25:780 39:712 65:492 Sem profissão declarada: Menores de 15 annos 91:666 90:980 182:646 Maiores » » » 25:423 84:183 109:556 ------- ------- ------- 463:453 347:990 811:443 Pelo mesmo recenseamento havia, no Rio de Janeiro, em 1906, 312:573 brasileiros, do sexo masculino e 288:355 do feminino; 101:777 portuguezes e 31:616 portuguezas, 17:148 italianos e 8:409 italianas; 14:110 hespanhoes e 6:589 hespanholas; 1:522 allemães e 1:053 allemãs; 1:173 inglezes e 498 inglezas; 1:678 francezes e 1:796 francezas; 1:417 estrangeiros de outras nacionalidades, do sexo masculino, e 2:364 do sexo feminino, na seguinte totalidade: Brasileiros 600:928 Portuguezes 133:393 Italianos 25:557 Hespanhoes 20:699 Allemães 2:565 Inglezes 1:671 Francezes 3:474 De outras nacionalidades 3:781 Segurança Publica A população fluminense dorme sob a guarda de cinco differentes collectividades, tres civis e duas militares, 4 das quaes tambem fazem o policiamento da cidade durante o dia. As corporações puramente militares são a Brigada Policial e as forças do exercito que fazem parte da guarnição do Rio de Janeiro. Estas fornecem os contingentes para as guardas dos edificios e monumentos publicos e auxiliam, em caso de necessidade, as outras corporações na manutenção da ordem publica. É muito variavel o numero de unidades do exercito que estacionam na Capital Federal, por causa das exigencias do serviço, podendo, todavia, calcular-se em 7:000 as praças das tres armas, infantaria, cavallaria e artilharia, que habitualmente guarnecem a capital da Republica. A Brigada Policial consta de 4:500 homens, dos quaes 2:700 de infantaria e 1:800 de cavallaria, sob o commando em chefe de um general, e subordinados, directamente, ao ministro da Justiça. Estaciona em dois quarteis, o de infantaria, na rua Evaristo da Veiga, e o de cavallaria, na rua Frei Caneca. As tres corporações civis são a Guarda Nocturna, a Guarda Civil e o Corpo de Agentes de Segurança Publica. Estes, os _buffos_ de toda a parte do mundo, indispensaveis á policia para o serviço de espionagem e de pesquizas, são apenas 50, e immediatamente dependentes do Chefe de Policia. A Guarda Civil é composta de 1:500 homens, e tem a seu cargo o policiamento das circumscripções urbanas. Á noite, esta Guarda é auxiliada por patrulhas de cavalleiros da Brigada Policial. Os guardas-nocturnos estão organisados em 14 das 25 zonas municipaes da cidade, e são pagos pelos moradores das respectivas parochias. São quatrocentos homens, approximadamente. * * * * * Quinze pretores, quinze juizes de direito, dois tribunaes do Jury e uma Côrte de Appellação, constituem a justiça civil e penal do Districto Federal. O Pretor, que é tambem o juiz dos casamentos, tem attribuições limitadas no Civel, no Commercial e no Crime. Em cada Pretoria, além do juiz-pretor, ha tres supplentes, nomeados para o substituirem no caso de falta. No Civel e no Commercial, o Pretor processa e julga, em 1.ª instancia, as causas cujo valôr não exceda 5:000$000 réis. No Crime processa as causas destinadas a julgamento no Tribunal do Jury, e aquellas em que lhe cabe lavrar sentença. Obedecendo á antiga divisão ecclesiastica da cidade, ainda hoje aproveitada, para os effeitos civis, em muitos casos, a 1.ª Pretoria comprehende a circumscripção da Candelaria e a ilha de Paquetá; a segunda a de Santa Rita e a ilha do Governador; a 3.ª actúa na circumscripção do Sacramento; a 4.ª na de S. José; a 5.ª na de Santo Antonio; a 6.ª na da Gloria; a 7.ª Lagôa e Gavea; a 8.ª Sant’Anna; a 9.ª Espirito Santo; a 11.ª Engenho Velho; a 12.ª Engenho Novo; a 13.ª Inhaúma e Irajá; a 14.ª Jacarépaguá e Guaratiba; e a 15.ª Pretoria comprehende as circumscripções de Campo Grande e Santa Cruz. Em cada Pretoria funcciona o Registro Civil da circumscripção. Ha tres juizes de direito do Civel; tres do Commercial; dois de Orfãos e Ausentes; um da Provedoria e Residuos; um dos Feitos da Fazenda Municipal e cinco do Crime. Estes processam e julgam todas as causas não pertencentes á alçada do Pretor e á do Tribunal do Jury. Os juizes de direito do Civel e do Commercial, julgam qualquer causa que exceda o valor de 5:000$000 réis. O juiz da Provedoria e Residuos, processa e julga todos os inventarios com testamento, em que não haja menores interessados. Havendo-os, as causas são da alçada dos juizes de Orfãos e Ausentes. O juiz dos Feitos da Fazenda Nacional, processa e julga todas as questões em que a Fazenda Municipal fôr interessada, como auctora ou ré. O Tribunal do Jury é composto de doze juizes de facto, ou jurados, sorteados entre cidadãos brasileiros e eleitores, de 21 a 60 annos de edade. Este tribunal julga os crimes que não são submettidos a outra qualquer jurisdicção. A presidencia é exercida, alternada e mensalmente, pelos juizes do Crime. A Côrte de Appellação é dividida em _primeira e segunda camara_, e tem jurisdicção em todo o Districto Federal. É composta de 15 juizes-desembargadores, que elegem, annualmente, o seu Presidente, não podendo reelegel-o sem que passe o periodo de tres annos. A Côrte de Appellação é o tribunal de segunda instancia, e julga todas as causas que sobem dos tribunaes dos juizes de direito, que são os de 1.ª instancia. A terceira e ultima instancia é constituida pelo Presidente da Côrte de Appellação e pelos presidentes da primeira e da segunda camara da mesma Côrte, que formam o Conselho Superior, o qual tambem resolve os conflictos de jurisdicção das auctoridades judiciaes do Districto Federal, bem como a suspeição opposta aos desembargadores, juizes de direito e ao Procurador Geral. O Ministerio Publico compõem-se de um Procurador Geral, cinco promotores publicos, seis adjuntos de Promotor, um Curador de Orfãos, um Curador de Massas Fallidas, um Curador de Ausentes e de Evento, e de um Curador de Residuos. É o Presidente da Republica quem nomeia todos os juizes e os membros do Ministerio Publico. Funcciona um escrivão privativo em cada uma das pretorias e das varas de direito, havendo tres nas orphanologicas e dois escrivães na Provedoria e Residuos. Os escrivães das pretorias suburbanas exercem as funcções de tabellião. A Côrte de Appellação tem dois escrivães, um para cada _camara_, e um secretario geral. Cada um dos dois tribunaes do jury, é servido por dois escrivães privativos. * * * * * A Chefia de Policia superintende nas seguintes repartições de serviço de segurança publica: —Inspectoria de Policia do Porto. —Inspectoria de Vehiculos. —Casa de Detenção. —Escóla Correccional. —Colonia Correccional. —Gabinete de Identificação e Estatistica. A 1.ª fiscaliza o serviço de embarque e desembarque de passageiros, assim como o movimento das embarcações mercantes. A 2.ª faz a matricula dos cocheiros e carroceiros, depois de submettêl-os a um exame profissional, e regularisa o transito de carros e outros vehiculos, de accôrdo com as posturas municipaes e sob as ordens do 1.º Delegado de Policia. A Escóla Correccional é, tambem, uma instituição de beneficencia, visto que dá educação physica, profissional e moral aos menores, agarrados na via publica, como vadios e gatunos, dos nove aos quatorze annos. Occupa um predio da rua de S. Christovão. A Colonia Correccional está installada na ilha Grande, fóra da barra, e é destinada á rehabilitação de adultos viciosos, por meio do trabalho. É uma grande fazenda agricola e possúe varias officinas e escólas, trabalhadas e frequentadas pela escumalha criminosa da população carioca, ebrios, falsos mendigos, proxenetas, desordeiros e ladrões recalcitrantes. O Gabinete de Identificação e de Estatistica tira o cadastro de todos os presos; trata da identificação de cadaveres desconhecidos e organisa os serviços de estatistica policial e criminal. Tambem photographa os locaes de delicto. A Casa de Detenção abriga, provisoriamente, os presos cujos processos correm os trâmites legaes. Nictheroy A capital do Estado do Rio de Janeiro, mal restabelecida ainda dos grandes estragos que soffreu com a revolta da armada, estende-se, com os seus arrabaldes, da ponta de Gragoatá á da Armação, ambas fortificadas. A travessia, do Rio de Janeiro, faz-se em vinte minutos, nas excellentes barcas, a vapor, da Companhia Cantareira e Viação Fluminense. A cidade não encerra palacios, nem monumento algum digno de nota, porém é agradavel á vista, pelas symetricas e impeccaveis linhas dos seus longos e largos arruados, pelo aceio mantido em todo o perimetro civico, pelas manifestações progressivas que patenteia aos olhos dos visitantes e pela belleza dos seus contornos. D’estes, o mais pittoresco é a praia do Icarahy, que as ondas docemente acariciam, bordada de lindas vivendas ao centro de formosos jardins. Santa Rosa, arrabalde onde os salesianos teem um collegio, é dominado pelo monumento de Nossa Senhora Auxiliadora, estatua dourada sobre uma torre de granito. Do lado da Armação está o gigantesco edificio do Laboratorio Pyrotechnico. É digno de menção o novo predio da Companhia Cantareira, para a estação das barcas. A matriz de S. João Baptista e as egrejas da Conceição, de S. Domingos e de S. Lourenço, elevam as suas torres em limpida e diaphana atmosphera, dominando um feerico panorama, em que a surprehendente bahia de Guanabara, com todos os seus thesouros naturaes, e a paisagem terrestre, assombrosamente arrebatadora, disputam a primazia na formosura e no encanto do conjuncto. Nictheroy e as suas dependencias são servidas por extensas linhas de _tramways_ electricos. Nos arredores ha algumas fabricas, que occupam centenas de operarios. A cidade possúe Escóla Normal, um hospital publico e o Asylo de Santa Leopoldina, para meninas, instituição de caracter particular. Nictheroy é a séde do Governador e de todas as repartições officiaes do Estado do Rio de Janeiro, bem como a residencia predilecta de parte da população que moireja na grande metropole fronteira. Petropolis A ex-cidade imperial, que continúa a ser, de verão, a residencia do Chefe da Nação, do mundo official e do corpo diplomatico, está em lamentavel estado de decadencia, quasi de ruina. O trajecto é um encanto, e muito mais apreciavel por barca e caminho de ferro, a galgar as encostas e contrafortes da Serra dos Orgãos, do que só por terra. No percurso de uma hora, em barca, o observador tem occasião de extasiar-se perante as bellezas naturaes da amplissima Guanabara, salpicada de encantadoras ilhas e ilhotas e circumdada de montanhas ridentes, onde as projecções solares aureolam deslumbrantes panoramas. Desde o portosinho de Mauá que a paisagem muda, por completo, e então o comboio, como uma fita cinematographica, deslisa por entre vegetação luxuriante, realçada por gigantescos e formosos ramalhetes de flôres, que corôam os cimos do arvoredo, e por onde lindos colibris, reflectindo todas as côres da nuance universal, adejam a formosura da natureza e os esplendôres divinos. O trem pára na estação da Raiz da Serra, muda-se de machina e entra-se n’aquella biblica região de primôres e de delicias que os nossos primeiros paes trocaram por uma simples e saborosa maçã. A opulencia vegetativa passa a segundo plano. É a téla que sublima a belleza do céo e o deslumbramento do sol e que além, nos esplendorosos limites do horizonte, põe termo ao assombro da nossa retina e ao supremo encanto da nossa alma. Descrever os innumeros e maravilhosos panoramas que a subida da Serra proporciona ao nosso espirito, é sublimidade que, por sobrehumana, só aos arroubos do genio é permittido attingir. Percorrem-se, na cidade, as avenidas ladeadas de bellas vivendas no meio de formosos jardins e suavisadas pelo deslisar de limpidas aguas; vae-se á Cascatinha, sitio encantador e votado ao mais criminoso olvido; contempla-se e admira-se o ineffavel amplexo da excelsa natureza a povoação tão amimada de primôres; e como se de páramos celestes caissemos em infectado pantano, o nosso espirito divaga da grandeza divina ás miserias humanas. Os buracos das ruas e a lama que os occultam, o capim que começa a invadir os proprios passeios abandonados pela incuria official; frontarias sujas; edificações que se não completam e outras que ameaçam ruina; tudo isso revela, ao forasteiro, quão monstruosa é a inepcia e vergonhoso o desleixo de quem assim trata uma localidade que é um primôr de situação topographica e a residencia dos representantes dos povos nossos irmãos e collaboradores na evolução ascencional para o Progresso e para a Luz. O brio, a dignidade nacional, o simples criterio e bom senso exigem a conservação e o aperfeiçoamento material de Petropolis. Conviver, no meio de um charco, com as summidades diplomaticas que, no Brasil, representam as nações civilisadas de todo o mundo, é provar-lhes que a nação prefere a economia de alguns vintens á subida honra de dignamente fraternisar com os povos que a distinguem com a sua presença e amisade. E um charco será Petropolis, em poucos annos, se continuar a incuria e o abandono das auctoridades brasileiras. Não é acceitavel o argumento de que a municipalidade não dispõem de recursos financeiros. Este é um dos casos excepcionaes em que o governo federal póde e deve intervir por dignidade propria e do paiz que representa. É preciso, porém, regressar e a paisagem, a natureza, Deus, o conjuncto de perfeições que paira por sobre a Terra, na immensidade dos céos, e que a humanidade jámais conseguirá corromper, enlevam-nos, pelos vôos do pensamento e pelos effluvios da alma, até onde a creatura divinisa-se pelo esquecimento eterno e pelo infinito amôr. Apreciação Geral Passando periodica e triumphalmente por todos os numerosos e variados aspectos de povoação colonial, de metropole de um paiz livre e de centro grandioso e bello da actividade humana, em todas as suas brilhantes manifestações, Rio de Janeiro, como desde o berço, terá sempre a aureolar-lhe o vértice glorioso dos destinos, a sua famigerada belleza natural que, sob este especialissimo ponto de vista, a sublima á apotheose de primeira cidade do mundo. A sua esplendorosa situação geographica e topographica foi, genialmente, escolhida para capital de primeira grandeza. Porto de entrada admiravelmente defensavel e tão vasto que, com superabundancia, abrigaria todas as esquadras mercantes e bellicas do nosso planeta; maravilhoso scenario de cordilheiras, serras e montanhas, corôadas de picos gigantescos, caprichosos e como que desenhados e vestidos para enfeite e realce da colossal metropole; valles amenissimos, encostas verdejantes e cabeços que desapparecem no seio das nuvens, onde haurem a frescura e a seiva que alimentam e suavisam a grandiosa cidade; todo esse conjuncto de primôres mantem a capital brasileira em um deslumbramento natural, que é o enlêvo e o supremo encanto dos seus moradores e visitantes. Mas, se tal é o seu aspecto geral, quanto á natureza e á situação geographica, vejamos o que é Rio de Janeiro como cidade, analysando-a detalhadamente, em todas as suas curiosidades. Esse mesmo amplexo, tão apertado quão assombrosamente bello, das preciosidades naturaes que a envolvem, prejudicam a localidade na sua expansão material e civica, difficultando-lhe o desenvolvimento. No centro, como nas extremidades, a povoação esbarra em morros, collinas e outeiros, uns que galgou, cobrindo-os de casaria, outros que procura derrubar, para expandir-se, e ainda alguns, cuja estructura é tão formidavel, que se torna forçoso contornar ou acceitar como limite da cidade. A soberba Avenida Central, algumas ruas largas que a cortam e outras que lhe são parallelas; a magestosa Avenida Beira-Mar; o aformoseamento de largos e praças; a erecção de monumentos publicos e a substituição de velhas edificações, transformaram, em grande parte, o Rio colonial, do Imperio e dos primeiros annos da Republica. A reedificação continúa a par da construcção gigantesca e utilissima do novo porto; novissimas avenidas e outros melhoramentos estão iniciados ou projectados, de modo que, no espaço de um decénnio, a capital brasileira será não só o primeiro centro civico e commercial da America do Sul, mas um dos melhores do globo, como já é o primeiro na incomparavel formosura dos seus contornos. Na execução do extensissimo plano de melhoramentos materiaes não se nota, porém, o criterio que seria para desejar em assumpto de tal magnitude e importancia. É assim que no aproveitamento de velhos arruamentos que ainda servem a povoação, taes como: Ouvidor, Rosario, Hospicio, S. Pedro, General Camara, Theophilo Ottoni e outros que communicam com a Avenida Central, para alargamento d’esses arruados, ou para construcção de novas avenidas, o que terá, impreterivelmente, de realisar-se em futuro mais ou menos proximo, serão sacrificados os grandiosos e artisticos edificios que, na Avenida Central, fazem esquinas com as ruas citadas. Tal não se daria se houvesse o bom senso de não consentir em novas construcções nas proximidades d’esses arruamentos, edificações que, pela sua grandeza, quasi fazem desapparecer, á vista, a já exigua largura d’aquelles. Outro gravissimo erro do governo federal e da municipalidade é a conservação, entre outros, dos morros do Castello e de Santo Antonio, cuja suppressão aproveitaria ás mesmas collectividades, pela acquisição de terreno edificavel; á salubridade e á hygiene publica pela circulação, mais livre, do ar e da luz, e á esthetica da cidade, que ficaria completa e aprimorada. Outros defeitos de menor importancia desapparecerão com o tempo e a boa vontade de dirigentes e dirigidos. Especialmente notavel é a falta de um Jardim Zoologico, digno d’este nome, em um centro como Rio de Janeiro, capital de um dos mais ricos paizes do globo, em quasi todas as especies animaes. O que existe com este nome é deposito particular, vergonhoso e deprimente para o civismo de uma população das tradições da capital fluminense. A burricada das companhias S. Christovão e Carris Urbanos, deve desapparecer, com brevidade, de um centro já abundantemente servido pela tracção electrica. A população mista e bizarra da grande cidade carioca, sendo morigerada e primorosamente hospitaleira está, comtudo, longe de corresponder á grandeza material do Rio de Janeiro e ás proporções civicas, que os seus governantes, homens novos e progressistas, estão a imprimir-lhe. Ella ainda não se adaptou aos costumes dos grandes centros civilisados, onde cada qual trata da sua vida e do bem commum, sem importar-se, por educação e por falta de tempo, com o que faz o vizinho. Nas cidades europeias e americanas, os moradores do mesmo predio não se conhecem, geralmente, limitando-se a cumprimentos de respeito quando, por acaso, encontram-se na escada. No Rio ainda impéra a bisbilhotice, e censuram constantemente os defeitos do proximo aquelles que não se conhecem. Muito ha ainda a fazer, a caminhar no sentido progressivo, n’este como sob outros pontos de vista. Trata-se, todavia, de um paiz novo, insufficientemente preparado nos primôres da civilisação; mas cuja população é intelligente e dotada de energia e de civismo sufficientes para, dentro em poucos annos, ascender ao logar que lhe compete no convivio universal dos povos e das nações. Possuidor de todos os elementos progressistas e civilisadores, de uma natureza uberrima, bellissima e fecunda, de homens eminentes pelas primorosas faculdades de espirito e qualidades moraes que formam os benemeritos da humanidade e da patria, o Brasil, que ainda recentemente impoz-se á consideração universal pelo genio de um dos seus filhos, continuará, ininterruptamente, a caminhar pela senda gloriosa dos seus destinos; e a sua capital, material e scientificamente aformoseada á altura da belleza natural que a sublima, brilhará, perante o mundo, como o vivo e deslumbrante testemunho do incommensuravel poder do genio da humanidade, fundido no cadinho immortal do trabalho, do talento, da justiça e do amôr. INDICE Pag. Razão de Ser 5 Domingo de Ramos 13 Situação e Aspecto Geral 19 Historia 27 Phases Fluminenses 39 Monumentos 45 Egrejas 61 Museus 69 Bibliothecas 77 Jardins e Parques 81 Theatros 91 Cemiterios 95 Curiosidades 99 Estabelecimentos Scientificos 117 Da Carioca ao Somaré 125 Assistencia Publica 129 Beneficencia Particular 145 Batalha de Confetti 193 Instrucção Publica 197 Corcovado 205 Governo Municipal 209 Copacabana, Leme e Ipanema 213 Salubridade 217 Viação Urbana 223 Imprensa 229 Commercio e Industria 233 Porto do Rio de Janeiro 237 Recenseamento 241 Segurança Publica 249 Nictheroy 257 Petropolis 259 Apreciação Geral 263 MONTEVIDEU Situação e Aspecto Geral O nome de Montevideu, que os orientaes-uruguayos escrevem—Montevideo—provém de um cerro, com 149 metros de altura, que se eleva defronte da capital. Encima-o a fortaleza General Artigas. A cidade está situada em uma peninsula da embocadura do Rio da Prata, no extremo sul do departamento de Montevideu, o mais pequeno da Republica, em extensão territorial. O seu porto é formado por vasta e bella bahia, de facillimo accesso, com um ante-porto artificial, que é um arrojo de engenharia, e numerosos cáes acostaveis, quasi concluidos, que farão de Montevideu um dos primeiros portos do mundo. A povoação é toda plana e o clima, regular nas quatro estações do anno, é geralmente ameno. É raro elevar-se a temperatura, no verão, além de 30 graus e no inverno descer a zero. Apenas o vento de sudoeste, ou _pampero_, açoita, por vezes, os mares visinhos, a bahia e a cidade. Esta póde considerar-se dividida em tres secções. A primeira comprehende a primitiva povoação de Zavala, o fundador, desde o extremo oeste até á actual rua da Cidadella. Traçou-a o capitão Millan. A segunda prolonga-se da Cidadella até Egido, e a terceira secção é a novissima cidade, que abrange os antigos bairros de Cordon e da Aguada, bem como a area até ao riacho Miguelete e o caminho da povoação de Propios. Os limites actuaes e officiaes de Montevideu são o arroio Miguelete, desde a sua foz, no Prata, até Propios, ao norte; a éste o caminho de Propios, e ao sul e oeste o rio da Prata. A população total da cidade é de cêrca de 260:000 habitantes, a do departamento de 290:000, e a de toda a Republica Oriental do Uruguay, de 1.250:000 habitantes. O aspecto geral de Montevideu é tristonho. As casas, em geral de um só pavimento e velhissimas, dão-lhe a perspectiva de uma antiga cidade colonial; mas, de espaço a espaço, a monotonia do conjuncto é quebrada por bellas e modernas edificações, algumas com artisticas frontarias. O que muito contribúe para afear as antigas e muitas das modernas casas da cidade, é fazerem as cimalhas em fórma de sacada e de varandas salientes, o que dá-lhes um tom original mas desagradavel á vista e attentatorio da esthetica. As ruas são quasi todas largas e muito arborisadas, porém a vegetação é macilenta e rachitica. Ha lindas avenidas, sendo a principal a _Dezoito de Julho_, com 30 metros de largura. O centro civico de Montevideu é constituido pelas tres praças, da Independencia, da Constituição e de Cagancha, assim como pelas arterias publicas que as communicam, taes como Rincon, Uruguay, Sarandi, Vinte e Cinco de Maio, Vinte e Cinco de Agosto e Zavala. A primeira das grandes praças acima citadas, occupa o centro, é vastissima e ajardinada, como as outras duas, não possuindo edificio algum notavel. As fachadas de quasi todos os predios que a circundam, assentam sobre columnas. Na praça da Constituição avultam a Matriz, e os edificios do Jockey-Club, do Grande Hotel e da Representação Nacional, antigamente do Cabido. O Atheneu e o Museu e Bibliotheca Pedagogicos, são as melhores construcções da praça Cagancha, tambem conhecida pelo nome de Liberdade, por ostentar, ao centro, o monumento da Liberdade, uma figura feminina, de bronze, sobre alta e elegante columna de granito. Depois d’estas, as melhores praças da capital uruguaya são as de Trinta e Tres e do General Flôres. Todas, bem como as ruas principaes, são illuminadas a profusão de arcos voltaicos, ou de fócos electricos, sendo pelo mesmo systema a illuminação geral de toda a cidade. Numerosos canaes subterraneos conduzem do rio Santa Lucia, a sessenta kilometros de distancia, abundancia de agua potavel para abastecimento da cidade. D’entre os mais notaveis edificios de Montevideu, sobresahem, além dos já citados, a Universidade, a Camara Municipal, o Monte de Piedade, o Theatro Solis, a Estação Central, o Manicomio, o Banco Britannico, as casas de Jackson, de Golorons e de Chiarino; os templos da Aguada, Metropolitano, de S. Francisco, de Cordon e dos Redemptoristas; os hospitaes Italiano, Hespanhol, Militar e da Caridade; os asylos dos Expostos e de Mendigos; a Bolsa; a Escóla de Artes e Officios; o Palacio do Governo e o Seminario Conciliar. Ha outras construcções particulares notaveis, principalmente algumas sédes bancarias. Porém, os principaes monumentos de Montevideu consistem nas suas instituições de Educação e de Beneficencia. Estas, então, são modelares. O Manicomio e os asylos de Expostos e de Mendigos, fariam honra e dariam gloria ás maiores metropoles do nosso globo. É que a população de Montevideu é essencialmente caritativa e affavel. Em parte alguma poderá haver quem exceda o montevideano em extremos de hospitalidade, de cortezia e de carinho. As senhoras, vestindo com elegancia e estonteadoramente formosas, dardejam scintillações astraes no taciturno aspecto da velha cidade. Por toda a parte o forasteiro sente-se bem; gosa e aprecia as delicias de um grande centro, eminentemente progressista, metropole de um paiz pequeno, mas admiravelmente bem organisado e dotado de instituições que o honram e glorificam, sublimando a grande familia humana aos esplendôres da civilisação e do amôr universal. Historia Com a designação de _San Felippe de Montevideo_, o general Bruno Mauricio de Zavala, que desempenhava, em nome do governo hespanhol, o cargo de governador de Buenos-Aires, mandou delinear uma nova povoação, na embocadura do rio da Prata. Em 24 de Dezembro de 1726, o capitão D. Pedro Millan, por nomeação do Governador, começou a abertura das ruas e a repartição dos terrenos para as primeiras edificações. Oito familias, compostas por 33 pessôas, foram os primeiros povoadores da novissima localidade, que já em 1770 contava mil e cem habitantes. As primitivas construcções eram de couro, com estacas, empregando-se a pedra, com cobertura de palha, nas melhores edificações. A 1 de Janeiro de 1730, Zavala creou a primeira instituição de Montevideu, o Cabido, especie de municipalidade, composta de 9 membros. O fundador mandou cercar de muralhas a nova povoação. O coronel José Joaquim de Viana, foi o primeiro governador civil e militar de Montevideu, nomeado em 1749. Em 1796 inaugurou-se a primeira escóla publica, sendo construida a casa, para o seu funccionamento, em um terreno doado por D. Maria Clara Zavala de Vidal. Ao alvorecer do seculo XIX, a população da nova cidade já era superior a 15:000 habitantes. Em 1807, Montevideu foi tomada pelos inglezes, sob o commando de Beresford, que muito pouco tempo depois a abandonaram, assignando a capitulação de Buenos-Aires. A primeira eleição popular, livre, fez-se em 1808, para a Junta do Governo. No anno seguinte começou a evolução emancipadora, que em 1809 transformou-se em revolução, sendo abafada pelas tropas hespanholas, que até 1814 resistiram dentro dos muros da cidade, aos caudilhos da independencia nacional. Finalmente, em 1815, o general Artigas entrou em Montevideu, arvorando nas suas muralhas a bandeira oriental—uruguaya. Dois annos depois, a capital foi tomada pelos portuguezes, em seguida á batalha de India Muerta, cujo effeito os combates de Rincon, Sarandi e Ituzaingó destruiram, voltando a famosa cidade á unidade nacional. Desde 1 de Maio de 1829 que Montevideu é a capital official da Republica Oriental do Uruguay. Esta cidade foi uma formidavel praça de guerra e é hoje um grandioso centro civico e commercial. A primeira fortificação foi levantada dois annos antes da fundação da localidade, no intuito de resistir aos portuguezes, que em 1723 tinham-se apoderado da peninsula de Montevideu, abandonada pelos hespanhoes. As muralhas, cuja construcção começou com a da cidade, communicavam com a Cidadella, elevada no local occupado hoje pela praça da Independencia. D’ahi seguiam até ao _portão de S. Pedro_, agora rua Vinte e Cinco de Mayo, entre Juncal e Cerro, e d’ahi até ao Cabo do Norte, na costa maritima. Ahi existia um cordão de baterias para proteger as _Bóvedas_, deposito de material de guerra. O _Cabo del Sur_, completava as fortificações exteriores de Montevideu, que assim resistiu a um cêrco de nove annos, de 1843 a 1851, ao cêrco de Artigas, de 1812 a 1814. A batalha de Guayabos, ganha pelo general Artigas ás tropas hespanholas, deu-lhe não só, em 1815, a posse da cidade, como ensejo á proclamação da independencia nacional, perturbada, em 1817, pelos portuguezes, e consolidada pela conquista das Missões e pelos feitos de armas de Ituzaingó, Rincon e Sarandi. Depois de quasi dois seculos de luctas pertinazes e gloriosas, começando pelas dos indigenas, que tornaram difficil a existencia dos primeiros habitantes, pretendendo mesmo destruir o primitivo nucleo civico, Montevideu é hoje uma grande cidade, residencia dos altos poderes da nação e destinada, pela admiravel situação geographica, pelo seu amplo e magnifico porto e pelo trabalho e patriotismo dos montevideanos, aos mais brilhantes destinos. Assistencia Publica _Hospital de Caridade_—O maior e mais importante de Montevideu. Foi fundado no anno de 1809, por doação de Francisco Antonio Maciel. A média annual de doentes é de sete mil. É um grande edificio, em 3 pavimentos, pessimamente situado no centro da cidade e nas proximidades do porto. No primeiro pavimento estão duas enfermarias cirurgicas, para o sexo masculino, uma enfermaria para militares, sala de operações cirurgicas, a pharmacia e uma enfermaria ophtalmologica. Nota-se, na sala das operações, a falta de apparelhos especiaes, cirurgicos, se bem que ahi trabalhe o dr. Navarro, primeiro cirurgião da Republica. No segundo pavimento ha uma enfermaria mista de medicina e cirurgia, para presos; enfermaria de partos e sala de operações da especialidade; enfermaria geral de medicina, para mulheres; enfermaria geral cirurgica, feminina; enfermaria para venereos, masculinos; sala de operações para homens; sala e enfermaria para officiaes militares, pensionistas do Estado, e mais duas enfermarias de medicina e uma de cirurgia, para homens. No rez-do-chão estão installados os depositos geraes do estabelecimento, entre elles o de cadaveres, bem como as cosinhas e as despensas. O edificio tem quatro pateos interiores. Em um d’elles está a sala de autopsias e dois são ajardinados. Nota-se pouca limpeza e, em consequencia, o odôr pronunciado e caracteristico dos hospitaes que, como este, são indignos de uma cidade da cathegoria de Montevideu, e deprimentes para o seu glorioso renome de beneficente e altruista. * * * * * _Manicomio_—Foi fundado em 25 de Maio de 1880, pelo governo do general Santos. É construcção vasta e dividida em dois pavilhões, um para cada sexo. O das mulheres é servido por irmãs de caridade. O serviço interno é feito por cinco medicos, um cirurgião e cinco praticantes. Á entrada, entre os dois pavilhões, está o estabelecimento hydrotherapico, com excellente installação. Salão de recepção. Sala provida dos mais modernos e aperfeiçoados apparelhos, para a cura pela electricidade. Enfermaria de observação de alienados, com banheiros. Secção especial de pensionistas, com pequenos pavilhões, e jardins privativos. Pavilhões, na cêrca, para observações. Grande pavilhão—lavanderia que prepara a roupa de todas as casas de caridade da capital. Officinas de carpintaria, mechanica, e de trabalhos manuaes. Quinta-pomar, entretida pelos doentes brandos, e que fornece o estabelecimento. Pavilhão com uma enfermaria de cirurgia, outra de medicina, salas de operações, de radiographia e consultorio odontólogico. Bibliotheca da especialidade. Pharmacia especial. Capella com torre, e interiormente revestida de marmores diversos. Grande cêrca e jardins com apparelhos para gymnastica e outros exercicios. Existencia de 1:500 alienados, de ambos os sexos. Ao contrario do Hospital de Caridade, nota-se n’este estabelecimento primoroso aceio. * * * * * _Asylo de Expostos e Orfãos_—Deve-se a sua fundação, em 7 de Outubro de 1818, á iniciativa do vigario D. Damaso Larreñaga, e do general portuguez Sebastião Pinto de Araujo Correia. Ao principio esteve este estabelecimento aggregado ao Hospital de Caridade. O actual edificio foi começado a construir em 1873 e concluido e inaugurado em 1875. Este Asylo é mantido pelo Estado, seu proprietario, e administrado pela Commissão de Caridade e Beneficencia Publica, entidade de nomeação official e que tambem superintende nos outros estabelecimentos de assistencia publica, de Montevideu. Em Maio de 1908 tinha uma existencia de 220 varões, de 3 a 17 annos, e de 180 meninas, que são admittidas dos 3 aos 18 annos. Abriga e sustenta orfãos e expostos na roda do estabelecimento, ou entregues pelos paes com o pretexto de indigencia. Ha cinco dormitorios para meninos e seis para meninas, todos bem ventilados e com muita luz. Escóla gratuita para meninas externas; enfermarias especiaes para syphiliticos e tuberculosos; ditas para enfermos de olhos e dos ouvidos; sala de operações cirurgicas, estufas de desinfecção, pharmacia e enfermarias de convalescentes e de observação. As creanças recem-nascidas e abandonadas, são entregues a amas que as criam fóra, e restituem ao Asylo, aos tres annos de edade. A pharmacia, além do estabelecimento, tambem serve a pobreza da cidade, despachando, diariamente, a média de 250 receitas. Consultorios medicos, interno e externo, e enfermaria de herpeticos. Este edificio está situado na rua do Salvador e tem uma area de 5:600 metros. A manutenção do Asylo custa ao Estado, mensalmente, quinze contos de réis. A Commissão administradora substituiu, ultimamente, as irmãs que faziam o serviço d’esta casa de caridade, por pessoal laico, tambem feminino, porque, no seu fanatismo, as irmãs martyrisavam as creanças com praticas religiosas, em excesso, e que principiavam de madrugada. * * * * * _Asylo de Mendigos e Chronicos_—Este edificio, situado na rua Larravide vale, com o terreno annexo, cêrca de trezentos contos de réis, moeda portugueza. Foi principiado a construir para universidade, depois vendido a particulares e, finalmente, comprado pelo Governo, em 1852. O Asylo foi fundado por decreto de 22 de Novembro de 1858, e inaugurado em 19 de Agosto de 1860. Ao centro eleva-se uma grande torre, que domina a cidade e os arrabaldes. Os fins principaes d’este estabelecimento de caridade, são alojar e alimentar anciãos dos dois sexos, que tenham, pelo menos, sessenta annos de edade, e chronicos desamparados, de qualquer edade. Ha dois grandes pateos centraes circumdados de dois pavimentos de varandas abertas e em columnata. A secção masculina encerra 8 enfermarias-dormitorios, 2 enfermarias de cancerosos e uma de chronicos; pharmacia e laboratorio. Na secção feminina ha 4 enfermarias geraes e 5 dormitorios, uma enfermaria de chronicas e outra de cancerosas. Além d’estas, o Asylo encerra 2 enfermarias para creanças, uma para cada sexo. O numero de asylados é de 690, entre homens e mulheres. Em face d’este Asylo e annexo ao seu serviço e administração, estão o Collegio de S. José e o Asylo Maternal n.º 4. Ahi são admittidos os varões até aos 7 annos, e as meninas até aos 16. São estabelecimentos de educação, o Collegio para o sexo masculino e o Asylo para o feminino. Teem classes de engommadeiras, costureiras, cosinheiras e bordados. Para meninos ha apenas a classe geral de primeiras lettras. * * * * * _Hospital Pereira Rossel_—É o nome do casal que doou o terreno para a edificação do hospital. Está situado no bairro das Tres Cruzes, _boulevard_ Artigas. Foi fundado em 1894, e inaugurado em 22 de Fevereiro de 1908. É especialmente destinado ao tratamento de creanças de ambos os sexos. Possúe uma grande cêrca com um pavilhão de isolamento. Em outro pavilhão, tambem isolado, estão installadas as cosinhas. As secções principaes são os gabinetes ophtalmologico, de radiographia, de observações; o laboratorio, a pharmacia, a sala de operações e a casa de banhos. Encerra varias enfermarias, em separado, para meninos e meninas, uns e outras admittidos só até á edade de 14 annos. Existencia, em Junho, de 1908 de cincoenta doentes dos dois sexos. * * * * * Além d’estes estabelecimentos officiaes, administrados pela Commissão de Caridade e Beneficencia Publica, existem, em Montevideu, as Escólas Maternaes, em numero de 4, casas de caridade que abrigam, sustentam e educam creanças de ambos os sexos. Estão sob a mesma administração official. Ha ainda o _Asylo Nocturno_, na rua Estanzuela, n.º 7, para abrigar os que não teem onde dormir e a _Assistencia Medica Nocturna_, para soccorros nocturnos urgentes. Funcciona na rua 18 de Julho, n.º 285. Directamente subordinado ao Ministerio da Guerra, está o Hospital Militar, installado no Caminho de Outubro, n.º 239. Na rua de Larrañaga, em Buceo, ha uma casa de isolamento, para infecciosos. Egrejas _Cathedral_—A Sé, Matriz, ou Metropolitana, como lhe chamam os montevideanos, ergue-se na praça da Constituição. A frontaria é de granito, vistosa, mas de vulgar architectura. Tres magestosos portões de ferro, gradeados, dão accésso ao templo, depois de atravessado o simples vestibulo. O portão central é ladeado por 4 meias-columnas caneladas. No interior, ha tres espaçosas naves formadas por quatro pesados arcos de granito, encimados por outras tantas tribunas gradeadas e em arcaria. Nas naves lateraes, estão 4 altares á esquerda e tres á direita de quem entra, todos guarnecidos de columnas caneladas e douradas. Logo á entrada, vê-se o tumulo de marmore, com estatua ajoelhada, de D. Jacintho Véra, 1.º bispo de Montevideu. O templo é em forma de cruz latina, e transposto o corpo principal, depara-se com mais dois altares, que rematam os braços da cruz. Ladeando o altar-mór estão duas capellas fundas, com os altares no mesmo estylo dos anteriores. A capella-mór é simples; apenas o altar ostenta oito columnas caneladas e douradas. O aspecto geral d’este santuario é pesado e sombrio. Data de 102 annos. Na crypta da capella da Virgem das Dôres, está sepultado D. Venancio Flôres, grande general da Republica. * * * * * _La Aguada_—É a parochial da freguezia de _Nuestra Señora del Carmen de la Aguada_, e eleva-se na rua Graciana. A frontaria d’este santuario é elegantissima, em estylo Renascença, com duas altas e bellissimas torres, tudo de cantaria. Interiormente é dividida em tres naves, não correspondendo o estylo decorativo á belleza artistica do exterior. As naves são formadas por oito arcos de pedra, revestidos de estuque e rematados por outras tantas tribunas abobadadas e gradeadas de ferro. Ha seis altares lateraes, cada um a duas columnas caneladas, de marmores de côres. O templo é em forma de cruz latina, com dois altares nas extremidades dos braços da cruz, e outros dois ladeando a capella-mór, que é de estylo simples mas elegante, e cujo altar é ornamentado por 6 lindas columnas de roseo marmore, 4 caneladas e 2 salomonicas. A Virgem do Carmo, que está no altar-mór, é uma obra prima, de madeira, e feita em Barcelona. A balaustrada que precede a capella-mór, é uma maravilha em marmore branco, de Carrara, executada em Genova. Finge uma cortina franjada e sustentada por anjos. O templo encerra dois crucifixos de muito valor; um que rematava o tumulo do general Artigas, e outro cuja cruz enorme, é de uma só peça de marmore preto. Cada um tem 5 metros de altura. * * * * * _Seminario_—Egreja em tres naves, com zimborio. Estylo simples. São notaveis os altares, rica e artisticamente dourados. O da capella-mór é de imponente aspecto, guarnecido a columnata, tambem dourada. * * * * * _Cordon_—Templo em estylo grego. Fóra, o frontão é sustentado por 4 columnas jonicas, e interiormente, ha vinte columnas, desde a entrada ao altar-mór, que sustentam a architrave. Esta é sobreposta de janellas, que illuminam o santuario. Dois dos altares lateraes teem columnas de marmore mesclado, ao passo que a grande columnata decorativa é em marmore fingido. * * * * * _S. Francisco_—Vistosa fachada granitica, e interior de simples estylo e grandioso aspecto. Fórma a cruz latina e encerra tres naves com seis arcos e duplas tribunas. Sobre estas, outras tantas janellas com vitraes coloridos. O altar-mór é dourado e subdividido em nichos. * * * * * _Capuchinhos_, ou _Santo Antonio_—Santuario em tres naves, sem importancia alguma architectonica. No altar-mór vê-se uma pintura valiosa. As outras egrejas de Montevideu, são _Salesias_, _Huerto_, _Tierra Santa_, _Reducto_, _Concepcion_, _Dominicos_, _Pocitos_, _Paso del Molino e Redentoristas_. Beneficiencia Particular _Hospital Italiano Humberto I_—A pedra fundamental d’este bellissimo e incompleto edificio, foi solemnemente lançada em 21 de setembro de 1884, em substituição de outro hospital que já havia sido fundado pela colonia italiana de Montevideu. Está situado em Tres Cruzes, nas proximidades do Hospital Rossell. A edificação apenas abrange a quinta parte do plano geral. Tem dois pavimentos, abrindo o primeiro, ou nobre, para uma especial varanda circular, guarnecida a grupos de columnas de marmore, por onde passeiam os convalescentes, quando o tempo o permitte. Vê-se ahi o marmoreo busto de Victor Manoel II. Ha quatro enfermarias geraes, duas pagas e duas gratuitas, uma sala de operações, excellentemente montada; uma outra de curativos, pharmacia, laboratorio, rouparia e oito quartos para pensionistas. É servido por sete irmãs capuchinhas, enfermeiras. Em Junho de 1908, abrigava 50 doentes do sexo masculino. * * * * * _Hospital Hespanhol_—Foi fundado ha 19 annos, pelos principaes membros da colonia hespanhola, para tratamento dos seus compatriotas domiciliados no territorio da Republica Oriental do Uruguay, mas ainda será inaugurado no proximo anno. O edificio, em via de conclusão, é em dois pavimentos, com 2 enfermarias já promptas e duas a preparar. Está situado na Avenida do General Garibaldi. * * * * * Ha tambem um hospital privativo da colonia ingleza, na rua Juan Cuestas, n.º 77. Edificios Publicos _Palacio da Representação Nacional_—Este edificio, onde funccionam a Camara dos Deputados e o Senado, foi construido em 1890, e eleva-se na praça da Constituição. A sala onde se reunem os deputados é estreita e comprida, tem o tecto abobadado, galeria para o publico e logares reservados para a imprensa e o corpo diplomatico. Não tem tribunas. Ha assentos para 87 deputados e seis ministros. Por detraz da meza da presidencia está o retrato, a oleo, do general Artigas. O Senado, que funcciona no mesmo pavimento, está installado em sala maior e lisa de tecto. As cadeiras para senadores são apenas 19, porém é n’esta sala que reunem-se as duas assembleias, nas occasiões solemnes. Decoram-n’a os retratos de Artigas e Flôres. As cadeiras são de talha e forradas a velludo azul e carmesim. Projecta-se a construcção de um verdadeiro e grandioso palacio para as duas camaras. Nos baixos d’este velho edificio, está a repartição central da policia. No pavimento superior, ha uma sala com os retratos, a oleo, dos personagens constituintes da Republica. * * * * * _Palacio da Presidencia da Republica_—Está situado na praça da Independencia, centro civico de Montevideu. É modestissimo, exterior como interiormente. Consta de um só pavimento. A frontaria assenta sobre columnas lisas, que enfrentam a praça. No rez-do-chão, á entrada, está installada a chefatura de policia. Subindo-se a escada de marmore, que tem grade de ferro e corrimão dourado, depara-se com a saleta de espera, mobilada a velhas cadeiras de pau preto, com fôrro de velludo carmesim. Depois entra-se no unico salão do edificio, que serve para recepções officiaes. É decorado a sanefas e cortinados de velludo vermelho-escuro, que tambem forra as cadeiras, de madeira preta. Completam a guarnição, tres grandes espelhos emmoldurados a metal dourado, um lustre pendente do centro do tecto e uma grande mesa de pau preto, com trabalho de talha. Segue-se a casa do Despacho, ou Secretaria, que nada contem de notavel. Não ha, por certo, em todo o nosso planeta, menos sumptuoso palacio de Chefe de Estado, o que impressiona muito agradavelmente o visitante, especialmente por tratar-se de um paiz democratico e que não é uma grande potencia, sem deixar de ser importante. As grandes como as pequenas Republicas da Terra, ou antes, as verdadeiras democracias, que gosam da unica fórma racional de governo, deviam todas inspirar-se na simplicidade burocratica da Republica Oriental do Uruguay. O dinheiro do contribuinte deve ser applicado no desenvolvimento economico das collectividades sociaes e politicas. Estradas, caminhos de ferro, escólas, hospitaes, asylos, protecção á lavoura, ao commercio e á industria, eis o que deve occupar a attenção dos governantes e em que deve ser gasto o dinheiro dos governados. * * * * * _Camara Municipal_—É linda e artistica a perspectiva exterior da municipalidade; porém o interior, por pequeno, é insufficiente ao serviço municipal, motivo porque quatro das repartições camararias estão installadas em outro local. É em tres pavimentos, accessiveis por bella escadaria de marmore branco, com duas tribunas-terraços sobre o pateo. Foi adquirido, este edificio, ha quarenta annos, pela municipalidade, a um particular. Além da escada apenas encerra de notavel a sala das sessões e a bibliotheca, installada no rez-do-chão, com 2:500 volumes. Universidade Santiago Vasquez iniciou a creação d’este grandioso instituto scientifico, fundado pelo dr. Manuel Herrera y Obes, e inaugurado em 18 de Julho de 1849, no actual edificio. Anteriormente, já a universidade de Montevideu funccionava no extincto convento de S. Francisco. O palacio é imponente e de bella architectura; porém está situado em péssimo local, nas proximidades do porto. Em uma das principaes e novas avenidas da capital, procede-se á construcção de um novo edificio para séde d’este importantissimo estabelecimento scientifico. Além de laboratorios e pequenos museus especiaes para cada faculdade, são notaveis as bibliothecas de Direito e Sciencias, com mais de 11:000 volumes; de Medicina, com 13:000; da Faculdade de Mathematica, com 5:000; a do Instituto de Hygiene Experimental, com 2:000; e, finalmente, a do Ensino Secundario, que contem 10:000 volumes. N’este particular, é a universidade de Montevideu uma das primeiras do mundo. Funccionam as seguintes Faculdades: —De Direito e Sciencias Sociaes.—De Medicina.—De Commercio.—De Mathematica.—De Agronomia e Veterinaria. * * * * * Á Universidade está annexo o ensino secundario, ou seja, officialmente, o Curso Geral de Preparatorios, comprehendendo as seguintes materias: Grammatica Hespanhola, Latim, Francez, Geographia, Arithmetica, Algebra, Geometria e Trigonometria, Physica, Cosmographia, Historia Universal, Historia Americana e Nacional, Chimica, Historia Natural, Botanica, Zoologia, Zoographia, Litteratura, Philosophia, Desenho, Ampliação de Mathematicas e Gymnastica. * * * * * Ha ainda tres cursos geraes annexos ao ensino universitario, e que são os de Pharmacia, Odontologia e Obstetricia. O plano de estudos do primeiro comprehende: —Chimica ampliada.—Physica Pharmaceutica.—Historia Natural Pharmaceutica.—Chimica Pharmaceutica. —Analyses Chimicas.—Materia Pharmaceutica.—Pharmacia Galénica.—Toxicologia e Posologia. A Odontologia abrange: —Systema Dentario e Anatomia da Bocca e Pharinge.—Pathologia da Bocca e Dentaria.—Therapeutica Dentaria.—Prothese Dentaria.—Chimica Odontologica. No curso de Obstetricia ensina-se: —Anatomia e Physiologia Preparatorias.—Obstetricia.—Clinica de Partos. * * * * * Em 1906 inscreveram-se em todas as secções de ensino 1:212 alumnos; entraram a exame 858; foram approvados 596 e reprovados 262. Os doutores mais graduados gosam de viagens gratuitas á Europa, ou aos Estados Unidos, durante dois annos, para aperfeiçoaram-se nas sciencias em que obtiveram diplomas. Museus _Museu Nacional_—1.ª secção e 1.º salão. Historia Natural. Numeroso mostruario, em armarios e vitrinas, de peixes, volateis e de quadrupedes do paiz. Duas enormes couraças, restauradas, do _Panochthus_ (fossil da ordem dos desdentados). Ninhos e ovos. Mostruario mineral-uruguayo. Medalhas e moedas da Republica e estrangeiras. Vasos antigos. Ceramica nacional. Saleta, ao lado, com varias cópias, em gêsso, de obras primas da esculptura greco-romana. Secção de Bellas Artes. Sala com varios quadros e algumas cópias de esculptura. Dois gabinetes, contendo quadros de pintores nacionaes. Sala com quadros, bustos e moveis antigos. Sala Historica. Encerra vitrinas com exposição de objectos historicos, que serviram nas campanhas pela independencia da patria uruguaya. Placas commemorativas. Retratos, a oleo, de personagens notaveis da Republica. Tratados e diplomas. Dois gabinetes contendo bustos, quadros, moveis, armas, munições e outros objectos historicos. Prélo portatil em que foi impresso o primeiro jornal do Rio da Prata, o _Telegrafo Maritimo_, em 1750. Foi tomado pelo general oriental Rivera ao seu collega argentino Echagüe, na batalha de Cagancha, em 1839. * * * * * _Museu Pedagogico_—Está installado em um predio da praça da Liberdade, ao lado do Atheneu. Encerra, em varias salas, gabinetes e corredores, numeroso mostruario de objectos escolares para todas as classes de ensino, taes como bancos, mesas, pedras, indicadores, esqueletos humanos e de irracionaes, instrumentos geographicos, bustos e modêlos em gêsso, etc., etc. Tribuna historica, de madeira, de cujo ambito José Pedro Varella, preleccionava em favor do desenvolvimento da instrucção. Busto, em bronze, do mesmo educador. Sala especial de hygiene escolar. Amostras de cereaes do paiz. Salas para leitura, trabalhos e conferencias publicas. Este utilissimo estabelecimento, que apenas é dotado, pelo Governo, com a mensalidade de réis 400$000, contem as seguintes secções: —Productos Nacionaes.—Jardins de Infancia e Trabalhos Manuaes.—Geographica.—Hygienica-Escolar.—Encyclopedica.—Historica.— Archeologica.—Iconographica.—Bibliotheca.—Photographica.—Officinas.— Galerias. * * * * * Ha tambem os museus privativos da Universidade, além de muitas collecções particulares. Bibliothecas _Bibliotheca Nacional_—O predio que contem esta Bibliotheca é uma construcção sem importancia architectonica, situado na esquina das ruas Florida e Mercedes. A bibliotheca foi fundada por Damaso Antonio Larrañaga, e inaugurada em Maio de 1816, sendo o seu iniciador o general Artigas. A existencia actual é de 42:500 volumes em 27:000 obras. Ha mais 185 gravuras e photographias, 63 peças musicaes e 197 mappas e planos. O estabelecimento lucta com a falta de espaço e de luz. Os gabinetes que encerram livros são acanhados e escuros. O salão geral de leitura ostenta os retratos de Larrañaga e do general Artigas. Em 1907, o numero de leitores foi de 9:871, que consultaram 12:310 obras. Em toda a Republica foram publicadas, em 1906, 112 obras, por auctores nacionaes. No mesmo anno publicaram-se, em todo o paiz, 241 diarios e periodicos. A casa, além de muito pequena, é velhissima, esperando-se que, muito brevemente, o Governo faculte mais decente installação á Bibliotheca Nacional. * * * * * _Bibliotheca Pedagogica_—Occupa o mesmo edificio do Museu Pedagogico. É dividida em theorica e didactica e foi, assim como o Museu, creada por decreto de 5 de Janeiro de 1889, sendo presidente da Republica o general D. Maximo Tajes, e ministro da instrucção publica, o douctor Martin Berinduague. A ideia da fundação partiu do actual director, Alberto Gomez Ruano. A _Noticia Historica_, sobre esta Bibliotheca e Museu, publicada pelo actual director, não menciona o numero de exemplares contidos n’esta collecção de livros. * * * * * Depois d’estas, as bibliothecas mais importantes de Montevideu, são as universitarias, já mencionadas, e em numero de cinco, com um total de 42:850 volumes que, em 1906, foram visitadas por 58:745 leitores. A de maior movimento foi a do Ensino Secundario, que teve 36:200 leitores, seguindo-se-lhe a da Faculdade de Medicina, com 10:476, a da Faculdade de Direito com 8:471 e a da Faculdade de Mathematica, com 3:599 leitores. Commercio _Bolsa_—Funcciona em bello edificio proprio, situado na rua Zavala e comprado, em 21 de Janeiro de 1907, pela _Camara de Comercio_, e pela quantia de 150:000 pesos uruguayos. A instituição foi fundada em Junho de 1875, com o nome de _Centro Comercial_. Este Centro foi substituido pela _Bolsa de Comercio_, com caracter de sociedade anonyma, e cujos estatutos foram approvados em 17 de Julho de 1907. O seu capital é de 110:000 pesos, em ouro, representados por 500 Acções, de preferencia e de 200 pesos. A _Camara de Comercio_ dirige os destinos d’esta aggremiação e ha uma Commissão de Correctores, d’ella derivada. O recinto das operações, vasto hemyciclo rodeado pelos escriptorios dos correctores, é muito animado, nos dias uteis, das 2 ás 4 horas da tarde. Ás 3 horas começam os pregões publicos. A somma total das operações effectuadas n’esta Bolsa, em 1907 foi de 91.384:518:61, moeda uruguaya, valor nominal, e de 59.725:700:99, valor effectivo[3]. Balanço Demonstrativo do Activo e Passivo da _Bolsa do Comercio_ de Montevideu, em 31 de Dezembro de 1907: ACTIVO Edificio da Bolsa, seu custo 155:000:00 Acções de preferencia, a emittir: 54 Acções, saldo das 500 fixadas pelos Estatutos, correspondendo 446 aos senhores socios 10:800:00 Acções ordinarias: 1:000 Acções a 10 pesos 10:000:00 10 Acções do Banco Comercial de 400 pesos, custo 4:300:00 Saldo, em conta corrente, no Banco Commercial 3:476:20 Dinheiro em caixa 345:35 Valor de moveis e utensilios 4:438:31 Recibos a cobrar (subscripção) 2:479:00 » » » de socios 950:00 » de alugueis, a cobrar 417:00 ---------- 192:205:86 PASSIVO Capital 110:000:00 Saldo das Obrigações Hypothecarias emittidas para a compra do edificio 79:200:00 Lucros realisados desde 1 de Outubro a 31 de Dezembro 3:005:86 ---------- 192:205:86 Na mesma época existiam 450 socios contribuintes. * * * * * _Alfandega_—Installada em amplo e velho casarão, apenas interessante pelo movimento e pelo grande numero de armazens e de dependencias em que é subdividido. O movimento geral em 1907, foi o seguinte: Navios de véla e a vapor, entradas, 2:325; saídas, 1:652. Total, 3:977. Toneladas de registro: Entradas, 3:134:446; saídas, 1:959:113. Total, 5:093:559. Carga effectiva: Entrada, 1:227:428; saída, 373:783. Total, 1:601:211. Os direitos sommaram:—Importação, 11:895:656:44. Exportação, 1:467:941:38. Total, 12:863:597:82. Faceia a Alfandega um amplo e formoso cáes acostavel a embarcações de qualquer calado, que faz parte das importantissimas obras do novo porto, em via de conclusão. Outr’ora os transatlanticos fundeavam ao largo, na linha do horizonte. Ha poucos annos construiu-se um ante-porto, para abrigo e fundeadouro das grandes embarcações, e n’este momento trabalha-se activamente na breve conclusão de cêrca de 2:000 metros de excellentes cáes acostaveis, intermeados de dócas e com uma profundidade de 7 e meio metros. Durante o anno de 1907, a Republica Oriental do Uruguay exportou 43:286:827 kilos de lã; 22:850:497 kilos de trigo; 2:217:505 kilos de milho e 500:000 cabeças de gado. É este o principal commercio da Republica, que para aperfeiçoamento das suas diversas especies productoras importou, em 1907, 540 animaes de raça bovina, 2:282 de raça ovina e 181 da raça equina, especialmente dos Estados Unidos, da Allemanha, da Nova Zelandia, da Suissa e da Inglaterra. O movimento industrial não é tão importante, se bem que em Montevideu e nos suburbios, já existam algumas fabricas de cortumes, vidros, calçado, roupas brancas, etc. [3] O peso uruguayo vale, approximadamente, 1:000 réis portuguezes. Parques _Villa Dolores_ (Jardim Zoologico)—Este encantador parque, uma das principaes curiosidades da capital uruguaya, está situado nas proximidades da praia de Pocitos. É propriedade de D. Aleixo José de los Rios. A entrada custa apenas 20 centimos. Apesar de ser variada e interessante a collecção zoologica, com numerosos e bellos exemplares de bipedes, quadrupedes e de reptis, o que mais delicia o visitante é a lindissima decoração de todo o recinto. Desde o minusculo museu de historia natural, á entrada, aos lagos, cascatas, mirantes, estatuas, pontes, fontanarios, chalets elegantissimos e jardinetes, caprichosamente tratados, tudo prende e satisfaz o observador, revelando o finissimo gosto do proprietario. Porém, o que de mais original e curioso a _villa_ encerra é o cemiterio dos irracionaes. Pequeno e encantador, elle revela-nos a saudade dos donos aos seus bichos mais queridos, em numerosos jazigos, alguns com figuras jacentes, grupos allusivos e dedicatorias. Predominam, como é de justiça, os sepulchros caninos, muitos com estatuas, bustos e medalhões dos fieis lebreus, ao lado de sentidissimas phrases gravadas, a buril, no marmore e no granito. Todas as sepulturas teem cercaduras floridas, vendo-se tambem, além dos tumulos especiaes, uma valla commum a cada especie representada na collecção. * * * * * _Parque del Prado_—É o Bosque de Bologna de Montevideu. Accessivel por dupla e formosa avenida de eucalyptos, elle prolonga-se e desenvolve-se em amplas e frondosas alamedas, ruas, caminhos, clareiras, tanques, lagos e espaçosos relvados. Encerra lindos e artisticos fontanarios, cafés cantantes e uma esplendida e luxuriante vegetação. Aos Domingos, principalmente, é no seu ambito que palpita a vida montevideana no que ella tem de mais valioso e distincto. Pelas alamedas centraes desfilam as ricas e as modestas equipagens, os cavalleiros, os cyclistas e os automobilistas, vendo-se nos arruados lateraes, e em muitos outros que atravessam o parque, milhares de senhoras e de cavalheiros, apuradamente vestidos, que ora desfilam, ou enfileiram-se, observando-se, trocando-se olhares de curiosidade, de admiração, de indifferença ou de amôr. Ao mesmo tempo, uma banda marcial fere-nos os tympanos com duvidosas harmonias, e nos cafés ao ar livre, cantores dos dois sexos despedaçam as gargantas em berros inconcebiveis. Faz-se noite e a concorrencia não diminue, continuando a passeiata á luz de grandes arcos voltaicos e de lampadas electricas pendentes do arvoredo. É este o grande mercado elegante da metropole oriental—uruguaya. Exposição ambulante e colossal de damas naturalmente formosas e de outras mais ou menos pintadas, algumas ricamente vestidas e de varias cathegorias sociaes, é alli que pelo olhar, por palavras e por intermedio de missivas, discretamente passadas, iniciam-se, combinam-se e decidem-se os destinos de milhares de creaturas, sob o pretexto do mais sublime e deturpado de todos os sentimentos humanos—o amôr. * * * * * _Parque Urbano_—É o segundo passeio publico-municipal da capital uruguaya. Ao contrario do Prado, este parque encerra uma vegetação muito rachitica, talvez por estar situado á beira-mar. Todavia, esta mesma situação o faz interessante, por causa dos seus estabelecimentos balneares e dos terraços, ou passeios de madeira que dominam as vagas. Além d’isso decoram-no um lago, um _chalet_ acastellado, ruinas fingidas, um café cantante e varias alamedas. É pouco frequentado de inverno e preferido, na estação calmosa, pela população fluctuante das visinhas praias de _los Pocitos_ e de _Ramirez_. Theatros Montevideu está bem fornecida de bons theatros. O _Solis_ é, architecturalmente, tão gracioso quão imponente. Em estylo de templo romano, a sua frontaria consta de tres corpos. Os lateraes estão occupados, o da direita pelo Museu Nacional, o da esquerda pelo Splendid Hotel. Estes têem a fachada circular, em columnatas, ao passo que o corpo central é composto de uma architrave recta, com frontão que descansa sobre oito columnas jonicas. O interior é amplo e tem cinco ordens de camarotes. Ultimamente, funccionava ahi uma excellente companhia, expressamente contractada para interpretar obras nacionaes. O theatro _Urquiza_, em estylo mais modesto, é tambem grandioso, se bem que o aspecto geral da sala seja pesado e sem elegancia. Encerra um bello vestibulo e cinco ordens de camarotes. O mobiliario é rico e a concorrencia é, geralmente, selecta. Frequentam-n’o companhias internacionaes. O _Polytheama_ é o mais vasto de todos os theatros de Montevideu, com tres ordens de camarotes e amplissima plateia. É frequentado, de preferencia, por companhias de zarzuella, e brevemente será transformado para melhor estylo architectonico. O _Ciblis_ tem quatro ordens de camarotes, é de simples decoração e architectura e egualmente entretido por companhias de zarzuella. O _Casino_ é de madeira, de tristonha e pobre perspectiva, funccionando ahi uma companhia de variedades. O _Odéon_, o _Stella d’Italia_ e o _Pabellon Pipo_, nada têem de notavel. Brevemente será inaugurado o _Theatro Moderno_, na rua dos Andes. Ha ainda outras salas de espectaculo, de menor importancia, bem como numerosos cinematographos, a actual praga de todos os centros civilisados e populosos. Em 1907, os theatros de Montevideu deram 2:227 espectaculos, com a assistencia de 2.001:664 espectadores. Curiosidades _Pocitos_—É uma praia de banhos, a pequena distancia da cidade e a ella ligada por dupla via de _tramways_ electricos. Possúe um grande hotel, á margem do oceano, com terraços construidos sobre o salso elemento, e muitas avenidas já povoadas de lindas e artisticas villas de recreio, O clima aqui é ameno e a temperatura geralmente agradavel. * * * * * _Atheneu_—É Academia de Sciencias e Lettras, e, ao mesmo tempo, club recreativo. O edificio, que data de 1896, é de formoso estylo architectonico. Está situado na praça de Cagancha, ou da Liberdade. No rez-do-chão visita-se a sala de jogo, a secretaria, a sala das pequenas reuniões e a bibliotheca, com dez mil volumes, que occupa um immenso salão, com galerias. No andar nobre, entre outros compartimentos como, por exemplo, a sala de fumo, que tem sacadas sobre a praça, admira-se o amplissimo e bello salão dos actos publicos. Dão-se ahi os grandes banquetes e realisam-se outras festas de caracter internacional. * * * * * _Cemiterio Central_—Este campo santo, eminentemente artistico, é de agradavel aspecto e dividido em duas secções, por altos e longos muros que contem centenares de tumulos-gavetas. Os monumentos estão semi-encobertos pela abundancia do arvoredo, cuja côr verde-escura realça a alvura das niveas e marmoreas sepulturas. Á entrada, está a capella das encommendações, que encerra uma crypta-pantheon de homens illustres. O centro é occupado pela urna contendo os restos mortaes do general Artigas. Em volta, ha outras urnas e sepulchros de personagens notaveis da Republica. D’entre os monumentos que guarnecem este cemiterio, destacam-se os seguintes, pela belleza artistica e sumptuosidade decorativa: Sepultura de Alcino Sanguinetti, com uma bellissima estatua feminina, de marmore. Tumulo encimado pelo marmoreo busto do almirante brasileiro Guilherme Parker, fallecido em 1873. Artistico sepulchro da familia de José Rodriguez, decorado a formosas estatuas, a um busto e por quatro columnas caneladas, que sustentam um pedestal com a estatua da Virgem. Tumulo do general Venancio Flôres. Estatua feminina, de marmore branco, com lindissima roupagem. Jazigo de Luiz Suppervielle, e familia. É em marmore mesclado. Grande, artistico e vistoso tumulo de Juan Martin, em marmore de Italia. Encima-o um Christo gigantesco e decoram-n’o bellas estatuas femininas. Grandioso jazigo, em marmore preto e branco, decorado a estatuas e a medalhões, dos cidadãos sacrificados em Paso de Quintetos. Além d’este ha, em Montevideu, os cemiterios de Buceo, Britannico, de la Teja e de Cerro, os dois ultimos nos suburbios. * * * * * _Parques Particulares_—O _Central_ e o _Giot_ são dois parques particulares, muito interessantes. O primeiro é accessivel a carruagens, cavalleiros e peões, pela estrada Oito de Outubro. A entrada é, quasi sempre, livre. Realisam-se ahi, ordinariamente, os jogos de _foot-ball_, pelota, _cricket_ e outros, para os quaes ha excellentes installações. O parque _Giot_ está situado na Villa Colón. Communica com a estação ferrea d’este nome, por meio de um _tramway_ especial. * * * * * _Bancos_—Na capital do Uruguay funccionam, actualmente, os seguintes estabelecimentos bancarios e instituições de credito: —Banco de la Republica, rua Zavala, 79. —Banco Hypothecario, Zavala, 167. —Banco Comercial, rua Cerrito, 189. —Banco Español, rua 25 de Mayo. —Banco de Londres, rua Cerrito, 205. —Banco Italiano, Cerrito, 135. —Banco Britanico, rua Zavala, 96. —Banco Inglez, rua Missiones, 117. —Banco London and Brazilian, rua Zavala, 83. —Banco Francés, rua 25 de Mayo, 322. —Banco Anglo-South-Americano, Zavala, 81. —Bolsa de Comercio, Zavala, 59. —Crédit Français, Missiones, 200. —Casa de Préstimos, rua 33, 180. —Monte de Piedad, rua Piedras, 265. —Banco Alleman Transatlantico, Cerrito, 183. —The Agency Company of Uruguay, rua Rincon, 66. —Credito Publico, rua Solis, 33. —Credito Real del Uruguay, rua 33, n.º 55. —Banco de Cobranzas y Locaciones, rua Sarandi, 78. —Centro de Productos del Pais, rua Miguelete, esquina da rua Rio Negro. * * * * * _Hoteis_—Os hoteis principaes de Montevideu, são o _Splendid Hotel_, na praça do theatro Solis; o _Grande Hotel_, entre as ruas Sarandi e Gomez; o _Hotel de las Piramides_, na rua Ituzaingó, 183; o _Hotel de Paris_, na rua 25 de Mayo, 280; o _Hotel Central_, na mesma rua, 247; o _Internacional_, na rua Ituzaingó, 89; o _Barcelona_, na rua da Ciudadela, n.º 120; o _Del Globo_, na rua Colón, 37; o _Oriental_, na rua Solis, 22; o _Comercio_, na Praça da Independencia, 97, e o _Hotel Piazza Bianchi_, em Muelle Viejo, 280. * * * * * _Viação Urbana_—A capital uruguaya é servida pelas seguintes companhias de tracção electrica e animal: —_La Transatlantica_, com oito linhas geraes a tracção electrica e duas a tracção animal. —_La Comercial_, com 18 linhas geraes, todas a tracção electrica. —_Union y Maroñas_, com tres linhas geraes a tracção animal. O serviço d’estes _tramways_ rivalisa, pela perfeição, com os das melhores capitaes do globo terrestre. Apreciação Sete grandes linhas telegraphicas e duas telephonicas communicam Montevideu entre si, com o interior da Republica e com todo o mundo civilisado. Em todo o territorio uruguayo só existiam, em 1869, dezenove kilometros de via ferrea. Actualmente, ha mais de 2:000 kilometros em exploração. A Republica possúe, para uma população total de 1.200:000 habitantes, cêrca de 700 escólas primarias, o que dá uma escóla para 1:700 habitantes. Esse numero vae ser consideravelmente augmentado porque, ha pouco tempo, foi votada a quantia de mil contos de réis para desenvolvimento da instrucção. Entre outros, a Universidade, o Atheneu e a Escóla de Artes e Officios, são estabelecimentos modelares. Na diffusão do ensino, no desenvolvimento material do paiz e na beneficencia publica e particular, assentam a grandeza e a gloria da Republica Oriental do Uruguay e da sua grandiosa capital. A Commissão Nacional de Caridade e Beneficencia Publica, dirige os estabelecimentos beneficentes do Estado, que são o Hospital de Caridade, o Asylo de Expostos e Orfãos, o Asylo de Mendigos, e quatro asylos Maternaes. Não obstante a Constituição da Republica consignar, no artigo 5.º, que a religião do Estado é a catholica-apostolica-romana, ha plena liberdade de cultos, e ainda recentemente a Commissão de Caridade, que é de nomeação official, substituiu, nos estabelecimentos sob a sua direcção, as irmãs de caridade por pessoal laico, não só porque, no seu fanatismo, ellas martyrisavam as creanças com excessivos exercicios religiosos, mas tambem para impedir que no animo de tão tenras creaturas prevaleça qualquer crença religiosa especial, deixando essa escolha ao raciocinio e aos sentimentos da sua maioridade, como convem a cidadãos de uma republica verdadeiramente democratica. Existe, na capital, um templo protestante, pertencente á egreja anglicana, e outro methodista, da egreja evangelica. Duas coisas impressionam agradavelmente o visitante, logo á chegada a Montevideu—a belleza das mulheres e a urbanidade dos habitantes. Ficam, perennemente, no pensamento, no coração e na alma a impressão do bello irradiada dos grandes e formosos olhos das montevideanas, da elegancia do seu porte, do fino gosto do seu vestuario; o supremo encanto que nos transmitte o contacto da população da capital, na doçura da phrase e na expressão dos sentimentos, facilitando-nos o estudo e a observação de tudo quanto, interior e exteriormente, revela ao forasteiro, estupefacto, as sublimes qualidades moraes e os preciosos elementos civilisadores de um povo que desperta enthusiasticamente para a vida, para a lucta e para a gloria. Da cúspide de um dos campanarios do templo de la Aguada, por exemplo, o panorama geral de Montevideu encanta-nos pela extensão e grandeza da cidade, pela amplitude e belleza do seu porto, coalhado de embarcações e dominado, da margem fronteira, pela fortaleza do Cerro, a coroar a unica elevação de terreno que a vista abrange em toda a linha do horizonte. O Brasil e a Argentina disputam-se a influencia sobre este paiz encantador, de largo e brilhante futuro, que já patenteia, a todo o mundo, valiosos documentos de progresso e de civilisação; povo bello, instruido e bom, como nenhum outro e que possúe uma capital dotada de todos os melhoramentos das grandes metropoles do globo. Ella é grande, rica e gloriosa em importantes estabelecimentos scientificos, nas suas numerosissimas livrarias, na estonteante formosura das suas habitantes, no assombroso desenvolvimento do seu commercio e, principalmente, no culto sacrosanto da caridade, que é a suprema belleza da alma. INDICE Pag. Situação e Aspecto Geral 273 Historia 279 Assistencia Publica 283 Egrejas 291 Beneficencia Particular 295 Edificios Publicos 297 Universidade 301 Museus 305 Bibliothecas 309 Commercio 311 Parques 315 Theatros 319 Curiosidades 321 Apreciação 327 BUENOS-AIRES Situação e Aspecto Geral Aos 34.° 36, 21´ 4 de latitude austral e 58.° 21´, 33´ 3 de longitude occidental de Greenvich, á margem direita do Rio da Prata e a 20 metros acima do nivel do mar, está situada a cidade de Buenos-Aires, capital da Republica Argentina e a metropole mais importante, commercial e populosa da America do Sul. N’esse ponto, a 275 kilometros da foz e a 200 de Montevideu, tem o rio 45 kilometros de largura e uma profundidade sufficiente para fundeadouro de grandes transatlanticos. O perimetro da cidade é de 200 kilometros as maiores extensões são—de Norte a Sul 18 kilometros e de Este a Oeste 25 kilometros, com uma superficie de 19:006 hectares, isto é, mais do que Paris, que tem 7:802 hectares, Berlim, 6:326, Vienna d’Austria, 5:540 e do que Hamburgo, que tem 6:346 hectares de superficie. Manchester, Londres e Marselha teem, respectivamente, 38:486, 30:486 e 22:336 hectares de superficie. Á excepção de algumas das grandes metropoles norte-americanas, nenhuma outra cidade do mundo apresenta mais rapido augmento de população. Os seus principaes periodos de crescimento, foram de 1869 a 1887 e d’este anno ao de 1895. Na primeira das citadas datas os habitantes eram em numero de 177:000 e na segunda de 433:000, tendo augmentado em 256:000 moradores no espaço de 18 annos. Em 1895, a população da capital era de 663:000 habitantes, ou mais 230:000 do que oito annos antes! Fundada, em 1580, com 16 quarteirões ou quadrados de casas, pelo recenseamento geral de 1895, verificou-se constar a cidade de 54:795 casas, das quaes 912 com mais de 3 pavimentos, 6:332 com dois andares e 30:083 de um só pavimento. Hoje, Buenos-Aires encerra cêrca de 83:000 edificações, que abrigam 1:200:000 habitantes. O aspecto geral d’esta soberba metropole é o de uma immensa planicie edificada e corôada pelos campanarios das suas egrejas e pelos zimborios dos seus palacios. O horizonte é limitado pela superficie do rio da Prata, cuja margem oriental apenas se avista nos dias muito claros, e pela aridez e côr pardacenta das campinas, que se estendem e prolongam além dos limites do municipio. O excessivo comprimento de muitas arterias publicas faz com que, para o observador, a sua já exigua largura desappareça na altura da casaria. A rua de Rivadavia, que divide, por completo e de um a outro extremo, o municipio, tem a extensão total de 18:000 metros, ou sejam 18 kilometros. Nos primeiros 2:080 metros de comprimento tem a largura de 9½ metros; de Callao á Praça das Flôres, essa largura attinge 26 metros, que conserva até final. A rua de Santa Fé, parallela á anterior, é comprida de 12:000 metros; a de Cordoba, de 10:500; a de Corrientes, de 9:000; as de Callao e de Entre Rios, de 8:500 metros cada uma; a rua Independencia de 8:000 metros e muitas outras têm extensões immediatamente inferiores ás já citadas. A magnifica Avenida de Mayo, com 30 metros de largura e kilometro e meio de comprimento, corre na direcção Este-Oeste e é, pelo movimento civico, pela situação topographica e pelo esplendôr dos seus edificios, a principal arteria publica da capital argentina. Termina na amplissima e magestosa praça do mesmo nome, ladeada de monumentos e palacios, como a Cathedral, o Banco da Nação Argentina, a Camara Municipal e o Palacio do Governo. Na extremidade opposta da Praça de Mayo, ergue-se o grandioso monumento do Congresso Nacional. A praça do general Lavalle, com 25:000 metros quadrados, é decorada a lindissimos jardins e, ao centro, pela estatua do general Lavalle. As avenidas de Corrientes, de San Juan, de Belgrano, de Santa Fé e de Callao, são as mais importantes, depois da de Mayo, e mais extensas do que esta, se bem que o seu aspecto geral não seja tão bello e imponente. A praça do general San Martin, profusamente ajardinada e ostentando a estatua equestre do seu homonymo, é um dos mais bellos pontos do centro da capital, assim como o passeio Alvear, ou da Recoleta e os parques Lezama e 3 de Fevereiro, especialmente o ultimo, com uma superficie de 3:677:464 metros quadrados, e que é o Bosque de Bologna de Buenos-Aires, excepto na vegetação. É especialmente frequentado ás terças e quintas-feiras, os dias da moda, por numerosas e ricas equipagens, que imprimem a esta capital o cunho essencialmente europeu dos grandes centros da aristocracia, da riqueza e da elegancia. Quem chega a Buenos-Aires em dia de semana e nas horas de maior movimento civico, tem a illusão de que está em Paris, por exemplo, tal é o feitio caracteristico e eminentemente parisiense da metropole buonarense. Os cafés installados nos amplos passeios lateraes; os kiosques de jornaes e de tabaco, espalhados em profusão; a assombrosa quantidade de carruagens e de vehiculos de toda a especie, e até os vendedores de jornaes e de bugigangas, que como o _camelot_ dos _boulevards_, tanta animação imprimem ás já animadissimas arterias da colossal cidade, tudo nos faz sentir que estamos em um dos formidaveis laboratorios humanos, onde se desenvolve a vida universal. Pena é que as arterias largas de Buenos-Aires, ou avenidas, sejam poucas em relação aos arruados que dividem as suas 3:500 _manzanas_, ou quadrados de casas, e que são excessivamente estreitos, para o espantoso movimento que os anima. É facillimo ao visitante orientar-se na famosa capital _porteña_, devido á originalidade da sua topographia. Effectivamente, o plano de Buenos-Aires é formado por quadrados de metros 130×130, que se cortam em angulo recto, formando como que taboleiros de xadrez. A numeração começa na direcção do porto e segue até á rua Rivadavia, que divide o municipio e onde principia a nomenclatura e a numeração de outras ruas. Os nomes d’estas estão escriptos, em todas as esquinas, em lettras brancas sobre fundo azul e em chapas ou placas de ferro esmaltado. Cada quadrado tem o maximo de cem unidades, com a numeração par á direita e a impar á esquerda. Todas as ruas e avenidas centraes são calcetadas a madeira e a asphalto, e as mais afastadas a parallelipipedos. Só a abertura da Avenida de Mayo custou dez milhões de pesos argentinos, e sommas fabulosas gastam actualmente o governo e a municipalidade na expropriação para alargamento de novas ruas, praças e avenidas, bem como na construcção de magnificos edificios publicos, que são verdadeiros monumentos. Trinta e quatro mercados publicos abastecem a maravilhosa cidade e mais de 25:000 candieiros de electricidade, gaz e petroleo a illuminam profusamente. Todas as praças, avenidas e ruas principaes são realçadas, durante a noite, por poderosos fócos electricos. As condições climatericas são excellentes, graças á situação topographica e geographica da localidade e já pelo cuidado e esmero das repartições competentes, em tudo o que diz respeito á salubridade e hygiene publicas. Até 1890, a mortalidade de Buenos-Aires era de 29 a 30 por 1:000 habitantes. Depois das obras de saneamento, terminadas n’esse anno e nas quaes foram gastos 33 milhões de pesos em ouro, as defuncções baixaram a 15 e 16 por 1:000. Tambem contribúe para esse resultado satisfactorio a amenidade da temperatura, cuja média, no mez mais frio do anno, o de Junho, é de 7.° centigrados e em Dezembro, o mez mais quente, é de 26.° Sob o ponto de vista artistico, e especialmente architectonico, a perspectiva geral da cidade é bizarra e variadissima. Da povoação colonial pouco resta e a nova capital foi edificada, até bem pouco tempo, ao capricho dos proprietarios e de architectos na maioria incompetentes. N’estes ultimos vinte annos, todavia, verdadeiras obras de arte teem apparecido a engrandecer a cidade, tanto particulares como publicas, especialmente nas novas e centraes avenidas. Buenos-Aires é não só metropole assombrosamente commercial, mas tambem centro importantissimo de gôso, de luxo e de prazer. Na estação invernosa, de Maio a Outubro, funccionam tres ou quatro companhias lyricas, com os melhores elementos de reputação universal, assim como numerosas emprezas e celebridades artisticas na zarzuella, na declamação e no genero variado. Os seus grandiosos theatros são o assombro e o encanto dos forasteiros, que tambem sentem a impressão do bello e do supremo gosto ao contemplarem defronte de esplendidas vitrinas, nos passeios e em ricas equipagens, formosas damas, elegantemente vestidas, e irradiando das suas gentilissimas pessôas, a graça que seduz o espirito e incendeia os corações. Historia O nome de Buenos-Aires tem duas versões, adoptadas ambas por historiadores da famosa capital argentina. Segundo uns, Sancho del Campo, official do _adelantado_, especie de vice-rei, D. Pedro de Mendoza, primeiro fundador da povoação, ao saltar em terra exclamára:—buenos-aires!—referindo-se aos ares agradaveis que circulavam na atmosphera. Outros escriptores sustentam que o nome provem do de Santa Maria de Buenos-Aires, muito da devoção dos mencionados expedicionarios. Effectivamente, o primeiro nome dado á localidade, foi o de cidade de Santa Maria. D. Pedro de Mendoza partiu de Sevilha em 24 de Agosto de 1535, com quatorze navios e 220 homens de equipagem, entre officiaes e soldados. O almirante da armada era D. Diogo de Mendoza, irmão de D. Pedro. A causa d’esta expedição foi a descoberta e exploração das minas de ouro e de prata, que o navegador Gaboto affirmára, em Hespanha, ter visto nas margens do Rio da Prata. Como o informador tambem se referisse á extraordinaria fertilidade e belleza das terras platinas, o espirito aventureiro d’aquellas épocas, acabou por decidir a organisação da frota, na qual o _adelantado_ foi acompanhado por muitas pessôas gradas, umas que tinham de transportar-se ao Paraguay, e outras desejosas de riquezas e de aventuras. Na altura das Ilhas Canarias, a expedição foi surprehendida por grande temporal, que a forçou a arribar ao Rio de Janeiro, onde, por vingança, Mendoza mandou matar o mestre de campo João de Osorio. Como a crueldade d’este acto provocasse a indignação da maioria da equipagem, o chefe mandou levantar ferro para impedir as deserções e nos primeiros dias do anno de 1536, ignorando-se a data exacta, fundeou a armada na embocadura do Rio da Prata. Seguiu-se o desembarque e a fundação da cidade, ao mesmo tempo que de um forte para defeza da nova povoação contra os ataques dos naturaes. Estes, os indios _querandies_, tentaram impedir o estabelecimento dos hespanhoes, conseguindo surprehender e matar dez d’entre elles, que haviam-se internado á procura de lenha. No intuito de vingar esta affronta, D. Diogo de Mendoza, á frente de uma expedição militar, partiu á procura da tribu, que o esperou nas margens de uma lagôa e em numero de alguns milhares de guerreiros. Os invasores succumbiram ao numero, e o proprio D. Diogo foi morto, o que profundamente desanimou o fundador de Buenos-Aires. D. Pedro caiu gravemente enfermo e á derrota seguiu-se a falta de viveres, que degenerou em fome, a ponto dos vivos alimentarem-se com a carne dos companheiros mortos. O governador resolveu retirar-se para o Brasil, mas quando ia a partir, appareceu-lhe, com algumas provisões, o capitão Oyolas, que elle mandára ao interior, em busca de viveres. Este successo reanimou um pouco os hespanhoes, porém os indios, tendo-se reunido em numero superior a 20:000, atacaram a nova povoação, ao mesmo tempo que incendiavam os seus tectos de palha, arremessando-lhes flechas ardentes. Os habitantes foram obrigados a refugiar-se, com D. Pedro de Mendoza, nos navios que os indios não puderam queimar, e partiram, em numero de 400, na direcção do Paraguay, ficando no porto de Buenos-Aires e a bordo de 4 navios, 160 homens, ao mando de Juan Romero. Do meio da viagem, D. Pedro de Mendoza, voltou a Buenos-Aires, onde encontrou reinstallada a gente de Romero, pela retirada dos indios. O _adelantado_ nomeou capitão do porto e da povoação a Francisco Ruiz Galán, e partiu para Hespanha, morrendo em viagem e a bordo do navio «Magdalena», em 23 do Junho de 1537. Privações de toda a especie continuaram a flagellar a pequena população de Buenos-Aires, até que em Abril de 1538, chegou de Hespanha uma caravella de soccorro, carregada de provisões. Em Outubro d’esse anno appareceu uma expedição auxiliar composta de dois navios e 200 tripulantes, com viveres para dois annos, sob o commando de Alonso Cabrera. Com estes reforços começou-se a reconstrucção das casas incendiadas, pelos indios, e da egreja. A Ayolas, capitão de Mendoza, que foi assassinado pelos indios do Chaco, succedeu no commando Domingo Martinez de Irala. Este reuniu, em Assumpção, os homens que Mendoza tinha deixado nas margens do Paraná, e dirigindo-se a Buenos-Aires, ahi fez proclamar a despovoação, levada a effeito em 10 de Maio de 1541, queimando-se os navios emprestaveis para navegar; e partindo Irala com toda a população para o Paraguay. Da expedição e tentativa de D. Pedro de Mendoza ficou, como recordação indelével, o rebanho de 75 cavallos e eguas que elle trouxera de Hespanha e que solto nas immensas planicies regadas pelas aguas dos rios Riachuelo e da Prata, foi a origem da actual riqueza animal das regiões platenses. D. Juan de Garay, nascido em 1528, em Villalba de Lora, provincia de Burgos, aos 16 annos de edade embarcou para Lima, no Perú, em companhia de seu tio, o licenciado Pedro Ortiz de Zárate, ouvidor n’aquella cidade sul-americana. Em 1549 acompanhou o general Juan Nuñez del Prado ás provincias de Tucuman. Tendo estado em Charcas e tomado parte em varias expedições contra os indios, em 1561 foi nomeado alguazil-mór do governo do Rio da Prata, pelo que estabeleceu-se na cidade de Santa Cruz da Serra, fundada por Nuflo de Chaves. Commissionado pelo governo do Paraguay para fundar uma povoação nas margens do Paraná, para alli partiu em uma caravella, a 14 de Abril de 1573, fundando a cidade de Santa Fé, em 15 de Novembro do mesmo anno. Depois de voltar ao Perú, para tratar um assumpto de familia e de derrotar, no Paraguay, o cacique Oberá, Juan de Garay, um dos maiores e mais celebres aventureiros do seculo XVI, organisou uma expedição e dirigiu-se ao Rio da Prata, em cuja foz lançou ferro. Desembarcando, com os seus companheiros, em 11 de Junho de 1580, depois de meia hora de marcha, fez alto em uma planura que lhe pareceu apropriada, e ahi traçou o local da praça principal de uma nova povoação, a que pomposamente deu o titulo de _Ciudad de la Trinidad de Buenos-Aires_. O fundador estava a pequena distancia do povoado fundado, 44 annos antes, por D. Pedro de Mendoza, e o espaço traçado pela sua espada é a actual praça 25 de Mayo. Quatro mezes mais tarde, procedeu-se á repartição das terras fóra do perimetro da cidade. Esta occupava um espaço de 16 quadras de frente por 9 de fundo, limitado pelas actuaes ruas 25 de Mayo, Balcarce, Viamonte, Libertad, Salta e Estados Unidos. Em 1762 já Buenos-Aires tinha 24 quadras de frente por doze de fundo. Cada quadra comprehende 140 varas de comprimento. As casas que, em 1650, não passavam de 400, eram algumas cobertas de telha, porém a maior parte tinha os tectos de palha, e eram muito baixas, de madeira e pedra. N’essa época e mesmo até ao fim do seculo XVII, nenhuma habitação attingia a altura de cinco metros. Assegurada a fundação e garantido o sustento da cidade, aquella por uma derrota inflingida aos indios _querandies_, e este pelas numerosas tropas de gado que povoavam as campinas circumvisinhas, partiu o fundador Juan de Geray para Assumpção, no Paraguay, com escala pelas colonias do rio Paraná, algumas tambem de sua fundação. Em uma d’estas excursões, tendo pernoitado em terras dos indios _miunanes_, ainda selvagens, foi traiçoeiramente morto por estes, bem como os da sua comitiva. Sabida, em Buenos-Aires, a noticia do desastre, assumiu o mando um sobrinho do _adelantado_ Vera, até á chegada d’este, em 1587. Já em 1585, a cidade tinha sido atacada pelo corsario inglez Eduardo Fontano, que foi repellido, renovando a tentativa dois annos mais tarde e com egual resultado, o famoso pirata, da mesma nacionalidade, Thomaz Cavendish. Os heroicos habitantes da povoação, todos soldados, tambem repelliram, victoriosamente, um ataque dos hollandezes, então estabelecidos no Brasil, em 1618. Um seculo depois da fundação, Buenos-Aires passou por longo periodo de decadencia, em consequencia do abandono da metropole, das hostilidades dos indigenas e da falta de navegação e de commercio, o que provocou a carestia dos generos de primeira necessidade. A primeira Audiencia, estabelecida por decreto de 6 de Abril de 1661, representou a situação da colonia ao rei de Hespanha, Filippe IV, recebendo resposta, sete annos mais tarde, firmada por D. Marianna d’Austria, viuva d’aquelle monarcha e regente do reino, durante a menoridade de Carlos II. Esse documento apenas recommendava ao mestre de campo, D. José Martinez de Salazar, que _empregasse todos os esforços para debellar a crise que affligia a colonia_. N’essa época a população de Buenos-Aires era de 4:000 pessôas, das quaes apenas uns 250 europeus. Já então a cidade começava a reanimar-se, devido á expansão commercial, maritima e do interior, a ponto que, em 1730, o jesuita Cattaneo, que a visitou, calculou os seus habitantes em 16:000. D. Juan José de Vertiz, governador que succedera a Zeballos, iniciou, em 1778, una série de melhoramentos que deram novo aspecto á cidade. Deve-se-lhe a illuminação publica, o empedramento das ruas, a introducção do primeiro prélo e a fundação da Casa dos Expostos e do Collegio de S. Carlos. Em fins do seculo XVIII, fôram construidos o primeiro theatro e a primeira praça de touros. Em 24 de Junho de 1806 e quando assistia a um espectaculo, com a sua familia, o vice-rei marquez de Sobremonte, recebeu a noticia de que acabára de ancorar, no porto, uma esquadra ingleza em attitude hostil. Immediatamente aquelle funccionario fugiu para Cordova, sem, ao menos, dar as providencias que requeriam a urgencia e a gravidade do caso. A 26 desembarcaram os inglezes e no dia seguinte, ao mando do general Beresford, entraram na cidade, quasi sem combate. No interior e na visinha Montevideu, principiou a organisar-se a resistencia contra os invasores, e depois de um fracasso, em Perdriel, os naturaes tendo-se reforçado pela juncção dos generaes Pueyrredon e Liniers, marcharam sobre Buenos-Aires, que retomaram em 12 de Agosto, depois de sangrentos combates que custaram, aos dois exercitos, mais de quinhentas vidas. Os inglezes retiraram-se para voltar, no anno seguinte, 1807, no mez de Junho, commandados, o exercito, pelo general Whiteloeke, e a esquadra pelo almirante Murray. O inimigo desembarcou em numero de 11:000 homens, das tres armas, principiando a assaltar a cidade em 2 de Julho. Defendiam-n’a Liniers e 8:500 soldados regulares, conseguindo no dia 5, em uma batalha geral, derrotar completamente os inglezes, que, a 7, assignaram uma convenção, compromettendo-se a abandonar as cidades de Buenos-Aires e Montevideu e todas as regiões banhadas pelo Rio da Prata, assim como as proprias aguas platenses. O governo da metropole galardoou a cidade com o titulo de _Excellencia_, e os seus vereadores com o de _Senhoria_. Em signal de regosijo, a Municipalidade, ou Cabido, libertou trinta escravos. Em 25 de Maio de 1810, rebentou a revolução pela independencia, que é não só o principal acontecimento historico de Buenos-Aires como de toda a nacionalidade argentina. Aos vivos desejos de autonomia politica e administrativa, manifestados pela população creoula e mestiça, principalmente, juntaram-se as noticias da invasão napoleonica da metropole e da independencia dos Estados Unidos da America do Norte. Além d’isso, o espirito bellico e auctoritario dos naturaes tinha sido animado pelas recentissimas luctas e victorias contra os inglezes. Quando o vice-rei Cisneros, em 18 de Maio de 1810, publicou, em nome de Fernando VII, uma proclamação dando conta dos successos passados na peninsula iberica e exhortando a população a unir-se em volta da auctoridade e do throno, o povo de Buenos-Aires começou a agitar-se e foi para a praça da Victoria manifestar-se, em altos brados, pela reunião de um Congresso Geral, ou Cabido Pleno, no qual o povo tivesse directa representação e resolvêsse sobre a proclamação do vice-rei. Em face d’essa attitude dos habitantes, reuniu-se o Cabido ordinario, no dia 21 e resolveu, de accôrdo com os desejos do povo, convocar um congresso geral dos habitantes para o dia seguinte, ás 9 horas da manhã. Foram convocadas 450 pessôas gradas, que nada resolveram no mesmo dia, que foi passado em calorosas discussões, combinando-se voltar a reunir a 23, ás 3 horas da tarde. A pluralidade de votos decidiu que o vice-rei Cisneros deveria depositar o seu mandato nas mãos do Cabido, até que fôsse eleita uma junta governativa. O vice-rei acatou e cumpriu as resoluções do povo, mas no dia seguinte o proprio Cabido convidou-o a reassumir o governo, auxiliado por 4 das pessôas mais gradas da cidade, formando uma especie de Junta, presidida por Cisneros. Finalmente, no dia seguinte, 25 de Maio, o povo da cidade, descontente com a solução da crise, sublevou-se de novo, e invadindo a praça Victoria, delegou uma deputação ao Cabido e á Junta, intimando-os a depôrem o mando nas seguintes mãos: D. Cornelio Saavedra, commandante geral das armas, presidente, e vogaes Juan José Castelli, Manuel Belgrano, Miguel Azcuénaga, Manuel Alberti, Domingo Matheu, Juan Larrea, Juan José Paso e Mariano Moreno, os dois ultimos como secretarios. Este triumpho popular e nacional deu em resultado o Congresso de Tucuman, reunido na cidade d’este nome, que em 9 de Julho de 1816 proclamou a independencia da Republica Argentina. No anno seguinte fôram as reuniões do Congresso Nacional transferidas para Buenos-Aires. Em 24 de Setembro de 1812, o general Belgrano derrotou as tropas hespanholas do commando do general Pio Tristán, no campo de Carreras, suburbios de Tucuman. Nos annos de 1817 e 1818, o mesmo general Belgrano e o seu collega San Martin, ganharam as batalhas de Chacabuco e de Maipú, que não só confirmaram e consolidaram a independencia nacional-argentina, como deram em resultado a proclamação da Republica do Chile. Depois do da revolução de Maio, o facto historico mais importante da capital e da Republica, foi a dictadura tyrannica de Juan Manuel Rozas, a quem o Congresso Nacional concedêra o poder supremo. Em 1851, o general Urquiza, governador da provincia de Entre Rios, collocou-se á frente dos patriotas, que propunham-se derrubar o tyranno, e auxiliado por brasileiros e orientaes, deu a Rozas, em 3 de Fevereiro de 1852, a batalha de Caseros, derrotando-o com 24:000 homens contra 30:000, e obrigando-o a fugir para a Europa. Rozas governára por espaço de vinte annos. Com a quéda da tyrannia foi promulgada nova constituição e Buenos-Aires entrou em phase de decidido desenvolvimento material. Ao cair Rozas, em 1852, contava a cidade 76:000 habitantes, em 1864, 140:000, 404:000 em 1867, 800:000 em 1900 e 1:150:000 em 1908. N’estes ultimos cincoenta annos, de muitos acontecimentos historicos teem sido theatro as ruas de Buenos-Aires, e ainda não ha muito tempo que ellas foram regadas com o sangue de irmãos, em feroz disputa do supremo poder. E por isso que ainda vivem muitos dos protagonistas d’esses infaustos successos, é de justiça lançar, sobre homens e factos, o véo do esquecimento e deixar á geração vindoura a tarefa de, serenamente, apreciar uns e outros e preparar o julgamento severo e perenne da Historia. O primeiro escudo de armas da cidade de Buenos-Aires, foi fixado em reunião do Cabido, presidido por D. Juan de Garay, quatro mezes depois da fundação da cidade, em 20 de Outubro de 1580. A dita assembleia, depois de eleger patrono da cidade a _San Martin de Tours_ deliberou que as armas e brazões de Buenos-Aires seriam formados por _un águila preta pintada al natural, con su corona en la cabeza, con cuatro hijos debajo demostrando que los cria, con una cruz colorada sangrienta que salga de la mano derecha y suba más alta que la corona, que semeje la cruz á la de Calatrava y la qual esté sobre campo blanco_. A aguia e seus filhos representavam as fundações effectuadas em nome dos _adelantados_ Juan Ortiz de Zárate y Torres de Vera y Aragon, que ostentavam nos seus respectivos escudos uma aguia corôada. Quanto á cruz de Calatrava e á corôa, explica o auto de Garay: —_La razón es haber venido á este puerto con fin y propósito firme de ensalzar la Santa Fé Catholica y servir á la corona real de Castilla y de Leon._ Um dos casos mais extraordinarios da historia de Buenos-Aires, é que 69 annos depois da decretação d’este escudo, o Cabido da cidade reuniu-se para crear um escudo «_atento á no haberse hallado en el Archivo de este Cabildo y sus libros que haya tenido ni tenga hasta ahora armas ningunas_». Pelo que, foi creado um escudo com uma grande aguia, ao centro e no alto, a esvoaçar sobre uma ancora, e em volta uma legenda.—Em 1744 adoptou-se outro escudo, e em 1905 o que actualmente vigóra e que consta de dois navios entre duas aves. Monumentos _Cathedral_—Entre os novos e monumentaes palacios da praça de Mayo, eleva-se a pesada e triste frontaria d’este templo, edificado na segunda metade do seculo XVIII. É em estylo grego, com 12 columnas jonicas, de granito, a sustentarem o frontão, em alto relevo. O interior, em tres naves, é amplissimo, porém sombrio. Os pilares, demasiadamente grossos, tiram toda a elegancia ao edificio. Ha 12 capellas lateraes e 2 ao lado do altar-mór. Um arco-cruzeiro, precede a capella-mór, que encerra seis arcos lateraes, os dois ultimos com tribuna e um pequeno orgão. No altar principal ha 4 columnas douradas e á esquerda está o sólio archiepiscopal. As paredes são revestidas de marmore mesclado, com seis janellas, que transmittem escassa luz ao recinto. No tecto da capella-mór ha tres pinturas e outras tantas no do corpo principal do santuario. Precede o arco-cruzeiro um alto zimborio, com 4 janellas a vitraes coloridos. Na terceira capella da nave direita está o tumulo, eminentemente artistico, do general San Martin, e na quinta capella o do arcebispo Aneiros, primeiro prelado de Buenos-Aires. O arcebispo está representado em estatua de marmore branco, ajoelhada. É trabalho do esculptor V. de Pol. A arcaria de todo o templo é ornamentada a meias columnas de marmore mesclado, com capiteis dourados. O monumento sepulchral do general San Martin, obra do esculptor Carrier-Belleuse, é de imponente e bella perspectiva. Sobre duplo pedestal de marmore assenta o bronzeo feretro do general. Ladeiam-n’o quatro blócos de marmore branco, tres com as estatuas da Liberdade, do Trabalho e do Commercio, e o outro com laureis, palmas, um baixo-relevo commemorativo da batalha de Maipú, e os escudos das Republicas Argentina, do Chile e do Perú. * * * * * _Congresso Nacional_—É este um dos mais grandiosos edificios de todo o globo. Se bem que, exteriormente, por concluir, já se póde admirar e descrever não só as suas monumentaes proporções, mas tambem a magestatica belleza da sua architectura. O estylo é greco-romano, com quatro pavilhões nos angulos, dominados pelo corpo central, em fórma de hemicyclo, com galerias em columnas. Esta especie de cupula, ou zimborio, repousa em uma formidavel estructura de 300 metros de granito e pesa 30:000 toneladas. Só o alicerce d’esta móle gigantesca importou em 500:000 pesos, e tem 10 metros abaixo do nivel do sólo, no mesmo feitio da cupula superior. Os planos e a execução do monumento são do engenheiro Victor Mano, e calcula-se que, terminado, custará 12 milhões de pesos argentinos. A camara dos deputados e o senado funccionam n’este palacio desde 1906. A sala dos deputados, com 149 cadeiras, tem tres pavimentos, o 1.º para o corpo diplomatico e o 2.º e o 3.º para o publico. Ha uma galeria especial para a imprensa. O salão é em fórma de meia laranja, guarnecido a columnas caneladas e a vitraes coloridos, no tecto. Cada assento de deputado tem a sua carteira especial. Salas de espera e de leitura. Guarda-roupa luxuoso. Secção do Senado. Sala de espera. Salão das sessões, tambem do feitio de meia laranja, com dois pavimentos, um de tribunas para o corpo diplomatico e outro de galerias para o publico. Até meia altura, as paredes são revestidas de velludo vermelho. Refeitorio dos senadores. Sala de recepção do Presidente do Senado e saleta de espera. Salão de recepção do corpo diplomatico. Pateo com galeria circular, ornamentada a grupos de columnas. Salão geral de refeitorio contendo o plano, em gêsso, do edificio, pelo architecto Dormel. Este salão é revestido de madeira do paiz, em talha. Todo o edificio está, interiormente, alcatifado e luxuosamente mobilado. O salão da camara dos deputados serve para as reuniões plenarias das duas camaras. * * * * * _Palacio de Justiça_—Ergue-se na praça Lavalle. As obras começaram em 1904 e devem estar concluidas em 1910. O projecto d’este monumento, em estylo neo-grego, é do architecto francez Norbert Meillart. O primitivo orçamento foi de oito milhões de francos; porém, concluido, o palacio custará cêrca de vinte milhões e será um dos maiores e mais bellos do mundo. O edificio tem 38 metros de altura e rematal-o-ha uma cupula de 120 metros, projecto este provisoriamente posto de parte, por causa do seu enorme dispendio. Uma galeria, a columnas doricas, ornamenta a frontaria principal á altura de dois pavimentos. O interior é dividido em um milhar de compartimentos, entre os quaes numerosos salões, cuja ornamentação corresponde á sumptuosidade, gosto artistico e riqueza da architectura. Todo o monumento, em seis pavimentos, é de tijolo e revestido, interior e exteriormente, de preciosos marmores e mosaicos. O vestibulo, grandioso e artistico, é guarnecido a estatuas. Todos os andares são revestidos de ferro, isolados e incombustiveis. Seis pateos interiores transmittem ar e luz aos compartimentos, que oito ascensores electricos communicam entre si. No rez-do-chão installa-se, n’este momento, o archivo geral da Justiça. No pavimento nobre admira-se a monumental sala dos Passos Perdidos, que communica com o salão geral das audiencias. A este seguem-se a sala do Jury, a de recepção, e as salas e gabinetes do Presidente e dos secretarios do Tribunal Supremo. A Côrte Suprema, tem um soberbo salão de audiencias ornamentado a columnas corinthias; a sua altura occupa o espaço de tres pavimentos. A sala da Côrte de Appellação, é alta de dois andares, e as simples salas de audiencia dos julgados, teem a altura de um pavimento. O estylo geral de todas estas dependencias é corinthio. Ha tambem as grandes salas de audiencia das Camaras Civil e Criminal, perfeitamente eguaes. Depois das principaes peças, já mencionadas, visita-se ainda os salões de trabalho, da Bibliotheca e a sala do julgamento supremo de todas as appellações da Republica, cujo tecto é de vidro. Os outros andares são alternados de salas e gabinetes de audiencia com os compartimentos dos escrivães, ou notarios, em numero de 115. O sexto e ultimo pavimento é occupado pelo julgado civil, e ricamente decorado a marmores de Carrara, da Belgica, e a onyx do paiz. O madeiramento empregado no palacio é da Australia, da Argentina e da Terra do Fogo. Sobre os tectos, que são tambem amplos terraços para passeio, estão installados os compartimentos das machinas propulsoras da illuminação e dos ascensores. Do mirante, á altura de 38 metros, a vista geral da cidade é esplendida. * * * * * _Estatuas_—O monumento da Republica occupa o centro da antiga praça Victoria, hoje de Mayo, a principal de Buenos-Aires. Consta de uma alta columna granitica, encimada pela figura symbolica da Republica, com escudo e lança. Na base da columna, estão quatro figuras femininas, e a data, em lettras douradas—_25 de Mayo de 1810_. * * * * * A estatua do general San Martin, ergue-se na praça do mesmo nome, é equestre e de bronze. Assenta sobre pedestal de marmore branco, sem decoração nem inscripção alguma. Com a mão esquerda, o general sustenta as redeas e com o dêdo indicador da mão direita aponta para o infinito. * * * * * O monumento a Adolfo Alsina, eleva-se na praça da Liberdade, defronte do bello e novo edificio granitico do Colyseu Argentino. É de bronze, em tamanho natural, sobre pedestal de granito, com as datas—1829—1877. * * * * * Situada a pequena distancia do monumento ao general San Martin, ergue-se a estatua do soldado Falucho, de bronze, em tamanho natural, e empunhando a bandeira nacional. Assenta sobre um pedestal de granito, com inscripção. * * * * * Ao centro da praça Lavalle, eleva-se a marmorea estatua do general d’este nome, sobre uma alva columna canelada, que repousa em uma base granitica. O pedestal da columna tem, gravadas, as seguintes inscripções:—_El Pueblo a Lavalle_—_Muerto por la Libertad, en 1841_—_Libertador y Martyr_—_Nascido per la Immortalidad en 1797_. Em uma pequena praça fronteira á egreja de S. Domingos, está o monumento do general Belgrano. Consta de uma urna de marmore branco sustentada por archanjos e rematada por um dragão de bronze. A base, de alvo marmore, descansa em um sopé de granito, e é ornamentada a baixos relevos, em bronze, e por duas estatuas allegoricas, do mesmo metal. No parque Tres de Fevereiro, erguem-se as estatuas de Sarmiento, Burmeister e Eduardo Costa. * * * * * _Theatro Colon_—É um dos mais modernos monumentos de Buenos-Aires, recentemente inaugurado. Na sua architectura figuram varios estylos, avultando o jonico, o corinthio e o attico. Tem 25 metros de altura, em 3 pavimentos. 16 estatuas ornamentam a monumental escadaria de marmore, que dá accésso á plateia. O vestibulo é amplo e bello, circumdado a tribunas e guarnecido a meias columnas de marmore côr de rosa, com capiteis dourados. A plateia tem 28 metros de comprimento por 22 e meio de largura, e o circulo da amplitude, em fórma de ferradura, tem 75 metros. Encerra 900 cadeiras e sete ordens de logares superiores, a saber, duas de frisas, duas de camarotes, duas de camarotes aos lados e de balcões ao centro, e a ultima ordem é de galeria geral, em columnata. Toda a immensa e bellissima sala é profusamente dourada e illuminada por centenares de lampadas electricas. No tecto ha uma pintura phantastica, a circular um gigantesco lustre em fórma de esphera armillar. A sala póde conter 3:570 pessôas. A abertura do palco tem 18,ᵐ25 de largura e 19,ᵐ25 de altura. As dependencias do edificio são, egualmente, magestosas pelas dimensões e decorações, sobresaíndo o _foyer_, ainda por concluir. O monumento custou quatro milhões de pesos argentinos. A inauguração do theatro teve logar por uma companhia lyrica italiana, sob a direcção de Luiz Mancinelli, em 25 de Maio de 1908. * * * * * _Deposito de las Aguas Corrientes_—O aspecto geral d’este edificio, exteriormente de tijolo, revestido de terra-cotta, é monumental e sumptuoso. 180 grupos, a 4 columnas de ferro fundido, sustentam, interiormente, 12 tanques, tambem de ferro, divididos, em partes eguaes, por 3 pavimentos, e com a capacidade, cada deposito, ou tanque, de 6:000 toneladas de agua, o que dá um total de 72:000 toneladas. O ferro empregado n’esta monumental fabrica, que é um arrojo de engenharia, pesa 16:000 toneladas. N’este deposito entram e d’elle partem os grandes canos geraes que fornecem toda a cidade, e cujo consumo annual attinge 40:000:000 metros cubicos. Ha numerosos apparelhos de nivelação das aguas, que são conduzidas do rio da Prata, á distancia de 20 kilometros, por gigantescos tubos de ferro. Domina o monumento uma torre—observatorio, com a melhor vista geral da cidade. * * * * * _Penitenciaria Nacional_—Pelo seu conjuncto, isto é, pela immensidade da area que occupa, pelo numero e grandeza das edificações, como devido á instituição em si, á sua installação e aperfeiçoamento, a Penitenciaria é um monumento e dos mais grandiosos e interessantes da capital argentina. A area total de terreno, occupado pelo edificio principal e dependencias, é de 120:000 metros quadrados. A construcção central consta de 5 pavilhões irradiantes de um centro commum encimado pela capella do estabelecimento, que tem uma porta para cada pavilhão, bancos aos lados do unico altar, pinturas no tecto, um pequeno orgão, organista, é em fórma octogona e frequentada pelos penitenciarios que quizerem fazêl-o, visto serem respeitadas todas as crenças. Cada pavilhão—galeria tem dois pavimentos com 120 cellas, que são caiadas, bem arejadas e illuminadas e teem uma tarimba, uma mesa tosca, um banco, uma prateleira, uma lampada electrica, um orificio de observações, um buraco para a passagem da comida, uma campainha de chamada, um colchão de lã e um travesseiro. Além d’estes cinco pavilhões, ha outro, central, para transmissão de ordens e parlatorio. Nenhuma cella póde conter mais de um preso. Cada pavilhão-galeria tem duas cellas de castigo, sem luz e com tarimba lisa. Os presos são classificados por conducta, á entrada perdem o nome, o cabello e a barba; porém não é usado, n’este estabelecimento, o barbaro systema das mascaras. Para cada penitenciario, que logo á entrada é photographado, ha um—promptuario—ou seja um folheto que contem a filiação, o retrato, as photographias radiographicas do encarcerado, a enumeração dos seus parentes; os seus processos e prisões, os antecedentes, o extracto da sentença condemnatoria, as notas da conducta interna, a data em que terminará o cumprimento da pena, a nota dos castigos applicados na prisão, as suas bôas acções e recompensas, a designação do seu trabalho penitenciario e as materias que estuda. Entre cada um dos pavilhões principaes ha um pomar e uma praça, livre, para gymnastica dos presos. No 2.º pavimento do pavilhão n.º 4, está um salão de conferencias, com capacidade para 400 pessôas e com apparelho para projecções luminosas. É tambem ahi a bibliotheca da Penitenciaria, cujo numero de livros consultados foi de 2:811, no 1.º semestre de 1908. Seguem-se 14 salas de aulas, cujos bancos e mesas foram feitas na casa. Cada sala tem uma pedra e varios mappas e espheras. São ensinadas as seguintes materias: —Leitura, escripta, linguagem e calligraphia. —Arithmetica e contabilidade. —Geometria. —Geographia e Historia. —Historia Natural. —Desenho. —Moral. A frequencia ás aulas, das 6 da tarde ás 8 da noite, é obrigatoria para todos os presos. Durante o dia, o trabalho é effectuado nas officinas de sapataria, alfaiataria, marcenaria, lithographia, carpintaria, photogravura, typographia, encadernação, latoaria e ferraria. Todas teem instructores civis e funccionam oito horas por dia. A officina de sapataria prepara, diariamente, 300 pares de botinas, e as de lithographia e typographia, com machinas braçaes e outras movidas pela electricidade, fazem os trabalhos do Estado, assim como as restantes. Na officina typographica imprime-se tambem e diariamente, o _Boletim Official e Judiciario_, e compõem-se todas as publicações officiaes. Ha um gabinete photographico e escólas de engenharia, jardinagem e de horticultura, com mestres especialistas e estufas adequadas. Na grande cêrca do estabelecimento ha varios pavilhões-enfermarias, para as diversas cathegorias de penitenciarios. Tambem ha pavilhões especiaes de lavanderia, com estufas de desinfecção, installação hydrotherapica, e o grande pavilhão isolado, contendo as enormes caldeiras propulsoras da energia electrica para a illuminação e officinas, assim como a caldeira especial para o fornecimento da cosinha, que é modelar e movida a vapor. Pharmacia, com laboratorio e gabinetes odontologico, radiographico, de psichiatria e de criminalogia. Tambem ha um pavilhão para condemnados a prisão, até 3 annos, e outro para detidos pela policia e que não tenham logar nas esquadras. A Penitenciaria de Buenos-Aires é verdadeira e perfeitamente modelar e facilmente accessivel para visitar-se, graças á extrema amabilidade do seu Director, a qual contrasta com a má vontade do seu collega da Penitenciaria de Lisbôa, que negou a permissão da visita a um escriptor, sob o pretexto, vocalmente formulado, de que um jornalista lisbonense escrevêra inverdades sobre o estabelecimento. E occupa este homem as mais elevadas posições sociaes e politicas, em Portugal, incluindo a de membro do Conselho de Estado! Em Julho de 1908, era de 1036 o numero total dos penitenciarios. * * * * * Para não alongar, demasiadamente, este capitulo, o auctor não trata aqui de outras instituições e estabelecimentos monumentaes da capital argentina, como, por exemplo, o Hospicio de las Mercedes, o Mercado Central de Fructos, o Palacio do Governo e a Municipalidade, que serão descriptos em outras secções. Assistencia Publica _Hospicio de las Mercedes_—Buenos-Aires possúe um manicomio para cada sexo, o feminino na rua Brandzen e o masculino na rua Vieytes, O primeiro, um dos melhores no genero, é superior ao segundo na qualidade das edificações, no aperfeiçoamento e grandeza das installações, no esmerado tratamento das enfermas e no aceio geral do estabelecimento. A fundação de ambos data de 1863. O manicomio de mulheres está installado em 12 pavilhões principaes, com outros tantos medicos effectivos, além de grande numero de substitutos, ajudantes e enfermeiras, cujo numero é variavel. Ao findar o 1.º semestre de 1908, era de 2:000 o numero de alienadas recolhidas e tratadas n’esta grandiosa casa de caridade. O pavilhão Esquirol, para enfermas agitadas, encerrava cêrca de duzentas. Ha gabinetes especiaes para furiosas, com uma varanda superior e circular, para observação e vigilancia. Ao lado, está o estabelecimento hydrotherapico. O pavilhão Charcot é para pensionistas de alta cathegoria. Possúe banhos electricos e sala geral de electricidade, com os mais aperfeiçoados apparelhos para exame das doentes; salão de recreio, bibliotheca e gabinete com apparelho para banhos de luz. Os quartos são divididos em 1.ª e 2.ª cathegoria, tendo os primeiros uma e os outros duas enfermarias. As doentes melancholicas teem aposentos escuros e claros as que são alegres. Cada pavilhão tem tres pavimentos e um sotão, communicando todos os pavilhões por galerias subterraneas. Nos refeitorios toca uma grande caixa de musica, durante as refeições. Todos os dormitorios e enfermarias teem ventilação e aquecimento. Em todos os pavilhões ha filtradores do ar que se respira. Uma rêde geral telephonica communica os pavilhões e as suas peças principaes. Pharmacia com grande laboratorio. Gabinete de nitro-photographia, para photographar os preparos da secção histologica. Gabinete de desenho de curiosidades anatomicas e pathologicas. No pavimento terreo ha uma sala, com tres frigorificos, para a conservação dos cadaveres que, depois de lavados em outra sala especial, são collocados na eça-ascensor, hydraulico, levados á capella ardente e descidos de novo aos frigorificos, quando ha necessidade de conserval-os até que venham as familias reclamal-os. Sala especial para autopsias. Todas as paredes são revestidas de ladrilho de ardosia para evitar sujidades. Secção bacteriologica, com estufas das mais aperfeiçoadas. Gabinete para analyse de urinas. Modelo especial de centrifugador electrico. Apparelhos microstomos, para córtes. Secção histologica. Idem de anatomia pathologica, constando de aula, museu, em duas salas, e grande laboratorio, o primeiro, no genero, em toda a America do Sul. Pavilhão-lavanderia, movido a vapor e a electricidade, do custo de 180:000 pesos. Aos lados, dois poços, um que fornece 27:000 litros de agua, por hora, e o outro 40:000 litros, este com a profundidade de 65 metros. Toda a roupa de uso é feita e lavada no estabelecimento. Pavilhões especiaes para cosinhas e machinas. Tres dynamos, dois com a força de 80 cavallos, cada, e um com a de 40. 250 _ampéres_. Baterias para 400 lampadas electricas e duas grandes caldeiras para fornecimento do vapor. A cosinha e as suas dependencias são dignas de visita e observação pela perfeição do systema e attendendo á extrema limpeza em que tudo é mantido. Todos os generos fornecidos ás alienadas e ao pessoal são de primeira qualidade, notando-se, na despensa, machinas e outros apparelhos para a fabricação de gêlo, dôces, limonada, etc. * * * * * Na secção masculina, o edificio principal é em tres pavimentos, com dormitorios e enfermarias. Pavilhão de pensionistas, de 1.ª e 2.ª classe, com bilhares e pateo ajardinado. Ha mais dois pateos, com jardim, e cercados pelas installações de serviço. Existencia total, em 1908, de 1:800 alienados. Cêrca com officinas, em pavilhões de madeira, de carpintaria, ferraria, alfaiataria, padaria, sapataria e lavanderia, todas trabalhadas por enfermos. Pavilhão especial para observação de doentes. Estabelecimento hydrotherapico. Officina typographica, onde é impresso, por alienados, o jornal _El Eco de las Mercedes_—. Banda de musica, tambem de alienados. Este estabelecimento, que era municipal, foi nacionalisado, isto é, passou a ser sustentado e administrado pelo Estado, desde 1903, attendendo aos inapreciaveis serviços que presta, recolhendo os alienados de toda a nação argentina. Sob a direcção d’este Hospicio, ha em Lujan, provincia de Buenos-Aires, uma Colonia Nacional de Alienados, com cêrca de 350 enfermos. * * * * * _Hospital de San Roque_—Hospital municipal de 1.ª categoria. Consta de 16 pavilhões isolados por jardins e abundante arvoredo, com outras tantas enfermarias, laboratorios e salas de operações e curativos. É servido por 44 medicos, internos e externos, 22 irmãs de caridade e 65 enfermeiros dos dois sexos. Pavilhão novo e especial de maternidade, com museu, salas de operações, laboratorio e incubadoras para creanças. Ainda outro pavilhão de genecologia, com 2 enfermarias e um pequeno museu da especialidade. Consultorio ophtalmologico, com enfermaria. Amphitheatro para aulas. Enfermaria de doentes presos, com guarda militar. Sala geral de esterelisação, com deposito de instrumentos cirurgicos. Estabelecimento hydrotherapico para cada sexo. Capella. Gabinete radiographico. Camara escura. Escóla de praticantes. Enfermaria ophtalmologica. Consultorio especial para molestias de vias urinarias, com instrumental apropriado. Duas enfermarias para molestias nervosas. Sala de autopsia e necroterio. Existencia média e regular de 700 pessôas, entre homens, mulheres e creanças. Para estas ha duas enfermarias geraes. Grande pateo central, ajardinado, com passeio circular, entre columnas. Este grandioso hospital, situado na rua do general Urquiza, foi inaugurado em 1872. * * * * * _Hospital Rawson_—Geral e municipal, como o anterior. Ergue-se fóra da cidade, no _Camino Puente Alsina_ e é subdividido em 14 pavilhões, que communicam por corredores. Servem-n’o 40 medicos, 10 internos e 30 praticantes, que habitam no edificio. O serviço medico é gratuito. Ha 16 irmãs de caridade. As enfermarias são 4 de clinica medica, 3 de clinica cirurgica, 2 de genecologia e 1 de creanças. Todas as enfermarias são aquecidas a vapor. Pavilhão especial com sala de operações cirurgicas e outras dependencias. Pavilhão de molestias das vias urinarias, com sala de operações. Outro especial de desinfecção, com grande forno crematorio. Ha outro forno desinfectante, a vapor. Mais dois pavilhões com enfermarias de parturientes, sala de operações e gabinete de esterelisação. Pavilhão-amphitheatro e outro de consultorio externo. Existencia média de 500 enfermos dos dois sexos, incluindo as creanças. * * * * * _Hospital de Clinicas y Maternidad_—É estabelecimento do Estado e funcciona, desde 1877, para os dois sexos e para creanças. Consta de 6 pavilhões com 11 enfermarias geraes. No jardim de entrada, pela rua de Cordova, 1149, vê-se a estatua, em bronze, sobre pedestal de granito, do dr. Pirováno. Sala de consultorio cirurgico, seguindo-se a de operações cirurgicas, com 4 dependencias. Gabinete radiographico. As enfermarias são aquecidas por fogões de gaz. Quartos para pensionistas e de curativos. Ha uma irmã de caridade para cada dependencia occupada por enfermos. Pavilhão central com a modesta capella do estabelecimento. Consultorio especial para creanças. Os rapazes são admittidos até aos 14 annos e as meninas até aos 17. Ha jardim commum de recreio. Gabinete de radiographia, de massagem e sala de aula para os estudantes de medicina, cuja faculdade é annexa e que praticam especialmente n’este hospital. Ha outra aula especial de genecologia, bem como um consultorio externo, mas este geral, com sala de operações. Pavilhão especial de molestias de olhos, com camara escura e sala de operações. Entre este e o pavilhão das mulheres, está o monumento, em bronze, sobre pedestal de pedra, do dr. Alexandre Castro, que foi lente da Faculdade de Medicina. Secção para molestias das vias urinarias, com sala de operações e consultorio. Pavilhão com installação hydrotherapica e banhos electricos. Amphitheatro para estudos anatomicos e laboratorio de anatomia pathologica. A secção da Maternidade tem 53 camas, em pequenos pavilhões do systema Tarnier, com salas especiaes para partos, para descanso das parturientes e para operações. Este hospital, construido em 1879, e contendo a média de 600 enfermos dos dois sexos, está sob a immediata dependencia do decano da Faculdade de Medicina. * * * * * _Casa de Aislamento_—Tambem conhecida por Hospital F. J. Muñiz. Occupa uma area de 14 hectares, na Avenida Velez Sarsfield, e é o maior e o mais interessante de Buenos-Aires. Encerra 25 pavilhões com 32 enfermarias, divididos por jardins e arvoredo, formando uma larga e bella avenida. É geral para os dois sexos e creanças e só para molestias contagiosas. Contém 610 camas, quasi todas occupadas, de ordinario, servindo cada pavilhão para uma só molestia e encerrando tudo quanto seja preciso para o tratamento d’essa enfermidade, evitando assim o contagio de uns para outros pavilhões. Foi fundado em 1883, e é um estabelecimento modelo. No pavilhão de diphtericos, ha accommodações para as mães das creanças atacadas do terrivel mal. Esta medida tem dois fins, o da humanidade, não separando mãe e filho, e o de evitar que as mães occultem os seus filhos doentes, com receio da separação. Laboratorio, completo, de bacteriologia e de anatomia pathologica. A maior população infantil é a de tinhosos, que permanecem longo tempo no hospital, motivo porque foi creada uma aula de instrucção primaria de ambos os sexos. Foi recentemente acabado um novo pavilhão para tuberculosos, dadiva dos srs. Roverano e da snr.ª de Arroyo. Ha um serviço especial de autopsias, com laboratorio, para os alumnos da Faculdade de Medicina, a cargo do dr. José Penna, director d’este estabelecimento, que é um dos mais gloriosos monumentos da capital argentina. * * * * * _Hospital Militar_—Tambem está situado na avenida Velez Sarsfield e, como os outros hospitaes de Buenos-Aires, consta de pavilhões no meio de jardins. Foi inaugurado em 1888. Tem oito pavilhões, que communicam por uma galeria em columnata. Sobre esta ha uma varanda-terraço para passeio e recreio dos convalescentes. Póde conter 268 enfermos, em oito enfermarias, e está quasi sempre cheio. É servido por 8 medicos, 16 praticantes e 22 irmãs de caridade. Enfermarias de officiaes e sala de operações. Pavilhão-amphitheatro e dito hydrotherapico. Sala de desinfecções, com estufa e machinismo electrico. Enfermaria de presos. Consultorio externo para militares e suas familias. Officinas militares e capella. Todo o estabelecimento é aquecido a vapor, para o que ha uma installação especial de machinas e caldeiras propulsoras. Laboratorio completo de bacteriologia e de anatomia pathologica, cujos resultados scientificos são publicados nos _Anales de la Sanidad Militar_. Na situação topographica, este hospital é superior, porém em tudo o mais é inferior ao seu congenere do Rio de janeiro. Nota-se, muito pronunciado, o cheiro habitual dos hospitaes de hygiene descurada. * * * * * _Hospital Rivadavia_—Situado na rua Bustamante, é só para o sexo feminino, e administrado pela Sociedade de Beneficencia da Capital, composta de senhoras. É sustentado por subvenção do governo, pelo imposto das loterias nacionaes, por doações e festas de caridade. Está installado em seis pavilhões. Ha quartos particulares, a 1 e 2 leitos, para pensionistas, de tres classes, que pagam de 3 a 15 pesos diarios. As seis salas-enfermarias encerram 524 camas, incluindo as dos quartos particulares, quasi sempre occupados. Todos os pavilhões, rodeados de jardins, teem salas de curativos, havendo uma sala de operações cirurgicas. O serviço é feito e dirigido por 25 irmãs de caridade. Os pavilhões estão ligados por corredores cobertos. O pavilhão da Maternidade, com a média annual de 700 partos, tem 74 camas em duas enfermarias, salas de operações e de curativos. Ha uma sala de isolamento para as parturientes febris. Estufas para os recem-nascidos. Aquecimento geral e a vapor, do edificio. Sala para aula pratica de medicos e de parteiras. Pavilhão de tuberculosos, com 80 camas. Pavilhão, a inaugurar, para clinica geral, custeado pela familia Cobo, com excellentes salas de operações. Pavilhão-amphitheatro com deposito de cadaveres e sala de autopsias. Pavilhão geral de operações externas e grande capella, com entrada para o publico. Em junho de 1908, a existencia de enfermas, n’este hospital, era de 435. * * * * * _Asylos_—É a seguinte a nomenclatura dos asylos de Buenos-Aires, com o numero de asylados que continham em 31 de Dezembro de 1907: —Das Creanças Abandonadas 1:604 —Dos Indigentes 874 —Dos Orfãos 451 —De Maternidade, Norte 385 —De Maternidade, Sul —De Maternidade, Oeste 15 —Da Misericordia 310 —Dos Immigrantes 594 —Das Creanças Abandonadas (Flôres) 162 —Das Creanças Abandonadas (Belgrano) 23 —De N. D. de la Merced 148 —Dos Orfãos Irlandezes 86 —Dos Servos de Jesus 66 Orphelinato Francez 100 Casa de Órfãos 192 Succursal 125 —De Orfãos de Militares 94 Patronato da Infancia 463 Martin Rodrigues 338 —Do Bom Pastor 84 —Maritimo 80 —Nocturno, municipal —Nocturno, do Exercito de Salvação —Nocturno, da Sociedade Franceza de Beneficencia. No 1.º, dos nocturnos, pernoitaram, n’aquelle anno, 38:435 pessôas; no 2.º, 50:417, e no 3.º, 3:191 individuos. * * * * * A municipalidade sustenta o Asylo de Mendigos, ou de Indigentes, e o Asylo Nocturno, municipal. O primeiro funcciona em vasto edificio, na esplanada da Recoleta. Os seus pavilhões e as outras dependencias correspondem, perfeitamente, ás exigencias e necessidades d’este genero de estabelecimentos. No Asylo Nocturno eram, outr’ora, admittidas todas as pessôas que se apresentassem depois do crepusculo; porém os abusos dos noctivagos e malfeitores que occupavam, ás vezes violentamente, as camas dos verdadeiros indigentes, forçaram a administração a exigir, para fornecer leitos, um cartão da Assistencia Publica. Em egual periodo, foram fornecidas, no Asylo Nocturno, mantido pela collectividade beneficente Exercito de Salvação, 110:880 refeições nocturnas. A Sociedade Franceza de Beneficencia, forneceu aos seus asylados, no mesmo anno, 13:693 ceias, nas quaes foram consumidos 5:368 kilos de pão, 3:700 e meio kilos de carne e 2:563 litros de leite. * * * * * Os asylos de Expostos, de Orfãos, Maritimo e das Mercês são dirigidos e sustentados pela Sociedade de Beneficencia da Capital. A Sociedade de Damas de Caridade, administra e mantem seis dos asylos citados no quadro anterior. O Asylo de Maternidade e Escóla de Parteiras, é annexo ao Hospital das Clinicas, e consta de tres pavimentos. No 1.º estão os quartos, a 2 camas, para parturientes e no segundo tres enfermarias geraes. N’este andar funcciona o laboratorio para estudos e analyses de urinas. Sala-amphiteatro e escóla de parteiras. A média mensal é de 80 parturientes, e de 90 alumnas, entre internas e externas. As dependencias de serviço estão installadas em um pavimento subterraneo. * * * * * _Hospital S. Luiz Gonzaga_—Mais conhecido pela denominação de _Hospital de Niños_, e é o unico especial para creanças. Foi inaugurado em 29 de Novembro de 1896 e é dirigido e mantido pela Sociedade de Beneficencia da Capital. Consta de 5 pavilhões occupados e 1 em construcção, com 4 enfermarias cirurgicas, 4 de clinica medica e duas de infecciosos, em pavimento especial. O serviço clinico é feito, gratuitamente, por 20 medicos. Pavilhão-amphiteatro de autopsias e laboratorios geral e pharmaceutico, privativos do estabelecimento. A existencia média é de 500 creanças dos dois sexos, que são admittidas até aos 12 annos as do sexo masculino e até aos 14 as do feminino. Ha pensionistas de tres classes. Diariamente, são dadas mais de 300 consultas externas a creanças, ás quaes também é fornecido leite, gratuitamente, quando os parentes o pedem. Gabinete radiographico. Á entrada está o busto, em bronze, do dr. Gutierrez, 1.º director do hospital. Durante o anno de 1907 houve 32:500 consultas externas. * * * * * _Hospital Juan A. Fernandez_—Antigo _del Norte_. Foi fundado em 1888, é municipal e administrado pela Assistencia Publica. A sua maior clientela é de meretrizes, que occupam tres enfermarias geraes, havendo tambem enfermarias e quartos para pensionistas. Ao todo, oito enfermarias em sete pavilhões, sendo só um para homens. Em junho de 1908 abrigava 184 doentes. É assistido por 3 medicos internos, 8 praticantes da Faculdade de Medicina, e 8 irmãs de caridade. Sala de operações cirurgicas, com esterelisação, e salas de curativos. N’este hospital ha sempre ambulancias, com cavallos atrelados, para acudir aos accidentes da rua. Pharmacia e laboratorio. * * * * * _Sanatorio Enrique Tornú_—É um hospital especialmente destinado á cura da tuberculose, situado nos suburbios da cidade, em plena campina da _Villa Ortúzar_, mas sobre uma collina batida dos ventos e abundantemente arborisada. Não são admittidos os tisicos incuraveis, que vão para a _Casa de Aislamento_, ou _Hospital Muñiz_. Póde abrigar, actualmente, 120 enfermos, mas estão a ser construidos novos pavilhões. Os doentes são submettidos a uma rigorosa disciplina de tratamento, sendo-lhes prohibido, entre outras coisas, o fumar, pelo que muitos renunciam ao curativo e abandonam o sanatorio. Foi fundado pela municipalidade, que o mantem, dando-lhe o nome de um dos facultativos que, na Republica Argentina, mais teem luctado contra a tuberculose. Sendo muitos dos enfermos paes de familia e indigentes, a direcção empenhou-se com varias associações beneficentes para soccorrer-lhes as familias, no intuito principal de que a preoccupação moral da miseria dos entes queridos, não difficulte o curativo dos seus chefes. É um estabelecimento-modêlo e em via de conclusão. * * * * * Além dos hospitaes, ligeiramente descriptos, e que são geraes, ha os estabelecimentos hospitalares e privativos de bairros populosos, taes como o _Theodoro Alvarez_, na parochia de Flôres, e o _Pirovano_, na de Belgrano. O primeiro é de construcção moderna e original, abrigando, na média, 250 enfermos. Funccionam, actualmente, seis _estações sanitarias_, creadas pela municipalidade á medida que se povoavam os suburbios da capital. São designadas pelos nomes de _Cosme Algerich_, _José Maria Bosch_, _San Carlos_, _Nueva Pompeya_, _Villa Devoto_ e _Liniers_. As duas primeiras são verdadeiros hospitaes. Em todas, dão-se consultas externas e fornecem-se medicamentos aos habitantes dos bairros afastados. Os seus directores fazem visitas a domicilio e passam attestado de obito, tudo gratuitamente. Cada _estação_ tem um pessoal de praticantes, pharmacia e secção de vaccina. Encerram, além d’isso, um consultorio externo, uma sala de curativos e outra com 10 camas para hospitalisar, temporariamente, os doentes e feridos de gravidade que não podem immediatamente ser conduzidos aos hospitaes geraes. Tambem possúem ambulancias e material para acudir, de prompto, a qualquer serviço de urgencia. Por causa do excellente resultado que teem dado estas _estações sanitarias_, trata-se da installação de mais duas, em novos bairros, com os nomes de _San Bernardo_ e _Santa Lucia_. * * * * * _Serviços de Assistencia_—Resumindo, os hospitaes que dependem, directamente, do governo nacional, são cinco, com um total superior a 2:500 camas. O _Hospicio de las Mercedes_, o mais importante, recebe alienados de qualquer ponto da Republica. O _Hospital de Clinicas y Maternidad_, selecciona os enfermos, recebendo só os exigidos pelos estudos das varias cathedras da Faculdade de Medicina. O _Hospital Militar_, é privativo da classe. O _Hospital de Niños_, ou de _S. Luiz Gonzaga_, é só para creanças e o _Rivadavia_, só para mulheres. A municipalidade sustenta 13 estabelecimentos hospitalares, sendo de 1.ª categoria os hospitaes geraes _San Roque_ e _Rawson_, de 2.ª os hospitaes _Juan Fernandez_, _Theodoro Alvarez_ e _Pirovano_, e de 3.ª as seis Estações Sanitarias. Completam o numero a _Casa de Aislamento_, ou _Hospital F. J. Muñiz_ e o _Sanatorio Enrique Tornú_. Além dos nacionaes e municipaes ha os hospitaes coloniaes-estrangeiros, que são o Italiano, o Hespanhol, o Francez, o Britannico e o Allemão. Foi o seguinte, o movimento geral de todos os hospitaes de Buenos-Aires, em 1907: Hospitaes Doentes tratados Mortalidade —S. Roque 6:624 633 —Rivadavia 4:041 247 —de Niños 2:280 293 —Militar 2:272 75 —Rawson 5:369 571 —F. J. Muñiz 5:409 1:226 —J. A. Fernandez 2:272 182 —Ophtalmologico 155 —Pirovano 1:607 173 —Theodoro Alvarez 2:478 270 —Cosme Argerich 525 46 —Sanatorio Tornú 328 74 —Italiano 3:957 198 —Hespanhol 2:394 153 —Francez 1:235 139 —Britannico 1:833 87 —Allemão 1:003 77 ------ ----- 43:782 4:444 Quanto ao Manicomio, ou _Hospital de las Mercedes_, o movimento foi: —Homens—1:157, entrados durante o anno, 235, curados, 445, melhorados, 98 sem melhoras, 25 evadidos e 321 mortos. —Mulheres—887 entradas, 112 curadas, 220 melhoradas, 220 sem melhoras e 200 mortas. Em 31 de Março de 1908 existiam, em todos os hospitaes de Buenos-Aires, 4:153 doentes, tendo fallecido n’esse 1.º trimestre e nos mesmos hospitaes, 133 enfermos argentinos e 246 estrangeiros. Em todos os asylos da capital, ficaram na mesma data, 8:588 asylados, tendo fallecido no 1.º trimestre d’esse anno, 39 argentinos e 8 estrangeiros. Em egual trimestre foram prestados 2:962 primeiros auxilios publicos, dadas 26:946 consultas externas, applicados 46:429 banhos publicos, vaccinadas e revaccinadas 13:091 pessôas e feitos 2:915 exames bacteriologicos. No mesmo periodo foram cremados 58 cadaveres, todos de hospitaes. Ainda no mesmo trimestre dormiram, nos 3 Asylos Nocturnos, 8:733 individuos e fôram distribuidas 11:311 refeições e 778 rações de pão, leite e carne. No Manicomio, o movimento, n’esse espaço de tempo, foi de 94 homens entrados, 16 curados, 20 melhorados, 7 sem melhoras, 3 fugidos, 27 mortos e 1:762 existentes em 31 de Março. Na secção feminina houve 64 entradas, 23 curas, 20 melhoras, 17 casos sem melhora, 1 fuga e 14 mortes. Existencia, em 31 de Março de 1908, 1:946 alienadas. * * * * * Os serviços de beneficencia e assistencia publica estão, principalmente, a cargo das seguintes entidades: Assistencia Publica (municipal) e Sociedade Nacional de Beneficencia, incorporada ao ministerio das Relações Exteriores e dos Cultos. A _Administração Sanitaria y Assistencia Publica_, sua designação official, é uma repartição municipal com jurisdicção em toda a capital da Republica. Depende do Departamento Executivo, que resolve, em ultima instancia, todas as questões administrativas. Technicamente, a _Assistencia_ é autonoma, governando-a uma Direcção Geral, composta de um Director, um sub-Director, um Secretario e dois empregados superiores, que dividem, entre si, a chefia dos serviços medicos e sanitarios. Funcciona na Casa Central, antigo Hospital de Mulheres. Ahi estão os escriptorios de administração, estatistica, hygiene e prophylaxia; consultorios, pharmacia, salas de curativo, laboratorio, gabinete vaccinico, drogaria, aposentos do pessoal, depositos e dependencias. O fim d’esta instituição municipal é soccorrer os necessitados que, transitoria ou definitivamente, vejam-se impedidos de occorrer ás proprias enfermidades e á extrema miseria. Ha duas categorias de pobres a soccorrer, os de _solemnidade_, ou de 1.ª categoria, que teem direito á assistencia gratuita, e os de 2.ª categoria, que pagam 0,30 centavos por cada receita. As consultas são gratuitas para todos os indigentes, bem como os primeiros auxilios, isto é, os curativos e os soccorros na via publica. Á 2.ª categoria pertencem, geralmente, os operarios que, pelo seu exiguo salario, não podem custear assistencia particular. O serviço é dividido em dois ramos principaes—medico e de hygiene e prophylaxia. A assistencia medica subdivide-se em serviço permanente na Casa Central, nas estações sanitarias, em dois consultorios seccionaes e na assistencia hospitalar em oito estabelecimentos. Logo que o necessitado chega á Casa Central, dirige-se á repartição do Registro, onde é visado o seu certificado de pobreza, e segundo o seu gráu, recebe uma papeleta de 1.ª ou de 2.ª categoria. Se é para curar-se em casa, espera que lhe aviem a receita, na pharmacia; se está infeccionado, ou gravemente enfermo, é recolhido aos hospitaes geraes ou á _Casa de Aislamento_. Além dos consultorios geraes, em numero de seis, ha os especiaes de ophtalmologia, odontologia, genecologia, das vias urinarias e venereo-syphlitico. Seis facultativos fazem visitas domiciliarias e gratuitas, durante a noite, nos seis districtos em que, para esse effeito, está dividida a cidade. Para as visitas urgentes ha medicos especiaes que se revézam, fazendo guarda na Casa Central. Estas visitas, incluidas na secção de _primeiros auxilios_, podem ser pedidas por qualquer habitante, sem distincção de classe nem de posição social. Verificada a situação do soccorrido, se é abastado compete-lhe retribuir os serviços prestados, com uma quantia, a tarifa estipulada, em beneficio do patrimonio da Casa Central. Ha tambem uma parteira permanente para acudir a qualquer chamada para os serviços da sua especialidade. Se houvér muitas requisições, ao mesmo tempo, os medicos internos auxiliam a referida parteira. Os mesmos facultativos prestam gratuitamente o serviço de reconhecimento e exame das amas de leite, bem como os attestados de obito dos individuos fallecidos sem assistencia medica. Basta um simples aviso telephonico para que da Casa Central, ou das suas succursaes já mencionadas, parta uma ambulancia com todos os recursos para soccorro immediato na via publica e em domicilio. Este serviço é rapido, perfeito e pratico, constituindo o primeiro elemento, em todo o sentido, de assistencia publica em Buenos-Aires. Logo que o guarda recebe o aviso telegraphico ou telephonico, indicando-lhe o domicilio ou o local onde caiu a victima, faz funccionar o timbre de alarme, que avisa, ao mesmo tempo, o praticante e o encarregado das ambulancias. A _Assistencia_ tambem manda buscar os cadaveres de indigentes victimados nas ruas ou nos domicilios, e transportal-os aos cemiterios. * * * * * A _Sociedad de Beneficencia de la Capital_, é a mais importante das entidades nacionaes de beneficencia publica. É administrada por uma commissão das mais distinctas senhoras da sociedade buonarense, e está sob a immediata direcção do _Ministerio de Relaciones Exteriores y Culto_. Foi creada em 2 de Janeiro de 1823, durante a administração do general Rodriguez, pelo eminente estadista D. Bernardino Rivadavia. As suas funcções abrangem desde a assistencia physica e a educação infantil, até ao estimulo moral e religioso, distribuindo premios á virtude. Tem fundado hospitaes, asylos e escólas e dirige nove estabelecimentos de caridade, os hospitaes Rivadavia, dos _Niños, de las Mercedes_ (mulheres), o Consultorio Ophtalmologico, a Casa de Expostos e os asylos de Orfãos, Maritimo e _de las Mercedes_. Em 31 de Dezembro de 1907, era o seguinte o estado financeiro d’esta Sociedade: RECEITA Recebido da Loteria Nacional 2:272:020 » da Thesouraria Nacional 369:705 » de donativos e legados 431:583 » de festas de caridade 52:346 » de pensões cobradas 272:415 » de alugueis, multas de policia, lei do jogo, etc. 20:128 » do Banco da Nação (conta corrente) 3:542:132 » por garantia de contratos 21:828 » por operações de ordem interna 48:885 --------- 7:031:042 DESPEZA Pago por gastos ordinarios nos estabelecimentos a cargo da Sociedade 1:532:289 Pago por gastos extraordinarios nos mesmos estabelecimentos 224:681 Obras do Asylo de Lomas 165:116 Construcção do pavilhão Pellegrini na Casa dos Expostos 142:163 Compras por licitação 821:564 Esmolas 28:268 Premios á virtude 16:120 Deposito feito no Banco da Nação (conta corrente) 4:020:473 Depositos devolvidos 21:234 Diversas operações de ordem interna 40:400 --------- 7:012:306 Saldo em caixa, em 31 de Dezembro de 1907 25:351, pesos argentinos, valendo cada peso cêrca de 450 réis portuguezes. * * * * * Como se vê pelo desenvolvimento d’este longo capitulo, a beneficencia e assistencia publicas estão perfeitamente creadas na capital argentina. O que falta é ampliar os estabelecimentos já existentes, ou crear outros novos, attendendo a que frequentemente os hospitaes municipaes e nacionaes, e tambem os asylos, comportam mais enfermos e asylados do que a propria lotação, e isto devido não só ao assombroso e constante augmento da população da capital, mas tambem á falta de hospitaes e asylos nas provincias, o que faz convergir para Buenos-Aires a grande maioria dos necessitados de todo o paiz. Beneficencia Particular As associações beneficentes de Buenos-Aires, com caracter particular, podem ser divididas em duas categorias—as que prestam auxilio a qualquer habitante da capital e as que só o fazem aos seus associados, nacionaes e estrangeiros. As primeiras prestam serviços de caracter social, sustentando e protegendo asylos, escólas, institutos de surdos-mudos e de cegos, etc., ao passo que as segundas, geralmente, só auxiliam os seus contribuintes e os seus hospitaes, que apenas admittem os individuos da propria nacionalidade. * * * * * O _Patronato da Infancia_, que funcciona desde 1892, tem por especial missão proteger e assistir ás creanças pobres, enfermas e abandonadas. Começou por abrir um consultorio medico e hoje, graças a donativos particulares e a festas de caridade, possúe dois asylos de engeitados, ou expostos, com capacidade, cada um, para 200 creanças, em edificios proprios; o internato _Manuel Aguirre_, onde recebem-se creanças, internas, de ambos os sexos, de tres mezes a seis annos; uma escóla de artes e officios; uma colonia agricola em Claypole, e consultorios gratuitos, para creanças, dirigidos por cinco medicos especialistas. Além d’isso, o _Patronato_ custeia e redige a _Revista de Hygiene Infantil_, com uma tiragem de 20:000 exemplares, destinada a instruir as mães e as amas sobre a maneira de alimentar e cuidar das creanças, desde os primeiros dias de nascidas. * * * * * A Sociedade de S. Vicente de Paula, fundada e dirigida por distinctas damas da capital, sustenta quatro asylos maternaes, onde são recebidas creanças pobres de ambos os sexos, de 3 a 10 annos, desde as 7 da manhã até ás 4 da tarde, fornecendo-lhes almoço e lições de primeiras lettras. Estas creanças pertencem, na quasi totalidade, a operarios que não teem a quem entregal-as durante as horas de trabalho nas officinas, e é esse o fim humanitario dos referidos asylos. * * * * * Ha, em Buenos-Aires, dois estabelecimentos, um para cada sexo, destinados á educação dos surdos-mudos. Annexa ao Asylo de Orfãos, da Sociedade de Beneficencia, funcciona uma secção para cegos, porém esta installação é insufficiente a um centro da importancia da metropole argentina, notando-se a falta de uma instituição para abrigar e tratar os indigentes faltos de vista. * * * * * Existem, actualmente, seis orfanatos—_Asilo de Huérfanos Militares_, _Asilo Naval_, _Sociedad Hermanas de los Desamparados_, _Asilo del Pino_, _Asilo de Niños Desvalidos_ e _Huerfanato Francés_. São mantidos por egual numero de associações beneficentes e recolhem menores indigentes até aos 14 annos, educam-os e ensinam-lhes officios manuaes, segundo as aptidões dos asylados. * * * * * São cinco as sociedades estrangeiras de beneficencia que sustentam hospitaes para os seus nacionaes: —_Sociedad Española de Beneficencia_, _Societá del Ospedale Italiano_, _Societé Philantropique Française_, e as que custeiam os hospitaes inglez e allemão. O Hospital Italiano é o maior e o mais importante. Occupa um vasto e bello edificio, expressamente construido para o effeito e servido por escolhido pessoal technico. * * * * * _A Liga Argentina Anti-Tuberculosa_, tem o triplice caracter de associação particular, nacional e municipal. De iniciativa individual, a _Liga_ é hoje patrocinada pelo Ministerio do Interior e pela Camara Municipal que, de accôrdo com ella, fundou o Sanatorio Enrique Tornú. Até 1902 os tuberculosos eram admittidos nas enfermarias geraes dos hospitaes communs; apenas os mais graves eram directamente mandados para a _Casa de Aislamento_. Foi n’esse anno que a Liga começou a desenvolver a sua benefica acção, fundando uma revista, destinada não só a combater os elementos sociaes alimentadores do terrivel mal, como a prescrever os meios de prevenir e de curar a tuberculose; e fazendo adoptar, nos estabelecimentos publicos e por toda a parte, medidas tendentes a evitar a propagação do maior inimigo da humanidade. A Liga, auxiliada pelo governo e pela municipalidade, fundou os dois dispensarios Enrique Tornú e G. Rawson, com o fim de prestar assistencia e protecção aos tuberculosos indigentes, proporcionando-lhes alimentos, roupas de cama e de corpo, escarradores de bolso e de quarto, alguns comestiveis e, diariamente, 750 grammas de carne, meio kilo de pão e um litro de leite. Como complemento a estes dispensarios, a Camara Municipal creou o Sanatorio Tornú, já descripto e que hospitalisando, magnificamente, os tuberculosos considerados curaveis, auxilia poderosamente a Liga na sua missão eminentemente philantropica. O altruismo dos habitantes de Buenos-Aires exteriorisa-se, principalmente, nas festas publicas de caridade, que são, em geral, brilhantes e enormemente concorridas, e quasi sempre promovidas pelas damas da alta sociedade, que dirigem as duas principaes associações beneficentes da capital. Salubridade e Hygiene Duas poderosas instituições salvaguardam a salubridade e a hygiene da metropole argentina—a _Inspeccion Técnica de Higiene_, e o _Departamento Nacional de Higiene_. A primeira é municipal e a segunda é nacional. Como o seu titulo o indica, o _Departamento_ cuida da salubridade e hygiene de toda a Republica, ao passo que a _Inspeccion_ dedica-se, especialmente, ao municipio de Buenos-Aires, e por isso d’ella nos occuparemos minuciosamente, attendendo á indole d’este livro. A _Inspeccion Técnica de Higiene_, funcciona desde 1892 e foi creada immediatamente depois da _Administración Sanitaria e Asistencia Publica_, dependendo o seu Director do d’esta _Administración_. Os seus deveres são investigar tudo quanto seja prejudicial á saúde publica; inspeccionar o estado sanitario do municipio; evitar o desenvolvimento e a propagação das enfermidades; vigiar a installação e funccionamento dos estabelecimentos incommodos e insalubres, taes como os mercados, cavallariças, fabricas, prostibulos, etc.; e vigiar pelo cumprimento das posturas municipaes. O serviço divide-se em tres secções; —Inspecção, que comprehende a hygiene pessoal e a veterinaria. —Desinfecção, praticada em domicilio ou nas estações officiaes. —Prophylaxia, ou vaccinação, feita como a desinfecção. Para este serviço, o da desinfecção, ha duas grandes estufas geraes, uma estabelecida ao Norte e a outra ao Sul da cidade. Logo que o proprietario, o vizinho ou qualquer cidadão qualificado denuncie a existencia de um fóco infeccioso, o inspector sanitario da secção respectiva váe pessoalmente verifical-o e constatando-o, immediatamente faz remover o habitante ou os habitantes para a Casa de Isolamento e requisita o pessoal de desinfecção para o saneamento do domicilio, o qual é feito segundo a gravidade do caso. De ordinario, as roupas de uso, colchões, camas e outros objectos em contacto com o infeccionado são levados a uma das estufas geraes, desinfectando-se, nos domicilios, as mobilias, quadros, espelhos e tudo quanto seja menos susceptivel de contagio. Nas estufas adopta-se o systema de vapor a pressão, pelos modelos de Geneste, Dehaitre e Leblanc. O chefe, ou director da _Inspeccion Técnica de Higiene_ tem, sob as suas ordens, um corpo de veterinarios para a inspecção dos animaes e para a fiscalização das carnes. Os veterinarios são divididos em tres grupos, um que visita os matadouros e as fabricas, outro as cavallariças e as vaccarias, e o terceiro os mercados e os açougues. Todo o animal e toda a carne contaminada é logo inutilizada, tomando conta de um e de outra o veterinario, que manda abater os animaes em um deposito especial. Ha um corpo de inspectores para impedir a venda de carnes que não provenham de matadouros e de estabelecimentos auctorisados official e legalmente. A administração municipal de vaccina depende tambem da _Inspeccion Técnica de Higiene_. A vaccina é obrigatoria para todos os habitantes, no primeiro anno do nascimento, ou da installação, e no periodo de dez em dez annos. O Registro Civil, repartição do Estado, remette á _Inspeccion_, a lista dos recemnascidos, cujos parentes são intimados a fazel-os vaccinar. Este serviço effectua-se na Casa Central, nos hospitaes e nos domicilios. Os vaccinadores são medicos e praticantes, sob a direcção de um chefe. Ha um corpo de oito medicos para as visitas, bi-semanaes, aos prostibulos. As mulheres publicas, enfermas, são tratadas em domicilio, que nunca póde ser o prostibulo, ou nos hospitaes, quando indigentes e assim o requeiram. Quando se inscrevem, na repartição competente, entregam-lhes uma caderneta com o retrato, os signaes particulares, o numero da matricula e a nota de sã ou enferma, documento que são obrigadas a mostrar quando lhes seja exigido. Ha agentes-fiscaes encarregados de denunciar e comprovar a prostituição clandestina, e a existencia de casas onde se prostituem mulheres não inscriptas. * * * * * O _Laboratorio Bacteriologico_, municipal, foi creado em 1886 e está installado em edificio especial. Além dos trabalhos de bacteriologia geral, entre elles um curso que já produziu 93 publicações da especialidade, o Laboratorio effectúa analyses chimicas dos productos organicos que lhe são remettidos dos consultorios dos medicos seccionaes; e diariamente, da qualidade das provisões destinadas aos hospitaes. Tambem effectúa as autopsias dos cadaveres de infecciosos e dos de pessôas fallecidas sem assistencia medica. O seu pessoal compõem-se de um chefe, um director de trabalhos, dois ajudantes e dos estudantes da Faculdade de Medicina, inscriptos para o curso geral de bacteriologia. * * * * * O _Laboratorio Pasteur_, de Buenos-Aires, foi fundado pelo doutor Davel, em Setembro de 1886. É o unico que existe em toda a Republica Argentina, e a elle recorrem muitos habitantes das vizinhas Republicas Oriental do Uruguay e do Paraguay. O seu pessoal technico reduz-se a um director e a dois auxiliares. Os resultados da applicação do sôro anti-rabico teem sido surprehendentes. * * * * * A cidade de Buenos-Aires é abastecida por tres systemas, independentes, de aguas correntes. O primeiro é o da cidade, propriamente dita, e o mais importante, a cargo da _Direccion General de Obras de Salubridad_, com agua colhida no rio da Prata; o segundo e o terceiro são os de Flôres e de Belgrano, bairros abastecidos por aguas de poços, canalisadas. O precioso liquido é tirado do rio a 850 metros da costa, defronte do bairro de Belgrano. Eleva-se alli uma Torre de Absorpção, na fórma de um tronco de pyramide quadrangular, á altura de 4,ᵐˢ88 sobre o nivel da agua. No centro está um poço com 9,ᵐˢ60 de profundidade abaixo do leito do rio. A agua entra n’esse poço por quatro aberturas com valvulas e vigas de ferro, para impedir a entrada dos grandes corpos fluctuantes. D’este poço parte um tunnel que conduz a agua ao estabelecimento da Recoleta. Este tunnel consta de duas secções:—a primeira, sob o leito do rio, tem 1:626 metros de longitude e 1,ᵐ524 de diametro; a segunda, entre o rio e o estabelecimento de bombas da Recoleta, tem 4:080 metros de comprimento, e é em fórma de uma ellipse, cujos eixos teem, respectivamente, 1,ᵐ524 e 1,ᵐ057. A primeira secção pode dar passagem, nas aguas baixas ordinarias, a 222:000 metros cubicos de agua por dia, e a segunda a 120:000. Na margem está um poço onde termina o tunnel sub-fluvial e começa o terrestre. A differença de nivel entre um e outro tunnel, dentro do poço, é de 6,ᵐˢ70, o que faz com que o tunnel seja um sifão invertido. Sobre elle, tanto no rio como em terra, ha varios poços que serviram para a construcção e que hoje são aproveitados para ventilação e fiscalização. O estabelecimento da Recoleta occupa uma area de 28:25 hectares. A primeira casa de machinas, ou de bombas elevadoras, tem motores de um poder total de 496 cavallos, que levantam a agua que chega do rio e do nivel de 9,ᵐˢ70 abaixo do sólo, a uma camara geral de distribuição aos depositos. Outras bombas, da força de 431 cavallos, e que estão collocadas em outra casa da margem do rio, no ponto em que termina a parte sub-fluvial do tunnel e começa a terrestre, levantam outra grande massa d’agua, que o tunnel transporta á mesma camara anterior de distribuição, aproveitando-se assim a differença de capacidade existente entre as duas secções do tunnel conductor. Todas as bombas podem elevar a quantidade maxima de 322:617 metros cubicos de agua, em cada 24 horas. Os grandes depositos são dois, com a capacidade de 148:840 metros cubicos, cada um, e com a altura de 3,ᵐˢ46. Cada um d’estes depositos é dividido em tres secções. Quando é preciso proceder á limpeza de uma secção esvasia-se-a por meio de comportas. Estes depositos são enormes excavações, revestidas de paredes de ladrilho prensado. De egual material são as paredes que dividem as secções, e as que formam os canaes para a circulação da agua. Sendo a agua do rio da Prata muito barrenta, não só passa por grandes filtros como é clarificada por uma substancia chamada alumino-ferrea, e que é composta de sulphatos de aluminio e de ferro, empregada na proporção, variavel, de 5 a 10 centigrammas por litro de agua, ou seja de 50 a 100 grammas por metro cubico de agua. A substancia clarificante é lançada no momento em que a agua é levantada do tunnel para a camara ou tanque geral de distribuição aos depositos. Canos de ferro conduzem a agua dos grandes depositos aos filtros, que teem uma superficie total de 48:000 metros quadrados. São oito grandes, e um pequeno, systema Coghlan, e cada filtro está dividido em tres secções independentes, variando a superficie de cada secção de 1:556 a 2:189 metros quadrados. Os filtros estão construidos em grandes excavações, com o fundo de granito cimentado e as paredes de ladrilho prensado. O material filtrante consta, na parte inferior, de um revestimento de pedra grossa, em troços de 15 centimetros e de 0,25 centimetros de espessura; sobreposto a este revestimento, está um outro de pedra fina, da espessura de 0,ᵐ15, em pedaços de 50 a 25 millimetros; um revestimento de areia grossa, de 0,ᵐ10 de espessura e outro de areia fina, com a espessura de 1ᵐ a 1,ᵐ20. Os grãos de areia fina teem, na quasi totalidade, um tamanho comprehendido entre ¼ e 2 millimetros. Esta camada de areia é que filtra a agua; a pedra e a areia grossa servem-lhe de supporte. A agua filtrada cáe em pequenos depositos ladrilhados e quatro dos filtros teem, por baixo, grandes depositos de agua filtrada com a capacidade de 70:000 metros cubicos, e que servem de reservas. Estas reservas de agua filtrada vão ser elevadas a 200:000 metros cubicos. Dois tunneis perfurados a 8 metros abaixo do nivel do terreno conduzem a agua filtrada aos poços de pressão das machinas impulsoras, que occupam tres casas do estabelecimento da Recoleta, e que levantam 254:778 metros cubicos de agua em cada 24 horas. Oito canos de pressão e de varios diametros conduzem a agua, prompta para o consumo, ao Grande Deposito Distribuidor, ou Palacio das Aguas Correntes, já descripto na secção—_Monumentos_—e situado entre as ruas de Cordoba, Rio Bamba, Viamonte e Ayacucho. Os oito canos, ao chegarem ao Grande Deposito, juntam-se uns aos outros, até ficarem reduzidos a dois, que atravessam o Deposito de Norte a Sul, e ao saírem d’elle ramificam-se de novo nas rêdes dos canos geraes. Estes canos, cujo diametro varia de 0,152 a 0,914, constituem uma rêde de grandes malhas, que alimenta os canos de distribuição pelos domicilios. Toda a canalização é de ferro fundido e está munida de valvulas para obstar a que a ruptura de um cano dê logar a inundações e á falta de agua. O comprimento da canalização geral é de 105:056 metros e de 840:929 metros o da canalização de distribuição. Apesar d’isto, apenas 75% da actual população de Buenos-Aires é directamente abastecida de agua. Flôres já foi ultimamente ligada ao abastecimento geral; apenas o grande bairro de Belgrano continua a ser abastecido por agua dos poços, levantada e distribuida por bombas e canos de pressão a vapor. O consumo annual de agua, na metropole argentina, é de cêrca de 50 milhões de metros cubicos, gastando, na média, cada habitante, 270 litros de agua por dia. * * * * * Para o importantissimo serviço de cloacas e de aguas servidas, a cidade da Buenos-Aires está dividida em 30 districtos. Os limites de cada districto estão determinados pela configuração do terreno. Á excepção de alguns districtos, que teem um funccionamento especial, o desaguamento effectua-se da maneira seguinte: As _cloacas collectoras_, construidas, geralmente, no centro das ruas, recebem as aguas servidas e as da chuva por intermedio das _cloacas domiciliarias_ e dos _sumidouros_. As cloacas domiciliarias recebem as aguas servidas e as da chuva, que cáe em cada propriedade. Os sumidouros recebem a agua da chuva que cáe nas ruas e estão construidos na proporção de quatro por cada quarteirão, ou quadra, dois a meio e dois nas extremidades mais baixas. Por meio das cloacas collectoras, que vão unindo-se umas ás outras, as aguas attingem uma _camara reguladora_, construida no ponto mais baixo do districto. D’aqui as aguas passam á _cloaca interceptora_, uma por cada districto. A capacidade dos conductores é regulada para uma chuva até 6 millimetros por 24 horas. Em caso de grandes chuvas, os conductores transbordam e as aguas pluviaes misturadas com os detrictos e as aguas servidas, cáem em _conductores de tormenta_ e por elles vão desaguar directamente no rio. Da _cloaca interceptora_, de cada districto, as aguas geraes passam á _cloaca maxima_, que atravessa a cidade de Norte a Sul, cruza o rio Riachuelo por meio de um siphão invertido, que é obra de grande importancia, e desemboca no rio da Prata, defronte de Berazategui. O seu comprimento é de 31:923 metros, dos quaes 27:331 são de alvenaria, 4:522 constam de tres canos de ferro fundido de 1,ᵐ067 de diametro, cada um, e 70 metros são correspondentes ao siphão. Até ao estabelecimento de _Puente Chico_, o desaguamento é feito por simples gravitação, porém n’aquelle ponto é preciso levantar as aguas por meio de bombas, á altura de 14 metros. A capacidade das bombas é de 296:755 metros cubicos de agua em cada 24 horas, e a dos motores é de 924 cavallos, indicados. Em todas as ruas ha varias _boccas de registro_, para a inspecção e limpeza das _cloacas collectoras_. Entre estas e as _cloacas domiciliarias_ estão as _cloacas domiciliarias externas_, formadas de ramaes de barro cosido, do diametro de 0,ᵐ152, e que conduzem as aguas d’estas para aquellas. Cada uma das _cloacas domiciliarias externas_ tem um cano de ventilação, com o diametro de 0,ᵐ102, collocado em frente das casas, e um siphão que as separa das cloacas domiciliarias internas. Os _conductores de tormenta_, que recebem o excesso das aguas da canalisação geral das cloacas e a agua da chuva caída nos sumidouros das ruas e praças, são nove principaes, bifurcando-se alguns d’elles em varios ramaes. Teem 4,ᵐˢ27 de largura e 3,ᵐˢ66 de altura. Estes conductores desagúam em um conductor geral, formado por uma galeria, desde a rua Garay até á rua Mejico, por duas galerias, desde esta rua até á de Cangallo, e, finalmente, por tres galerias desde este ponto até ao desaguamento geral no rio, no molhe Norte do porto. Desde a juncção até ao rio, esta galeria tem 22,ᵐˢ50 de largura. O comprimento total d’este grande conductor é de 3:792 metros. A area com o serviço de cloacas abrange uma superficie de 2:557 hectares. O serviço de aguas correntes acompanha não só a rêde geral de desaguamento de aguas servidas, como prolonga-se a bairros afastados que, como Flôres e Belgrano, ainda não possúem o serviço geral e completo de aguas servidas e de chuva. É de cêrca de 600 kilometros a extensão da canalização geral relacionada com a rêde geral das cloacas. * * * * * O serviço de limpeza publica está a cargo de um Administrador Geral, que tem sob as suas ordens um pessoal composto de 1:630 individuos. O orçamento annual, para custeio d’este importantissimo ramo do serviço publico, ultrapassa, actualmente, a somma de tres milhões de pesos argentinos, ou sejam cêrca de 1:400 contos de réis, em moeda portugueza. O processo de limpeza publica comprehende tres serviços, 1.º a rega, varredura, lavagem de ruas e _papeleiros_; 2.º apanha de lixo e 3.º a queima de lixo e de animaes. Para a realização d’estes serviços, está a cidade dividida em duas secções principaes, a do Norte e a do Sul, servidas, respectivamente, segundo o recenseamento municipal de 1907, por 813 e 754 empregados. Estas secções subdividem-se, cada uma, em tres outras que abrangem varios bairros, havendo uma secção especial para o Parque de Palermo e suas dependencias. Ao Norte, ao Sul, e em Palermo, ha grandes curraes-depositos de material e de gado, cêrca de dois mil cavallos. Em 1907 havia um total de 535 vehiculos, assim descriminados:—281 carros de limpeza, 77 carros-varredores, 10 carros de forragem, 23 ditos _papeleiros_, 50 machinas varredoras, 31 ditas de rega diurna, 23 ditas de rega nocturna e 40 carros de transporte. O serviço de limpeza publica é feito á noite, desde as 9 horas até terminar. O pessoal de cada uma das grandes secções, do Norte e do Sul, percorre, em cada noite, de 600 a 700 quadras, não sendo, ainda assim, possivel fazer-se, em uma só noite, a limpeza de toda a cidade. Durante o dia a limpeza é feita por peões, em numero de cêrca de 800, chamados _papeleiros_, porque varrem e apanham os papeis e outras sujidades das ruas, que depositam em carrinhos de mão de 100 decimetros cubicos de volume. Quando cheios, estes pequenos vehiculos são empurrados para junto dos carros _papeleiros_, puxados a 1 e 2 mulas e divididos por secções, e ahi despejado o seu conteúdo. Tambem são usadas as regas nocturnas e diurnas por meio de mangueiras. A queima do lixo e dos animaes é feita por contracto da Camara Municipal, com uma empreza particular e effectua-se em um vasto terreno fóra da cidade, e ainda pelo primitivo processo da labareda ao ar livre, não tendo sido até agora adoptados os fornos crematorios, não obstante varias experiencias já feitas n’esse sentido. Os cães vadios são apanhados na via publica, durante a noite, por individuos munidos de laços e acompanhados de carros-jaulas. Os cães não reclamados no prazo de 48 horas, são asphyxiados, aos grupos de 100, por uma corrente de acido carbonico, dentro de um recinto hermeticamente fechado. Passa de 12:000 o numero de cães apanhados annualmente. * * * * * Em 1906, dos 1:084:113 habitantes de Buenos-Aires, morreram 17:916, o que dá a proporção de 16.52 por 1:000 individuos. D’esse numero, 1:662 nasceram mortos; eram 10:565 argentinos e 7:351 estrangeiros. D’estes, 3:379 eram italianos, 1:795 hespanhóes, 672 francezes, 158 inglezes, 134 allemães, 345 uruguayos e 868 de outras nacionalidades. Homens eram 10:462 e mulheres 7:454. Solteiros, 11:155, casados, 4:724, viuvos, 1:860. No mesmo anno nasceram 36:009 pessôas, sendo 18:362 do sexo masculino e 17:647 do feminino. Nascimentos legitimos, 31:062, illegitimos, 4:947. No mez de Março de 1908 nasceram 1:478 varões legitimos e 213 illegitimos e 1:445 meninas legitimas e 208 illegitimas. Em egual mez realisaram-se 748 casamentos civis e 387 religiosos, e falleceram 1:528 pessôas, sendo 894 varões e 634 mulheres. No mesmo mez e para uma população de 1:150:000 habitantes, foram abatidas 50:992 cabeças de gado, nos matadouros de Liniers. Instrucção Publica Uma lei de 1884 declara obrigatoria a instrucção para todos os argentinos de 6 a 14 annos do edade, apenas com o pagamento da matricula, na importancia annual de um peso nacional, ou sejam 450 réis portuguezes. D’essa mesma despeza é dispensado todo aquelle que perante a auctoridade respectiva, provar a impossibilidade de satisfazêl-a. N’este caso tambem o Estado fornece, gratuitamente, os livros e o mais que fôr indispensavel á instrucção. A mesma lei creou, para a direcção da instrucção primaria, o Conselho Nacional de Educação, que tem por auxiliares um corpo de inspectores technicos e os Conselhos Escolares de Districto, formados por paes de familia encarregados da inspecção administrativa das escólas. O Conselho Nacional de Educação, funcciona na capital, sob a dependencia do Ministerio da Instrucção Publica, e ao mesmo tempo que tem a direcção facultativa e a administração geral das escólas, gosa de amplas attribuições, que permittem-lhe desenvolver, com inteira independencia, a sua esphera de acção. A instrucção publica comprehende a instrucção primaria, a instrucção secundaria, a instrucção normal, commercial e industrial e a instrucção superior. A instrucção primaria é, em Buenos-Aires, dada officialmente em escólas superiores de meninos, superiores de meninas, elementares de meninos, elementares de meninas, infantis, nocturnas e militares. O seu numero era, em 1908 e respectivamente, de 19, 27, 38, 59, 55, 40 e 80. Ao todo 318 escólas primarias e officiaes. Em 31 de Março de 1908, estavam inscriptos, n’essas escólas, 83:171 alumnos, com a frequencia média de 68:183. A instrucção secundaria é fornecida nos seguintes estabelecimentos officiaes, cuja frequencia é da mesma data acima: Collegio Nacional Central 692 alumnos » » de Oeste 388 » » » do Sul 337 » » » do Norte 385 » » » de Noroeste 287 » Instituto Livre de Ensino Secundario 186 » ----- 2:275 » A instrucção normal, commercial e industrial, consta das seguintes instituições officiaes: —Instituto do Professorado Secundario 243 alumnos —Escóla Normal de Professores 139 » — » » » Professoras, n.º 1 440 » —Escóla Normal de Professoras, n.º 2 565 » —Escóla Nacional de Commercio, para Varões (Central) 714 » —Escóla Nacional de Commercio, para Varões (Sul) 292 » —Escóla Nacional de Commercio, para Mulheres 276 » —Escóla Industrial da Nação 36 » —Escóla Profissional de Artes e Officios, n.º 1 (mulheres) 316 » —Escóla Profissional de Artes e Officios, n.º 2 (mulheres) 565 » —Instituto Nacional de Surdas-Mudas 94 » —Instituto Nacional de Surdos-Mudos 92 » —Instituto Nacional de Meninas Cegas 22 » ----- 3:794 » Finalmente, a instrucção superior está a cargo da Universidade, com as seguintes Faculdades, e a matricula em 31 de Março de 1908: —Faculdade de Mathematica 490 alumnos — » de Medicina 2:467 » — » de Direito 1:038 » — » de Philosophia e Lettras 77 » ----- 4:072 » As escólas para a instrucção primaria e official estão divididas em 14 districtos e eram, segundo a ultima estatistica, regidas por 298 professores ordinarios e 67 especiaes, as do sexo masculino, e por 1:579 professoras ordinarias e 318 especiaes as do sexo feminino. Total 2:262 professores de ambos os sexos, para 318 escólas e 83:000 alumnos. As escólas primarias fôram, ha poucos annos, dotadas com bellos e amplos edificios, verdadeiramente modelares, mas nem assim são sufficientes ás exigencias do ensino e á frequencia, sempre em augmento, de alumnos de ambos os sexos, pelo que o Conselho Nacional de Educação, adoptou o horario alternado, o que permitte ensinar nas mesmas escólas um numero duplicado de alumnos. A Escóla Presidente Roca, modelar como são as escólas Sarmiento, Pellegrini, Rodrigues Peña, Rivadavia, Benjamin Zorilla, Saavedra, Irigoyen, etc., occupa um bellissimo edificio em estylo corinthio, na praça Lavalle. Era frequentada, em Junho de 1908, por 350 alumnos do sexo masculino. Encerra 10 salas de classe, onde funccionam 10 cursos, ou classes, diariamente. Ha, tambem, curso livre de francez, escóla official de primeiras lettras e escóla nocturna. Em volta de todas as aulas vê-se, na parede, um revestimento de lousa, de 3 metros de altura. Cada sala de aula tem o nome de um dos próceres da independencia nacional, assim como o seu retrato. O mobiliario consta de uma mesinha de graduar altura e o competente assento de madeira e ferro. Funcciona n’esta, como nas outras escólas, o _Copo de Leite_, designação popular, officialmente—_Amigos da Educação_—instituição fundada, em 1906, pelo dr. Genaro Sixto. Cada creança tem, diariamente, um copo de leite, esterilizado, com 250 grammas. Constituem esta associação os proprios paes dos alumnos. A mesma collectividade organisa bibliothecas, nas escólas elementares, destinadas aos professores, alumnos, aos vizinhos das escólas e ao publico em geral. A bibliotheca da Escóla Presidente Roca, já conta cêrca de 2:500 volumes, patentes de dia e á noite. A mesma associação publíca uma revista mensal intitulada—_La Escuela Moderna_—orgão da sociedade e collaborada pelos professores, pelos paes dos alumnos e por estes, quando os seus escriptos sejam julgados dignos de admissão. Cada uma d’estas escólas tem um museu fundado pelos proprios alumnos. O da escóla que nos occupa consta de productos da historia natural, objectos de ensino e trabalhos das creanças, tudo colleccionado, classificado e arrumado em armarios envidraçados. N’estes museus são dadas lições com projecções luminosas. Cada escóla tem um jardim, cuidado pelos alumnos, que o dividem em secções. Cada alumno possúe um livro para inserir, diariamente, o seu relatorio com as observações metereologicas, o estado dos seus estudos, o desenvolvimento das plantas a seu cargo, e outras minudencias. Em todas as materias, o ensino é pratico. O livro, nas escólas argentinas, é um simples auxiliar. Todas estas escólas teem officinas manuaes, para trabalho em madeira, vestindo os alumnos aventaes apropriados e aprendendo a manejar as varias ferramentas para trabalhar em madeira, escolhendo depois o modêlo que preferem. * * * * * O Conselho Nacional de Educação, funcciona no palacio da Educação Nacional, na praça Rodriguez Peña. Além da importante bibliotheca, que descreveremos em capitulo especial, encerra um Museu Escolar, interessantissimo, grande numero de escriptorios de serviço e um grandioso salão de conferencias. O programma official de ensino, nos collegios nacionaes, abrange as seguintes materias: 1.º anno—Francez 3 horas semanaes —Hespanhol 3 » » —Historia Argentina 4 » » —Arithmetica 4 » » —Historia Natural (Zoologia e Botanica) 3 » » —Geographia Argentina 3 » » —Desenho 3 » » —Trabalho Manual e Educação Physica 6 » » 2.º anno—Hespanhol 3 » » —Francez 3 » » —Historia Argentina 3 » » —Arithmetica e contabilidade 3 » » —Geometria 3 » » —Historia Natural, Mineralogia e Geologia 3 » » —Geographia Argentina 2 » » —Desenho, trabalho manual e educação physica 6 » » 3.º anno—Hespanhol (idioma e litteratura) 2 » » —Francez 3 » » —Inglez 3 » » —Historia da America 2 » » —Algebra 2 » » —Geometria 2 » » —Historia Natural, Anatomia e Physiologia 2 » » —Geographia da America 2 » » —Desenho 3 » » —Educação Physica 3 » » 4.º anno—Litteratura 3 » » —Inglez 3 » » —Historia Antiga 3 » » —Algebra 2 » » —Physica 3 » » —Chimica Inorganica 3 » » —Historia Natural, Physiologia e Hygiene 3 » » —Geographia da Asia e Africa 2 » » —Desenho e Educação Physica 6 » » 5.º anno—Litteratura 3 » » —Inglez 3 » » —Italiano 2 » » —Historia da Grecia, Roma e Edade Media 3 » » —Philosophia 3 » » —Physica 3 » » —Chimica Organica 3 » » —Geographia da Europa e Oceania 2 » » —Educação Physica 6 » » 6.º anno—Litteratura 3 » » —Italiano 2 » » —Historia Moderna e Contemporanea 3 » » —Philosophia 3 » » —Instrucção Civica 3 » » —Cosmographia 2 » » —Geographia Physica, Geral e Chimica Analytica 3 » » —Educação Physica 6 » » O programma official de estudos para as 4 Escólas Normaes de Professores, 2 para cada sexo, é como segue: 1.º anno:—Arithmetica, Historia Antiga, Grega e Romana, Geographia da Asia e da Africa, Hespanhol, Francez, Historia Natural (zoologia e botanica), Physica, Chimica, Pedagogia Theorica, Pedagogia Pratica e Educação Physica. 2.º anno—Arithmetica e Algebra, Historia Medieval e Moderna, Geographia da Europa e da Oceania, Hespanhol, Francez, Historia Natural (mineralogia e geologia), Physica e Chimica, Pedagogia Geral, 2, Pedagogia Pratica, 4 (aulas), Educação Physica. 3.º anno—Algebra e Geometria, Historia Contemporanea e Argentina, Geographia Argentina e Americana, Hespanhol, Francez, Historia Natural (anatomia e physiologia), Pedagogia, 2, Critica, 2, Pratica, 6, Educação Physica. 4.º anno—Cosmographia, Historia Argentina e Americana, Litteratura, Instrucção Moral e Civica, Historia Natural (physiologia e hygiene privada e escolar), Pedagogia e Psychologia, 4, Critica, 2, Pratica, 9. * * * * * Programma para o Professorado Superior: Primeiro anno: —Pedagogia (Sciencia da Educação Pratica e Critica). —Algebra e Geometria. —Historia da Civilisação. —Psychologia Fundamental. —Physiologia applicada á Psychologia. —Litteratura. —Inglez. Segundo anno: —Pedagogia Pratica e Critica. —Hygiene. —Geographia Physica Geral. —Cosmographia e Topographia. —Psychologia Infantil. —Litteratura. —Inglez. * * * * * A Academia de Bellas Artes comprehende tres cursos—o do professorado, o dos collegios nacionaes, ou lyceus, e o das escólas normaes. O curso especial de bellas artes, que abrange a pintura e a esculptura, prepara alumnos ao concurso de viagens de estudos á Europa. Este concurso é para os 2 sexos. N’esta Academia funccionam 22 aulas, diariamente, frequentadas, em Junho de 1908, por 650 alumnos e regidas por vinte e dois professores. As salas e gabinetes onde se effectuam as aulas, são acanhadissimos, sem ar e sem luz. Trata-se, actualmente, da construcção do Palacio das Bellas Artes, para esta Academia, o Museu Nacional e o Conservatorio de Musica. Por emquanto, a Academia está installada no edificio do _Bon Marché_, pertencente á _Companhia Ferro Carril del Pacifico_, nos altos do Museu das Bellas Artes. Os estudos, n’esta Academia, são divididos em: 1.º curso elementar, que abrange o desenho linear e geometrico; 2.º curso elementar, desenho geometrico, desenho de ornato (flora e fauna) e desenho de figura (fragmento de figura humana). 1.º Curso Preparatorio—Desenho de figura humana e animal. Perspectiva. 2.º Curso Preparatorio—Desenho de figura humana, busto e estatua (copiado do modêlo em gêsso) Anatomia Artistica. 3.º Curso Preparatorio—Desenho de figura humana (copia do modêlo vivo, nú e vestido). Historia da Arte. Curso Especial de Pintura. 1.º Curso—Copia em claro, escuro e colorido, da natureza morta. Composição decorativa. 2.º Curso—Copia de cabeça e de meia figura humana, núa e vestida. Composição. 3.º Curso—Copia completa do nú. Composição decorativa moral. Esthetica. Esculptura. 1.º Curso—Modelado de ornato. Modelado de figura humana. Elementos de architectura. 2.º Curso—Modelado de estatua e de figura humana. Copia de modelo vivo. Composição decorativa. 3.º Curso—Modelado de baixo relêvo e estatua de figura humana. Composição monumental. Esthetica. * * * * * A Universidade de Buenos-Aires é constituida pelas Faculdades de Medicina, de Direito, de Philosophia e Lettras e de Engenharia, _ou_ Mathematica. Todas funccionam em edificios separados, porém as melhor installadas são as duas primeiras, ameaçando ruina a casa em que a ultima funcciona. A Faculdade de Medicina funcciona, ha 15 annos, na rua de Cordoba, em um palacio com bella frontaria granitica. As suas principaes installações são: —Amphitheatro geral com bancadas e galeria superior. Notavel quadro decorativo—_A Morte_. —Sala das sessões decorada a retratos dos lentes fallecidos. —Salão para a solemnidade dos actos, decorado a frescos. —Galeria nobre dos lentes fallecidos, guarnecida a bustos e a retratos. —Bibliotheca da especialidade, em 3 salões e com 30:000 volumes. —Laboratorio de Hygiene, com aula para a classe theorica. —Laboratorio de Histologia. Gabinete de nitro-photographia, com camara _escura_ e apparelhos dos mais aperfeiçoados. —Sala e gabinete de microbiologia. —Laboratorio de Clinica Geral, dividido em duas secções, qualitativa e quantitativa. —Laboratorio de Clinica Medica, tambem dividido em 2 secções. —Laboratorio de Physiologia. —Escóla de Pharmacia, com laboratorios, aulas e amphitheatro. —Escóla Pratica de Medicina, installada em um grandioso edificio, ao lado do antecedente e para sua ampliação. —Museu Anatomico. —Laboratorio de Toxicologia. —Salão para congressos medicos. —Amphitheatro de classe. —Museu de Anatomia Pathologica, em 4 salões. Collecção importantissima. —Laboratorio de Anatomia Pathologica. —Sala e gabinete de odonthologia. —Laboratorio de Bacteriologia, em 3 salões. —Dois salões para trabalhos de anatomia. —Grandes depositos de animaes em gaiolas, para experiencias bacteriologicas. —Morgue geral para depositos de cadaveres encontrados no perimetro da cidade, com a parte superior circular e envidraçada. Os cadaveres são expostos, congelados, durante 6 mezes. —Forno crematorio para cadaveres. —Ascensores electricos. —Machinas electricas propulsoras da ventilação, e de congelação e aquecimento. —Grande tanque para conservação de rãs destinadas a experiencias. * * * * * Esta faculdade confere não só o gráu de doutor em medicina, mas tambem os de pharmaceutico, dentista e parteira. O curso de doutorado em medicina abrange sete annos de estudos das seguintes materias: 1.º anno—Zoologia, Botanica e Anatomia Descriptiva. Trabalhos praticos de botanica, zoologia e dissecação. 2.º anno—Anatomia Descriptiva, Histologia, Chimica Medica, Physica Medica. Trabalhos praticos de chimica, physica, histologia e dissecação. 3.º anno—Chimica Biologica, Physiologia geral e humana, Bacteriologia, Anatomia Pathologica. Trabalhos praticos de anatomia pathologica (no 2.º semestre) de bacteriologia, chimica e physiologia. 4.º anno—Pathologia geral, Hygiene publica e privada, Materia medica e therapeutica, Toxicologia e Anatomia Pathologica. Trabalhos praticos de toxicologia, de hygiene, de anatomia pathologica e de pathologia geral. 5.º anno—Pathologia externa, Anatomia topographica, Medicina operatoria, Clinica cirurgica, Clinica octo-rino-laringolica (1.º semestre) Clinica genito-urinaria. Trabalhos praticos no laboratorio central de clinicas e no de dermo-siphilographia e dissecações. 6.º anno—Clinica Cirurgica, Clinica Ophtalmologica, Pathologia interna, Clinica Genecologica, Clinica Medica, e Clinica Neurologica. Trabalhos praticos no laboratorio central de clinicas e no de neurologia. 7.º anno—Clinica obstetrica, Clinica pediatrica, Clinica medica, Clinica epidemiologica, Medicina legal e Clinica psichiatrica. Trabalhos praticos no laboratorio central de clinicas e no de psichiatria. O curso de Pharmacia comprehende tres annos, assim divididos: 1.º anno—Botanica systematica applicada a pharmacia. Pharmacognosia vegetal e animal. Trabalhos praticos de botanica, de chimica inorganica e de pharmacognosia. 2.º anno—Chimica organica applicada a pharmacia. Pharmacia galénica (technica pharmaceutica) e Hygiene. Trabalhos praticos de chimica organica e de pharmacia galénica. 3.º anno—Chimica analytica e toxicologica. Ensaio e determinação de drogas. Trabalhos praticos de chimica analytica e toxicologica, de hygiene e pratica pharmaceutica. O curso de Odontologia abrange: Anatomia, Physiologia e Pathologia (1.º anno) Cirurgia prothetica, Hygiene, Materia medica e therapeutica dentaria, bem como o 2.º anno de medicina legal e trabalhos praticos, nos 2 annos do curso e no laboratorio odontologico da Faculdade. O ensino da Escóla de Obstetricia, para parteiras, é dado em 2 annos e consta de Parto Physiologico, isto é, anatomia, physiologia, embriologia, embaraço, parto e hygiene obstetrica, no 1.º anno, e de Parto Distócico, isto é, distosia, operações obstetricas e medicina legal e obstetrica para o 2.º anno. * * * * * A Faculdade de Direito e Sciencias Sociaes, funcciona em um edificio granitico e artistico, dividido em dois pavilhões, por um jardim. Á entrada estão as estatuas de José Antonio Moreno e de Antonio Mallavar. As suas principaes divisões são a sala das sessões, 4 salas de aulas, a bibliotheca, com 24:000 volumes e salão de leitura, a secretaria e o salão dos actos, em parte aproveitado para aulas, por causa da deficiencia do edificio. O doutoramento comprehende seis annos de estudos das materias que seguem e um exame geral de theses: Introducção ao direito. Logica das sciencias sociaes. Breve revista dos antigos systemas philosophicos, e ampla exposição dos contemporaneos. Psycologia. Revista da Historia moderna e contemporanea. Direito Romano. Direito Civil. Economia Politica. Direito publico-internacional. Finanças. Direito Penal. Direito Commercial. Direito Constitucional. Legislação rural e de minas. Procedimentos. Philosophia do Direito. Direito internacional-privado. Direito Administrativo. * * * * * _A Faculdade de Sciencias Exactas, Physicas e Naturaes_, designação official da Faculdade de Mathematica, ou de Engenharia, fórma engenheiros civis, engenheiros mechanicos, architectos, agrimensores, doutores em sciencias physico-mathematicas, doutores em sciencias naturaes e doutores em chimica. Para a formatura em engenharia civil são precisos 6 annos de estudo; em engenharia mechanica 6 annos; em architectura 5 annos: em sciencias physico-mathematicas 5 annos; em sciencias naturaes 4 annos e 5 em chimica. * * * * * A _Faculdade de Philosophia e Lettras_ encerra tres cursos distinctos e completos, além do curso geral, de Sciencia da Educação, que é incluido em todos os outros. Os cursos especiaes são os de Philosophia, Litteratura e Historia. O 1.º comprehende—Psycologia, Logica, Etica, Metaphysica, Sociologia e Historia da Philosophia. O 2.º consta de Latim, Grego, Literaturas latina, grega, hespanhola (da Europa e da America) da Europa Meridional, Esthetica e Litteratura Geral. O curso de Historia exige os estudos de Historia Argentina, Geographia, Historia Universal e Archeologia Americana. Estes cursos abrangem o periodo de cinco annos de estudos. Para obter o grau de doutor, depois dos cinco annos de frequencia, o candidato é submettido a um exame geral e de theses. Além d’estes cursos regulares ha os cursos livres, e as conferencias publicas sobre os cursos regulares, que a Faculdade póde auctorisar mediante requerimento dos interessados. * * * * * Desde 1890 que funccionam na capital argentina, duas Escólas Nacionaes de Commercio, uma para cada sexo. Comprehendem tres cursos, um diurno, para Perito Mercantil e dois nocturnos, para Contador Publico e para Dependente Idoneo do Commercio. Além dos tres diplomas, tambem são expedidos os de Calligrapho e de Estenographo Publico. * * * * * As principaes escolas industriaes de Buenos-Aires, são a Escóla Industrial Argentina e o Collegio Pio IX de Artes e Officios, fundado por padres salesianos. A 1.ª foi fundada, em 1897, pelo ministro Bermejo, e desde 1899 que tem organisação independente. Ambas preparam auxiliares de engenheiros, architectos e directores de fabricas, dividindo-se o ensino em tres especialidades, Mechanica, Construcções e Chimica. Cada uma abrange 6 annos de estudos, sendo communs para as tres especialidades, as materias dos 4 primeiros annos. O ensino é theorico-pratico. A instrucção theorica comprehende as seguintes materias: —Mathematicas (até á iniciação do calculo differencial e integral) topographia, mechanica technica, physica, technologia do calor, electrotechnica, sciencias naturaes, chimica, technologia chimica, desenho linear, geometria descriptiva, estatica graphica, resistencia de materiaes, elementos de machinas, construcção de machinas, technologia mechanica, desenho de machinas, construcções, contabilidade, desenho a pulso, idioma nacional, historia, geographia, calligraphia, francez, inglez, italiano e direito commercial. A instrucção pratica consiste em duas horas diarias de trabalho manual, que os alumnos de todos os annos dos cursos theoricos, effectuam nas officinas de carpintaria, marcenaria, ferraria fundição, electrotechnica e photographica, que estão montadas com os mais aperfeiçoados apparelhos. Annualmente, realisa-se uma exposição dos trabalhos dos alumnos. Estas Escólas conferem os diplomas de Industrial Mechanico, Mestre-Mór de Obras e Industrial Chimico. Museus _Museu Nacional de Bellas Artes_—Foi creado por decreto de 16 de Julho de 1895 e inaugurado em 25 de Dezembro de 1896. São cêrca de 350 os exemplares expostos. Começou por 4 salas e hoje occupa 17, comprehendendo o legado da collecção Adriano Rossi, a collecção, comprada, de Aristobulo del Valle, as principaes obras das collecções de Arraga e Andrés Lamas, 22 mesas incrustadas de nacar, 1:180 pranchas gravadas em cobre, de Piranesi, offerta do governo italiano, e muitas doações particulares, de nacionaes e estrangeiros. A escóla franceza de pintura, a mais largamente representada, ostenta quadros, entre outros, de Corot, Troyon, Bourguignon, Rousseau, Courbét, Monvoisin, Brune, Français, Gustave Doré, Luminais, Laurens, Maillart, Boyer, Papety, Charles van Loo, Gustave Michel, Victor Gilbert, Montenard, Roll, Raphael Collin, Puvis de Chavannes, Meissonier, Le Sueur, Ribot, Blanchon, Vollet, Albert Besnard, Duez, Netter, Tassaert, Lefebvre, Richter, Granié, Saint-Auge, Charton Isabey, Willette, Victorien Bastet, Brissot de Warville, Gaston Prunier e Gervex. Segue-se, em numero, a escóla italiana, cujos representantes são Luca Giordano, Tintoretto, Salvator Rosa, Annibal Carracci, Lippo Memi, Morone, Belloni, Piazzeta, Castiglione, Barabino, Tiépolo, Piranesi, Mitti-Zanetti, Gignous, Armenise, De Rubelli, Agujary, Mantillo, Luigi Rossi, Arduino, De Dominicis, Celentano, Manzoni, Mancini, Deleani, Trentacoste, Patizzi, Victor de Pol e Arduino. Da escóla hespanhóla, ha quadros de Murillo, Alonso Cano, Juan de Joanes, Sánches Coello, Barbudo, de la Rosa, Villavicencio, Goya y Lucientes, Ruiz Luna, Sancha, José de Villegas, Sorolla y Bastida, Doniengo, Meifren, Menezes Osorio e Ramon Cásas. Representam a escóla flamenga, Adrien Brawer, van Thulden, Franck el Viejo, van Crayer, Adrien van Utrecht, Jacob van Oost, Le Roy el Viejo, Jan Chalon e Ferdinand de Braekeleer. Os hollandezes são Barthelemy van der Helst, Schellinks, Both, de Wet, Adrien van Ostade e Palamede Stevens. Ha quadros allemães de Albrecht Adam, Tirchbein, Stadler e Deiker; russos de Chelmonski; norte-americanos de Myers Boggs, Sterner e Alexander Harrison; suecos de Allan Osterlind e Ingeborg Westfalt; inglezes de John Phillip, Schgoer, Hicks, West, David Wilkie e Benham Hay; suissos de Steinlein e uruguayos de Blanes e Pallejá. A escóla brasileira está representada por Decio Villares, Aurelio de Figueiredo e Rowley Mendes. Finalmente, dos pintores argentinos, ha quadros de Correa Morales, Pueyrredón, Agrélo, Franklin Rawson, Collivadino, Giudice, Vela, Malharro, Della Valle, Rodriguez Etchart, Mendilakarzu, Lastra, Boneo, Cafferata, Irurtia, Dresco, Ripamonte, Alonso, de la Cárcova, Sivori, Ballerini, Ricardo Garcia, Schiaffino, Julia Wernicke, Quirós e Maggiolo. Entre as obras primas dos auctores já citados, figuram _La Educacion de la Virgen_, de Alonso Cano, _El Paño de la Veronica_, de Murillo, o _Ecce Homo_, de Juan de Joannes, _La Mujer y el Toro_, de Roll, _Los Estañadores_, de Meissonier, _Partida de Caza_, de Schellincks, _Retrato de Ombre_, de Jacob van Oost, _El Borracho_, de Branner, _Arlequin danza_, de Degas, _Perfil de Mujer_, de Puvis de Chavannes, _Alegoria de la Confraternidad Brasileño-Argentina_, por Decio Villares. Este Museu possúe uma bibliotheca, em formação, de historia e critica artistica. Quanto á esculptura nota-se um busto, de marmore branco, de Victorien Bastet—_La Abandonada_; e muitas copias de trabalhos célebres. _Aurora y Céfalo_, _Jarrão de Sévres_, de François Le Moyse. O director d’este estabelecimento adquiriu, ultimamente, na Europa, cêrca de mil e duzentos exemplares esculpturaes e estatuarios, muitos de grande valor, mas que ainda não estão expostos. O aspecto geral d’este museu, não obstante o seu valor artistico, é sombrio e mesquinho, para o que muito contribúe a sua péssima installação, na rua Florida, 783, altos da Academia das Bellas Artes. * * * * * _Museu de Historia Natural_—Este Museu, que occupava um velho edificio da rua Perú, esquina da rua Alsina, está actualmente fechado por motivo de mudança. Foi fundado pelo Presidente Rivadavia, em 1823. Deu-lhe grande desenvolvimento o professor allemão Burmeister, que o dirigiu durante trinta annos. As suas secções principaes são a _zoologica_, com cêrca de 26:000 exemplares; a _paleonthologica_, com o numero, approximado, de 4:500 exemplares; a _ethnologica_, com uns 1:600 objectos, a _botanica_, com cêrca de 2:400 especies nacionaes e estrangeiras; e a secção _geologica-mineralogica_, com 6:500 exemplares. A bibliotheca especial d’este museu, compõe-se de uns 12:000 volumes. * * * * * _Museu Historico Nacional_—Occupa um pavilhão em dois pavimentos, na rua Defensa, 1:600, ao lado do parque Lezama. No 1.º pavimento ha uma ampla galeria, um corredor, um salão e 2 gabinetes, cujas paredes estão cobertas de retratos a oleo, quadros de batalhas, gravuras e aguarellas, quasi todas sobre assumptos militares. Ao centro e encostados ás paredes, estão vitrinas e armarios envidraçados contendo uniformes e outros objectos que pertenceram aos mais famosos generaes da Republica, e a alguns estrangeiros, entre elles o celebre presidente do Paraguay, Francisco Solano Lopez. Tambem lá estão varios trophéus, entre elles uma bandeira do 2.º regimento de infantaria do exercito brasileiro, tomada no combate de Ituzaimbó, em 1827. O pavimento inferior, apenas encerra um salão com retratos, quadros, lithographias e moveis historicos. Este museu é essencialmente militar, e por militares é inspeccionado, sendo franqueado ao publico apenas duas vezes por semana, aos Domingos e Quintas-feiras, da 1 ás 4 da tarde. Á entrada estão varias peças e alguns obuzes de bronze. A notar, ainda no 1.º pavimento, uma sala especialmente dedicada ao general patriota San Martin, contendo o seu busto, uniforme, armamento, condecorações, a reproducção da casa de Boulogne-sur-Mer, onde elle falleceu e varios outros objectos que lhe pertenceram. * * * * * _Museu de Armas_—Na rua Paraguay, n.º 1321, é a residencia do general Garmendia, que possúe um importante museu de armas. A collecção começou a ser feita em 1894 e continúa a ser enriquecida com objectos dados e doados por amigos do general, e por outros que elle pessoalmente adquire. As armas são antigas e modernas, nacionaes e estrangeiras. D’estas, a melhor e a mais rica secção é a indiana. Escudos, punhaes, carabinas, espadas, floretes, arcabuzes, alabardas, pistolas, lanças, adagas, canhões, achas, trabucos, obuzes, metralhadoras, couraças, mochilas, balas e outros projectis, de tudo se vê em profusão e documentado. Não ha catalogo. Chamam, especialmente, a attenção os punhaes turcos e marroquinos, as armas indianas e algumas levantinas, assim como varios escudos, couraças e alabardas da Edade Média. Em Buenos-Aires, como em todos os grandes centros civilisados, ha muitos collecionadores particulares, especialmente de _bric-á-brac_. Bibliothecas _Bibliotheca Nacional_—Já em 1799, o prelado de Buenos-Aires, D. Manuel Azamor y Ramirez, legára os seus livros para que se fundasse uma bibliotheca publica em Buenos-Aires; porém, só em 1810 a Junta Revolucionaria levou a effeito a fundação da Bibliotheca Nacional, aproveitando esse e outros donativos e offerecimentos. Até 1902 funccionou em um antigo recolhimento de jesuitas; porém hoje occupa um sumptuoso predio, que fôra edificado para séde da Loteria Nacional. Além da sala de leitura, dos depositos de livros, em numero superior a 180:000 e dos escriptorios e gabinetes de serviço, visita-se o magnifico salão, em amphitheatro, que serve para conferencias e para concertos classicos. Este palacio, que é do Conselho Nacional de Educação, na praça Rodriguez Peña, abriga tambem um museu escolar. Publica—_Anales de la Bibliotheca._—Os manuscriptos são cêrca de 8:500. Possúe imprensa, officina de encadernação e estufas de desinfecção de livros. * * * * * _Bibliotheca Municipal Rivadavia_—Na rua Corrientes. Consta, actualmente, de 43:000 volumes. Foi fundada por Domingos Faustino Sarmiento, em 20 de Maio de 1880. Auxiliaram o fundador outros cidadãos e nomeadamente Mitre e Arthur Castanho, que constituiam a _Associação Bernardino Rivadavia_, de onde a bibliotheca tomou o nome. Admitte socios subscriptores, que pagam um peso por mez e teem o direito de levar livros para casa. * * * * * _Bibliotheca General Mitre_—Foi fundada pelo general D. Bartholomeu Mitre e, depois da sua morte, adquirida pelo governo. Occupa o mesmo predio onde o seu antigo proprietario a creou, na rua do General Mitre, n.º 336. Possúe riquissima collecção de documentos e de manuscriptos. É exclusivamente americana e divide-se nas seguintes secções:—Bibliographia americana;—America anti-colombiana, raças e linguas indigenas, geographia physica—Descobrimento da America—Antecedentes geographicos. Colombo e Vespucio. Poemas epicos sobre o descobrimento—America em geral, historia e geographia, viagens e descobrimentos.—Rio da Prata, em geral e particular.—America Hespanhola (Divisão geographica pelas Republicas).—America Portugueza—America do Norte—Questões americanas, especialmente de limites—Hespanha e America—Direito, Codigo, Constituições, Collecções de tratados—Manuscriptos sobre o Rio da Prata, em particular, e sobre a America, em geral. Archivo historico de Mitre.—Mappas e desenhos. Além d’estas tres grandes e principaes bibliothecas de Buenos-Aires, sendo a _Nacional_ e a _Mitre_, federaes, e a _Rivadavia_, municipal, muitas e importantes collecções de livros, verdadeiras bibliothecas pelo numero de volumes e importancia das obras, existem na capital da Republica, merecendo especial menção as das Faculdades de Medicina e de Direito, já referidas, a do jornal _La Prensa_, facultada ao publico, a _Bibliotheca Escolar_, na esquina das ruas Charcas e Rodriguez Peña; a _Bibliotheca de la Sociedad Tipográfica Bonaerense_, funccionando diariamente e facultando leitura em domicilio, a do Museu de Bellas Artes e outras de instituições officiaes e particulares. No mez de Março de 1908, as bibliothecas Nacional e Rivadavia, as principaes, foram visitadas por 5:000 pessôas, que consultaram 5:055 obras. No anno anterior ellas tinham sido visitadas por 38:434 leitores, que consultaram 55:994 obras. Arte A esthetica e a arte são cultivadas, na capital argentina, não só exteriormente, na symetria impeccavel dos seus arruados, avenidas e praças; na sumptuosidade e belleza dos seus monumentos estatuarios e architectonicos; mas tambem, e principalmente, no interior dos seus museus publicos e particulares. Entre estes avultam as galerias de pintura, preciosos escrinios artisticos que demandam menção especial. A _Galeria de Pintura Guerrico_, na rua Corrientes, n.º 537, hoje pertencente á viuva do colleccionador d’aquelle nome, consta de duas peças principaes, além de varios gabinetes mais pequenos. A exposição geral é cuidada e artistica, se bem que se note a falta de luz. Em pintura e como collecção particular, é considerada a primeira da America do Sul. Visita-se pedindo-se permissão á proprietaria. Enriquecem-n’a trabalhos dos seguintes artistas:—Meissonier, Thomas Weber, Jules Lefebvre, Eugéne Lambert, Ribot, Gabriel Ferrier, Alfred Stevens, Vau Marcke, Charles Jacque, Kemmerer, Sanchez Barbudo, Ziem, F. Roybet, Louis Leloir, Fortuny, Hemmer, Lunch, Isabey, I. Jacquet, Louis Deschamps, Falguiére, I. Boudin, R. de Madrazo, Gustave Doré, V. Gilbert, Perez de Villamil, Eduardo de Martino, Goya, Van Hier, Charpentier, Domingo, Tintoretto, Rosa Bonheur, Juan Gonzalez, Tiratelli, Raidanino, Hernandez, Barbazan, Giudici, Andreotte, Galofre, Misalles, Johannes Fyt, Munier, Cervi, Bisco, Muñoz, Vilerand de Geest, M. Cossman, Gaston Gérard, Tiépolo, Pescador Saldana, C. Delort, Tantardini, Marchetti, Delesalle, A. L. Barye, Roman Rivera, J. P. Méne, Jong King, L. Spiridon, Esquivel, R. Goubie, A. Vollon, Heilbuth, F. Vinea, Emile Bayard, A. Pasini. A segunda galeria particular de pintura era a de T. Piñero, hoje dissolvida, tendo sido os quadros distribuidos por diversos museus. Ainda ha umas tres ou quatro galerias particulares, menos importantes, que visitam-se da mesma fórma que a Galeria Guerrico. Egrejas _Montserrat_—Frontaria em estylo grego-corinthio. Ampla nave central e duas lateraes, que quasi desapparecem á vista, pela grossura dos pilares que as dividem da principal. Ao todo, onze altares, todos dourados. Zimborio a dividir o transepto da capella-mór. Aspecto geral pesado e triste, no interior. * * * * * _Concepcion_—Fachada granitica, em estylo dorico. Bella perspectiva. Interiormente é dividida em tres naves e tem onze altares dourados. Nas naves lateraes, os altares são divididos por pequenos zimborios. Grande cupula central. O templo é em fórma de cruz latina. * * * * * _San Telmo_—Tambem é em fórma de cruz latina e encerra treze altares dourados. Occupam-a tres naves, as lateraes muito estreitas, em proporção á central, e em grande parte occupadas pela demasiada grossura dos pilares divisorios, que formam seis arcos. Sobre estes e nos tectos ha pinturas decorativas. Tem zimborio e orgão. * * * * * _Santa Lucia_—Elegantissima frontaria granitica, terminando em campanario, ao centro. O estylo architectonico é original e bello. O interior é em uma só e vasta nave, em arcaria, com quatro altares lateraes. Capella-mór de marmore de côres, decorada a mosaicos metallicos. O altar-mór é guarnecido a columnas de marmore preto e os altares lateraes teem, cada um, quatro columnas douradas. O templo é illuminado, de dia, por quatro janellas em meia laranja, com vitraes coloridos, e á noite por seis grandes lustres de metal amarello. Enorme crucifixo de madeira. O altar da padroeira é de marmore branco e cinzento. * * * * * _S. Domingos_—É este o santuario mais importante de Buenos-Aires, depois da cathedral e, como n’esta, nota-se a excessiva espessura dos pilares divisorios das naves, o que escurece e desfeia o monumento. O vestibulo e o côro são demasiadamente baixos, em proporção á altura da nave central. Os dez altares lateraes são todos dourados. As duas capellas fundas que ladeiam a capella-mór são notaveis pelas dimensões e pela decoração, especialmente a do Santissimo Sacramento, profusamente dourada. Numerosas janellas com vitraes coloridos, no alto zimborio central e no transepto, illuminam o interior. Grande orgão, no côro. O templo foi construido de 1751 a 1779, a expensas de particulares. * * * * * _La Merced_—Aqui, a vastidão da nave central desfaz a má impressão produzida pela enorme grossura dos pilares que a dividem das duas estreitas naves lateraes. Treze altares dourados. Grande zimborio, ou cupula central, sem elegancia. A frontaria, granitica, é em bello estylo e ladeada por dois campanarios. Este é o santuario preferido pela alta sociedade da capital. D’entre os outros templos de Buenos-Aires, em numero de quarenta, além de vinte capellas, devemos citar os de _San Ignacio_, _San Francisco_, _San Nicolás_, _Pilar_, _Socorro_, _Balvanera_, _Piedad_, _San Juan Evangelista_, _Capuchinas_, _San Cristóbal_, _San Miguel_ e _Salvador_. Acatholicas, ha a egreja _Metodista Episcopal Norteamericana_, a _Anglicana_, a _Protestante Alemana_, a escocesa de _San Andrés_, a _Ortodoxa_ e a _Israelita_. Quasi todos os santuarios catholicos-romanos foram edificados na epocha colonial e a expensas de pessôas ricas e devotas, por architectos europeus. Commercio e Industria Foi em 1855 que se effectuou o primeiro censo commercial, em Buenos-Aires, e o ultimo em 1904. N’aquella data existiam 3:139 estabelecimentos commerciaes, divididos em 9 categorias, e n’esta época, 17:985, assim especificados: —Alimentação 9:358 —Construcções 426 —Vestidos e chapéus de senhora 2:465 —Moveis e annexos 289 —Transporte e annexos 903 —Artisticos, adornos e recreio 638 —Tecidos, couros e pelles 56 —Sanidade e chimica 370 —Artes Graphicas e annexas 158 —Depositos e vendas varias 1:169 —Varios negocios 2:153 ------ 17:985 O penultimo recenseamento tinha sido feito em 1895, e déra um numero total de 12:881 estabelecimentos commerciaes, ou seja um augmento de 5:154 casas de negocio em 9 annos. O valor d’este commercio, em 1904, era representado por 40:568:000 pesos em immoveis e por 480:138:300 de pesos, em mercadorias, ou seja um total de 520:706:300 de pesos, cêrca de 230 mil contos em moeda portugueza. O seguinte quadro é mais elucidativo, se bem que deficiente quanto á classificação de casas de negocio: Classe N.º de casas Immoveis Mercadorias Alimentação 9:358 14:667:500 29:309:000 Construcções 426 2:215:000 10:355:000 Modas e confecções 2:465 3:639:500 28:604:000 Moveis e annexos 289 347:000 2:580:000 Transportes e annexos 903 2:172:500 4:936:000 Arte e decoração 638 1:729:000 6:063:000 Couros e pelles 56 150:000 497:500 Sanidade e chimica 370 1:352:800 4:010:500 Artes graphicas e annexas 158 533:500 2:036:000 Depositos e vendas varias 1:169 1:698:200 4:247:400 Negocios varios 2:153 12:063:000 387:499:900 ----------- 520:706:300 Todos os estabelecimentos commerciaes eram servidos por 79:547 empregados, 64:154 do sexo masculino e 15:393 do sexo feminino, 49:951 eram estrangeiros e 29:936 argentinos. Dos proprietarios das casas de commercio, 15:202 eram estrangeiros e 2:783 argentinos. Dos 17:985 estabelecimentos commerciaes, que existiam em 31 de Dezembro de 1904, 6:823 negociavam com mercadorias nacionaes, 860 com generos e artigos estrangeiros e 10:302 com mercadorias mistas. * * * * * A Bolsa de Buenos-Aires funcciona em um pequeno mas elegante e artistico edificio proprio, situado na praça de Mayo. Consta de tres pavimentos de granito, sendo a frontaria dos dois primeiros em columnata, que sustenta bellas architraves. A sala das sessões é simples, com duas meias galerias, e ao centro a indispensavel grade dos pregões. Ha grandes salas lateraes para os serviços auxiliares, além dos escriptorios dos correctores. No 1.º pavimento estão installadas a secretaria e outras repartições. Esta instituição foi fundada em 1840, com o titulo de _Sala de Comercio_, e era só composta de inglezes. Em 1854 e 1862, foi mudada de local, na rua San Martin, e em 1885 principiou a funccionar no actual edificio. O balancete de 1907 é o seguinte: ACTIVO Acções da Empreza do Edificio 49:362 Bancos e Caixa 40:290:72 Credito Argentino Interno 73:186:44 Immovel 756:176:47 Moveis e utensilios 18:734:44 Reparações no edificio 9:593:20 Recibos de subscripção 5:450 Terrenos no Tigre 6:000 Varios 1:210 ---------- 960:003:27 PASSIVO Capital da Empreza do Edificio 770:000 » » Associação 61:162:92 Fundo de Reserva da Empreza 50:525:73 » » » » Associação 16:340:74 » especial para calamidades publicas 8:076:92 Fundo de jubilações de empregados 2:905:34 » » beneficencia 609:07 Dividendos a pagar 2:049 » de 1907, 2.º semestre 42:520 Varios 6:083:55 ---------- 960:003:27 Resumo do movimento geral de transacções effectuadas, em 1907, na Bolsa de Commercio de Buenos-Aires: Valores Cotisados A dinheiro A prazo Divida Interna da Nação 9:382:400 239:500 » » da Municipalidade 1:159:400 17:000 Divida Interna da Provincia de B. Aires 12:345:017 561:000 Divida Interna da Provincia de Santa Fé 1:029:000 33:000 Divida Interna da Provincia de Entre Rios 149:100 Cedulas Hypothecarias Nacionaes 60:945:750 2:167:050 Cedulas Hypothecarias da Prov. de Buenos-Aires 3:485:650 254:000 Sociedades Anonymas—acções 2:220:730 1:736:267 Sociedades Anonymas—obrigações 164 Sociedades Anonymas—certificados 75:696 ---------- --------- 90:712:047 5:247:513 A situação dos Bancos de Buenos-Aires era a seguinte, em egual periodo: HESPANHOL DO RIO DA PRATA Deposito em ouro 2:654:572:33 » » papel 114:511:038:59 Descontos e a descoberto, ouro 2:957:256:98 » » » » papel 94:247:299:23 Existencia, ouro 1:385:959:63 » papel 29:992:812:04 FRANCEZ DO RIO DA PRATA Deposito em ouro 4:438:342:88 » » papel 47:839:625:68 Descontos e a descoberto, ouro 5:810:721:90 » » » » papel 46:659:182:32 Existencia, ouro 3:102:134:53 » papel 12:739:130:30 ALLEMÃO DA AMERICA DO SUL Deposito em ouro 155:550:98 » » papel 2:121:878:12 Descontos e a descoberto, ouro 343:762:29 » » » » papel 3:794:044:96 Existencia, ouro 393:020:30 » papel 3:470:332:26 LONDRES E RIO DA PRATA Deposito em ouro 7:367:235:27 » » papel 135:380:899:52 Descontos e a descoberto, ouro 8:269:607:87 » » » » papel 86:773:226:62 Existencia, ouro 4:791:172:42 » papel 41:012:881:27 NOVO BANCO ITALIANO Deposito em ouro 449:661:43 » » papel 20:545:293:76 Descontos e a descoberto, ouro 833:781:30 » » » » papel 10:844:729:92 Existencia, ouro 135:720:71 » papel 4:180:125:17 BANCO POPULAR ARGENTINO Deposito em ouro 27:518:96 » » papel 9:187:016:07 Descontos e a descoberto, ouro 5:217:70 » » » » papel 9:208:439:02 Existencia, ouro 156:694:87 » papel 2:914:008:48 BANCO ALLEMÃO TRANSATLANTICO Deposito em ouro 1:337:050:51 » » papel 26:941:334:79 Descontos e a descoberto, ouro 4:767:855:31 » » » » papel 29:004:868:61 Existencia, ouro 1:756:597:59 » papel 5:624:324:27 BANCO DA ITALIA E RIO DA PRATA Deposito em ouro 1:971:862:57 » » papel 70:563:247:18 Descontos e a descoberto, ouro 4:075:632:21 » » » » papel 48:409:201:09 Existencia, ouro 2:131:585:94 » papel 18:704:869:81 BANCO LONDRES E BRASIL Deposito em ouro 850:680 » » papel 7:648:720 Descontos e a descoberto, ouro 2:959:784 » » » » papel 6:278:150 Existencia, ouro 684:484 » papel 2:168:132 BANCO DA NAÇÃO ARGENTINA Deposito em ouro 1:788:214:90 » » papel 167:989:358:18 Descontos e a descoberto, ouro 1:362:631:48 » » » » papel 170:573:212:13 Existencia, ouro 9:354:376:96 » papel 52:439:174:43 BANCO BRITANNICO DA AMERICA DO SUL Deposito em ouro 1:472:389:15 » » papel 32:885:443:01 Descontos e a descoberto, ouro 3:828:160:85 » » » » papel 29:189:759:81 Existencia, ouro 1:496:153:66 » papel 8:832:724:11 Total do movimento geral em todos os Bancos mencionados: Depositos em ouro 22:513:078:98 pesos » » papel 635:613:854:80 » Desc. e a descob. ouro 35:214:411:89 » » » » » papel 534:982:114:41 » Existencia, ouro 25:387:900:61 » » papel 182:078:514:14 » ---------------- Total geral 1:435:789:874:83 » * * * * * A Alfandega de Buenos-Aires funcciona em um immenso e velho edificio, que tem a frontaria principal para a praça de Mayo. Os armazens-depositos e as construcções annexas são cerca de 30, em face de 4 diques e de 10:000 metros de cáes acostaveis. O porto natural é pequeno e formado pela foz do rio Riachuelo; porém o porto artificial é extenso e grandioso, accessivel por dois canaes, o do sul com 10:700 metros de largura e 18 de profundidade; e o do Norte com 9:800 metros de largura e 21 de profundidade. O total da superficie liquida do porto é de 660:200 metros, ou 66 hectares. Nos molhes ha 60 kilometros de via ferrea e numeroso machinismo hydraulico. Estão gastos mais de 40 milhões em ouro, nas obras do porto, cujo prolongamento e aperfeiçoamento continuam. A exportação de mercadorias paga apenas o imposto do sêllo. Este rendeu, em 1907, 140 mil 470 pesos e 38 centavos. No mesmo anno a importação rendeu 53:368:154 pesos, ouro e 757:545 pesos, papel. O movimento de entrada e saída de embarcações, no mesmo anno, foi de 29:178, com 13:335:737 toneladas. Na exportação occupam os primeiros logares, em importancia, as lãs, 149:110 toneladas, no valor de 58:402:771 pesos, ouro; o milho, 2:693:739 toneladas, no valor de 53:365:687; o trigo, 2:247:988 toneladas, valendo 66:561:181, ouro; o linho, 538:496 toneladas, no valor, ouro, de 25:915:861, pesos; a carne de vacca, congelada, 153:809 toneladas, no valor de 15:380:897, e os couros seccos, cuja exportação foi de 11 milhões de pesos. Na importação avultam o carvão de pedra, 2:339:634:991 de kilos, na importancia, em ouro, de 16:377:584 pesos; os tecidos de algodão, 28 milhões de kilos, no valor de 23 milhões de pesos, ouro; os tecidos de lã, 8 milhões de kilos, valendo, ouro, 15 milhões de pesos; os vinhos de mesa e finos, cêrca de 120 milhões de litros no valôr de 11 milhões e 500 mil pesos; a herva-matte do Brasil e do Paraguay, 64 milhões de kilos, na importancia, ouro, de 8 milhões de pesos, e o arroz de varias qualidades, 58 milhões de kilos, no valor de 4 milhões e 200 mil pesos. Estes algarismos, numeros redondos, referem-se á importação e exportação geral da Republica. Para conhecer-se a parte que diz respeito ao porto de Buenos-Aires, bastará deduzir, da totalidade, 180 por 1:000 na importação e 561 por 1:000 na exportação. * * * * * A industria que mais tem progredido n’estes ultimos vinte annos, na capital argentina, é a que se relaciona com as artes graphicas. O typo, a lithographia, a photographia e a photogravura taes como são hoje trabalhados em Buenos-Aires, podem competir, vantajosamente, com as melhores producções, similares, da Allemanha e das outras nações europeias onde o culto da divina arte de Guttemberg é mais aperfeiçoado. Muito contribúe, para este resultado, o periodismo bonaerense, um dos mais importantes dos centros civilisados. As fabricas de congelação de carnes para exportação, occupam logar primacial na industria da capital. A ultima estatistica official da industria da metropole _porteña_ data de 1904, e accusa o numero de 8:877 estabelecimentos fabris, no perimetro da capital federal, mais 749 do que em 1887, epocha do penultimo censo industrial. Essas fabricas eram impulsionadas por motores da força de 19:858 cavallos, e empregavam o capital de 60 milhões de pesos nacionaes. Esses estabelecimentos produziram, em 1904, mercadorias no valor de 183 e meio milhões de pesos. Sendo a Republica Argentina um paiz tão fertil, abundante e rico em madeiras para construcções, é lamentavel que, na sua importação, figure ainda o madeiramento, em somma avultada, o que tem impedido o desenvolvimento da industria constructora. Já não succede o mesmo com os elementos empregados na confecção de productos alimenticios, approveitando-se, o mais possivel, a materia prima nacional, e por isso é, actualmente, esta industria uma das mais prosperas da capital argentina. A preparação do couro e das pelles de animaes, tem tomado grande desenvolvimento, assim como a fabricação de phosphoros, cujo preparo é aperfeiçoado e sufficiente para o consumo nacional. Quadro demonstrativo das fabricas, por categorias, existentes em Buenos-Aires, em 1904, e do capital n’ellas empregado: Designação Numero Capital Alimentação 715 16:093:400 Construcções 915 7:837:940 Vestuario e annexos 3518 16:082:440 Moveis e annexos 932 7:525:030 Metaes e derivados 1093 12:756:360 Arte e adornos 568 3:437:000 Artes graphicas e papel 406 6:655:500 Productos chimicos 126 3:169:600 Emprezas e industrias varias 604 25:418:550 ----- ---------- 8:877 98:975:820 Tabella reveladora da producção, por cada ramo de industria, e do pessoal empregado nas fabricas de Buenos Aires, em 1904: Designação Producção Pessoal Alimentação 31:131:175 6:420 Construcção 15:510:610 7:873 Vestuario e annexos 29:084:450 15:450 Moveis e annexos 12:147:690 6:315 Metaes e derivados 10:979:850 8:032 Arte e adornos 4:376:230 1:873 Artes graphicas e papel 7:072:300 3:943 Tecidos, couros e pelles 29:909:530 Productos chimicos 6:106:400 2:493 Emprezas e industrias varias 37:134:410 16:113 ----------- ------ 183:452:645 68:512 Quadro demonstrativo do movimento impulsionador das fabricas de Buenos-Aires: Designação Motores Cavallos de força Alimentação 149, a vapor 74, electricos 50, a gaz 3:773 Construcções 79, a vapor 48, electricos 9, a gaz 2:643 Vestuario, annexos e Tecidos 39, a vapor 56, electricos 27, a gaz 1:640 Moveis e annexos 55, a vapor 42, electricos 13, a gaz 1:064 Metaes e derivados 98, a vapor 78, electricos 25, a gaz 1:976 Arte e adornos 22, a vapor 40, electricos 6, a gaz 283 Artes graphicas e papel 28, a vapor 96, electricos 10, a gaz 882 Productos chimicos 32, a vapor 19, electricos 2, a gaz 787 Varias emprezas e industrias 124, a vapor 74, electricos 21, a gaz 6:870 ----- ------ 1:316 19:858 Do pessoal empregado nas fabricas 55:435 individuos pertenciam ao sexo masculino e 13:077 ao feminino; 7:191 eram menores de 16 annos, dos quaes 4:820 varões e 2:371 meninas. A industria que maior numero de menores empregava era a de tecidos, com 819, e a seguir a de phosphoros, com 583, e a de calçado, com 269 menores. 5:270 sabiam lêr e escrever; 1:104 tinham já os quatro primeiros gráus das escólas communaes, 636 frequentavam as escólas primarias e 181 não prestaram declarações. Em 1904, os proprietarios de fabricas eram em numero de 8:431, 7:390 estrangeiros e 1:041 argentinos. Na média, o salario de um carpinteiro, actualmente em Buenos-Aires, é de 4 pesos diarios; o de um pedreiro, de 3 pesos e egual o de cada padeiro. Em nenhum estabelecimento fabril trabalha-se, actualmente, mais de 8 horas por dia, se bem que a estatistica official de 1904, inclúa a seguinte tabella: Numero das fabricas Horas de trabalho 19 6 27 7 1967 8 491 9 645 9 e 10 1926 10 39 11 75 12 Sem especificar as horas de trabalho, 1:554 fabricas. D’estes 8:877 estabelecimentos industriaes, 2:306 trabalhavam, ordinariamente, aos Domingos, incluindo as padarias, 1:262 só o faziam extraordinariamente, 2:620 não trabalhavam ao Domingo e 2:689 não especificavam. Das mulheres empregadas nas fabricas, 6:363 eram solteiras, 1:472 casadas, ignorando-se o estado civil das restantes. Em 1906 houve 23 gréves na capital argentina, em que tomaram parte 18:317 operarios, motivadas por augmento de salario e por diminuição de horas de trabalho, havendo transacções entre operarios e patrões em 10 conflictos, submettendo-se os operarios em 10 e ganhando a sua causa em 3 questões. Em consequencia d’essas gréves, os operarios que n’ellas tomaram parte perderam salarios na importancia de 1:844:000 pesos. Jardins e Parques _Parque Tres de Fevereiro_—O seu nome popular é Parque de Palermo. Occupa a superficie de 3:677:487 metros quadrados. A avenida principal, chamada _das Palmeiras_, lembra, com saudades, as suas homonymas do Rio de Janeiro, altas e esbeltas, ao passo que estas não attingem um terço da altura d’aquellas. A vegetação geral é rachitica, recordando a densa e frondosa vitalidade e pujança do Bosque de Bologna, a que os bonaerenses comparam o Parque Tres de Fevereiro. As avenidas são amplas, bem tratadas e amenisadas por varios lagos e cursos de agua. No recinto e na orla d’este amplissimo local de recreio estão o Jardim Zoologico, o Velodromo Nacional, o Hippodromo Nacional, a Escola Normal de Tiro, o Club Hippico Argentino, os restaurantes dos Lagos e de Palermo, o Tiro Federal Argentino, o _Cricket Club_ e muitas outras installações sportivas. Decoram tambem este magnifico parque, as estatuas de Domingos Sarmiento, Carlos Burmeister e de Eduardo Costa. A 1.ª é do esculptor Rodin, e foi inaugurada em 25 de Maio de 1900. A figura está de pé sobre uma base de marmore branco, que ostenta artistica allegoria, representando Apollo, o deus da Luz, a espancar as trevas da ignorancia, symbolisadas pela serpente Python. O monumento de Burmeister, foi inaugurado em Outubro de 1900, e é obra do esculptor allemão Ricardo Aigner. O do doutor Eduardo Costa, data de 19 de Março de 1902, e não é particularmente notavel como obra de arte. No recinto d’este parque teem funccionado varias e importantissimas exposições da Sociedade Rural Argentina, patrocinada pelo governo. As terças-feiras e sabbados são os dias da moda para este parque, frequentado então por milhares de vehiculos e de peões. A melhor construcção architectonica de todo o recinto é a do Tiro Federal Argentino, com bellissima frontaria ladeada por duas altas e elegantes torres. Nos hippodromos de Buenos-Aires, as apostas ascenderam, em 1906, á somma de 47:218:602 pesos. * * * * * _Jardim Zoologico_—Este bello parque está perfeitamente á altura de uma grandiosa capital, como é Buenos-Aires. D’entre as installações avultam, pela architectura e sumptuosidade, a dos zebús, em estylo indiano; dos ursos, a mais imponente; dos leões e pantheras, um verdadeiro palacio; dos elephantes, em estylo oriental; a dos asnos e a colossal gaiola de ferro das aves de rapina. São importantissimas e raras muitas das outras collecções e especies representadas, como a dos cervos, divididos em varias classes e cercados; a dos reptis, dos rapinantes e a dos gorillas e chimpanzés, installados em minusculo templo egypcio. Nota-se extremo aceio, tanto nas jaulas como no parque. A entrada custa apenas 50 réis. Aos domingos, o Jardim é frequentado por milhares de pessôas. No recinto encontram-se cafés e restaurantes, carrousseis, linha ferrea para creanças e numerosos e minusculos vehiculos puxados por varios animaes, como o avestruz, a zebra, o cão e o carneiro. D’entre os mais raros e notaveis exemplares d’este Jardim, avultam dois soberbos hippopotamos. Todo o brasileiro, e especialmente o fluminense, que visitar este grandioso parque, deve sentir-se vexado do seu similar do Rio de Janeiro, hoje transformado em posto zootechnico-particular, por cuja visita paga-se dois mil réis de entrada! A area d’este Jardim é de 179:400 metros quadrados. Em 1906 visitaram-n’o 1:022:614 pessôas, rendendo as entradas 102:261:40. * * * * * _Jardim Botanico_—A frente é um extenso gradeado soldado em cantaria, na rua de Santa Fé, proximidades do Jardim Zoologico e do Parque Tres de Fevereiro. O interior está dividido em secções, por continentes, indicados em placas azues com lettras brancas. Ha grandes estufas e pequenos tanques para plantas aquaticas, d’entre as quaes sobresahe a famosa _Victoria Regia_. Os principaes e floridos maciços são decorados a estatuas de marmore branco. Nota-se extremo cuidado na conservação e limpeza do recinto, assim como na classificação das especies, a nenhuma das quaes falta a respectiva placa descriptiva. A secção argentina é, naturalmente, a melhor representada; todavia ha milhares de curiosos e interessantes exemplares da Asia, especialmente, da Africa, dos archipelagos da Oceania, e da Australia. Na organisação e variedade, este Jardim é superior ao seu congenere do Rio de Janeiro, que avulta sobre aquelle na extensão, na magestosa belleza do conjuncto e na formosura e originalidade de alguns detalhes, como sejam as universalmente famosas avenidas das Palmeiras e dos Bambús. Além d’estes, os principaes parques e jardins de Buenos-Aires, são o _Parque Saavedra_, com 426:397 metros quadrados de superficie; o _Parque Patricios_, com 228:795; o _Parque Christovão Colombo_, com a area de 162:000 metros quadrados; o _Parque Lezama_, amplo de 76:637 metros quadrados; o _Paseo de Julio_, com 33:085 e o _Paseo Colon_, com 20:215 metros quadrados. Ha ainda os parques _Intendente Alvear_ e de _los Andes_, bem como os passeios _Rivadavia_, _Santa Fé_, _Monte Castro e Gaona_, e os jardins do _Sul_, _Infantil_ e _Japonez_. Todos os logradouros publicos da capital teem a superficie total de 7:100:000 metros quadrados. Theatros São 16 os theatros principaes da metropole argentina, em todos os generos e frequentados, especialmente de Maio a Setembro, por companhias de primeira ordem, nacionaes e estrangeiras. Do esplendido theatro _Colon_, já tratamos no capitulo _Monumentos_. Os mais importantes são: * * * * * _Opera_—Ao penetrar na sala da _Opera_, o visitante comprehende a necessidade que Buenos-Aires tinha do theatro _Colon_. Aquella não está na altura de occupar o primeiro logar entre os grandes theatros da capital bonaerense. É um edificio pesado, sem architectura e de tectos baixos, onde apenas se attendeu ao conforto. A triplice ordem de corredores estreitos, alcatifados e aquecidos por numerosos fogões de ferro e por grossos e pesados cortinados de velludo, mantem no interior do theatro, durante as noites de inverno, uma temperatura elevada. A sala tem cinco pavimentos, sendo um de frisas, dois de camarotes, um de camarotes e balcões e o mais alto é a galeria geral. A profusão de lustres, com lampadas electricas, faz realçar o dourado da sala, em cujo tecto ha uma pintura allegorica. Do centro pende um soberbo lustre. O _foyer_ é pequeno mas confortavel e luxuosamente guarnecido. A entrada principal é pela rua Corrientes, uma das mais animadas da cidade, principalmente á noite. A assignatura annual, ordinaria, é de 50 recitas, de Maio a Agosto. O preço avulso, de cada cadeira, é de 16 pesos, como no _Colon_. Ao contrario do que succede n’este monumental theatro, cuja amplidão e esplendôr da sala eclipsam o brilho das _toilettes_ e a formosura das senhoras, a sala da Opera é um encanto, nas noites de espectaculo. A côr _grenat_-escura da alcatifa, dos cortinados e das cadeiras realça as côres claras, os decotes e as joias que, por sua vez, augmentam a belleza do elemento feminino e a perspectiva geral do conjuncto. Para completar o deslumbrante effeito das _soirées_, a orchestra e os cantores são o que ha de melhor em todo o mundo, no genero lyrico. * * * * * _Odeon_—Na rua Esmeralda. Não tem architectura especial nem dependencias notaveis. Na sala ha uma ordem de frisas, uma de camarotes e balcões, e o ultimo pavimento é o _paraiso_. Frequentam-n’o, de preferencia, companhias dramaticas estrangeiras. A concorrencia é selecta e o traje de rigor. * * * * * _Polytheama Argentino_—Rua Corrientes, 1470. Grande hemicyclo em quatro ordens, sem ornamentação. É todo pintado de branco. Apesar das suas amplas dimensões, tem excellentes condições acusticas. É, de preferencia, frequentado por companhias lyricas de segunda ordem, de Maio a Agosto. No resto do anno funcciona com varios generos theatraes. * * * * * _Nacional_—Na rua Corrientes. Ha outro com o mesmo nome, na rua Santa Fé. Tem duas ordens de camarotes, uma de frisas e a galeria geral. Companhias de zarzuela. * * * * * _Marconi_—Sala ampla e simples. Apenas contem tres pavimentos, um de frisas, outro de camarotes e balcões e o ultimo é a galeria, ou o _paraiso_. É frequentado por companhias italianas de opera e de opereta. * * * * * _San Martin_—Vasto recinto, com quatro pavimentos, que tanto serve para declamação como para circo. É um dos maiores theatros de Buenos-Aires. Rua Esmeralda, 257. * * * * * _Mayo_—Situado na avenida de egual nome. Sala com tres ordens de camarotes e a galeria. O tecto é decorado a pinturas. Frequentam-n’o companhias hespanholas de zarzuela. * * * * * _Moderno_—A sala, que é pequena, tem quatro ordens de camarotes. A companhia comico-dramatica que n’elle trabalha interpreta unicamente as peças approvadas pelo Conservatorio de Buenos-Aires. Eleva-se na praça Lorea. * * * * * _Comedia_—Rua das Artes, n.º 24. Sala com quatro pavimentos. Companhias hespanholas de zarzuela. * * * * * _Apollo_—Rua Corrientes, n.º 1386. Minuscula e interessante sala, o mais pequeno recinto theatral de Buenos-Aires. Exhibe peças nacionaes, interpretadas por artistas argentinos. * * * * * _Scala_—Novissimo theatro para o genero ligeiro. Revistas, cançonetas e variedades. * * * * * Ha a notar, ainda, o Colyseo Argentino, que funcciona em um esplendido edificio, o Theatro Victoria, o Argentino, o Casino, o Royal Theatre, o Rivadavia e o Circo Anselmi. Como todos os grandes centros populosos, a capital _porteña_ abriga a praga dos cinematographos, que alli funccionam em assombrosa quantidade. A vida theatral e sportiva é intensa, dando os bonaerenses a preferencia ás corridas de cavallos. Em 1906, os theatros da capital déram 5:838 representações, que produziram cinco milhões de pesos. D’esses espectaculos, 485 foram de operas e operetas, 787 de zarzuelas, 924 de comedias e dramas hespanhoes, 457 de comedias e dramas em italiano, 17 de comedias em francez, 1:002 de comedias e dramas argentinos, 409 funcções de circo, 42 bailes de mascaras e 1:715 representações cinematographicas. Esses espectaculos foram frequentados por 3:216:968 espectadores. No mesmo anno realisaram-se 706 corridas de cavallos, em que tomaram parte 5:901 animaes e assistiram 519:000 espectadores, que fizeram apostas na importancia de 47:218:602 pesos. Curiosidades _Palacio do Governo_—Visto do porto, este edificio mostra um aspecto grandioso e imponente, no conjuncto, com os seus quatro pavimentos, terraços, balcões e um grupo de gigantescas estatuas a corôal-o, obra do esculptor Bianchi. Observado da praça de Mayo, para onde olha a frontaria principal, a perspectiva é muito reduzida, especialmente pela irregularidade da architectura, sem estylo definido, antes demonstrativa de que pertence a epochas diversas. No andar nobre estão installados os ministerios das Obras Publicas, da Justiça e Instrucção Publica, da Fazenda, das Relações Exteriores, do Interior e a Presidencia da Republica. Todas as installações constam, pouco mais ou menos, do mesmo numero de peças, umas doze para cada ministerio, comprehendendo as salas de espera e de recepção, os escriptorios e o gabinete do ministro. No Ministerio das Relações Exteriores ha, a maior, o salão de recepção dos diplomatas, decorado com simplicidade. A Presidencia da Republica, compõe-se de sala de espera, gabinete do Presidente, com o retrato, a oleo, de Rivadavia, saleta de conversação e saleta de fumo. Seguem-se as secretarias dos officiaes militares e civis. O grupo dos tres salões principaes do edificio é accessivel por duplo lance de escadaria de marmore branco. O primeiro é o de recepções simples, o do centro é o salão Branco, ou das grandes recepções officiaes, e o terceiro é o das reuniões do Conselho do Governo, presidido pelo Presidente da Republica. Este salão não tem decoração alguma. Apenas se vê, ao centro, a mesa, forrada de velludo vermelho-escuro e nove cadeiras da mesma fazenda. Do tecto pende um lustre. O salão Branco encerra um soberbo e artistico lustre de metal dourado, com 280 lampadas electricas, trabalho argentino de Azaretto. O recinto é ainda illuminado por 24 candieiros dourados, a 11 lampadas cada um. Ha uma galeria circular para o publico. Sobre pedestaes de marmore preto, circumdam o salão os bustos, em marmore branco, da Republica, do general Roca, do general Sarmiento, do dr. Quintana, de Rivadavia, de Bartholomeu Mitre, de Urquiza, e de outros vultos importantes da Republica. Do general Roca ha outro busto, sobre niveo pedestal, com lettras douradas. Nos outros pavimentos estão os escriptorios de serviço dos ministerios e um terraço com habitações de empregados e varias officinas. D’ahi gosa-se vistas parciaes da cidade e o panorama geral do porto. Este palacio mede 125 metros de frente por 81 de fundo. Das pequenas bibliothecas e dos archivos dos varios ministerios, avultam os do Ministerio das Relações Exteriores, pela quantidade e importancia. Em arcas de ferro, estão guardados os tratados celebrados com as nações estrangeiras, desde 1811, sendo alguns d’elles verdadeiras obras de arte. * * * * * _Cemiterio de la Recoleta_—Occupa, ao fundo do passeio de egual nome, uma superficie de 50:000 metros quadrados e abriga já 250:000 cadaveres, havendo apenas espaço para 300:000 sepulturas e tendo sido inaugurado em 1822. Outr’ora situado longe da cidade está hoje rodeado de populosos bairros, animados de intensa vida, a contrastar com a suprema quietude tumular d’aquella immensa necropole. Como que para honrar a magestade da morte, o engenho humano sublima-se alli á apotheose da arte em muitos e preciosissimos monumentos, inspirados na piedade christã e nos mysterios divinos. O _Christo_, de Monteverde, em marmore branco, que se vê na capella das encommendações é, talvez, a mais extraordinaria manifestação artistica que este cemiterio encerra. Os adoradores do bello-artistico deliciar-se-hão perante a _Dolorosa_, de Tantardini, que decora o sepulchro de Facundo Quiroga. Realça o monumental e bello jazigo do dr. Francisco J. Muñiz, a estatua da _Sciencia_, magnifico bronze de esplendidas roupagens, sem assignatura do auctor. É tambem notavel o _Genio_, em bronze, do tumulo de Fernando Villanueva, assim como a estatua symbolica do esculptor Falguiéres, que decora o monumento funebre de Lucio Lopez. A citar ainda, como eminentemente artisticos, os sarcophagos e jazigos de Domingos Sarmiento, do dr. Carril; do juiz Thedin; de Dorrago-Ortiz-Basnaldo; da familia de Angel Estrada; de Samuel Hale; de Elias Romero; de Vélez Sarsfield e das victimas da revolução de 1890. Repoisam alli os despojos mortuarios de outras famosas personalidades da Republica, como Rodriguez Peña, Marco Avellaneda, Mitre, Juan Varella, Diego de Alvear, Rawson, Navarro Viola, Brandzen, Mayer, Lugones, e outros. * * * * * _Pavilhão Argentino_—Este elegantissimo edificio de ferro, vidro e pedra, construido para exposições permanentes e periodicas, está situado na praça de San Martin, e pertence ao Estado. No 1.º pavimento visita-se um museu mineral, nacional e estrangeiro, interessante pelos exemplares expostos, porém um tanto desorganisado na installação e entretenimento. No andar superior funcciona, provisoriamente, um collegio particular de meninos. A parte central da frontaria d’este pavilhão é uma obra de arte. Sobre a porta principal está um grupo allegorico de bronze. * * * * * _Jockey Club_—Na rua Florida, entre as ruas Lavalle e Tucuman, ostenta-se um dos mais grandiosos palacios de Buenos-Aires. A frontaria é vistosa e artistica, em granito escuro, com uma varanda sustentada por columnata e guarnecida por tres grupos allegoricos, dois em nichos de pedra e o maior e o mais bello a rematar a cimalha. O vestibulo é decorado a estatuas em nichos de marmore. A escadaria é formosa, dupla, monumental e de preciosa pedraria. No primeiro lanço admira-se a celebre estatua—Diana—do esculptor Falguiéres. O ambito da escadaria é circumdado por 12 columnas de ordem corinthia e de marmore côr de rosa. Os corrimões são de onyx de S. Luiz. No primeiro pavimento, á entrada, estão tres salões—o de leitura, o de conversação e o de recepção. Do lado opposto visita-se a bibliotheca. Todo o mobiliario é luxuoso. No salão de conversação admira-se uma bella estatua feminina, sentada, de marmore branco. O salão de leitura é decorado a quadros. Na sala de admissão de socios ha um quadro de Roybet, e na secretaria estão quadros de Perrault, Roybet e Zem. O salão de jogos é illuminado por 7 lustres a 8 luzes e por 10 serpentinas a tres lampadas electricas. Magnifico salão de bilhares. No 2.º pavimento visita-se o salão-restaurante, com serviço permanente e orchestra. Ha ainda outro, privativo da direcção, e mais dois exteriores, em varandas, para o verão. De terraço-restaurante do 3.º andar, gosa-se lindissima vista parcial da cidade e especialmente do porto. No 1.º pavimento ha uma sala privativa de jogos illegaes. O estabelecimento hydrotherapico está installado no rez-do-chão, assim como a typographia especial do Club, e um salão de esgrima, ricamente guarnecido a preciosas panoplias. Em todos os pavimentos ha dormitorios e banheiras para socios residentes fóra da capital e também para os socios _porteños_ que desejem utilisar-se d’elles. Todos os quartos, além de magnifica mobilia, teem fogão, telephone e profusa illuminação. Cada socio provinciano não poderá pernoitar no edificio mais de tres noites seguidas, nem mais de seis noites em cada mez. Para os socios da capital o praso é de 2 noites seguidas e de 4 mensaes. * * * * * _Frigorificos_—Nas proximidades do Mercado Central de Fructos, de que trataremos no capitulo—Alimentação Publica—e nas margens do pequeno rio Riachuelo, estão installados varios frigorificos, dos quaes os mais importantes são o _La Blanca_ e o _La Negra_. Este foi fundado em 1883, por M. Sansisena. N’elle trabalham cêrca de 700 individuos, que matam para o consumo e exportação, diariamente, a média de tres mil animaes. O capital é de tres milhões de pesos, ouro, tendo a empresa distribuído dividendos de 50%. Já em 1903 este estabelecimento exportou, congelados, 3:500:000 carneiros, e 900:000 quartos de novilhos. O frigorifico _La Blanca_, foi inaugurado em Setembro de 1903. É um grande edificio, todo branco, de imponente aspecto. As suas dependencias occupam enorme area. Encerra um immenso banheiro, para a lavagem dos animaes, antes de abatidos. De todos os compartimentos, o mais notavel e interessante é o das machinas, que abriga tres grandes frigorificos, da força de 200 cavallos, installações impulsoras da energia electrica e bombas de incendio. Segue-se o pavilhão das caldeiras com tres da força de 200 cavallos. Depois é o deposito de amoniaco, conduzido aos quatro pavimentos do edificio por um cano que, desdobrado, daria o comprimento de 96 kilometros. N’esses quatro andares estão as camaras de congelação, que podem preparar, ao mesmo tempo, 7:000 novilhos e 70:000 capões. Vehiculos automaticos conduzem os animaes sacrificados ás camaras de arejamento. Alimentação Publica _Matadouro de Liniers_—No extremo-oeste do municipio de Buenos-Aires, nos terrenos conhecidos por Nova Chicago, está situado este novo e colossal matadouro, concluido em 1900. As suas installações são vastas e numerosas, occupando uma area total de 319:773 metros quadrados. Comprehende 44 armazens de mercado de compra, venda e peso de gado e 96 matadouros com espaço para trinta mil animaes. Todos os pavimentos são de asphalto e os tectos de telha. Ha tambem uma grande casa de machinas e de bombas; o edificio de residencia e trabalho dos veterenarios, um pavilhão com forno crematorio para os animaes condemnados e o grande edificio da Administração. Desde 1900 a 1907, a media annual para o consumo de Buenos-Aires, é de 382:000 bois e vaccas abatidas, 108:000 vitellos, 585:000 carneiros e 55:000 porcos. Em 1906 os frigorificos forneceram 17 milhões de kilos de carne congelada, para a alimentação da cidade, que tambem consumiu no mesmo periodo: —1:351:100 kilos de peixe fresco. —4:279:800 » » » salgado. — 22:500 » » especiaria de mar. —6:481:050 duzias de ovos. —3:600:000 kilos de aves diversas. — 27:000 » » caça rasteira. — 335:797 litros de leite introduzidos na capital, só pelas companhias de caminhos de ferro. * * * * * _Mercado Central de Fructos_—É um gigantesco edificio de tijolo e ferro, situado na margem direita do rio Riachuelo. Este curso d’agua, que tem de 25 a 30 metros de largura está, até á ponte de ferro levadiça, inaugurada em 1892, pejado de embarcações de grande e pequeno calado. Este Mercado passa por ser, em dimensões, o maior de todo o mundo. É, ao mesmo tempo que deposito de productos do paiz, divididos por galpões numerados, uma especie de bolsa de commercio, onde diariamente effectuam-se importantissimas transacções, especialmente de lãs, couros e cereaes. Occupa a superficie total de 152:000 metros quadrados, e tem quatro pavimentos, todos de ferro. No interior funccionam 72 guindastes e ascensores e grande numero de motores a vapor, além de 44 perfuradores hydraulicos. O maior deposito, ordinariamente, é de lãs, que varia entre 100 e 140 milhões de kilos, durante o anno, podendo abrigar, ao mesmo tempo, 26 milhões de kilos. Diversas linhas ferreas, de bitola estreita, communicam as diversas secções d’este gigantesco mercado, que custou 4:155:000 pesos em ouro, a uma sociedade anonyma por acções. Depois d’este, o mais importante mercado de Buenos-Aires é o _Mercado Nuevo_, de pedra e ferro, construido recentemente na rua de Montevideu. Municipalidade Na epocha da dominação hespanhola, eram os _Cabildos_ encarregados da administração municipal. Como elles se desempenhavam d’esta incumbencia, bastará dizer-se que, ao finalisar o seculo XVIII, em Buenos-Aires não havia ruas praticaveis nem illuminação publica. Essas instituições eram mais politicas do que administrativas e já vimos no capitulo—Historia—a que ponto o _Cabildo_ de Buenos-Aires, contribuiu para a independencia nacional. Em consequencia d’esse prestigio e d’essa força e preponderancia na politica argentina, por vezes a referida collectividade assumiu o governo supremo da nação, sustentada pelas outras instituições directoras e preponderantes na politica e na administração do paiz. Em 24 de Dezembro de 1821, o governador, general D. Martin Rodriguez, inspirado pelo seu ministro D. Bernardino Rivadavia, supprimiu os _Cabildos_, por simples decreto, distribuindo-se a administração municipal pelos chefes de policia, os regedores ou alcaides dos bairros da cidade e por outros funccionarios publicos. Por decreto de 2 de Setembro de 1852, o general Urquiza, creou um Conselho Municipal, departamento deliberante, de eleição popular, que se renovaria pela metade, annualmente, e um Conselho de Administração e Governo, para as funcções executivas, composto de um presidente, dois supplentes, tres visitadores fiscaes e de um secretario. Este decreto não teve execução, por motivo da separação do Estado de Buenos-Aires da Confederação Argentina, resultante da revolução de 11 de egual mez e anno; porém reappareceu em 1854, com ligeiras modificações, e vigorou até 1865, anno em que foi promulgada uma lei especial para o municipio de Buenos-Aires, muito semelhante á de 1852. Divide a municipalidade em dois corpos—o deliberante e o executivo—com identicas attribuições ás formuladas por aquelle decreto, e com a variante da tutela da legislatura provincial, submettendo á sua approvação o orçamento geral do municipio e as contas de inversão de fundos. Em consequencia da federalisação da cidade de Buenos-Aires, declarada em 1880 capital da Republica, vigóra, desde 1 de Novembro de 1882, a lei organica municipal, modificada por lei de 24 de Janeiro de 1901, que supprime o systema da eleição popular e transfere as funcções do antigo Conselho Deliberativo a uma commissão de 22 habitantes, nomeada pelo poder executivo nacional, com prévio accôrdo do Senado. Estes individuos exercem gratuitamente os seus cargos e não podem escusar-se a fazêl-o, a não ser por motivos expressamente indicados na lei. Portanto, o governo municipal compoem-se de uma Commissão Deliberante e de um Departamento Executivo, ambas as collectividades nomeadas pelo Presidente da Republica. O Departamento Executivo está a cargo do Intendente Municipal, nomeado por dois annos, podendo ser reconduzido. Em caso de ausencia, morte, enfermidade, suspensão ou renuncia, as suas funcções serão desempenhadas pelo presidente ou pelo vice-presidente da Commissão Deliberante, até que o poder executivo, sempre de accôrdo com o Senado, faça a nomeação do substituto. O Intendente nomeia o pessoal das repartições a seu cargo, excepto os chefes, para cuja nomeação lhe é indispensavel o consentimento da Commissão Deliberante. O mesmo alto funccionario representa a municipalidade nas suas relações com o governo nacional e, como pessôa juridica, nas questões judiciaes. Deve apresentar, annualmente, á Commissão, o projecto do orçamento de receita e despeza, as propostas de impostos e um relatorio de todo o movimento municipal. Póde assistir ás sessões da Commissão, sem voto, e é obrigado a fornecer os esclarecimentos que por ella sejam pedidos. Tambem a lei faculta-lhe convocar sessões extraordinarias da Commissão Deliberante e prorogar as sessões ordinarias, quando seja isso indispensavel ao serviço publico. O Intendente impoem multas por contravenção de posturas municipaes e n’estes assumptos pronuncia, como juiz de faltas, sentenças appellaveis para a justiça correccional. O Departamento Executivo, pela sua importancia administrativa e peta extensão e multiplicidade das suas faculdades e attribuições, é superior, em trabalho e movimento, a alguns ministerios e a muitos dos governos provinciaes da Republica. O Intendente, chefe do Departamento Executivo, tem a responsabilidade dos actos d’este poder municipal e responde perante os tribunaes ordinarios por invasão de poderes, abuso de auctoridade, transgressão e omissão de deveres e pelos prejuizos causados, a particulares, pela administração municipal. Elle executa as deliberações da Commissão referentes á fazenda, obras publicas, segurança, hygiene, beneficencia e moralidade, além das faculdades que lhe conferem a lei organica e as leis especiaes. As repartições do Departamento Executivo são:—Secretaria, Assessoria, Contadoria, Direcção de Rendas, Repartição do Imposto Geral, Thesouraria, Repartição de Procuração, Direcção de Estatistica, Repartição de Pagamentos, Registro Civil, Administração Sanitaria, Banco de Emprestimos, Departamento de Obras Publicas, Deposito Geral de Materiaes, Administração de Limpeza, Direcção de Illuminação, Direcção de Passeios, Administração de Curraes, Administração de Mercados, Repartição Chimica, Inspecção Geral, Administração de Lavadouros, Administração de Cemiterios e as Secções municipaes de Flôres, Belgrano e Boca e Barracas. A Secretaria divide-se em tres sub-secretarias, correspondentes aos ramos de fazenda, obras publicas e hygiene e segurança. Ellas são as transmissoras das resoluções do Intendente. Annexas á Secretaria funccionam as repartições—de Valôres, encarregada da arrecadação dos impostos,—de Compras, que trata dos preços e das propostas para fornecimentos, que por não attingirem á somma de mil pesos não requeiram licitação publica, e a Repartição de Informações, que fornece ao publico os dados e esclarecimentos de caracter municipal. A Assessoria é a repartição juridica. Dirige os pleitos da municipalidade e auxilia o Intendente em todas as questões judiciaes. A Contadoria é a chave mestra da administração municipal. Foi recentemente reorganisada no caracter de fiscalisadora de todas as outras repartições municipaes, sob o ponto de vista financeiro. A Direcção de Rendas, arrecada as rendas, os fundos e os impostos municipaes. Os empregados prestam fiança equivalente ás suas responsabilidades. A repartição de Procuração trata, especialmente, da cobrança de impostos atrasados. Procede judicialmente contra os que pretendam lesar os interesses municipaes. A Thesouraria é a unica depositaria dos fundos do municipio, e a encarregada de effectuar os pagamentos, sendo o thesoureiro pessoalmente responsavel pelos valores confiados á sua guarda. Para o pagamento dos salarios ao pessoal da Camara, ha uma repartição especial, independente d’aquella. A Direcção Geral de Estatistica recólhe e coordena todos os dados referentes á vida civica. Publíca o _Anuario Estadistico de la Ciudad de Buenos-Aires_, em duas edições, uma em francez e outra em hespanhol; e mensalmente o _Boletim de Estadistica Municipal_. O Registro Civil, trata não só de authenticar o estado civil dos habitantes, registrando os nascimentos, casamentos e obitos, mas tambem dos registros eleitoral e militar comprehendidos nos limites do municipio. A Administração Sanitaria comprehende egualmente os serviços da assistencia publica. Superintende na inspecção technica dos serviços de hygiene publica, dos matadouros, mercados e estabulos, na profilaxia das molestias infecto-contagiosas, nos serviços de desinfecção e vaccinação anti-variolosa e antica-rabica; nas analyses chimicas e bacteriologicas; nas observações de metereologia em relação com a hygiene urbana e trata, finalmente, dos serviços relacionados com a prostituição. A assistencia publica é prestada nos hospitaes, nos domicilios e em consultorios, abrangendo, além do serviço medico, o aviamento de receitas aos enfermos pobres. Comprehende tambem os asylos, o serviço de autopsias para os fallecidos sem assistencia medica e o de primeiros auxilios para todos os accidentes occorridos no perimetro do municipio e a qualquer hora do dia ou da noite. Da Administração Sanitaria dependem seis hospitaes municipaes, uma casa de isolamento para enfermos infecto-contagiosos, cinco estações sanitarias, um dispensario de salubridade, tres estações de desinfecção, dois laboratorios e um asylo nocturno, além das dependencias privativas dos serviços de inspecção sanitaria e de primeiros auxilios. O orçamento d’esta repartição foi, em 1905, de 2:120:936 pesos, dispendendo-se 1:020:936 em ordenados ao pessoal, 350:000 pesos em construcções hospitalares e 750:000 pesos em gastos geraes da administração. O _Banco Municipal de Préstamos_, tem por principal fim combater a usura dos chamados—montes de piedade—vulgarmente—casas de prégo. Empresta sobre alfaias e objectos portateis, adeanta dinheiro com caução de titulos da divida publica interna, nacional e municipal, sobre cédulas hypothecarias nacionaes e desconta lettras de thesouraria. Tem personalidade juridica e caixa economica, cujo ultimo balanço de deposito accusava a somma de 878:977 pesos. O capital do Banco é de 1:100:000 pesos. O _Departamento das Obras Publicas_, é, naturalmente, uma das repartições de maior importancia e movimento. Tem dirigido e fiscalisado a quasi totalidade da transformação do municipio, operada directamente ou por contractos com emprezas particulares. Está subdividido em varias secções, das quaes as mais importantes são a direcção de niveis e calçadas, a de architectura, a de hygiene e segurança e a de demarcações e cadastro. Não obstante occupar-se da edificação, em geral, e especialmente da construcção de edificios publicos, é na pavimentação das ruas que mais se tem desenvolvido a sua actividade. De 1895 a 1905, esta repartição dirigiu a pavimentação de 2:535 quadras de cem metros. No _Deposito Geral_, armazenam-se todos os materiaes necessarios para a execução das obras municipaes, servindo de repartição intermediaria entre os fornecedores e as estações consumidoras. A _Direccion de Paseos_, tem a seu cargo a formação, conservação e vigilancia de todos os logradouros publicos, incluindo o Jardim Zoologico. Trata tambem do cultivo, reproducção e desenvolvimento das arvores e das plantas destinadas ao aformoseamento e decoração dos parques e jardins publicos. A _Administração dos Lavadouros_, dirige tres grandes estabelecimentos publicos e municipaes, para a lavagem de roupa, sendo prohibido, na cidade, esse serviço fóra d’estes locaes. A municipalidade aluga, ás lavadeiras, as pias e os secadores, a vapor, por módico preço e sustenta, nas proximidades dos lavadouros, banheiros publicos concorridissimos pelas classes menos abastadas. Os cemiterios são tambem estabelecimentos municipaes, secularisados. As secções de Flôres, Belgrano e de Boca y Barracas, são repartições municipaes que comprehendem todos os elementos do serviço municipal para aquelles distantes e populosos bairros. A despeza annual, da municipalidade, com a limpeza das ruas, orça, na média, por dois milhões de pesos. Os serviços do fornecimento de agua e de limpeza de cloacas estão a cargo do governo federal. Quanto á illuminação publica e ás communicações urbanas, estão a cargo de emprezas particulares, fiscalisadas pela municipalidade. O numero total de empregados do municipio é, actualmente, superior a 5:200, assim classificados: —Chefes de administração, de 1.ª categoria, com o ordenado, mensal, de 700 pesos. —Chefes de administração, de 2.ª categoria, com o ordenado de 550 pesos. —Chefes de administração, de 3.ª categoria, com 450 pesos. —Directores de repartição, de 1.ª categoria, com o ordenado de 400 pesos. —Directores de repartição, de 2.ª categoria, com 340 pesos. —Directores de secção, de 1.ª categoria, com 300 pesos. —Directores de 2.ª categoria, com 240 pesos. —Idem » 3.ª » » 200 » —Primeiros officiaes » 180 » —Segundos » » 160 » —Terceiros » » 140 » —Primeiros auxiliares » 120 » —Segundos » » 100 » —Terceiros » » 95 » Não podem ser empregados municipaes os menores de 17 annos, nem os individuos cujo bom comportamento não seja comprovado documental ou testemunhalmente. Os empregos obteem-se por accesso, á excepção do de Secretario. Os empregados inferiores teem direito a licenças maximas de 45 dias, durante o anno, e os superiores pódem obter licenças annuaes para viajarem pela Europa, com a condição de, no regrésso, apresentarem um relatorio sobre assumptos municipaes relacionados com as funcções dos seus cargos. Para creditos, retiradas, jubilações e subsidios, ha um fundo especial constituido pelo desconto de 5% sobre todos os ordenados fixos, incluindo os de empregados jubilados; pela importancia das multas; pelos ordenados não recebidos até ao prazo de dois annos; pela 3.ª parte do 1.º mez de soldo dos empregados novos e por cem mil pesos annuaes fornecidos pela municipalidade. Em 1906, era de 1:300:000 pesos a importancia d’este fundo especial. A sua administração está a cargo da directoria do Banco Municipal de Emprestimos. As installações municipaes, tanto a do Departamento Executivo, na Avenida de Mayo, como a da Commissão Deliberante, na rua Perú, não estão á altura da importancia de Buenos-Aires, nem dos serviços que por ellas transitam e d’ellas dimanam. O edificio da Commissão tem mais de cem annos de construido, é exiguo e ameaça ruina. Ha apenas a notar ahi uma pequena bibliotheca. A séde do Departamento Executivo, na Avenida de Mayo, esquina da praça de egual nome, se bem que de vistoso aspecto, não corresponde aos fins a que é destinada, notando-se grande agglomeração de serviços em pequenos gabinetes, a par da extrema amabilidade do pessoal superior, sempre sollicito em fornecer esclarecimentos, verbalmente e por publicações municipaes, aos individuos que os requisitam. Segundo as estatisticas municipaes entraram, em 1906, pelo porto de Buenos-Aires, 366:309 pessôas, sendo 302:249 immigrantes. D’estes, 186:514 eram homens, 66:022 mulheres e 50:249 creanças. Em egual periodo, foram commettidos, na capital, os seguintes crimes: Contra outrem 3:237 » a propriedade 3:744 » os costumes, as garantias individuaes e a ordem publica 606 ----- Total 7:587 O numero de prisões foi de 8:380, incluindo as dos contraventores de ordenanças municipaes. Pagaram multa 4:334 autoados. Orçamento municipal de 1908: RECEITA Pesos Imposto geral 4:500:000 » dos matadouros 1:900:000 » de carne á venda 500:000 » » carruagens 60:000 » » vendedores ambulantes 5:000 » » extracção de couros 80:000 » » predial e de averbamentos 340:000 » » certificados de venda 2:000 » » registo de marcas 200 » » matriculas de consignatarios 7:500 Mercados:—Fructa, verdura, etc. 866:300 Imposto de matança de animaes fóra dos mercados 58:000 Vendedores de mercados 280:000 Carros de mão e carregadores 335:000 Compradores ambulantes 28:000 Engraxadores 600 Vendedores avulsos 7:000 Carruagens particulares 210:000 Automoveis particulares 70:000 Carruagens de cocheira 130:000 Coches funebres 22:000 Automoveis de aluguel 3:000 Ditos de carga 2:500 Carruagens de praça 800:000 Carroças 850:000 Bicicletas 3:000 Tara 20:000 Cocheiros 7:000 Carroceiros 1:500 Tarifas de carruagens 500 Certificados para conductores 1:500 Imposto de 5% nos theatros 350:000 » » » » circos 5:000 » dos centros sociaes 10:000 Festas de carnaval 13:000 Bailes particulares 200 Cafés cantantes com palco 11:000 » » sem » 10:000 » » com piano e orchestra 10:000 Bilhares 141:000 Taboletas 9:000 Jogos diversos 3:300 Tiro ao alvo 700 Montanhas russas e phonographos 2:500 Apparelhos automaticos 1:400 Gabinetes opticos 1:000 Organistas 3:500 Musicos ambulantes 500 Gondolas 500 Cursos de dansa e salas de armas 200 Panoramas 500 Cinematographos 30:000 Salões de guiñol 200 Moços de corda 3:000 Patentes de cães 18:000 Escriptorio central de mensageiros 6:500 Collocações de bandeiras 6:000 Leiloeiros 1:500 Analyses de substancias alimenticias 210:000 Peças soltas 4:000 Contraste de pesos e medidas 240:000 Imposto de caldeiras 55:000 » » motores a gaz e electricos 40:000 Inspecção de novas installações 35:000 Delineações e edificações 1:000:000 Inspecção de novas construcções 550:000 Imposto de niveis 1:300:000 Chapas de numeração 10:000 Poços 50:200 Construcções nos cemiterios 28:100 Imposto de conventilhos 95:000 » » casas de vicio 9:000 » » hoteis 12:000 » » restaurantes 8:000 » » casas de lanche 6:000 » » hospedarias 13:000 » » casas de pensão 500 » » alojamentos 9:000 » » casas mobiladas 15:000 » » tambos 3:500 » » casas de penhores 60:000 » » » » compra e venda 13:000 » » prostibulos 200:000 » » pousadas 40:000 » » cafés com camareiras 10:000 » » fornos de ladrilhos 5:000 » » _studs_ 9:000 » » cocheiras e cavallariças 40:000 » » » particulares 30:000 » » _garages_ 5:000 » » casas de venda de gado 200 » sobre estabelecimentos incommodo perigosos e insalubres 90:000 Fabricas de mosaico 100:000 Chapas de publicidade 20:000 Taboletas e lettreiros 75:000 Propaganda na via publica 150:000 » em theatros e _gares_ 35:000 Estacionamento de carruagens 220:000 Dito de ditas em _gares_ 45:000 Estacionamento de vehiculos em Flôres e Belgrano 3:000 Estacionamento de carroças 15:600 Mesas nas avenidas 14:000 Toldos 8:000 Marquesinhas 1:000 Postes telephonicos 12:000 Imposto de _tramways_, 6% sobre o producto bruto 1:400:000 Imposto de desvios e curvas de linhas urbanas 20:000 Inspecção de _tramways_ 32:000 Patente de 50 pesos por quadra, dos _tramways_ 250:000 Novos contractos de concessão de _tramways_ 50:000 Imposto de 2 centavos por metro cubico de gaz 700:000 6% do rendimento das companhias de electricidade 500:000 Hospitaes geraes 12:000 Maternidade 1:500 Desinfecção 20:000 Laboratorio bacteriologico 1:000 Vaccina anti-rabica 500 Inspecção veterinaria 3:000 Inspecção medica 1:500 Aluguel de ambulancias 15:500 Venda de sepulturas no cemiterio Norte 400:000 Idem no cemiterio Oeste 80:000 Arrendamento de sepulturas 290:000 Cremações Inhumações 127:000 Entrada de cadaveres nos cemiterios 30:000 Trasladações funebres 35:000 Titulos duplicados de sepulturas 2:000 Transferencias de titulos 12:000 Enterros 5:000 Missas de corpo presente 8:000 Entradas de carros no cemiterio de Oeste 12:000 Zeladores de sepulchros 9:000 Registo Civil 135:090 Direitos de officinas 115:000 Boletim de estatistica 300:000 Lavadouros publicos 32:000 Aguas correntes de Urquiza 20:000 Extracção de areias 12:000 » » estrume 30:000 Ambulancia para animaes 600 Deposito de carruagens 100 Certificados de comportamento 100 Contadores de gaz e electricidade 100:000 Sociedades anonymas 17:000 Jardim Zoologico 100:000 Diversões n’este jardim 12:000 Certificados em geral 100:000 Alugueis de propriedades municipaes 75:000 Saldo dos annos anteriores 1:400:900 Hippodromos 1:000:000 Loteria Nacional 50:000 Veredas no cemiterio Oeste 8:000 Eventuaes 250:000 Arrendamento de mercados 480:000 Imposto aos mercadores 55:000 Saldo de contribuições 900:000 Venda de terrenos municipaes 537:000 A receber de terrenos e productos da quinta de Hale 1:751:000 ---------- 27:445:405 DESPESA Pesos Ordenados a todos os funccionarios municipaes 7:080:940 Lavadouros publicos 1:800 Banhos publicos 225 Assistencia publica 190:655 Conselho Nacional de Educação 800:000 Fundo de jubilações 150:000 Bibliotheca Rivadavia 600 Liga contra a tuberculose 1:800 Patronato da infancia 5:800 Sociedade de Educação Industrial 1:000 Sociedade Estimulo de Bellas-Artes Emprestimo de 1882, interesses 151:118 Amortisação 159:315 Emprestimo de 1884, interesses 368:441 Amortisação 331:558 Emprestimo de 1888, interesses e amortisação 1:249:985 Commissão e gastos na Europa 12:499 Emprestimo do theatro Colon, interesses e amortisação 280:000 Gastos geraes da administração municipal 500:000 Reforma e conservação de edificios municipaes 200:000 Reforma, conservação e construcção de hospitaes 350:000 Pago ao pessoal da Commissão Municipal 180:000 Festas patrias 50:000 Serviços de emprestimos hypothecarios e seguros de edificios municipaes 25:000 Despesa com as machinas municipaes 200:000 Limpeza publica 950:000 Conservação e reforma dos passeios 110:000 Conservação do parque 3 de Fevereiro e viveres para o Jardim Zoologico 182:000 Gastos com as ruas. 900:000 Saneamento dos arrabaldes 200:000 Gastos geraes da Administração Sanitaria 800:000 Alimentos e roupas para o Pavilhão da Assistencia Publica 800.000 Serviço e ampliação de arruados 2:000:000 Eventuaes 100:000 Laboratorio de chimica 5:000 Obras, conservação e hygiene dos mercados 50:000 Imposto de pavimentação para as propriedades municipaes 30:000 Jubilações 5:000 Pago por vaccas tuberculosas 30:000 Gratificação aos agentes de policia 10:000 Pago de exercicios findos 300:000 Lettras a pagar 58:880 Despesas no matadouro de Liniers 204:500 Para obras de depuração das aguas servidas no matadouro de Liniers 340:763 Ao Conselho Nacional de Educação 549:087 Para construcção de mercados 500:000 » » do Asylo de Mendigos e Chronicos 537:805 Lettras a pagar a Baring Brothers 628:172 Gastos na quinta de Hale 300:000 Para a erecção de estatuas aos membros da 1.ª Junta Municipal 70:000 Para abertura de avenidas 500:000 Para alargamento de ruas 200:000 Para acquisição de obras de arte para as praças e passeios e para auxilio da litteratura nacional 50:000 Construcção do theatro Colon 854:000 Decoração do seu _foyer_ 35:000 ---------- 23:590:943 Imprensa Em 1765, o vice-rei governador e capitão general do Rio da Prata e das provincias do Perú e do Chile, D. Manuel de Amat y Jumient, concedeu licença ao padre D. Mathias Roza, procurador geral da Companhia de Jesus, afim de estabelecer uma imprensa no collegio de Monserrat, da cidade de Cordoba, _para facilitar as impressões dos actos litterarios e outras obras_. O prélo que havia, até então, n’essa jurisdição, era o de Lima, no Perú, a 1:200 leguas de distancia. Os jesuitas pagaram 100 pesos de licença e fizeram transportar, da Hespanha, o prélo e todos os seus pertences. A permissão foi-lhes concedida com a condição de não imprimirem livro algum que tratásse das Indias, nem de _papel sellado_, nem do vocabulario ou lingua dos indios, sem prévia auctorisação das auctoridades superiores. Pouco tempo depois foram expulsos os jesuitas e parou a imprensa de Cordoba, até que em 16 de Setembro de 1775, o vice-rei Vertiz officiou ao reitor de Monserrat, propondo-lhe a transferencia da imprensa para Buenos-Aires, o que teve logar no anno seguinte, pelo preço de mil pesos, tendo ella custado 2:000 duros aos padres de Loyola. Foi, ao principio, montada em uma casa velha, no local onde hoje funcciona o Collegio Nacional e Central, sendo pouco depois transferida para a esquina das ruas Bolivar e Moreno. Para o cargo de administrador geral da imprensa, foi nomeado D. José da Silva y Aguiar, pelo tempo de dez annos, a unica pessôa de Buenos-Aires que, ao tempo, entendia da arte typographica. Em Maio de 1780 fez-se a primeira impressão, um formulario de nomeação para empregos de milicias. O primeiro papel impresso que appareceu em Buenos-Aires, com o caracter de publicação periodica, foi em 1 de abril de 1801, o _Telegrafo Mercantil, Rural, Politico, Economico e Historiografico del Rio de la Plata_, fundado pelo coronel D. Francisco Antonio Cabello y Mesa. Era bi-semanal, de oito paginas 13×20, e muito mal imprésso na que então já se chamava _Real imprenta de niños expósitos_. Seguiu-se-lhe o _Semanario de Agricultura y Comercio_, publicado por D. Hipolito Vieytes, em 1802, na mesma imprensa, porém melhor elaborado. Belgrano fundou, em 1810, o _Correo de Comercio de Buenos-Aires_, jornal politico, apesar do seu titulo. No mesmo anno appareceu _La Gaceta de Buenos-Aires_, editada pela typographia de _M. J. Gandarillos y socios_, com melhor material e superiormente redigida por D. Mariano Moreno, insigne patriota. Surgiram, até 1835, numerosos periodicos politicos, noticiosos e commerciaes, supprimindo-os o dictador Rosas, com excepção do seu orgão—_La Gaceta Mercantil de Buenos-Aires_, que se publicou de 1823 a 1852. Derrubado o tyranno e proclamada a liberdade da imprensa, pela constituição de 1853, o periodismo entrou em nova phase, apparecendo numerosos jornaes diarios, semanarios e revistas, dos quaes os primeiros e os mais importantes fôram _El Comercio_, _El Federal_, _La Avispa_, _El Correo Argentino_, _El Nacional_, _La Tribuna_, _La Crónica_, _El Orden e Los Debates_. Este ultimo começou a ser publicado em 1852 e resurgiu em 1857, sendo seu redactor, em chefe, o celebre general Mítre. Em 1862 mudou o titulo para _La Nacion Argentina_, e em 1870 para _La Nacion_, que ainda hoje ostenta, disputando a _La Prensa_, a gloria de ser o primeiro jornal argentino. Actualmente publicam-se, em Buenos-Aires, mais de quatrocentos diarios, periodicos e revistas, sendo uns cem estrangeiros. Além dos dois acima citados, os principaes são _El Diario_, _El Pais_, _La Patria degli Italiani_, _La Razón_, _El Diario de España_ e _El Tiempo_. Porém o melhor installado é _La Prensa_, que possúe um esplendido palacio, na Avenida de Mayo. É em quatro pavimentos e remata-o uma torre-observatorio, á altura de 55 metros, com uma estatua que empunha um poderoso fóco electrico. Este monumental edificio foi mandado construir pelo dr. José Paz, fundador do jornal. As principaes installações de _La Prensa_, além dos soberbos machinismos rotativos, movidos a electricidade e que imprimem 95:000 exemplares por dia, são a sala geral de recepção, espelhada, perfumada e luxuosamente mobilada, o salão de bilhar, o grande refeitorio, com rica e artistica mobilia, a bibliotheca, com 6:000 volumes, o museu de curiosidades, as officinas de photographia, a de photogravura, o salão de conferencias, decorado a pinturas douradas e a esplendidos lustres e as salas e aposentos para hospedes de distincção. O papel para impressão está depositado em dois subterraneos, abaixo do das machinas. Ha tambem um salão de esgrima e outras dependencias. Vários ascensores electricos communicam os diversos pavimentos entre si e com a torre-observatorio. Das revistas e illustrações avultam _Ilustración Sud-Americana_ e _Caras y Caretas_. Em nenhum outro centro da intellectualidade universal o periodismo está mais adeantado e aperfeiçoado do que em Buenos-Aires. Viação Urbana As dez companhias de _tramways_ electricos, de Buenos-Aires, transportaram, em 1907, 200:700:247 passageiros, que pagaram passagens na importancia total de 20:436:090 pesos e 35 centavos. D’essas empresas, só tres estão ainda em transformação do serviço de tracção animal para a tracção electrica, adoptando as outras sete este ultimo systema de locomoção. Das tres primeiras, duas teem a electricidade adoptada já em quasi todas as suas linhas. A companhia Anglo-Argentina explorava, em 1908, 8 kilometros e 34 metros de linhas a tracção animal e 257 kilometros e 944 metros a tracção electrica; tinha 880 carros e 2:170 empregados em actividade. A empresa _La Capital_, dispunha, no mesmo anno, de 3 kilometros servidos a tracção animal, 56 kilometros e 491 metros a tracção electrica, 157 carros e de 760 empregados. A _F. C. C. Argentino_ tinha 1,ᵏ 300,ᵐˢ de linhas em exploração pela tracção animal. A companhia _Electricos de Buenos-Aires_, fazia circular 85 carros, por 38,ᵏ 660,ᵐˢ com 415 empregados. A _Metropolitana_, electrica, explorava 33,ᵏ 70,ᵐˢ com 90 carros e 420 empregados. A _Gran Nacional_, electrica, 121,ᵏ 700,ᵐˢ 463 carros, 1:440 empregados. A _Lacroze de Buenos-Aires, Limtd._, 42,ᵏ 094,ᵐˢ 158 carros, 554 empregados. A _Belga—Argentina_, electrica, 16,ᵏ 390,ᵐˢ 40 carros, 85 empregados. Finalmente, a companhia _Electricos del Sud_, tinha 8,ᵏ 486,ᵐˢ 8 carros e 46 empregados. Da capital da Republica partem cinco grandes linhas geraes de caminhos de ferro, pertencentes a outras tantas companhias, na extensão total de 11:314 kilometros, com 1:227 machinas, 1:368 carruagens e 33:605 vagões em serviço. Essas empresas são—_Sul de Buenos-Aires_, com 4:093 kilometros (em 1907), 510 locomotivas, 433 carruagens e 11:578 vagões. —_De Buenos-Aires ao Pacifico_, 1:610 kilometros, 319 locomotivas, 240 carruagens e 5:501 vagões. —_De Buenos-Aires ao Rosario_, 1:977 kilometros, 239 locomotivas, 237 carruagens e 6:837 vagões. —_Central-Argentino_, 1:823 kilometros, 145 locomotivas, 254 carruagens e 5:201 vagões. —_Oeste de Buenos-Aires_, 1:555 kilometros, 185 locomotivas, 174 carruagens e 4:488 vagões. No mesmo periodo, essas companhias transportaram, só para as estações do municipio de Buenos-Aires, 15:135:230 passageiros e 3:726:714 toneladas de mercadorias. Em igual anno havia, em Buenos-Aires, 978 carruagens particulares, 601 com rodas de borracha, 1:095 de aluguel, das quaes 454 com rodas de borracha; 2:277 carruagens de praça; 423 automoveis particulares, 109 ditos de aluguel; 31 automoveis de carga, 25 motocyclos, 4:877 bicycletas, 11:547 carroças e 1:317 carrinhos de mão. Todas as companhias de _tramways_ teem contractos com a municipalidade, por um periodo que varia entre 60 e 99 annos. Findos os prazos todo o material e as installações d’essas empresas pertencerão ao municipio. As passagens nos _omnibus_, ou _tramways_, e dentro do perimetro da cidade, regulam o preço de 10 centavos por pessôa e por viagem. Nas horas de maior movimento, atrelados aos carros communs, circulam outros, a meios preços, para a população operaria e indigente. Os horarios são submettidos á apreciação e approvação da municipalidade, havendo só uma companhia que sustenta o serviço permanente, regulando a labuta das outras empresas, das cinco da madrugada á 1 hora da noite. Movimento Associativo O ultimo recenseamento d’este movimento, feito em 1906, deu o seguinte resultado: —291 associações, com a totalidade de 167:977 membros. D’estas, 97 eram de soccorros mutuos, com 66:693 associados. Em 1904, todas as sociedades de Buenos-Aires arrecadaram, de mensalidades, 3:129:279 pesos, correspondendo 1:112:812 ás collectividades de soccorros mutuos. Ás de beneficencia couberam 689:573 pesos. Os circulos catholicos de operarios, fundados ha 15 annos pelo padre Grote, do gran-ducado de Luxemburgo, teem, actualmente, mais de 40:000 socios, dando-lhes o censo de 1906, apenas 4:414 membros. Quadro demonstrativo do caracter das associações, do numero de sociedades e do numero dos associados: Caracter Sociedades Socios Social 10 5:031 Beneficente 23 19:485 Recreativo 52 5:664 Litterario, scientifico e artistico 25 5:622 Maçon 3 209 Mutualista 97 66:693 Sport 15 18:382 Operario, (circulos) 6 4:414 Socialista 16 22:568 Protector de irracionaes 1 500 Politico 2 719 Protector da infancia 5 2:749 Diverso 36 15:941 --- ------- 291 167:977 D’estas associações 118 eram argentinas, 85 italianas, 19 hespanholas, 12 francezas, 7 inglezas, 7 allemãs e 6 suissas. Dos seus membros, 147:420 eram homens e 16:242 mulheres. A de maior numero de socios era o Circulo da Guarda Nacional, com 14:000. Segue-se-lhe a _Associacion Española de Soccorros Mutuos_, com 12:428 socios e a _Confederación de Ferrocarrileros_, com 12:000. As que possuiam maiores bibliothecas eram o _Circulo Medico Argentino_, 8:573 volumes; o _Club del Progresso_, 7:530; a _English Literary Society_, 4:000 volumes, e o _Centro Socialista de la Boca_, 3:400 volumes. Das agremiações beneficentes e promotoras da instrucção, citaremos a _Protectora de Niños Desvalidos_, que sustenta um asylo e uma escóla; a _Sociedad de Beneficencia Ospedale Italiano_, que mantem o importante hospital da colonia; a _Sociedad Española de Beneficencia_, idem; a _Nazionale Italiana_, que sustenta uma escóla frequentada por 535 alumnos; _A Union Operai Italiani_, com escóla de 380 alumnos: a _Italia Unita_, escóla de 170 creanças; a _Cosmopolita de Proteccion Mutua e Instrución_, escóla com 157 alumnos; a _Umberto I_, escóla com 117 frequentadores; o _Circulo de Obreros de Palermo_, escóla com 300 crianças, e a _Associacion Rivadavia de Jóvenes Cristianos_, que sustenta uma escóla frequentada por 250 alumnos. A notar, ainda, a associação franceza _Les Dames de la Providence_, fundadora de um orphelinato francez, que em 1906 abrigava 120 asylados. A sociedade que mais dispendeu, no mesmo anno, foi a _Sociedad de Beneficencia Ospedale Italiano_, com 3:142 socios, a receita de 260:880,71 e a despesa de 243:324 pesos e 38 centavos. Segue-se-lhe a _Asociacion Española de Soccorros Mutuos_, com 12:428 socios, que arrecadou 173:234,50 e dispendeu 185:668,01 e a _Sociedad Española de Beneficencia_, respectivamente, 3:673, 286:000, e 194:784,75. _A Caja de Socorros de Policia y Bomberos de la Capital_, tinha 5:536 socios, recebeu 174:183,61, gastou 167:065 pesos e 65 centavos. De 914:000 habitantes, que então contava Buenos-Aires, 104:808 pertenciam a sociedades mutualistas, dos quaes 94:640 eram homens, 8:880 mulheres e 1:288 crianças. Parallelo Synthetizando o estudo feito nos 50 capitulos que tratam das manifestações vitaes das metropoles brasileira e argentina, em todos os ramos da actividade humana, passaremos, para terminar este livro, a estabelecer um parallelo entre as duas capitaes, baseando o nosso trabalho nos principaes pontos até aqui desenvolvidos. E é assim que poderemos considerar, comparativamente, Rio de Janeiro e Buenos-Aires, sob os seguintes 26 aspectos: —Situação geographica e topographica. —Climatologia. —Aspecto geral. —Monumentos religiosos. —Monumentos profanos. —População. —Area civica. —Museus. —Bibliothecas. —Logradouros publicos. —Arte. —Esthetica. —Historia. —Assistencia publica. —Beneficencia particular. —Theatros. —Instrucção publica. —Salubridade e hygiene. —Commercio e Industria. —Intellectualidade. —Municipalismo. —Viação urbana. —Movimento civico. —Movimento associativo. —Alimentação publica. —Natureza. * * * * * =Situação Geographica e Topographica=—Não obstante a largura do rio da Prata ser de 45 kilometros, defronte de Buenos-Aires, o porto d’esta cidade, amplo e profundo, não deixa de ser de costa, ou margem de rio, e a sua situação geographica inferior á do Rio de Janeiro. Amplissimo e profundo, como o da capital argentina, o porto fluminense é, além d’isso, _especial_ e de belleza natural incomparavel. A differença é radical não só quanto ao porto propriamente dito, como em relação á situação geographica e á exposição topographica das duas capitães. A entrada natural do Rio de Janeiro consta de dois canaes entre fortalezas e montanhas. Transpostos aquelles, depara-se-nos uma immensa bacia liquida de 140 kilometros de circumferencia, semeada de 80 ilhas, abrigada por cordilheiras, ladeada de cidades, villas e aldeias, enfeitada por uma vegetação tropical e luxuriante. A exposição da cidade é prejudicada pela topographia do terreno, extraordinariamente accidentado. Em consequencia, as edificações galgam e contornam as elevações, não podendo, por isso, fazer-se, exteriormente, ideia da extensão e formosura da cidade. É preciso desembarcar e percorrêl-a, subir ao vértice das collinas edificadas e á cúspide das montanhas circumvisinhas, para abranger-se o panorama geral e os detalhes da povoação, surprehendendo-se situações imprevistas e gravando-se, no pensamento e no coração, a indelével impressão que resulta do conjuncto formado por um porto natural de primeira ordem, rival glorioso dos portos de Constantinopla e de Napoles, pelos esplendôres de uma paisagem feerica e unica e pela bellissima, se bem que irregular situação de uma grande cidade prejudicada por excrecencias naturaes que urge destruir, mas tão rica de moldura quão irradiante de primôres. Em Buenos-Aires não ha belleza natural. O porto é vasto e vulgar e a cidade está edificada em immensa planicie mal vestida de vegetação e pantanosa. * * * * * =Climatologia=—Pela situação geographica da povoação, o clima de Buenos-Aires é mais regular e ameno do que o da sua rival. É no clima, no aspecto geral e no movimento civico que a metropole argentina mais se assimilha ás capitaes da Europa central. O clima do Rio de Janeiro é, em geral, quente e humido, se bem que suavisado, de dia e á noite, por brisas terrestres e maritimas. A não dar-se esta circumstancia e a existencia da pujante vegetação que perennemente abraça a capital brasileira em transportes de ineffavel suavidade, a metropole fluminense seria ainda hoje uma insignificante povoação indigena, a vegetar em constante e desigual lucta com a inclemencia dos elementos. Ao passo que aqui a temperatura rarissimas vezes baixa de 20.° centigrados, no mez de Julho, o mais frio do anno, em Buenos-Aires desce, frequentemente, a 5.° pela mesma epocha. Em Janeiro não é raro marcar o thermometro 32.°, no Rio de janeiro, se bem que a média da temperatura seja de 27.°, o que poucas vezes acontece na sua rival, cuja média de temperatura, no verão, é de 25.°, e no inverno, de 12.°. Cidade aberta e desabrigada, Buenos-Aires é, com frequencia, açoitada pelos _pampeiros_, furacões que se formam nos pampas. Devido á sua situação geographica e topographica, Rio de Janeiro está naturalmente mais defendida da furia dos vendavaes. * * * * * =Aspecto Geral=—Sob este ponto de vista não é menos profunda a differença entre as duas capitaes, do que em relação á sua topographia e climatologia. Buenos-Aires é um grandioso centro civico, extraordinariamente movimentado. Quem percorre a povoação de dia ou á noite, nas horas de maior labuta, experimenta a illusão de que está em plena Paris, Hamburgo ou Berlim. Examinada, todavia, em detalhe, conclúe-se pela monotonia e ausencia da esthetica, n’esses arruados demasiadamente longos e estreitos, que fatigam a vista e a imaginação, a não ser que procuremos rapidamente um derivativo e um refrigerio na avenida e praça de Mayo, ou no parque de Palermo. Rio de Janeiro, visitada n’estes ultimos tempos, produz o effeito de reconstrucção civica, após medonho cataclismo. Não obstante estarem já concluidas soberbas avenidas e transformados, para melhor, numerosos arruados, na maioria dos bairros continúa, activamente, a substituição da cidade colonial por outra mais digna da grandiosa nacionalidade que representa e dirige. Exteriormente, o aspecto geral do Rio de janeiro, arrabaldes e suburbios é não só superior, em extensão e belleza, ao de Buenos-Aires, mas tambem ao de quasi todas as metropoles do globo; interiormente, porém, somos forçados a dar a preferencia á capital _porteña_, pelo seu feitio completo, internacional, europeu e pela assombrosa animação das suas arterias publicas, do seu commercio e de todas as manifestações da actividade humana. * * * * * =Monumentos=—Caracteristicamente monumental, nenhuma das duas capitaes é; em ambas predomina ainda o mestre de obras a fazer casas sem arte, estylo nem gosto. Quando apparece, raramente, o architecto a manifestar-se em frontarias classicas e em detalhes interiores e artisticos trata-se, geralmente, de edificios do Estado ou de grandes empresas do commercio e da industria. Não ha muitos annos que, n’uma e n’outra capital, as casas, em geral, não passavam do segundo pavimento, o que explica-se, em parte, pela abundancia e barateza do terreno edificavel. Hoje, que elle vae escasseando e encarecendo, que as populações são mais numerosas e outras as condições da vida civica, os andares accumulam-se uns sobre os outros, apresentando as arterias publicas mais imponente aspecto. Rio de Janeiro não possúe um Congresso Nacional nem um Palacio de Justiça, monumentos grandiosos em qualquer dos maiores centros da vida terraquea; mas e em compensação, Buenos-Aires não encerra coisa que se pareça com a Candelaria, precioso escrinio monumental e artistico. Os outros santuarios fluminenses são ainda superiores aos da capital argentina, á excepção da Cathedral. S. Bento e S. Francisco da Penitencia reflectem, deslumbrantemente, o ouro e a arte dos tempos coloniaes, em que as energias moraes, physicas e economicas eram consumidas a celebrar a gloria de Deus e a da sua côrte celestial. Quanto a estatuas e a grupos artisticos, as praças e os parques das duas metropoles estão egualmente guarnecidos e ornamentados em numero e qualidade. Temos, pois, que em monumentos religiosos a superioridade pertence ao Rio de janeiro, e em monumentos civis, ou profanos, a Buenos-Aires, não obstante a monumental decoração da Avenida Central, e os edificios publicos e particulares que, na capital fluminense, ostentam, aqui e alli, as suas imponentes frontarias. * * * * * =População=—463:453 homens e 347:990 mulheres, eis os numeros officiaes da população fluminense, em 20 de Setembro de 1906, data do ultimo recenseamento. Total 811:443 habitantes. 16 annos antes, em 1890, os habitantes do Rio de Janeiro eram 522:651, havendo um augmento de 288:792 individuos. Este censo abrange as duas zonas, urbana e suburbana, subdivididas em 25 districtos municipaes. A densidade da população, na zona urbana, é de 3:928 habitantes por kilometro quadrado, e na zona suburbana, apenas de 191. D’aquelles 811:443 moradores do Rio de Janeiro 600:928 eram brasileiros, e 210:515 estrangeiros; 195:880 solteiros, 214:730 casados e 52:704 viuvos. Dos restantes não se conhecia o estado civil. Sabiam lêr 260:941 homens e 160:131 mulheres; eram analphabetos 202:512 homens e 187:859 mulheres; total 390:371. Existiam 50 homens e 128 mulheres com mais de cem annos de edade. Hoje, a população do Rio de Janeiro, arrabaldes e suburbios, é computada em 900:000 habitantes. Em Buenos-Aires, no mesmo periodo de tempo em que foi feito o recenseamento official da população da capital brasileira (setembro de 1906) havia, tambem officialmente recenseados, 1:084:113 habitantes. Dois annos antes, o censo déra o total de 950:891 almas, das quaes 497:839 homens e 453:052 mulheres; 523:041 argentinas e 427:850 estrangeiras. Em 31 de Março de 1908, a população de Buenos-Aires era, officialmente, de 1:140:377 moradores, que n’este momento poderão computar-se, sem exaggêro, em 1:200:000. Só as cidades norte-americanas, e não todas, podem competir com a capital argentina em rapidez de augmento de população, o que explica-se, principalmente, pelo movimento immigratorio. Só no mez de Março de 1908 entraram no porto de Buenos-Aires, 309 embarcações com 31:846 passageiros, dos quaes 12:330 eram immigrantes. No anno de 1906 entraram 419 embarcações, transportando 419:024 passageiros, dos quaes 114:889 eram immigrantes. Pelo recenseamento geral e official de 18 de Setembro de 1904, dos 950:891 habitantes de Buenos-Aires, apenas eram analphabetos 70:825 homens e 86:474 mulheres. 104:925 homens e 97:898 mulheres eram solteiros; 159:310 homens e 149:576 mulheres eram casados, e 12:541 homens e 34:016 mulheres eram viuvos. Do resto da população ignorava-se o estado civil. Superioridade da população de Buenos-Aires sobre a do Rio de Janeiro—300:000 habitantes, numeros redondos. * * * * * =Area Civica=—A superficie da cidade do Rio de Janeiro, é, actualmente, de 1:100 kilometros quadrados, isto é, maior do que a de New-York, que tem 770 kilometros, a de Paris, com 500 e a de Vienna de Austria, com 178 kilometros quadrados e inferior á área civica de Londres, que é de 1:704 kilometros quadrados. O facto de tamanha area em relação á população, explica-se pela topographia da povoação, cujo desenvolvimento acompanha os accidentes do terreno, extremamente montanhoso, e pelo systema de construcção de habitações, em geral baixas e separadas por espaços ajardinados. Ha ainda quem dê á capital do Brasil, a superficie total de 1:892 kilometros quadrados, maior do que todo o Districto Federal, que é de 1:394 kilometros quadrados. De Norte a Sul, a extensão da cidade é de 14 kilometros e de 16 de Leste a Oeste. Pelo ultimo recenseamento official, o de 1906, o numero de casas edificadas era de 84:000. O perimetro civico de Buenos-Aires é de 200 kilometros, e o numero de casas edificadas, em 1904, era de 83:000 (ultimo recenseamento official). A enorme differença da superficie total, em kilometros quadrados, de uma a outra metropole, está em que Buenos-Aires é uma povoação compacta, onde os quarteirões, ou _manzanas_, succedem-se, ininterruptamente, e Rio de janeiro é uma cidade de bairros distantes e distanciados, divididos entre si e do nucleo central por grandes depressões de terreno e por exuberancias naturaes. O centro civico da capital do Brasil, é pequenissimo em proporção dos nucleos edificados que com elle communicam e dos numerosos arrabaldes que circumdam os bairros populares. A extensão de Buenos-Aires é de 18 kilometros de Norte a Sul e de 25 kilometros de Leste a Oeste. * * * * * =Museus=—As preciosidades artisticas encerradas na Escóla Nacional, ou Academia de Bellas Artes, onde avultam quadros de Raphael, Corregio, Dominichino, Jordaens, Rubens, Ribera, Ticiano, Van Dyck, Valasquez, Paulo Veronese, Pedro Americo, Victor Meirelles, Amoedo e outras summidades do pincel; o Museu Nacional, com as suas valiosas e numerosissimas collecções, que occupam o espaço de mais de 3:000 metros quadrados; O Museu Naval e o Pedagogium, avantajam-se aos quatro museus de Buenos-Aires. Estes são o Museu Nacional de Bellas Artes, o Museu de Historia Natural, o Museu Historico Nacional e o Museu de Armas. Falta á capital do Brasil uma installação que recorde á mocidade e ao publico, em geral, os actos de heroicidade e de civismo praticados pelos seus filhos mais illustres, na curta mas já brilhante trajectoria da existencia nacional; todavia, e em compensação, as collecções de historia natural, mineralogia, ethnographia, pintura, numismatica, e ainda outras dos museus fluminenses, são mais preciosas do que as suas similares dos museus de Buenos-Aires. Nas 17 salas do Museu Nacional de Bellas Artes da capital argentina, ha maior numero de quadros do que nos exiguos e escuros compartimentos da Academia de Bellas Artes, do Rio de janeiro; porém os quadros d’esta ultima são de maior valor artistico e constituem, incontestavelmente, a primeira collecção da America do Sul. Quanto ao Museu Nacional, esse é tambem, no seu genero, o melhor do continente sul-americano. Brevemente, reunidas todas as collecções naturaes e artisticas no sumptuoso palacio das Bellas Artes, em construcção na Avenida Central, a capital do Brasil possuirá um dos primeiros museus do globo. * * * * * =Bibliothecas=—A Bibliotheca Nacional do Rio de Janeiro, possúe 240:000 volumes, e a Bibliotheca Nacional, de Buenos-Aires, 180:000. Além de que a primeira tem 100:000 estampas e gravuras e 25:150 moedas e medalhas. Em compensação, a argentina possúe imprensa propria, officina de encadernação e estufas de desinfecção, o que a fluminense ainda não contem, mas que certamente não lhe faltarão, e em condições de superioridade, na sua nova installação da Avenida Central que, dentro em pouco, será inaugurada. A Bibliotheca Nacional, brasileira, já estava melhor installada do que a sua similar, argentina; agora, transferida para o novo e magestoso palacio, em conclusão, não terá rival em toda a America do Sul. Quanto á frequencia média, mensal, a da Bibliotheca Nacional do Rio de Janeiro é de 3:500 leitores e a da sua congenere de Buenos-Aires, é de 2:500. A Bibliotheca Municipal, fluminense, encerra 22:000 volumes, com a media mensal de 1:200 leitores; a Bibliotheca Municipal, ou Rivadavia, de Buenos-Aires, 43:000 livros, com equivalente frequencia. As outras collecções de livros mais importantes, nas duas capitaes são, em Buenos-Aires, as bibliothecas General Mitre, do jornal _La Prensa_, das Faculdades de Direito e de Medicina e da Sociedade Typographica Bonaerense; no Rio de Janeiro, a _Fluminense_, com 90:000 volumes, a _Germania_; a do _Commercio_ e as especiaes do Exercito e da Marinha, nos respectivos arsenaes. De associações e particulares, ha numerosas collecções de livros, mais ou menos importantes, em uma e outra capital, equivalendo-se em numero e qualidade. Se a existencia de livros, na Bibliotheca Nacional, fluminense, é superior em 60:000 volumes aos exemplares da sua congenere do Rio da Prata, o numero de livros que enriquecem a Bibliotheca Municipal de Buenos-Aires, é superior em 11:000 volumes á collecção da Bibliotheca Municipal do Rio de Janeiro. A primazia d’esta capital, em bibliothecas, é principalmente devida ás respectivas installações. * * * * * =Logradouros publicos=—Principaes parques e jardins de Buenos-Aires, com as competentes areas em metros quadrados: Parque Tres de Fevereiro, ou de Palermo 3:677:467 Parque Saavedra 426:397 » Patricios 228:795 Jardim Zoologico 179:400 Parque Christovão Colombo 162:000 » Lezama 76:635 Jardim Botanico 80:427 Passeio de Julho 33:085 » Colon 20:216 Ha ainda outros parques e jardins, menos importantes e citados no capitulo respectivo, que completam o algarismo de 7:100:000 metros quadrados, para a indicação da superficie total dos logradouros publicos da capital argentina. Quanto aos da sua rival, brasileira, eis o quadro: Jardim Botanico 544:611 Parque da Republica 198:000 » de S. Christovão 180:000 Passeio Publico 28:196 Jardim da Gloria 20:000 Addicionando as superficies de todos os outros jardins e passeios ajardinados do Rio de Janeiro, muito inferiores aos mencionados anteriormente, temos, no maximo, uma area de 1:500:000 metros quadrados de superficie total para todos os logradouros publicos da capital do Brasil. Propositadamente não incluimos, n’este quadro, o Jardim Zoologico e a Floresta da Tijuca, do Rio de Janeiro, ambos descriptos no capitulo respectivo, porque o primeiro é indigno d’esse nome e está alugado a particulares, e a segunda fica muito além da area civica e está inculta, em grande extensão e liga-se, por diversos pontos, a matagaes virgens. É, sob este ponto de vista, esmagadora a superioridade da capital argentina sobre a brasileira; mas o que Buenos-Aires jámais possuirá é um Jardim Botanico comparavel ao do Rio de Janeiro, mesmo porque este não tem rival em parte alguma do mundo, quanto a belleza e desenvolvimento da vegetação. N’este particular, todos os logradouros publicos fluminenses são superiores aos bonaerenses, cujo arvoredo é, em geral, rachitico e raro. * * * * * =Arte e Esthetica=—Em manifestações estheticas e artisticas temos, nas duas capitaes, os monumentos publicos e particulares, as preciosidades contidas nos seus museus e a esthetica geral e civica das duas metropoles. Considerado este especialissimo ponto de vista, Buenos-Aires avantaja-se ao Rio de Janeiro, na generalidade, e esta capital áquella nos detalhes. A capital argentina tem um caracter definido do bello, apreciavel e discutivel, mas emfim é uma cidade regularmente edificada em arruados symetricos e que obedecem a um plano preconcebido, se bem que na sua execução haja a notar a pouca amplidão das arterias em relação ao comprimento, o que faria de Buenos-Aires uma cidade triste e monotona, se a não animásse a extraordinaria actividade de 1:200:000 individuos, que parecem multiplicados por quatro. Rio de Janeiro é uma cidade em transformação. Esta obedece tambem a um plano revelador do caracter esthetico; mas a verdade é que muito resta ainda da antiga povoação colonial, mesmo no centro da cidade, e que só muito mais tarde será completamente transformado; ao passo que ha mais de trinta annos que Buenos-Aires é uma capital regularmente edificada, _por igual_. Considerados os detalhes não ha parallello possivel. A Avenida de Mayo, com todo o seu movimento parisiense e londrino, não vale a esthetica nem a arte da Avenida Central, ladeada por cem palacios, como a perspectiva do parque de Palermo, não se compara aos esplendores irradiantes do percurso pela Avenida Beira Mar. Em todas as coisas d’este mundo, porém, a verdade é só uma e a logica implacavel, obrigando-nos a resolver o assumpto pela generalidade. Em valor e formosura de monumentos e de collecções artisticas, já vimos a superioridade da capital argentina quanto ao primeiro ponto. O thesouro artistico, em pintura, da Academia de Bellas Artes, do Rio de Janeiro, compete vantajosamente com todas as collecções de arte que enriquecem os museus e as galerias particulares de Buenos-Aires. * * * * * =Historia=—É egualmente gloriosa para as duas primeiras capitaes sul-americanas, a historia da sua fundação. Gonçalo Coelho e Pedro de Mendoza, militares de alta patente, o 1.º almirante e o 2.º governador militar, ou _adelantado_, foram os primeiros europeus que pisaram o solo onde, mais tarde, deveriam ser fundadas as soberbas metropoles que nos occupam. O _adelantado_ foi mesmo o fundador da primitiva cidade de Buenos-Aires, cujo nome provem da exclamação do seu subordinado, o capitão Sancho del Campo, ao saltar em terra:—_Qué buenos aires son los de este suelo!_ A hostilidade dos naturaes e a falta de recursos pelo esquecimento e abandono da metropole, não permittiram que prevalecêsse a obra do governador hespanhol, e cinco annos após a fundação, a localidade era abandonada, para só reviver 39 annos depois, sob o genial impulso de Juan de Garay. O almirante portuguez continuou a sua derrota para o Sul, limitando-se a baptisar falsamente, com o nome de Rio de Janeiro, a bahia de Guanabara, na supposição de que fôsse a foz de um grande rio. Foram os francezes, vinte e seis annos depois da visita de Gonçalo Coelho, os primeiros europeus que se estabeleceram nas margens guanabarinas, em 1528, e só em 1531 appareceu Christovão Jacques, enviado por D. João III, a desalojal-os. Reincidiram os gaulezes, por varias vezes, até que definitivamente os expulsaram Mem de Sá e seu sobrinho Estacio de Sá, em 20 de Janeiro de 1567. Já então e desde 1565, estava fundada por Estacio de Sá, a cidade de S. Sebastião do Rio de Janeiro, entre os morros da Babilonia e da Urca, no porto de Martim Affonso. O fundador morreu dos ferimentos recebidos na batalha de 20 de Janeiro, e o seu tio Mem de Sá transferiu a recente povoação para o morro do Castello, mais defensavel dos inimigos. Ambas as cidades foram baptisadas em sangue e nasceram do espirito de aventura e da ambição do mando, causas do impulsionamento dos extraordinarios feitos que desenvolveram a civilisação e o progresso da humanidade, ao mesmo tempo que davam logar a contendas armadas e ao odio entre povos, sedentos de riquezas, de poderio e de vingança. No Rio de Janeiro, como em Buenos-Aires, a cruz estabeleceu-se á sombra da espada, e no terreno onde os capitães traçavam perimetros civicos com a ponta das espadas, fincavam os monges as bases da sua grandeza no dominio das consciencias e na exploração de bens materiaes e da ignorancia popular. Foi preciso que os abusos attingissem a meta da paciencia humana, para que se manifestassem as energias dos dois povos, retemperados no trabalho e no soffrimento, aquecidos por esse bello e fecundo sol da America, que só resplende para aureolar a Liberdade e cujo occaso é a imagem da tyrannia, mergulhada nas trevas da maldição universal. O 25 de Mayo de 1810 e o 12 de Outubro de 1822 fôram, em Buenos-Aires e no Rio de Janeiro, os primeiros passos dados na senda gloriosa dos brilhantes destinos de argentinos e brasileiros. Fundada 15 annos antes da sua rival, só 12 anos depois conseguiu a capital do Brasil emancipar-se do jugo da metropole, como só 79 annos depois de Buenos-Aires e da Republica Argentina, entraram Rio de Janeiro e o Brasil na orbita das capitaes e das nacionalidades que gravitam e expandem-se livremente, illuminadas por instituições democraticas, cuja base firma-se na liberdade, no trabalho, na instrucção, na justiça e no amôr. Eis o que explica o atraso da capital brasileira em relação á argentina, quanto ao desenvolvimento material e ao caracter de internacionalisação. Essa differença, porém, desapparecerá em poucos annos, a continuarem os patrioticos esforços desenvolvidos desde a proclamação da Republica dos Estados Unidos do Brasil. Em vinte annos a esta parte, Rio de Janeiro tem conquistado quasi tudo quanto lhe fizeram perder os 257 annos de sujeição colonial e os 67 annos de marasmo imperial. Por seu lado, Buenos-Aires não estacionará na actual expansão, continuando as duas grandiosas capitaes a dar ao mundo o glorioso espectaculo de uma rivalidade que, para honra de ambas e da civilisação universal, jámais ultrapassará os limites contidos na ambição maxima pela paz suprema. * * * * * =Assistencia Publica=—No Rio de Janeiro funccionam os seguintes hospitaes: —_Da Santa Casa de Misericordia._—É de administração particular, mas de funccionamento publico e o principal do Rio de Janeiro. Movimento annual de 12:000 enfermos, na média. A mesa da Santa Casa administra e sustenta mais 5 hospitaes e 5 asylos. Possúe 350 prédios, 1:506:000:000 réis em apolices municipaes e 600:000:000 réis em outros papeis. —_Nacional de Alienados._—Para os dois sexos, com a média annual de 1:200 enfermos. É federal. —_De S. Sebastião._—Para infecciosos. Tem 300 leitos. Estabelecimento modêlo, com grandes laboratorios. Federal. —_Militar_, ou _Central do Exercito._—Em 8 pavilhões com 25 enfermarias. É federal e está por concluir. —_Da Ilha das Cobras._—Para marinheiros. Federal. —_Dos Lazaros._—Estabelecimento modelar. Federal. —_De Barbonos._—Para o Corpo Policial. Federal. —_Da Beneficencia Portugueza._—Particular. —_Da Ordem Terceira da Penitencia._—Particular. —_Da Ordem Terceira do Carmo._—Particular. —_Da Ordem Terceira de S. Francisco de Paula._—Particular. —_De N. S. das Dôres._—Da Santa Casa. —_De N. S. do Soccorro._—Da Santa Casa. —_De N. S. da Saúde._—Da Santa Casa. —_De S. João Baptista._—Da Santa Casa. —_De Crianças._—Da Santa Casa. Ao todo 16, sendo apenas 7 geraes. Dos 9 restantes, 1 é da colonia portugueza, 3 pertencem a Ordens Terceiras e 5 á administração e propriedade da Santa Casa de Misericordia. Em Buenos-Aires, ha os seguintes hospitaes: —_De Las Mercedes._—Dois hospitaes, separados, um para cada sexo. O feminino é modelar. Existencia, média, de 2:000 mulheres e de 1:800 homens. —_De S. Roque._—Municipal, de 1.ª cathegoria. Media de 700 enfermos, entre homens, mulheres e crianças. —_Rawson._—Municipal. 500 enfermos, na média, entre homens, mulheres e crianças, mensalmente. —_De Clinicas y Maternidad._—Federal. Média, mensal, de 600 enfermos dos dois sexos e crianças. —_De Aislamento, ou Muñiz._—Para infecciosos. É o maior hospital de Buenos-Aires. 25 pavilhões, isolados, com 32 enfermarias. Para os 2 sexos e crianças. Municipal. —_Militar._—Federal. 268 camas. —_Rivadavia._—Só para mulheres. Federal. —_De Niños_ ou de _S. Luiz Gonzaga_.—Especial para crianças. 500, na média. Federal. —_Juan Fernandez._—Municipal. Média, mensal, de 200 doentes. —_Enrique Tornú._—Para tuberculosos. Municipal. —_Pirovano._—Regional e Municipal. —_Theodoro Alvarez._—Regional e Municipal. —_Cosme Argerich._—Regional e Municipal. —_Ophtalmologico._—Federal. —_Italiano._ } —_Allemão._ } —_Francez._ } —_Britannico._ } Das respectivas colonias. Total, 19. Mas não é só, nem principalmente em numero, que a hospitalisação, em Buenos-Aires, é superior á do Rio de Janeiro, e sim na situação topographica e na installação, em geral. Á excepção do Militar, dos de S. Sebastião e dos Lazaros, os hospitaes, na capital do Brasil, occupam péssimas situações e estão longe de corresponder, a começar pelo principal, ás actuaes exigencias da sciencia, e especialmente da hygiene. Em Buenos-Aires os estabelecimentos hospitalares são quintas de recreio. O systema é de pavilhões isolados por espaços ajardinados e arborisados, como no Rio de Janeiro começa a adoptar-se com a installação do Hospital Militar. Tendo-os minuciosamente descripto nos capitulos—Assistencia Publica—ao tratar do Rio de Janeiro e de Buenos-Aires, o auctor abstem-se de repetir agora pormenores de installação, synthetizando, todavia, que ainda n’este ponto a prioridade pertence aos hospitaes bonaerenses. Não obstante o grande numero de casas para abrigar e tratar enfermos, existentes em ambas as capitaes, nota-se ainda a falta de hospitaes, tal e tão rapido augmento é o da população das duas cidades. Accresce a circumstancia de, por falta de hospitalisação no interior dos dois paizes, serem muitos enfermos remettidos para as capitaes, pelas auctoridades das provincias e Estados. O serviço de assistencia na via publica é feito, no Rio de Janeiro, pela Directoria Geral de Hygiene e Assistencia, municipal, pela Policlinica de Botafogo, na respectiva area, e pela Associação dos Empregados no Commercio do Rio de Janeiro. Essas instituições dispõem de material rodante, aperfeiçoado, e de corpos clinicos para accudirem immediatamente e a qualquer hora do dia ou da noite, aos accidentes de rua. A municipalidade tem postos de soccôrro, estabelecidos em varios pontos da cidade. Em Buenos-Aires o mesmo serviço é realisado pela Administração Sanitaria e Assistencia Publica, municipal, que dispõem de uma Casa Central e de varias succursaes, uma por cada bairro, para immediatos soccorros publicos na rua, com excellente e rapido material e serviço de ambulancia, e para consultas gratuitas, fornecimento de medicamentos e visitas domiciliarias. Como no Rio de Janeiro, a Assistencia de Buenos-Aires, manda buscar, aos domicilios, os cadaveres de indigentes e sepulta-os gratuitamente. Em 1906, a Assistencia Publica, da capital argentina, fez recolher aos hospitaes 14:188 enfermos indigentes, deu 76:826 consultas gratuitas e fez 5:298 visitas a domicilios. No mesmo anno, os hospitaes tiveram um movimento geral de 43:782 doentes e a Assistencia acudiu a 27:541 accidentes de rua. A Assistencia Publica do Rio de Janeiro, em 1904, soccorreu 2:422 doentes em domicilio; deu consultas e fez curativos a 11:969 indigentes; acudiu a 36 accidentes na via publica; passou, gratuitamente, 78 attestados de obito e 1:641 guias para os hospitaes, e praticou 4:190 vaccinações e revaccinações. * * * * * =Beneficencia Particular=—A Santa Casa de Misericordia do Rio de Janeiro, que tambem consideramos sob o ponto de vista da assistencia publica, por causa do seu grande hospital geral e dos hospitaes regionaes por ella mantidos e administrados, tambem sustenta o _Recolhimento das Orfãs e das Desvalidas de Santa Thereza_; o _Asylo da Misericordia_; o _Asylo de S. Cornelio_ e o _Asylo Provisorio do Hospital Geral_. O _Asylo dos Invalidos da Patria_, é nacional, e o _Asylo de S. Francisco d’Assis_, de administração municipal. O _Asylo Gonçalves de Araujo_, é administrado pela Irmandade de N. S. da Candelaria. O _Dispensario Azevedo Lima_, para tuberculosos, é uma das mais uteis instituições da beneficencia particular, fluminense, se bem que subsidiado pelo Governo. Os asylos da _Caridade_, _do Bom Pastor_ e de _Santo Antonio_, são mantidos pela Ordem da Immaculada Conceição. A _Policlinica Geral do Rio de Janeiro_, é tambem uma instituição de beneficencia particular, assim como a sua derivada, a _Policlinica de Botafogo_. A _Maternidade das Laranjeiras_, se bem que subsidiada pelo governo é administrada particularmente. O Instituto de Protecção e Assistencia á Infancia, sustenta um _Dispensario_, para crianças pobres. É subvencionado pela municipalidade e pelo governo federal. O _Asylo da Velhice Desamparada_, é uma grandiosa instituição particular. A Missão Central, gremio protestante, mantem um _Dispensario Central_. A Sociedade Amante da Instrucção sustenta um _Asylo de Orfãs_. A Associação de S. Vicente de Paula, de senhoras, e a Associação de Senhoras da Egreja Evangelica Brasileira, soccorrem os seus associados, assim como 185 collectividades beneficentes, que funccionam na capital do Brasil. Em Buenos-Aires as associações beneficentes são divididas em duas categorias, as que prestam auxilio a qualquer habitante e as que só o fazem aos seus associados. O Patronato da Infancia, protege crianças pobres, enfermas e abandonadas e possúe _dois asylos de expostos_, cada um para 200 crianças, em edificios proprios; uma _colonia agricola_: _consultorios gratuitos_, para crianças e custeia e dirige a _Revista de Hygiene Infantil_, com a tiragem de 20:000 exemplares, que distribúe gratuitamente, para instrucção das mães e das amas. A Sociedade de S. Francisco de Paula sustenta _4 asylos maternaes_, para abrigar crianças pobres de ambos os sexos, de 3 a 10 annos, desde as 7 da manhã ás 4 da tarde, fornecendo-lhes almoço e lições de primeiras lettras. São especialmente destinados a filhos de operarios. Estas instituições não existem no Rio de Janeiro, que em compensação possúe o grandioso _Instituto Benjamim Constant_, para cégos, o que faz falta a Buenos-Aires. Esta capital encerra dois institutos de surdos-mudos, um para cada sexo, e a capital brasileira só tem um. Ha 6 _orfanatos_, em Buenos-Aires, mantidos por outras tantas associações beneficentes. A Liga Argentina Contra a Tuberculose, tem o triplice caracter nacional, particular e municipal. Com o auxilio do governo e da municipalidade fundou os dispensarios _Enrique Tornú_ (que nada tem com o sanatorio-hospital de egual nome) e _Rawson_, para distribuição diaria, aos tuberculosos indigentes, de 750 grammas de carne, meio kilo de pão e 1 litro de leite, além de roupas de cama e de corpo, e de escarradores. A Sociedade de Beneficencia da Capital depende hoje do governo mas é composta de senhoras da alta sociedade bonaerense. Dirige nove estabelecimentos de caridade. Em ambas as capitaes ha institutos Pasteur e Vaccinico—Municipal e, frequentemente, grandiosas festas de caridade, por motivos de catastrophes publicas e para auxilio a associações beneficentes. No Rio de Janeiro ha mais a _Casa de S. José_, municipal, para rapazes abandonados; a _Escóla Quinze de Novembro_, federal e subordinada á chefia de policia, para menores vagabundos; o _Instituto Profissional_, municipal, para os dois sexos; a _Assistencia Judiciaria_, destinada a proporcionar defesa e amparo aos criminosos pobres, e a _Assistencia Policial_, para conducção de enfermos dos domicilios, ou caídos na via publica. A Irmandade da Misericordia mantem a _Roda dos Engeitados_ e um serviço de consultas gratuitas e fornecimento de medicamentos. Para concluir, citaremos ainda as duas recentissimas instituições de philantropia fluminense—_Soccorros Immediatos ás Victimas de Accidentes no Mar_ e o _Deposito de Menores_. * * * * * =Theatros=—No Rio de Janeiro:—Municipal, S. Pedro de Alcantara, Lyrico, Sant’Anna, Recreio Dramatico, Apollo, S. José e Lucinda. Em Buenos-Aires—Colon, Opera, Polytheama, Odeon, Nacional, Marconi, San Martin, Mayo, Moderno, Comedia, Apollo, Scala, Colyseu Argentino, Royale Theatre, Victoria, Argentino e Rivadavia. As outras casas de espectaculo, como circos, frontões, cinematographos, cafés cantantes, etc., são muito mais numerosas em Buenos-Aires, do que no Rio de Janeiro, o que explica-se pelo clima e pela differença de população. O Theatro Municipal, da capital brasileira, não póde competir com o theatro Colon, um dos primeiros do mundo em dimensões, architectura e decorações, não obstante aquelle ser tambem um monumento. Nenhum dos outros theatros do Rio de Janeiro póde comparar-se aos theatros bonaerenses de segunda ordem. * * * * * =Instrucção Publica=—Na Republica Argentina, a instrucção publica é obrigatoria e gratuita. No caso de indigencia, o Estado não só dispensa o alumno do pagamento do peso (450 réis) annual de matricula, mas tambem fornece-lhe livros e o mais que fôr indispensavel á instrucção. A instrucção primaria é dirigida pelo Conselho Nacional de Educação, que tem por auxiliares um corpo de inspectores technicos, e os Conselhos Escolares de districto, formados por paes de familia, encarregados da inspecção administrativa das escólas. O Conselho Nacional de Educação, depende do Ministerio da Instrucção Publica e funcciona na capital. A instrucção primaria é, em Buenos-Aires, dada officialmente em escólas superiores de meninos, superiores de meninas, elementares de meninos, elementares de meninas, infantis, nocturnas e militares. O seu numero era, em 1908, respectivamente de 19, 27, 38, 59, 55, 40 e 80. Ao todo, 246 escólas primarias officiaes. Na mesma epocha, a matricula geral era de 83:171 alumnos, com a frequencia média de 68:183. A instrucção secundaria é fornecida nos seguintes estabelecimentos officiaes: Collegio Nacional Central 692 alumnos » » de Oeste 388 » » » do Sul 337 » » » do Norte 385 » » » de Noroeste 287 » Instituto Livre de Ensino Secundario 186 » ----- 2:275 » A instrucção normal, commercial e industrial, consta das seguintes instituições officiaes: Instituto do Professorado Secundario 243 alumnos Escóla Normal de Professores 139 » » de Professoras, n.º 1 440 alumnas » » » » 2 565 » Escóla Nacional de Commercio para varões (Central) 714 alumnos Escóla Nacional de Commercio para varões (Sul) 292 » Escóla Nacional de Commercio, para mulheres 276 alumnas Escóla Industrial da Nação 36 alumnos » Profissional de Artes e Officios, n.º 1 (mulheres) 316 alumnas Escóla Profissional de Artes e Officios, n.º 2 (mulheres) 565 » Instituto Nacional de Surdas-Mudas 94 » Instituto Nacional de Surdos-Mudos 92 alumnos Instituto Nacional de Meninas Cegas 22 alumnas ----- 3:794 » A instrucção superior está a cargo da Universidade, com as seguintes Faculdades: Mathematica 490 alumnos Medicina 2:467 » Direito 1:038 » Philosophia e Lettras 77 » ----- 4:072 » Todos estes algarismos de matricula são officiaes e correspondentes ao anno de 1908. As escólas para a instrucção primaria e official estão divididas em 14 districtos e, segundo as ultimas estatisticas, eram regidas por 298 professoras ordinarias e 67 especiaes as do sexo feminino, e por 1:579 professores ordinarios e 318 especiaes as do sexo masculino. Total, 2:262 professores de ambos os sexos, para 246 escólas e 83:000 alumnos. Ha bellos edificios de escólas primarias, grandiosos e artisticos, taes como as escólas Presidente Roca, Sarmiento, Rodriguez Peña, Pellegrini, Rivadavia, Benjamin Zorilla, Saavedra, Irigoyen, que teem cursos diurnos e nocturnos, distribuição gratuita de leite; museus, bibliothecas, jardins, gymnastica, officinas, etc. * * * * * No Rio de Janeiro ha tres categorias de escólas primarias, officiaes—primarias, modêlo e elementares, todas municipaes, porque é o municipio que subsidia e dirige a instrucção publica. Ha 11 districtos escolares, urbanos e 4 suburbanos. Escólas elementares 79, alumnos 5:500 » primarias 193, » 26:891 » modêlo 11, » 4:267 --- ------ 283 36:658 Esta matricula é de 31 de Dezembro de 1907. O total de professores diplomados pelo municipio era, em 1907, de 952, para todas as escólas. O Conselho Superior de Instrucção Publica, municipal, é quem superintende n’estas escólas, bem como nos seguintes institutos: Escóla Normal 686 alumnas Instituto Profissional, masculino 300 alumnos » » feminino 120 alumnas ----- 1:106 O Governo Federal sustenta, no Rio de Janeiro, os seguintes estabelecimentos de instrucção secundaria, technica e superior: Escóla Nacional de Bellas Artes, Faculdade de Medicina, Escóla Polytechnica, Gymnasio Nacional (internato), Gymnasio Nacional (externato), Instituto Nacional de Musica, Escóla Militar, Collegio Militar, Escóla Naval, Instituto Benjamin Constant, Instituto de Surdos-Mudos, e Escóla Preparatoria e de Tactica. Dos edificios escolares-municipaes do Rio, os melhores são as escólas Tiradentes, Prudente de Moraes e Rodrigues Alves, mas não possúem installações comparaveis ás suas congéneres da capital argentina. Temos, portanto, em Buenos-Aires, 246 escolas primarias, officiaes, com a matricula de 83:171 alumnos, e regidas por 2:262 professores; e 23 estabelecimentos de ensino official secundario, normal, commercial, industrial, profissional e superior, com a totalidade de 10:141 alumnos matriculados. No Rio de Janeiro, ha 283 escólas primarias e elementares com a frequência de 36:658 alumnos e 15 estabelecimentos, 3 municipaes e 12 federaes, de ensino secundario, normal, profissional e superior, de onde se conclúe que havendo, na capital argentina, menos 37 escólas primarias do que na metropole brasileira, aquellas são frequentadas por mais 47:513 alumnos, o que dá a média de 338 para cada escóla contra 126 alumnos para cada escóla do Rio de Janeiro. Os estabelecimentos de ensino secundario e superior são mais numerosos e importantes em Buenos-Aires, que possúe uma universidade completa, com installações independentes e modelares, havendo no Rio de Janeiro apenas uma Faculdade de Medicina, pessimamente installada. De 811:443 habitantes do Rio de Janeiro, em 20 de Setembro de 1906, 361:501 eram analphabetos, dos quaes 185:873 homens e 175:628 mulheres. Dos 950:891 habitantes de Buenos-Aires, em 18 de Setembro de 1904, apenas 157:299 eram analphabetos, dos quaes 70:825 homens e 86:474 mulheres. * * * * * =Salubridade e Hygiene=—A cidade do Rio de Janeiro está hoje abundantemente fornecida de agua, para o que possúe 26 reservatorios, ou depositos. Ha o fornecimento regular de 210 milhões de litros por cada 24 horas. O abastecimento de aguas está a cargo da Inspectoria Geral de Obras Publicas, subordinada ao Ministerio da Industria e Viação. Buenos-Aires é abastecida por tres systemas, independentes, de aguas correntes, captadas no rio da Prata, e conduzidas por cinco cannos de ferro ao grande e monumental deposito distribuidor, o palacio das Aguas Correntes, que encerra 12 immensos tanques de ferro, de onde partem os cannos geraes e distribuidores de agua por toda a cidade. Ha 105:056 metros de canalisação geral, de ferro fundido, e 880:929 metros de canalisação de distribuição. O serviço de limpeza ao sub-sólo, isto é, de captação e conducção, para o mar, de detrictos e aguas servidas é feito por um systema complicado e interessante de cloacas domiciliarias, internas e externas, collectoras, interceptoras e cloaca maxima. A area de serviço de cloacas abrange a superficie de 2:557 hectares. A extensão da canalisação total, relacionada com a rêde geral de cloacas, é de 600 kilometros. O serviço de limpeza publica, á superficie, municipal, como o anterior, está a cargo de um administrador geral, que tem sob as suas ordens 1:700 individuos. O orçamento de limpeza é, annualmente, de cêrca de 3 milhões de pesos. O processo divide-se em tres—rega, varredura e lavagem das ruas—apanha de lixo e queima de immundicies e de animaes. Ha 535 vehiculos e 2:000 cavallos empregados n’este serviço. A Inspecção Technica de Hygiene, municipal, e o Departamento Nacional de Hygiene, federal, superintendem na salubridade e hygiene de Buenos-Aires. A 2.ª trata de toda a Republica, a 1.ª só da capital e depende da Administração Sanitaria e Assistencia Publica, tambem municipal. Investiga tudo quanto seja prejudicial á saude publica, inspecciona o estado sanitario do municipio, a propagação das molestias, vigia o cumprimento das posturas municipaes e os estabelecimentos prejudiciaes á saúde publica. O serviço divide-se em 3 secções—a _Inspecção_, que comprehende a hygiene pessoal e veterinaria—a _Desinfecção_, praticada em domicilio ou nas estações officiaes, e a _Prophylaxia_, ou vaccinação. Ha duas grandes estufas geraes para desinfecção. Logo que ha denuncia de um fóco de infecção, o inspector sanitario da secção respectiva vae, pessoalmente, verifical-o, fazendo remover os infectados para a Casa de Isolamento, e manda proceder á desinfecção do domicilio, segundo a gravidade do caso. Os objectos portateis e pequenos são levados ás estufas geraes e o mobiliario é desinfectado em casa. Ha um corpo de inspectores para impedir a venda de carnes deterioradas, e agentes fiscaes encarregados de denunciar e comprovar a prostituição clandestina e a existencia de casas onde se prostituem mulheres não inscriptas. A vaccina é obrigatoria no primeiro anno do nascimento, ou installação, e de 10 em 10 annos. Os vaccinadores são medicos e praticantes, sob a direcção de um chefe. O Registro Civil remette uma lista dos recem-nascidos á Casa Central que intima os parentes. Ha um corpo de medicos para as visitas bi-semanaes aos prostibulos. O Laboratorio Bacteriologico, examinando chimicamente os productos organicos, remettidos dos consultorios medicos, seccionaes, e a qualidade das provisões destinadas aos hospitaes, presta relevantes serviços á salubridade e hygiene de Buenos-Aires. Em 1906, dos 1:084:113 habitantes de Buenos-Aires, falleceram 17:916, na proporção de 16,52 por 1:000. D’esses, 1:662 nasceram mortos. 10:462 eram homens e 7:454 mulheres. No mesmo anno nasceram 36:009 pessôas, sendo 18:362 varões e 17:647 femeas. Nascimentos legitimos, 31:062, illegitimos, 4:947. No Rio de Janeiro, no mesmo anno, morreram 13:957 dos 811:443 habitantes, ou sejam 17 por 1:000. A mortalidade infantil foi na proporção de 150 por mil adultos. A assistencia publica, no Rio de janeiro, está a cargo da Directoria Geral de Hygiene, municipal, que tem postos medicos installados nas agencias da Prefeitura. O serviço é feito, pouco mais ou menos, como em Buenos-Aires, se bem que mais embaraçado por attrictos entre as auctoridades federaes e municipaes. Devido a essa circumstancia e ao facto da hospitalisação, na capital argentina, ser mais aperfeiçoada e completa do que no Rio de Janeiro; á amenidade do clima, ao abundante material e numeroso pessoal para a limpeza publica e ao aperfeiçoado systema de esgotos e de abastecimento d’aguas, a proporção da mortalidade, em relação á população, é menor em Buenos-Aires do que no Rio de Janeiro, e as ruas da primeira capital são, geralmente, mais limpas do que as da segunda, não obstante o assombroso movimento d’aquellas. * * * * * =Commercio e Industria=—Pelo recenseamento official, de 1906, havia, no Rio de Janeiro, 22:000 estabelecimentos commerciaes, em todos os generos, e 7:000 vendedores ambulantes. O maior numero de lojas era de mercearia. As fabricas, de todas as industrias, eram 250, avultando, pela quantidade, as de calçado. No mesmo anno, o commercio exterior do Brasil ascendeu á cifra de 400 mil contos, tres quartas partes pertencendo á actividade dos portos do Rio de Janeiro e de Santos. O movimento annual do porto do Rio é, na média, de 600 embarcações á véla, e de 2:400 a vapor, entradas e saídas, representando 3 milhões de toneladas. A média da renda mensal da Alfandega do Rio de Janeiro, é de seis mil e quinhentos contos de réis e o de volumes transitados pelos seus armazens é, annualmente, de tres milhões e quinhentos mil. A estatistica official de 1904, a ultima existente, dá 17:985 estabelecimentos commerciaes á cidade de Buenos-Aires, sendo 9:358 de generos alimenticios. O valor d’este commercio era representado por 520:706:300 pesos. O resumo das transacções effectuadas na Bolsa de Commercio da capital argentina, em 1907, foi de 90:712:47 pesos, a dinheiro, e de 5:247:513 pesos, a praso. O movimento de entrada e saída de embarcações, no porto de Buenos-Aires, em 1906, foi de 29:178, com 13:335:737 toneladas. A Alfandega rendeu, no mesmo periodo, 54:266:699 pesos, ou sejam cêrca de 80 mil contos em moeda brasileira, notando-se que as mercadorias exportadas, apenas pagam, na Republica Argentina, o imposto do sêllo. Só este imposto rendeu, n’aquelle anuo, para as mercadorias exportadas pelo porto de Buenos-Aires, 140:470 pesos. N’esta capital e seus suburbios trabalhavam, em 1904, 8:877 estabelecimentos fabris, que produziram, n’esse anno, 183 e meio milhões de pesos, em mercadorias, impulsionados pela força de 19:858 cavallos e com o capital de 60 milhões de pesos. Essas fabricas empregavam 68:512 operarios de ambos os sexos. Conclúe-se que não obstante haver menor numero de casas de negocio em Buenos-Aires, o commercio é aqui mais importante do que no Rio de Janeiro, sendo maior o movimento do porto e o rendimento da Alfandega. Quanto á industria, é enorme a superioridade da capital argentina. * * * * * =Intellectualidade=—Sob este ponto de vista nós reivindicamos a prioridade para os brasileiros, em geral, e especialmente para os fluminenses. Não que os argentinos, e d’elles os bonaerenses, não sejam, em grande numero, illustrados, intelligentes e talentosos; porém a sua actividade intellectual perde-se, um pouco, no assombroso movimento da sua grandiosa capital. Aqui a vida intensa de trabalho e de prazer prejudica as manifestações subtis do espirito como as sublimes e empolgantes producções do cerebro. As condições climatericas tambem influem, e consideravelmente, na expansão intellectual dos cariocas, mais intensiva e brilhante, se bem que, em geral, o espirito dos fluminenses não seja mais cultivado do que o dos seus visinhos. Não está nas proporções d’esta resenha synthetica balancear o movimento litterario e scientifico de uma e outra capital, nem encontramos estatisticas publicadas a esse respeito; mas não é difficil, acompanhando a vitalidade intellectual das duas metropoles, e attendendo á differença de população, verificar que no Rio de Janeiro produz-se mais e melhor em prosa e verso. E visto que da imprensa nos occupamos em capítulos especiaes, a ella particularmente nos referimos aqui. Nenhum dos jornaes do Rio de Janeiro possúe installações comparaveis ás de _La Prensa_, de Buenos-Aires; mas a verdade é que, sob o ponto de vista intellectual, que é o que nos occupa, o _Jornal do Commercio_, _O Paiz_, o _Jornal do Brasil_, a _Gazeta de Noticias_, e ainda outros orgãos da imprensa fluminense, que estão magnificamente installados em palacios proprios são, pelo menos, tão bem redigidos como os seus numerosos e brilhantes collegas do jornalismo bonaerense. Não repetiremos a citação de nomes mas curvamo-nos, reverentes, perante a pleiade de homens de lettras, que no Rio de Janeiro sublima a instituição da imprensa e a intellectualidade brasileira aos páramos onde gravitam as mais refulgentes constellações do pensamento humano. * * * * * =Municipalismo=—A instituição municipal foi transplantada, das metropoles, para as colonias sul-americanas. A principio, o _Ajuntamiento_, ou _Cabildo_, e o Senado da Camara, tivéram grande importancia e até decidida preponderancia politica e administrativa, como se viu em Buenos-Aires, com a revolução de Mayo, que occasionou a independencia nacional e em varios periodos da historia fluminense. Por vezes, porém, o poder central, em um e outro paiz, absorveu as attribuições dos municipios, indo até ao ponto de supprimir, por completo, as administrações municipaes. Actualmente, em Buenos-Aires, a municipalidade é, como no Rio de Janeiro, dividida em poder deliberativo e executivo, mas tanto a collectividade que representa o primeiro, e que é composta de 22 cidadãos, com o titulo de Commissão Deliberante, como o Intendente Municipal, que tem a seu cargo o Departamento Executivo, são de nomeação do Presidente da Republica. Não existe, portanto, em Buenos-Aires, o municipalismo electivo, instituição popular que é uma garantia das liberdades publicas e dos direitos individuaes. No Rio de janeiro, ha o Conselho Deliberativo, que é o poder legislativo municipal, de eleição popular e composto de dez membros. O poder executivo municipal é exercido pelo Prefeito, nomeado por decreto do Presidente da Republica. O Prefeito governa a cidade de accôrdo com as leis votadas pelo Conselho Deliberativo, sobre o qual o poder central não exerce tutela alguma. Quanto á divisão dos serviços administrativos, é feita, no Rio de Janeiro, por 25 districtos, representados por agentes e pessoal subalterno, e em Buenos-Aires por 23 repartições do Departamento Executivo e por 3 secções municipaes de suburbios. O orçamento municipal bonaerense, para 1908, foi de 27:445:405 pesos, receita, e 23:669:143 pesos, despesa. A receita da municipalidade do Rio de janeiro, foi orçada no mesmo anno em 26:427:215$000. Quanto á despesa, nem é conhecida ainda a dos ultimos annos, em consequencia das obras extraordinarias com a transformação da cidade, colossal tarefa que é o maior titulo de gloria da municipalidade fluminense e do ex-prefeito Pereira Passos. * * * * * =Viação Urbana=—O Districto Federal é servido pelas seguintes linhas ferreas, que o atravessam em direcção aos Estados do Rio de Janeiro, S. Paulo e Minas Geraes: _E. F. Central do Brasil_, a principal de toda a Republica, com um movimento de passageiros, só no 1.º trimestre de 1908 e na area suburbana da capital, de 5:011:359. _Leopoldina Railway Company_, que parte da estação suburbana de S. Francisco Xavier, atravessa a zona federal de Irajá, e vae a Petropolis. _E. F. do Rio do Ouro_, que partindo da Ponta do Cajú termina no rio S. Pedro, serra do Tinguá, depois de um percurso de 60 kilometros. Dentro do perimetro da cidade do Rio de Janeiro, são as seguintes as empresas de viação: _Companhia Ferro Carril do Jardim Botanico_, a mais poderosa empresa de viação urbana fluminense, 79:000 metros de linhas, bitola de 1ᵐ,44, transporte annual, na média, de 22 milhões de passageiros; tracção electrica. _Companhia Ferro Carril Villa Izabel._—Percurso total de 49:000 metros, bitola de 1ᵐ,44, tracção electrica. _Companhia Ferro Carril de S. Christovão._—65:435 metros de rede geral, bitola de 1ᵐ,35, tracção animal. _Companhia Carris Urbanos._—70 kilometros de extensão geral de linhas, bitola de 0ᵐ,80, tracção animal, transporte annual, na média, de 34 milhões de passageiros. _Companhia Ferro Carril Carioca._—Tracção electrica, extensão total de 12 kilometros, transporte médio, annual, de 1:200:000 passageiros. _Estrada de Ferro do Corcovado._—3:790 metros de extensão e tracção a vapor. Ha tambem as linhas maritimas da bahia, em numero de 4, que communicam a cidade com a visinha Nictheroy, Mauá-Petropolis, Maruhy-Friburgo e Piedade-Theresopolis. As dez companhias de _tramways_ electricos de Buenos-Aires (ha tambem duas, como no Rio de Janeiro, que ainda empregam a tracção animal) transportaram, em 1907, 200:700:247 passageiros, cuja importancia de passagens foi de 20:436:090 pesos. Estas empresas teem o percurso total de 358 kilometros, no perimetro civico da capital argentina. São cinco as linhas ferreas que communicam Buenos-Aires com o interior da Republica, e que só para a area suburbana da capital, transportaram, em 1907, 15:135:230 passageiros e 3:726:714 toneladas de mercadorias. Resumindo: Rio de Janeiro—5 companhias de viação urbana, a tracção electrica e animal, com o percurso de 276 kilometros e o transporte annual, médio, de 92:000:000 de passageiros. Buenos-Aires—10 companhias de viação urbana, a tracção electrica e animal, com o percurso total de 358 kilometros e o transporte annual, médio, de 200:700:247 passageiros. * * * * * =Movimento civico=—Sob este ponto de vista Rio de Janeiro não póde competir com Buenos-Aires, não só pela differença de população, mas tambem, e principalmente, pela importancia commercial e industrial da metropole argentina, pelo seu feitio internacional e caracteristicamente europeu, e emfim, pela intensa vida que agita, povôa e anima quasi todas as arterias publicas da capital platense e que no Rio de Janeiro, só se nota nos bairros commerciaes. * * * * * =Movimento associativo=—Pelo recenseamento official de 1904, era o seguinte o movimento associativo de Buenos-Aires: Caracter da Associação Numero Socios Recreativas 52 5:664 Beneficentes 23 19:485 De Soccorros Mutuos 97 66:693 Litterarias e scientificas 25 5:622 Socialistas 28 27:600 Maçonicas 3 209 De Sport 15 18:382 Circulos de operarios 6 4:414 Protecção aos animaes 1 500 Politicas 2 719 Protecção á infancia 5 2:749 Diversas 36 15:941 --- ------- 293 168:008 No Rio de Janeiro, funccionavam na mesma epocha 181 associações beneficentes, contra 120 em Buenos-Aires, em um total de 300 collectividades sociaes, contra 293 bonaerenses. A superioridade da capital fluminense ainda é maior sob o ponto de vista associativo, considerando-se a differença de população, 900:000 habitantes para 1:200:000. * * * * * =Alimentação Publica=—No matadouro de Santa Cruz, que abastece a capital do Brasil, houve o seguinte movimento em Abril, Maio e Junho de 1908: Bois abatidos 29:441 » regeitados 219 » » em pé 24 Vitellas abatidas 634 » regeitadas 1½ Carneiros abatidos 4:300 » regeitados 20 » » em pé 11 Suinos abatidos 5:106 » regeitados 183¼ » » em pé 2 ------- 39:941¾ Foram mais receitados 1:292 figados, 103 linguas e 2:522 fressuras. Tomando-se por base esta estatistica official, verifica-se que o consumo animal de animaes é, no Rio de Janeiro, de cêrca de 160:000. No matadouro de Liniers, em Buenos-Aires, a média annual da matança é de 382:000 bois, 108:000 vitellos, 585:000 carneiros, e 55:000 porcos, numeros de assombrosa prioridade, mesmo considerando-se os 300:000 habitantes que a capital argentina tem a maior que a brasileira. As condições climatericas e o bem estar da população contribúem, consideravelmente, para explicar, até certo ponto, a enorme diferença na alimentação publica das duas capitães, differença que se nota, proporcionalmente, em todos os generos de consumo. Importa-nos, todavia, saber, não só a quantidade, mas tambem a qualidade dos generos consumidos em uma e outra capital, isto é, a fórma porque é feita a inspecção e fiscalisação dos mesmos pelas auctoridades sanitarias. Tanto o matadouro de Santa Cruz, como o de Liniers, são municipaes, dependem da Directoria Geral de Hygiene e Assistencia Publica, sendo em ambos o serviço de inspecção feito por veterenarios, que examinam os animaes antes do sacrificio, condemnando os infeccionados, e procedendo egualmente para com a carne dos animaes mortos, que verificam deteriorada. Ao passo que no gabinete de Microscopia, annexo ao matadouro de Santa Cruz, apenas foram feitos, em 1908, 800 exames de fiscalisação, o Laboratório Municipal de Buenos-Aires, já em 1906 effectuou 65:774 exames, só em generos destinados á alimentação da cidade. * * * * * =Natureza=—É este o ponto final do parallelo e a apotheose da capital do Brasil. Possivel e até provavel é que o auctor tenha errado na apreciação e conclusão de varios dos assumptos desenvolvidos no livro, e em especial n’este capitulo; a sua consciencia, porém, tranquillisa-o quanto a ter agido com imparcialidade e justiça. Mas se teve de capitular perante a evidencia de provas que affirmam a prioridade da metropole argentina, o seu orgulho nativo é compensado pela natural sublimidade do paraiso fluminense, que paira acima de todas as capitães do universo, como entre as nuvens gravita o condôr dos Andes, a disputar aos mundos da immensidade um atomo d’esse espaço, infinito como a ideia de Deus. E assim como aquelle gigante alado fende o ether e mantem-se na atmosphera, impulsionado e equilibrado pelas forças que haure da excelsa natureza, o Brasil e a sua esplendorosa capital ascendem á brilhante orbita das constellações internacionaes, ao halito pujante do trabalho e do patriotismo, aureolados pela gloria irradiante da paz, da civilisação e do amôr. Concluindo: Situação geographica e topographica Rio de Janeiro Clima Buenos-Aires Aspecto geral Buenos-Aires Monumentos religiosos Rio de Janeiro Monumentos profanos Buenos-Aires População Buenos-Aires Area civica Rio de Janeiro Museus Rio de Janeiro Bibliothecas Rio de Janeiro Logradouros publicos Buenos-Aires Arte Rio de Janeiro Esthetica Buenos-Aires Historia Rio de Janeiro Assistencia publica Buenos-Aires Beneficencia particular Rio de Janeiro Theatros Buenos-Aires Instrucção publica Buenos-Aires Salubridade e hygiene Buenos-Aires Commercio e Industria Buenos-Aires Intellectualidade Rio de Janeiro Municipalismo Rio de Janeiro Viação Urbana Buenos-Aires Movimento civico Buenos-Aires Movimento associativo Rio de Janeiro Alimentação publica Buenos-Aires Natureza Rio de Janeiro -------------- ------------ 12 15 INDICE GERAL Pag. Razão de Ser 5 Rio de Janeiro Domingo de Ramos 13 Situação e Aspecto Geral 19 Historia 27 Phases Fluminenses 39 Monumentos 45 Egrejas 61 Museus 69 Bibliothecas 77 Jardins e Parques 81 Theatros 91 Cemiterios 95 Curiosidades 99 Estabelecimentos Scientificos 117 Da Carioca ao Somaré 125 Assistencia Publica 129 Beneficencia Particular 145 Batalha de Confetti 193 Instrucção Publica 197 Corcovado 205 Governo Municipal 209 Copacabana, Leme e Ipanema 213 Salubridade 217 Viação Urbana 223 Imprensa 229 Commercio o Industria 233 Porto do Rio de Janeiro 237 Recenseamento 241 Segurança Publica 249 Nictheroy 257 Petropolis 259 Apreciação Geral 263 Montevideu Situação e Aspecto Geral 273 Historia 279 Assistencia Publica 283 Egrejas 291 Beneficencia Particular 295 Edificios Publicos 297 Universidade 301 Museus 305 Bibliothecas 309 Commercio 311 Parques 315 Theatros 319 Curiosidades 321 Apreciação 327 Buenos-Aires Situação e Aspecto Geral 335 Historia 343 Monumentos 357 Assistencia Publica 371 Beneficencia Particular 397 Salubridade e Hygiene 403 Instrucção Publica 419 Museus 441 Bibliothecas 447 Arte 451 Egrejas 453 Commercio e Industria 457 Jardins e Parques 475 Theatros 481 Curiosidades 487 Alimentação Publica 495 Municipalidade 499 Imprensa 521 Viação Urbana 527 Movimento Associativo 531 Parallelo 535 Obras do mesmo auctor _=Preceitos e Devaneios=_—1 vol. broch. 400 réis _=Chronica Planetaria=_ (Viagem á volta do mundo) Itinerario:—Portugal, Hespanha, França, Italia, Austria, Estados Balkanicos, Turquia, Grecia, Egypto, India, China, Japão, Canadá, Estados Unidos, Brasil, Ilha da Madeira e Lisbôa. Descripção completa dos Logares Santos. 1 volume brochado 600 réis. 1 volume encadernado 800 » _=Aspectos Europeus=_—Descripção das seguintes cidades: Madrid, Toledo, Saragoça, San Sebastian, Biarritz, Bordeaux, Paris, Lyon, Turim, Bologna, Florença, Roma, Napoles, Pisa, Milão, Lucerne, Berne, Genebra, Zurich, Constança, Munich, Dresde, Berlim, Hamburgo, Bremen, Salzburgo, Vienna, Varsovia, Moscow, S. Petersburgo, Stockolmo, Upsal, Gefle, Ostersund, Drontheim, Christiania, Goteborg, Copenhague, Odense, Amsterdam, Haya, Rotterdam, Anvers, Bruxellas, Gand, Liége e Namur. 1 volume brochado, 600 réis. 1 volume encadernado 800 » _=Cidades de Portugal=_—Descripção minuciosa das 29 cidades do continente de Portugal. Obra illustrada com 28 brazões de armas. 1 volume brochado, 500 réis. 1 volume encadernado 700 » _=Suprema Dôr=_—Um volume brochado, 400 réis. 1 volume encadernado 500 » *** END OF THE PROJECT GUTENBERG EBOOK TRES CAPITAES *** Updated editions will replace the previous one—the old editions will be renamed. Creating the works from print editions not protected by U.S. copyright law means that no one owns a United States copyright in these works, so the Foundation (and you!) can copy and distribute it in the United States without permission and without paying copyright royalties. Special rules, set forth in the General Terms of Use part of this license, apply to copying and distributing Project Gutenberg™ electronic works to protect the PROJECT GUTENBERG™ concept and trademark. Project Gutenberg is a registered trademark, and may not be used if you charge for an eBook, except by following the terms of the trademark license, including paying royalties for use of the Project Gutenberg trademark. If you do not charge anything for copies of this eBook, complying with the trademark license is very easy. You may use this eBook for nearly any purpose such as creation of derivative works, reports, performances and research. Project Gutenberg eBooks may be modified and printed and given away—you may do practically ANYTHING in the United States with eBooks not protected by U.S. copyright law. Redistribution is subject to the trademark license, especially commercial redistribution. START: FULL LICENSE THE FULL PROJECT GUTENBERG LICENSE PLEASE READ THIS BEFORE YOU DISTRIBUTE OR USE THIS WORK To protect the Project Gutenberg™ mission of promoting the free distribution of electronic works, by using or distributing this work (or any other work associated in any way with the phrase “Project Gutenberg”), you agree to comply with all the terms of the Full Project Gutenberg™ License available with this file or online at www.gutenberg.org/license. Section 1. General Terms of Use and Redistributing Project Gutenberg™ electronic works 1.A. By reading or using any part of this Project Gutenberg™ electronic work, you indicate that you have read, understand, agree to and accept all the terms of this license and intellectual property (trademark/copyright) agreement. If you do not agree to abide by all the terms of this agreement, you must cease using and return or destroy all copies of Project Gutenberg™ electronic works in your possession. If you paid a fee for obtaining a copy of or access to a Project Gutenberg™ electronic work and you do not agree to be bound by the terms of this agreement, you may obtain a refund from the person or entity to whom you paid the fee as set forth in paragraph 1.E.8. 1.B. “Project Gutenberg” is a registered trademark. It may only be used on or associated in any way with an electronic work by people who agree to be bound by the terms of this agreement. There are a few things that you can do with most Project Gutenberg™ electronic works even without complying with the full terms of this agreement. See paragraph 1.C below. There are a lot of things you can do with Project Gutenberg™ electronic works if you follow the terms of this agreement and help preserve free future access to Project Gutenberg™ electronic works. See paragraph 1.E below. 1.C. The Project Gutenberg Literary Archive Foundation (“the Foundation” or PGLAF), owns a compilation copyright in the collection of Project Gutenberg™ electronic works. Nearly all the individual works in the collection are in the public domain in the United States. If an individual work is unprotected by copyright law in the United States and you are located in the United States, we do not claim a right to prevent you from copying, distributing, performing, displaying or creating derivative works based on the work as long as all references to Project Gutenberg are removed. Of course, we hope that you will support the Project Gutenberg™ mission of promoting free access to electronic works by freely sharing Project Gutenberg™ works in compliance with the terms of this agreement for keeping the Project Gutenberg™ name associated with the work. 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The following sentence, with active links to, or other immediate access to, the full Project Gutenberg™ License must appear prominently whenever any copy of a Project Gutenberg™ work (any work on which the phrase “Project Gutenberg” appears, or with which the phrase “Project Gutenberg” is associated) is accessed, displayed, performed, viewed, copied or distributed: This eBook is for the use of anyone anywhere in the United States and most other parts of the world at no cost and with almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included with this eBook or online at www.gutenberg.org. If you are not located in the United States, you will have to check the laws of the country where you are located before using this eBook. 1.E.2. 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It exists because of the efforts of hundreds of volunteers and donations from people in all walks of life. Volunteers and financial support to provide volunteers with the assistance they need are critical to reaching Project Gutenberg™’s goals and ensuring that the Project Gutenberg™ collection will remain freely available for generations to come. In 2001, the Project Gutenberg Literary Archive Foundation was created to provide a secure and permanent future for Project Gutenberg™ and future generations. To learn more about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation and how your efforts and donations can help, see Sections 3 and 4 and the Foundation information page at www.gutenberg.org. Section 3. Information about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation The Project Gutenberg Literary Archive Foundation is a non-profit 501(c)(3) educational corporation organized under the laws of the state of Mississippi and granted tax exempt status by the Internal Revenue Service. 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