The Project Gutenberg eBook of O Ensino da Historia da Arte nos Lyceus e as excursões escolares

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Title: O Ensino da Historia da Arte nos Lyceus e as excursões escolares

Author: Joaquim de Vasconcellos

Release date: March 16, 2008 [eBook #24844]
Most recently updated: January 3, 2021

Language: Portuguese

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*** START OF THE PROJECT GUTENBERG EBOOK O ENSINO DA HISTORIA DA ARTE NOS LYCEUS E AS EXCURSÕES ESCOLARES ***



O ENSINO

DA

HISTORIA DA ARTE NOS LYCEUS

E

AS EXCURSÕES ESCOLARES

POR

Joaquim de Vasconcellos






PORTO
Typ. de A. J. da Silva Teixeira, Successora
Rua da Cancella Velha, 70
1908
[1]

O Ensino da Historia da Arte nos Lyceus

E

AS EXCURSÕES ESCOLARES

Os Documentos que vão lêr-se prendem-se com um problema que julgo de immediato interesse e da maior influencia educativa. A circular de 25 de outubro de 1906 é a que recommenda a organisação das excursões escolares, como elemento pedagogico de capital importancia.

Não é de agora o empenho com que me occupo do assumpto. Ha mais de trinta annos (1877) que em artigos avulsos da imprensa, conferencias publicas, opusculos e volumes de critica e de pedagogia da Arte, ando propondo a solução racional e mais economica, dentro dos nossos usos e costumes, isto é: conforme as boas tradições da arte e da vida portugueza.

O assumpto vae ser debatido muito brevemente pelo Conselho do Lyceu El-Rei D. Manoel II. Os documentos são ineditos.

É necessario advertir que o elemento estampa, que as figuras (e portanto a Arte) inundaram==é este o termo==os [2] livros, destinados á instrucção primaria e secundaria, porque o programma official dos concursos de compendios exige as illustrações, que são applicadas, muitas vezes, sem sombra de criterio, sem o menor respeito pelas leis da esthetica. Já não fallarei do criterio pedagogico, revelado na escolha d'ellas1... Esta questão é apreciada em outro logar2.

Porto, 1 de novembro de 1908.

Joaquim de Vasconcellos.

[3]

DOCUMENTO I

Ill.mo Ex.mo Snr. Reitor do Lyceu Central do Porto El-Rei D. Manuel II.

Já em sessão do Conselho do Lyceu3, agradeci a honra de me haverem convidado para collaborar no programma que convém organisar, no intuito de satisfazer os varios fins do problema educativo que a Circular de 25 de outubro de 1906 da Direcção Geral de Instrucção Publica recommenda á attenção do corpo docente dos Lyceus.—Hoje renovo o meu agradecimento e repito que apenas sobre um dos pontos do programma da circular me posso pronunciar com conhecimento de causa; o que se refere á visita dos alumnos aos nossos monumentos nacionaes.

Não pertenço ao grupo dos professores que [4] leccionam sciencias physicas e naturaes, nem ao grupo que ensina geographia e historia. A esses especialmente compete responder. Como adjunto me considero pois, sómente, como vogal supplementar a quem os seus estudos especiaes sobre a historia da arte e das industrias portuguezas, feitos ha dezenas de annos, dão voto no problema educativo. É unicamente como escriptor e pedagogo, que tenho sido n'esses assumptos de educação artistica, que posso prestar algum serviço; como professor do Lyceu não poderia ter competencia n'uma materia que em nenhum Lyceu do reino é ensinada.

Devo dizer, a proposito, que semelhante materia—estudo dos Monumentos Nacionaes—portanto estudo da Arte, em geral, e das suas varias manifestações decorativas—é hoje ensinada unicamente na Escola de Bellas-Artes de Lisboa, em tres cadeiras, segundo a ultima organisação (Reforma de 14 de novembro de 1901)4. A Escola irmã do Porto não tem esse ensino, nem sombra d'elle. Estão no mesmo caso as duas Escolas ou Academias polytechnicas de Lisboa e Porto, os dois Institutos industriaes das mesmas cidades e ainda todas as Escolas Industriaes do Reino, apesar de serem de fundação recente (1883-84).

[5]

Comtudo, em todos esses estabelecimentos de ensino (e inclusive na propria Universidade de Coimbra, cadeira de Desenho annexa á faculdade de Philosophia), o ensino das formas da arte entra, com mais ou menos desenvolvimento, como disciplina obrigada. Esqueceu-se porém o legislador, esqueceram-se os pedagogos officiaes de nos dizer como é que o ensino das formas, quer pelo desenho (lapis ou pincel), quer pela esculptura (escopro ou cinzel), quer pelo esquadro em linhas architectonicas—se pode realisar, quando alumnos e professores ignoram por completo a genese historica d'essas formas e a esthetica que d'ellas se deriva, em ultima instancia!

Sublinho muito de proposito esta anomalia para que ninguem supponha que é problema facil ensinar a alumnos de qualquer Lyceu, mesmo nas classes superiores (6.ª e 7.ª) o methodo pelo qual se chega a uma apreciação, embora muito summaria, mas sensata de qualquer monumento, quer sob o aspecto esthetico, quer sobre o ponto de vista historico. Esses alumnos têm comtudo, sempre noções sufficientes das outras disciplinas (Sciencias physicas e naturaes—Geographia e Historia) que poderão utilisar praticamente nas excursões escolares. Da arte, porém, e mórmente da architectura, não possuem a minima noticia. E não se diga que se trata de especialisar, de proceder a estudos technicos, dentro de um programma que pertence só ás escolas especiaes. Mesmo reduzindo a exposição ao mais elementar, dando á Arte apenas o papel de companheira da Historia, [6] ainda fica margem para serios estudos, ainda são graves as difficuidades que encontro.

A inclusão do ensino da Historia da Arte no programma dos Lyceus centraes seria evidentemente o meio mais efficaz de interessar o alumno no estudo dos monumentos nacionaes e, por meio d'elles, no estudo de todas as tradições patrias, no estudo do nosso solo, dos nossos costumes, da historia intima da familia portugueza. Não é uma utopia.

O decreto de 14 de novembro de 1901 já diz no preambulo textualmente: «Lá fóra, cadeiras de historia da arte estão appensas ao ensino secundario, como explicação, ora causal, ora integrante dos successos da historia social e politica.» (L. cit., pag. 70). Poderei, se fôr preciso, apresentar a V. Ex.a e ao Conselho do Lyceu numerosos volumes nas linguas allemã e franceza que servem de compendios de Historia da Arte nas varias classes do ensino lyceal da Allemanha e França, tanto para o sexo masculino, como para o sexo feminino. Limito-me aqui a citar apenas as obras magistraes do Prof. Wilhelm Lübke de Stuttgart, não as grandes monographias sobre a historia da architectura, esculptura, pintura, etc., mas sómente os resumos methodicos com o caracter de vulgarisação e de propaganda em grande escala, para intelligencias medianas, resumos que têm sido traduzidos em quasi todas as linguas vivas europeias.

O estudo da historia da arte e o modo como ella é divulgada no ensino secundario, influiu até [7] no ensino da historia, propriamente dito, transformando-o, ampliando-o. Vejamos:

Ha mais de 25 annos que o ensino da historia começou a ser facultado na Allemanha aos dous sexos, de modo a ligar os factos politicos com as tradições, as manifestações da arte, e com os costumes sociaes. O que foi historia, segundo a idéa limitada do chronista, transformou-se na pintura da civilisação de um paiz. Os allemães crearam o termo: Culturgeschichte para caracterisar esse novo processo de escrever e de ensinar a historia. Assim vemos, por exemplo, já n'uma obra notavel de E. Döring: Lehrbuch der Geschichte der alten Welt für höhere Schulen (Manual da historia do Mundo antigo para escolas secundarias, Frankfurt a/M. ed. M. Diesterweg, 1880) a historia politica dos povos orientaes, dos gregos e dos romanos, ligada á mythologia, á historia da arte e ao quadro da civilisação antiga. Illustram os volumes gravuras dos mais famosos monumentos, reproducções das mais celebres estatuas e pinturas muraes; são chamados a depôr os productos afamados da arte ceramica e da glyptica, que tão fielmente nos descrevem as scenas da vida intima dos antigos. Os trajes, os utensilios domesticos, a vida do palco e da officina, nada falta n'esse compendio de historia. O estudo da architectura vae, por exemplo, até á analyse das plantas dos edificios (templos, theatros) e dos seus elementos constructivos (systema das tres ordens). E comtudo esta obra nunca deixa de ser um compendio de historia, [8] com o caracter de texto para o ensino secundario (für höhere Schulen).

Já em 1891 um auctor inglez (Morse Stephens) tentou n'uma Historia de Portugal5 um processo parecido, illustrando o texto com grande abundancia de imagens, sem comtudo pretender imitar, nem de longe, o methodo pedagogico, transcendente, do auctor allemão citado.

Os novos modelos estrangeiros não passaram desapercebidos em Portugal a um ou outro amigo da instrucção. O benemerito escriptor Trindade Coelho no seu volume intitulado Pão Nosso—Leituras elementares e encyclopedicas para uso do povo (Lisboa, Aillaud, 1904) inclue um capitulo Arte (pag. 245-256), que abrange a Architectura, Esculptura e Pintura e por fim Monumentos de Portugal, com 14 grav., entrando na ultima secção vistas do mosteiro dos Jeronymos e da Batalha. O unico reparo que devemos fazer a esta tentativa corajosa e benemerita, é a reducção extrema do assumpto a 15 pag., quando em tão limitado espaço apenas caberia uma menção resumida dos edificios notaveis portuguezes sómente e da sua significação historica.

É sob este ponto de vista, n'esta intima relação que deve ser recommendado o estudo dos nossos principaes monumentos aos alumnos dos [9] Lyceus. O professor de historia deve entender-se sempre com o especialista que houver de fazer a exposição propriamente technica e esthetica. E quando digo especialista, sublinho o termo, porque excluindo do terreno o erudito que pode cançar o alumno com uma tarefa excessiva, ponho tambem de parte o curioso, que o enfastiará com banalidades. Só quem conhece um assumpto a fundo é que póde gradual-o em harmonia com o sentir e pensar de um auditorio, cuja capacidade no caso sujeito—o dos Lyceus—deve variar muito.

Os Mosteiros de Belem e da Batalha, a collegiada de Nossa Senhora da Oliveira, os templos de Alcobaça e Leça do Balio, as Sés de Lisboa, Porto e Coimbra, as creações polymorphas de Thomar e Cintra e muitas outras, estão tão intimamente ligadas á vida historica da nação portugueza, que não é possivel ao moderno prelector separar o elemento arte da narrativa do chronista, tanto menos que os antigos escriptores foram quasi sempre de um laconismo desesperador em materia d'arte, e devem ser corrigidos e completados a cada passo, dentro da aula e fóra d'ella, durante as excursões. Temos tido occasião de verificar centos de vezes perante os monumentos, que estes e as suas pedras desmentem os chronistas.

Deve exigir-se pois ao professor de historia dos nossos Lyceus o conhecimento da historia da arte e da archeologia, tanto quanto fôr necessario para a informação dos seus respectivos alumnos. [10] Para elle se habilitar com esse ensino, é forçoso crear cursos livres, sufficientemente remunerados, junto dos Lyceus, para os quaes o Governo deverá chamar os especialistas de merito comprovado.

Até então, terá o professor de historia de contentar-se com a sorte que o poderá favorecer com o concurso de um collega ou de pessoa estranha ao Lyceu, bastante habilitada e intelligente para comprehender o modesto cargo de commentador technico das excursões que revestirem um caracter artistico; bastante enthusiasta e amante da sua terra para pôr em relevo, n'uma demonstração de esthetica pratica, applicada, o que constitue o sentimento do Bello na Arte e o seu reflexo sobre a alma portugueza.

Esse commentario artistico não é, nem póde ser o que se faz no ensino academico aos alumnos que se encaminham para o estudo das Bellas-Artes. É uma iniciação no estudo elementar das fórmas da arte, mórmente na architectura e nas artes decorativas, que d'ella dependem, iniciação para a qual se exige a collaboração assidua do alumno, que deverá levar sempre debaixo do braço o seu album ou caderno de notas, para aprender a tomar apontamentos e a fazer pequenos esbocetos in loco.

Em casa deverá ampliar e completar as notas tomadas segundo um Questionario adequado.

Resumo as minhas conclusões:

[11]

1.º O estudo dos Monumentos Nacionaes é necessario no ensino secundario dos Lyceus centraes, pelo menos.

2.º Este estudo não póde realisar-se proficuamente sem um estudo parallelo dos elementos essenciaes da historia da arte.

3.º Este estudo póde e deve ser feito como Commentario ao Curso de Historia, pelos seguintes meios:

a) Excursões escolares dos alumnos das classes mais adeantadas.

b) Commentario technico e esthetico perante o monumento, á altura da capacidade dos alumnos.

c) Notas, esboços e reproducções photographicas, tiradas nas respectivas localidades.

4.º É necessario crear, desde já, os Cursos livres sobre historia da Arte, especialmente da Arte nacional, junto dos Lyceus centraes, emquanto não se incluir o ensino regular das fórmas da Arte no Quadro das disciplinas do Lyceu para ambos os sexos, conforme existe ha muito nos Lyceus de França e Allemanha.

5.º É necessario ir juntando, desde já, o material de demonstração, colleccionando estampas, photographias e reproducções em gesso, que sirvam para o estudo, o que póde ser feito, aproveitando os trabalhos dos alumnos e quaesquer publicações nacionaes de valor, por exemplo, a excellente collecção da Casa Biel do Porto: A Arte e a Natureza em Portugal, que já apresenta um inventario artistico muito variado e muito valioso (73 fasc. a 4 est., total 292, com texto em portuguez e francez), publicação economica que está até ao alcance dos alumnos, porque os fasc. vendem-se separadamente a 500 reis.


P. S. A obra está agora concluida em 8 vol. a 12 fasc. cada um. Cada fasc. a 500 reis, com 4 est. e 8 pag. de texto (Nota accrescentada em Outubro de 1908).

[12]

DOCUMENTO II

Ill.mo Ex.mo Snr.

Alguns collegas meus do Lyceu, que V. Ex.a dignamente dirige e ainda outros do Lyceu da 1.ª zona, alguns dos quaes assistiram ás minhas Conferencias sobre Historia da Arte nacional, realisadas no Museu da Academia portuense de Bellas-Artes nos meses de junho e julho—manifestaram-me o desejo de as ouvir novamente, seguidas.

Raros foram os que assistiram a todas as cinco; e aquelles que só ouviram fragmentos transmittiram-me, com o desejo acima formulado, os votos dos collegas que, por dever do officio, não lograram assistir a nenhuma; estes ultimos, com mais razão ainda, pediam e pedem a repetição.

Parece-me, Ex.mo Snr., que n'este caso devo ser grato a manifestações tão honrosas e corresponder ao desejo com a offerta de serviço maior [13] e mais effectivo do que aquelle que tentei em julho proximo passado.

Em vez de um Curso de historia da arte romanica archaica, da historia de um periodo, embora de capital importancia—offereço-me para organisar um Curso graduado e completo da Historia da Arte comparada, especialmente da Arte Nacional, em lições semanaes, ás quintas-feiras, e se fôr necessario e a Lei o permittir, poderei reforçar esse Curso com uma prelecção ao domingo, em quanto durar o anno lectivo.

Os meus dignos collegas que em ambos os Lyceus regem proficientemente as cadeiras de Historia geral e especial, foram os primeiros a applaudir a ideia que, em embrião, exponho a V. Ex.a, para que se digne submettel-a á consideração, ao superior criterio do Conselho do Lyceu, que a poderá corrigir e completar, pois sendo uma innovação poderia parecer excesso de trabalho n'um programma de estudos, já carregado soffrivelmente.

Trata-se, porém, de uma materia que só pede ouvintes voluntarios e não obriga a nenhum exame nem despeza—pois todo o material illustrativo é offerecido por mim, (sendo aliás consideravel, raro e dispendioso) sem nenhum encargo para o Estado.

N'este caso parece-me que presto algum serviço no sentido de uma Proposta fundamentada sobre o modo de tornar proficuas, para o Estudo da Arte, as excursões escolares, a qual durante o anno lectivo findo apresentei por escripto [14] a V. Ex.a e mereceu o louvor do Conselho escolar6.

Solicito de V. Ex.a e do Conselho a mesma benevolencia para a offerta, que ora faço, do Curso graduado.

Se fôr acceite, apresentarei o programma, sem demora, que de certo modo se ajusta e combina com o Programma official do Curso de Historia. Nào é copia de nenhum programma estrangeiro7: é uma adaptação rigorosamente nacional, especialmente para estudo do que é nosso, embora os lineamentos geraes se baseiem no que traçou magistralmente Mr. de Caumont no seu Curso de archeologia e historia da arte (civil, religiosa e militar) Caen, 1870, 5.ª ed., em 3 vol.—e Mr. Ch. Blanc—para a Historia das Artes decorativas (Grammaire des arts du dessin, 6.ª edição; e Grammaire des arts décoratifs).

Como compensação—se a V. Ex.a e ao Conselho parecer justo—peço apenas que me sejam contadas as horas de serviço d'esse Curso como [15] serviço normal do horario, e pelo preço da tabella official, sem nenhuma gratificação a mais.

Algumas horas de menos no ensino das linguas, que professo, podem ser preenchidas por outro collega, sem prejuizo algum, creio eu.

Em compensação, offereço um ensino novo, nos Lyceus, que está introduzido nos principaes paizes cultos, para ambos os sexos, no quadro do ensino secundário desde 1875.

Se a troca de certas lições de linguas, pelas lições de materia nova, não parecer acceitavel, por qualquer motivo ponderoso, então offereço-me para accumular o serviço novo com o antigo, mediante a remuneração da tabella official. E se a peço, é porque a organisação do Curso importa para mim, em todo o caso, a acquisição constante de novo material de estudo, além do que tenho accumulado durante cerca de quarenta annos.

O material para o ensino da Historia propriamente dita e da Historia da Civilisação—no sentido em que os allemães a classificam de: Culturgeschichte, que vi e examinei demoradamente no Lyceu, ha meses, é—a bem dizer—inintelligivel, sem uma Exposição parallela da Historia da arte antiga comparada, sobretudo da arte egypcia e greco-romana.

Em face das descobertas capitaes no dominio da arte pre-historica e proto-historica, feitas em Portugal durante os ultimos trinta a quarenta annos, é inadmissivel querer separar as questões ethnologicas, ethnographicas e archeologicas, [16] n'uma especialisação esteril, que a ninguem aproveita, salvo ao pedantismo de alguns raros eruditos bisonhos.

O ensino da historia deve ser vivo, hoje, palpitante, em face do monumento, da estatua, da tela, da gravura, da photographia, da planta topographica, do desenho e do esboço. O livro illustrado pela Arte invadiu tudo.

Todo o enorme material dos Museus europeus foi posto em movimento ha meio seculo.

O que sabe o alumno dos Lyceus de tudo isso?

O que sabe elle do material accumulado nas collecções nacionaes?—quando uma imagem, um retrato supre, ás vezes, uma lição?

Fui talvez prolixo n'esta justificação; mas, confessando o defeito, peço a benevola attenção de V. Ex.a e do Conselho para os motivos, que são puros e sinceros.

Deus guarde a V. Ex.a

Porto, 9 de agosto de 1908.


Ill.mo e Ex.mo Snr. Reitor do Lyceu Central do Porto—2.ª zona.

O PROFESSOR EFFECTIVO

Joaquim de Vasconcellos.

1 Por exemplo: o compendio de Historia do snr. Marques Mano (Porto, 1908—Preço 2$000 reis) tem 96 estampas. O compendio de Geographia do mesmo auctor, (Porto, 1908—Preço 1$200 reis) tem 66 estampas; aqui, uma boa escolha e cuidadosa reprodução; acolá, confusão e falta de criterio esthetico e pedagogico.

2 Na Revista: Educação Nacional. 8 de nov. 908.==A arte nos livros do Ensino.

3 No mez de maio de 1907.

4 Vid. Boletim da Dir. Geral de Inst. Publ.—Anno I, 1902, fasc. 1-5, pag. 70-88.

5 Foi traduzida por Oliveira Martins; as gravuras do original inglez apparecem, porém, mal reproduzidas.

6 Está transcripta no Documento I.

7 A prova já a dei no Elencho de Quatro Conferencias (aliás cinco) que fiz nos mezes de junho e julho d'este anno, na Academia Portuense de Bellas-Artes. O programma impresso—Porto, 1908, 8 paginas, versa sobre o Estylo romanico archaico e o Romanico dos seculos XI e XII. Este programma nada tem de commum com o espetaculoso prospecto da 13.ª cadeira da Escola de Bellas-Artes de Lisboa—que trata da Historia geral da arte na Edade Media e envolve Portugal, por incidente, em appendice.